A estação maluca

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O Verão ganhou o apodo de estação maluca porque segundo críticos de olhar acerado, língua afiada, escrita tersa e acutilante, as pessoas ganham comportamentos esquisitos atribuídos às elevadas temperaturas alcançadas nos meses que lhe dão corpo.
Não vou maçar os leitores trazendo em meu auxílio bordões de vária natureza, tonalidades e sonoridades a justificarem o epíteto, o Estio é a estação maluca nos círculos bem pensantes (assim se julgam). Ponto final parágrafo.
Fragmentos de estrídula matricialidade o confirmam, ou pelo menos revestem de veracidade tal juízo relativo a sazão sem juízo. Sem obstáculos à observação a bebedeira desportiva iniciou-se há mais de um mês sendo o futebol o primacial motivo. A verdade manda escrever que desde a Primavera se sucediam as carraspanas clubísticas, o campeonato europeu alargou os efeitos, eufóricos glosamos a humilhação aos chauvinistas franceses, vingamos antigas humilhações, o feito assumiu a coloração de épico acontecimento análogo à batalha de Aljubarrota. Vale a pena ler o artigo de Eduardo Lourenço acerca do feito.
As senhoras do atletismo também ganharam medalhas e logo lacrimejaram a comenda de mérito igual à concedida aos futebolistas. Se estivessem mais serenas calavam-se ficando à espera da reacção do Presidente da República. A protestante após receber o penduricalho veio em forma de assim dizer não estar «chateada» com o Professor Marcelo, nem ele com ela. O efeito da caloraça às vezes frita as meninges sem necessidade de sertã e azeite. O eclético Presidente tomou boa nota, não é Lelé da cuca, possui memória de elefante.
As televisões esburgam os ossos de todas as modalidades até ao tutano, na estação maluca baixam as receitas publicitárias, adicionam-lhe o sangue de tragédias e desastres em quantidades a fazerem inveja aos filmes produzidos em Espanha nos idos de sessenta impregnados de sumo de tomate, raparigas carnudas, cobóis empoeirados e pistolas reluzentes. Até a Cláudia Cardinale surgia na pantalha a bambolear os generosos pómulos. No geral do Cine Camões batiam-se pés e soltavam-se alarvidades. Pudera!
A tonta estação no ano presente ao contrário dos passados tem o acicate político das palmatoadas, longe vão os tempos das férias repimpadas da classe mais criticada na sociedade portuguesa, também muito invejada pois potencia narcisismos, mesmo que inócuos. Empunhando a Santa Luzia, a dona Luzia sabia fazê-lo, os homens de Merkel representam mal no folhetim das sanções, expresso em milhentas declarações, algumas despudoradas, mesmo por cá cujo exemplo «maluco» são as de Maria Luís Albuquerque. Ninguém lhe coloca pedras de gelo nas «fontes» da cabeça?
Obviamente, a toleima não é exclusivo da Senhora que devia estar calada durante pelo menos dezoito meses, o período de nojo de Barroso, os já referidos burocratas de Bruxelas também gostam de se divertir período festivaleiro, sisudos recorrem às fábulas de Esopo, atacam Portugal imitando o lobo (não o ibérico) a lamber os beiços e a regougar ao cabrito: se não foste tu, foi o teu pai.
Se meditarmos sobre as declarações dos ditos senhores irritamo-nos, podemos ficar possuídos de loucura (Erasmo de Roterdão) mansa ou furiosa, de qualquer maneira, a maleita não pode tornarmo-nos iguais aos loucos imunes a todo o género de malfeitorias, sofrendo no corpo e no ânimo as consequências da insânia de políticos encerrados na torre do poder.
O filósofo Foucalt deixou-nos fuzilantes considerações relativamente aos doentes mentais e sua vivência durante Idade-Média, só que, felizmente, por um lado já não estamos em tempos medievais, por outro a consciência política evoluiu profundamente, a trilogia liberdade, igualdade e fraternidade o atesta.
A maluquice pode atacar-nos na época calmosa, não pode é privar-nos de senso, bom senso, no sentido de pensarmos nas motivações profundas dos decisores europeus comunitários.
Não podemos ter a sorte do cabrito. Como? Será que os partidos, todos, não conseguem aglutinar esforços no sentido de afugentarmos o predador? A oposição laranja tem de sair do seu labirinto. Se persistir na errância o custo eleitoral subirá desde logo nas autárquicas. Duvidam? No próximo ano também volta a estação doida.

Armando Fernandes