Um país sem Lei, sem Rei, sem Roque

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Em nenhum momento da era democrática a situação portuguesa foi tão confusa e periclitante como no presente. Excpetuando, claro está, os tempos áureos do famigerado Processo Revolucionário em Curso (PREC) quando a democracia ainda não estava devidamente consolidada. Nem mesmo nos momentos aflitivos em que o Estado se defrontou com situações de pré-bancarrota a Nação esteve tão dividida, desmotivada e desgovernada, com destaque para o período que redundou no colapso do governo de José Sócrates. Tudo isto sobrepesando os grandes domínios da governança, designadamente político, social e económico, por mais que certos indicadores macroeconómicos hoje se apresentem circunstancialmente positivos. As crises profundas que presentemente se vivem na Saúde, no Ensino, na Habitação, na Defesa, na Justiça e na própria Agricultura não podem, de forma nenhuma, ser iludidas por mais que o governo as iluda, minimize e menospreze. As revoltas dos professores, dos médicos, dos enfermeiros ou dos quadros qualificados, entre outros, que procuram na emigração uma solução de recurso para as suas vidas, não são despicientes. Bem pelo contrário. Trata-se, portanto, de uma situação anormal, caótica e sobretudo surpreendente porquanto o Governo é suportado por uma ampla maioria de deputados, cega e servil, e tem ao seu dispor vastíssimos fundos comunitários, supostamente para desenvolver, modernizar e dinamizar o país, e propiciar, em última análise, melhores condições de vida aos portugueses, só que os resultados são manifestamente negativos. Manda a justiça que se diga, porém, que tudo isto também demonstra que a incompetência, a impreparação e a desonestidade dos governantes em particular e da classe po- lítica em geral, nunca foram tão gravosas e generalizadas como actualmente. O que se explica, principalmente, pelas evidentes e persistentes debilidades do regime político vigente, gerador de tão deprimentes cenários, ainda que assegure, até ver, o funcionamento frouxo das instituições democráticas fundamentais. Usando uma divertida embora dramática alegoria, dir-se-á que Portugal é um pais sem Lei, que o mesmo é dizer sem uma Constituição Política e correlativas leis fundamentais à altura das circunstâncias. E sem rei, porque o Presidente da República, incapaz de chamar a rainha à razão e de reverter este dramático status quo, como já teve oportunidade, razão e dever de o fazer, continua a optar por divertir o povo com sorrisos e dichotes, postergando os gravosos insucessos governamentais. Enquanto o Primeiro-ministro, qual rainha-mãe da desgraça, governa com cínica sobranceria, sobrelevando e abençoando, obstinadamente, os sucessivos escândalos e fracassos da sua corte. E sem que, até hoje, tenha ousado traçar um rumo claro e mobilizador, conducente a resgatar o país da mediocridade comunitária. Limita-se a governar como se governar fosse um permanente baile de máscaras em que uns tantos muito se divertem e tiram chorudo proveito. Mas, se aceitarmos que Portugal é um país sem lei e sem rei, também havemos de admitir que o é sem roque porquanto, do lado da oposição também se não vislumbram peças do xadrez político, bispos, torres e cavalos, capazes de desempenhar o papel que lhes cabe com a dignidade e a eficiência que as circunstâncias requerem. Claro que se esta conjugação negativa se não verificasse, Portugal teria hoje, por certo, um governo capaz, os fundos comunitários já estariam a dar bom frutos, o SNS estaria a funcionar em pleno, a TAP já não seria um encargo para a Nação, haveria paz no Ensino, a corrupção não andaria em roda livre e não existira tanta pobreza e discriminação. Melhor um tanto: os peões seriam tratados com a dignidade a que têm direito no tabuleiro nacional, e não seriam comidos a toda a hora, com a desfaçatez e a falsidade que são do domínio público. Assim sendo, isto é verdadeiramente dramático, não se vislumbram soluções imediatas, eficazes e duradoiras para os problemas que presentemente afligem a Nação porquanto continuam procrastinadas as indispensáveis reformas das instituições fundamentais que desde há muito estão identificadas e qualificadas. Reformas que, pelos vistos, não convêm a certos machuchos políticos porquanto melhor os favorece o Estado desgovernado, designadamente a Justiça desordenada, o povo afastado das urnas e a corrupção impune. Haveremos de concluir, por tudo isto, que urgente, mesmo, é mudar de governo.

Henrique Pedro