Malefícios do Telemóvel

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A Senhora Professora usava um telemóvel descartável no exercício de trabalhos chantagistas sob o pretexto de divulgar naifadas (desculpem o termo, mais a mais quando a executante é uma educadora) nos matrimónios dos prevaricadores amigos da mulher do próximo, também do homem da próxima, no futuro não sei como irei escrever após a entrada em vigor do cartão da cidadania.
A expedita pedagoga não era gaga a pensar e a escrever mensagens ameaçadoras, evadia-se da obrigação de falar no fito de fintar o desmascaramento, no intuito de não secar a fonte de rendimento obtida através da coscuvilhice pródiga no disse que disse, no dar continuidade através de novas técnicas de comunicação de valor acrescentado. Longe vão os tempos das falas sobre a vida alheia acobertadas debaixo do rótulo – de mulheres de soalheiro – alegre e soezmente comparticipadas pelos homens.
O sórdido episódio das tentativas de extorsão levaram-me a rememorar o ouvido nos ajuntamentos de pessoas pouco atentas aos efeitos de faladuras em alta voz obrigando a todos em seu redor ficarem a saber de incompatibilidades e debilidades de toda a ordem.
A necessidade de atenuar a erosão do ver, olhar e perscrutar leva-me a frequentar uma Clínica Oftalmológica onde pontifica o renomado oftalmologista António Sampaio. Este ilustre especialista reconhecido além-fronteiras, bragançano de gema, é neto e sobrinho de conhecidos médicos no território do Nordeste (Moreira Pires), além de não poupar esforços e cuidados no tratamento dos afectados irradia jovialidade, ainda mias acentuada quando salienta a sua ancestralidade bragança e transmontana.
Ora, há tempos, no decorrer de uma observação disse-lhe da minha intenção em escrever uma crónica a glosar pontos picarescos e jocosos das audições enquanto aguardo a vez de ser atendido. Alargou profundo sorriso.
A intenção ficou retida na bolsa da memória furtando-se à prisão devido à rocambolesca actividade da docente de Vila Real. Não vou desvendar nenhum segredo, esmiuçar negócios tratados, mentiras gordas e magras, luxuriosas e piedosas, seria impróprio, além de mau imitador das ditas cujas mulheres de ouve, conta, reconta e acrescenta, no entanto, asseguro a quem ler este escrito quão perigoso é tagarelar utilizando o extraordinário invento. Pior se forem adicionadas fotografias.
Certamente, o leitor já deu conta da sua tendência em elevar a voz quando entabula conversações longe dos interlocutores, as representações da voz – entonações e intonações – acentuam os graves e os agudos levando à saída da neutralidade, podendo resultar da imprevidência graves prejuízos a quem prevarica.
Todos conhecemos casos a confirmarem o acima referido, nos antigos centros de soalheiro e nos cantinhos do inferno às vezes aconteciam cenas de afrontamento físico envolvendo unhadas, puxões da rêpas, alarido recheado de palavrões, agora a sofisticação conduz a pagamentos forçados, vinganças e divórcios.
O prodigioso avanço da ciência e da técnica levaram ao esventrar de confidências sussurradas, a movimentação dos lábios desvenda o dito, entrar nos computadores e deles «sacar» o desejado é uma brincadeira de crianças, por assim ser estamos tramados.
A linguagem gestual mercê dos trabalhos de um ilustre cristão-novo Nordestino é reserva de polichinelo, as trocas de olhares espelham maquinações, pessoalmente, resta-me a escrita modelo encadeado. Às vezes tento, só que, passados uns dias não consigo decifrar o emaranhado. Recorro à minha mulher que também é paleógrafa. Ficam escarrapachados os íntimos sentimentos dando azo a obrigatórias e esponjosas explicações. Uma catrefada de palavras!
Preclaros leitores: todo o cuidado é pouco. Estou a treinar o método de comunicar através dos dedos. Lembram-se das significações? Façam o favor de não serem maliciosos!

Armando Fernandes