Da Chave na Porta aos Assaltos por Esticão

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S empre que vem a propósito, quando o tema é Segurança, costumo partilhar com os meus amigos a seguinte passagem: há pouco mais de 30 anos, frequentava eu a Faculdade de Letras da Universidade do Porto. No primeiro exame que tive, Literaturas Orais e Marginais, o prestigiado professor da cadeira, Arnaldo Saraiva, apercebendo-se da minha origem geográfica, pelo sotaque, comentou em voz alta: “Você é de Bragança, terra onde as pessoas deixam a chave na porta”. Infelizmente, não obstante a negação, uns por conveniência, outros porque lhes custa aceitar a mudança dos tempos, esse longínquo Paraíso Terreste, o Éden bragançano, é matéria para as agradáveis e salutares partilhas no “Memórias e Outras Coisas”, blogue de que sou fã incondicional. Há 3/4 anos, numa vaga de assaltos na cidade de Macedo de Cavaleiros – extensível a todo o distrito de Bragança-, um comerciante, a quem tinham assaltado a loja comercial várias vezes no mesmo mês, e de cujas intromissões dos donos do alheio resultaram avultados prejuízos, instado a pronunciar-se, perante a comunicação social, sobre o sucedido, e num estranho estado de resignação, observou: “ A sociedade pariu- -os, temos que os aguentar!”. Numa tarde do pretérito mês de Julho, estando eu na esplanada do café Goalkeeper, na Rua Almirante Reis, por volta das 18 horas, a beber o meu fininho, assisti, incrédulo, à parte final dum assalto, cuja vítima, um jovem africano, estudante de mestrado no IPB, lhe foi roubada a carteira na “Creparia” Raquel. O desespero do jovem, na ocasião, não era tanto o dinheiro roubado, mas os documentos, porque, no dia seguinte, tinha viagem marcada para o seu país. Pela descrição física dos meliantes - um rapaz e uma rapariga - (alguém, que por ali passava no momento, se apercebeu), o marido da Raquel, o Toninho Sardinha, ficou a saber quem eram os “artistas”. Adoptando uma atitude pedagógica, sem participar às autoridades policiais, foi a casa dos ditos e recuperou a carteira com os documentos. Há duas semanas, na nossa cidade, a comunicação social local e as redes sociais davam conta dum assalto por esticão, cuja vítima, uma jovem, além do roubo, ficou fisicamente muito mal - tratada. Acontece também, com alguma frequência, na nossa “pacata” Bragança, idosos serem assaltados, em plena luz do dia, quando vão levantar a mísera reforma ao banco. Isto tudo será coincidência?! Não. Estes episódios, que, desde sempre, nos habituámos a ouvir falar na rádio, na televisão e a ver nos jornais, e que tinham como palco as grandes cidades do país, está hoje, para mal dos nossos pecados, a tornar-se norma em Bragança. Há solução para isto? É evidente que sim. O problema está do “politicamente correcto”, que está a fazer Escola nesta sociedade de valores invertidos, que, nesta matéria, é sinónimo não de urbanidade ou inteligência social, mas da mais indisfarçável hipocrisia e rasteiro tacticismo político. Mas como não sou, nem de perto nem de perto nem de longe, adepto do fingimento, mas partidário da ideia de que se devem “chamar os bois pelos nomes” e, por outro lado, porque a segurança, enquanto cidadãos, é um dos bens mais preciosos que podemos almejar, lanço o seguinte desafio a quem a Democracia, através do voto, legitimou para nos representar. Todos sabemos (até a mais boçal criatura) que grande parte do produto dos furtos é para comprar droga. Assim sendo, via com bons olhos facilitar a vida a esta rapaziada, criando na nossa cidade um “centro de acolhimento”, qual “Quinta dos Segredos”, ou, no formato televisivo mais recente, um “Quem quer Casar com o Agricultor”, mas com o nome (parece-me feliz) de “Quem quer fumar com o toxicodependente”. Seria um local permanente abastecido do “produto”, quer pela autarquia, quer pelas IPSS (eu próprio me prontificava, a título de voluntariado, na ajuda das ditas entregas), para que nenhum “utente” fosse privado da respectiva dose diária. Porque prezo muito a minha segurança e a dos meus, não me importava nada (digo- -o sem qualquer ironia) que retirassem mensalmente do meu magro vencimento, quer através de imposto, quer de taxa municipal, uma percentagem para esta “causa”. Se continuarmos a fechar os olhos a esta triste realidade (permitam-me a metáfora: o lobo só desce ao povoado e ataca, se não tiver alimento no matagal), temo o que estará para vir!

António Pires