A voz de quem cuida em Paliativos

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A Unidade Local de Saúde (ULS) do Nordeste assinala o Dia Mundial dos Cuidados Paliativos – 12 de outubro – dando a palavra a profissionais deste Departamento que, ao longo da última década, aí têm vindo a prestar cuidados a doentes com necessidades paliativas.

O que são os cuidados paliativos?

Definem-se como cuidados ativos, coordenados e globais, prestados por unidades e equipas específicas, em internamento ou no domicílio, a doentes em situação de sofrimento decorrente de doença incurável ou grave, em fase avançada e progressiva, assim como às suas famílias.

 

Qual é o seu objetivo?

É promover o bem-estar e a qualidade de vida, através da prevenção e alívio do sofrimento físico, psicológico, social e espiritual, com base na identificação precoce e no tratamento rigoroso da dor e outros sintomas físicos, a par das necessidades psicossociais e espirituais.

 

Que filosofia seguem?

Os cuidados paliativos devem ser implementados o mais precocemente possível, aliados a outras terapêuticas (radioterapia, quimioterapia…). A filosofia seguida é afirmar a vida e aceitar a morte como um processo normal; levar os doentes a viver tão ativamente quanto possível até ao final; aliviar a dor e o sofrimento; contribuir para a melhoria da qualidade de vida, influenciando positivamente a trajetória da doença; e integrar as componentes psicossocial e espiritual nos cuidados do doente e família, inclusive no processo de luto.

 

E na ULS do Nordeste?

A ULS do Nordeste tem um Departamento de Cuidados Paliativos, disponibilizando respostas diversas e multidisciplinares às necessidades neste âmbito. É o caso da Unidade de Internamento, em Macedo de Cavaleiros, com 12 camas; as Equipas Intra-Hospitalares de Suporte em Cuidados Paliativos (nos hospitais de Bragança, Macedo e Mirandela), as Unidades Domiciliárias de Cuidados Paliativos (da Terra Fria, de Alfândega da Fé e do Planalto Mirandês), Hospital de Dia e ainda Consulta Externa.

 

Relação médico-doente

A missão do médico é estar ao serviço dos doentes, não se posicionando co­mo se o outro lhe fosse transcendente, mas sim em estreita vinculação com ele, num encontro de intersubjetividade, de perceção e respeito absoluto pelas possibilidades do outro. Na experiência da fragilidade do outro, da crise, da doença reversível ou irreversível, o apelo do cuidado dita a intervenção médica.

Nem o tecnicismo nem a massificação da medicina conseguiram despersonalizar o doente. A relação paternalista deu lugar ao “homem duplo”, ao “ser bi-pessoal” de responsabilidade partilhada, de surpresa, em que dois sujeitos partem de lugares diferentes e olham para o mesmo objetivo, onde se fundem, partindo em união para uma cadeia de decisões.

O homem-médico anseia radicalmente a reabilitação do homem-doente vulnerável e sofredor, mas é imperativo aceitar a finitude humana, aceitar que ninguém é senhor do tempo nem do futuro.

Este triângulo singular, ou seja, médico-doente-doença, quando inclui um corpo irreversivelmente doente, um espírito conturbado pela intuição da morte e um médico consciente da sua impotência na cura, é triângulo de infinita desigualdade vital, mas também de infinita igualdade na incerteza. Cabe ao médico total disponibilidade, humana presença, para absorver em si os ecos ruidosos do corpo que termina, descobrir com a pessoa doente tudo o que tem para viver nesse tempo de despedida e paz. Cabe-lhe sobretudo não arremessar sobre o doente e a família os seus próprios medos.

O privilégio da partilha de duas narrativas vivenciais, em que o escutar e o atender ganha prioridade sobre o conhecer e o entender, cria novos espaços de encontro, em códigos que os olhos e a matemática não alcançam.

Liseta Gomes – Médica

 

Cuidar em equipa

É para mim um privilégio acompanhar o desenvolvimento dos cuidados paliativos no Nordeste Transmontano. Nesta valência, somos das regiões do país com maior cobertura. E é importante realçar o que temos de bom!

Os últimos 10 anos permitiram que doentes em situação de doença crónica, progressiva e incurável tivessem acesso a cuidados paliativos em diferentes tipologias, seja em regime de internamento ou no domicílio (do próprio doente ou de um familiar, lares, família de acolhimento ou na Rede Nacional de Cuidados Integrados).

O bem-estar do doente é a nossa principal preocupação. E só é possível atingir os nossos objetivos trabalhando em equipa, sendo o doente e o cuidador parte integrante dessa equipa.

Poder aliviar a dor e outros sintomas, não só a nível físico como emocional, social e espiritual, permitir que o doente permaneça no domicílio, faz-nos ter, enquanto equipa, a perceção de dever cumprido, com o acompanhamento do doente e da família, num momento tão marcante para quem parte e para quem vê partir.

Ana Gonçalves, Enfermeira

 

A psicologia tem um papel crucial nos cuidados paliativos, não só pelo suporte que proporciona aos doentes e famílias, mas também pela continuidade do apoio emocional no luto. Trabalha-se a aceitação e as adaptações necessárias à doença, fazendo emergir prioridades pessoais, sociais/relacionais e espirituais, muitas vezes subestimadas. O objetivo é que os doentes e famílias consigam reestruturar as suas experiências e significado de vida, vivenciando o final de vida com dignidade e com aceitação incondicional.

Sara Fernandes – Psicóloga

 

Promover a autonomia

Incurabilidade, incapacidade que se instala, dor que já não se tolera. Agora querem-se outros cuidados, dizem que se chamam paliativos: quer-se alívio, conforto... mas ainda assim sentir-se ativo, capaz... Capaz de se adaptar às mudanças do corpo que lenta ou rapidamente vão surgindo. É nessa altura que a fisioterapia desempenha o seu papel: procura prolongar as tão preciosas funcionalidade e autonomia.

Cidália Nunes – Fisioterapeuta

 

Envolver a família

A intervenção social em cuidados paliativos assenta em componentes essenciais como o acompanhamento psicossocial, um modelo holístico e um plano de cuidados integrado ao utente, envolvendo sempre a família como parte fundamental do processo.

Sílvia Asseiro – Assistente Social