CORRUPÇÃO… OU CONFUSÃO?

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É assumido que o correto é começar pelo princípio. Contudo, quando este é incerto, difícil de identificar e impossível de o localizar, com segurança, não há outra solução que não seja… começar pelo fim mesmo que este seja confuso, complexo e pouco claro. É o que é! É com perplexidade que, na mesma semana seja do conhecimento público que um autarca tenha sido detido para justificar a exigência de contrapartidas (modestas) para uma associação desportiva e uma atividade cultural pela instalação no concelho de um mega investimento, que um outro autarca perdeu o mandato por ter usado um veículo da Câmara para fins pessoais ao mesmo tempo que se chegava à conclusão que a disponibilização de centenas de milhares de euros pela dire- ção do Benfica (que é o meu clube, de sempre) para prendas a árbitros não assume qualquer laivo de corrupção e que o primeiro-ministro foi levado a demitir-se por um parágrafo escrito pela Procuradora Geral, com base em escutas transcritas com lapsos e erros, não por algo que tenha feito, em concreto, no processo em análise, mas pelas supostas ações de um amigo que terá elegido como o melhor de todos e pela imprudência de um subordinado, mal escolhido, por certo… apesar de estar inocente. Inocente, sim. Porque se as suposições jurídicas implicam tais consequências, afinal a presunção de inocência, serve para quê? É uma treta para encher a boca? Ou apenas para mascarar a repetição da história? Há dois mil anos, no Gólgota foram crucificados e condenados à morte, Jesus Cristo, um ladrão bom e um ladrão mau, enquanto nas apertadas e movimentadas ruelas de Jerusalém, passea- va livremente Barrabás o assumido malfeitor libertado pelo povo em nome de quem se praticam todos os atos de justiça! Mas se olharmos pelo outro lado da cortina podemos ver a mesma realidade com outros olhos, nomeadamente na questão das contrapar- tidas de Sines em que o que mais importa não são elas, o seu valor ou destino mas a legalidade das pretensões dos empresários anteriormente recusadas pela vereadora, sendo igualmente questionável o interesse público de um investimento de milhares de milhões num mega armazém de dispositivos de memórias, gigantesco consumidor de energia e terraplanador de extensas superfícies protegidas que chega a Portugal, não como resultado da promoção lusa de captação de investimento, mas por recusa de outras localizações, que o carro da autarquia de Gaia foi usado para fins pessoais do presidente e também dos seus familiares. Mesmo que se admita ser exagerada a penalidade aplicada, não deixa de ser claramente condenável, pelos vistos a montanha de dinheiro dos cofres benfiquistas saiu em valores individualmente modestos, meras ofertas de cortesia e que não há qualquer prova nem indício razoável de consequentes benefícios, e ainda que, sendo inocente de quaisquer acusações que, bem ou mal, constem dos autos, António Costa é o responsável pelo epíteto de “melhor amigo” (a pretensa infelicidade do gesto igualmente não pode ser assacada a mais ninguém) e pela sua intervenção, remu- nerada ou não, em processos relevantes e de impacto na vida comum e ainda, apesar de vários avisos, a escolha do chefe de gabinete foi uma prorrogativa exercida conscientemente pelo detentor da chefia do governo. Não deixa, igualmente, de ser verdade que a condição de ino- cente não isenta ninguém de ser alvo de suspeitas e pode reconhecer-se alguma lógica na argumentação dos que defendem que quem está inocente se deve comportar de forma serena e não usar o cargo e o lugar onde o exerce para lançar dúvidas sobre a legitimidade das averigua- ções em curso. Perante este cenário é normal a disparidade de opiniões dos comentadores… Já os políticos deveriam reconhecer que as leis que aportaram a esta realidade foram feitas por eles!

José Mário Leite