Beefs, women in red & etc.

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Ter, 28/06/2016 - 09:52


Há quatro séculos que a humanidade vê crescer, a partir da Grã-Bretanha, uma influência política e económica que atingiu, talvez, a condição de maior império conhecido. Já na fase de declínio imperial, foi-se consolidando o inglês como língua franca, em resultado do poderio americano, com todos os efeitos positivos e negativos na vida cultural mundial.
Vale a pena trazer à reflexão alguns factos, para que não fiquemos boquiabertos com a decisão dos habitantes do actual Reino Unido.
No período tardo-medieval já se notava o peso dos bretões, especialmente durante a guerra dos cem anos (séc. XIV/XV), um confronto que dilacerou a Europa.
Em Portugal, desde o século XIV, olhámos para a Inglaterra como uma potência que nos amparou contra a velha Castela. No entanto, não deveríamos esquecer que, em pleno século XVI, o corsário Francis Drake esperava as nossas naus, em acções de rapina, levando à sua raínha Isabel, a primeira, o espólio.
Pelo fim do século XVII já a Inglaterra disputava com a França o império mundial, apesar da famosa divisão do mundo, em 1494, em Tordesilhas, celebrada entre Portugal e o então novo reino da Espanha.
A Inglaterra chegou a primeira das potências. Mesmo quando, em 1776, perdeu o controle sobre as colónias da América do Norte, com a França a apoiar os revoltosos, continuou hegemónica, depois de ter anulado, com fleumático requinte, o visionário Bonaparte, provavelmente um dos mais lídimos representantes da ideia de uma Europa livre, cooperante e destinada a grandes feitos na história mundial.
Pelo meio fez dos portugueses peões de xadrez, impondo-nos um verdadeiro protectorado, que se prolonga até aos dias que correm, embora não pareça. Se nos lembrarmos de Beresford, em 1817 e do ultimato de 1890 talvez percebamos. No hino nacional, que hoje cantamos alegremente, a marcha era contra os bretões, não contra os canhões.
Durante o século XX o Reino Unido, que não deve confundir-se com a Inglaterra, surgiu duas vezes como um dos esteios da liberdade, o que lhe granjeou respeito. Mas, quando se sentiu a urgência de uma coesão europeia, para constituir um bloco capaz de se impor nas condições do fim do século XX, os ingleses não demonstraram empenhamento, permitindo-se agora arriscar surpresas pouco entusiasmantes. Desde logo, para eles mesmos, que podem ver desagregar-se o seu próprio estado, com escoceses e irlandeses a sorrir de desdém.
Por enquanto os cidadãos do Reino Unido que votaram pela saída da união, não estão sozinhos. Também por cá tivemos um fim de semana de women in red, que embarcaram na promessa de festa desagregadora. Foi interessante ver a encenação das blusas escarlate na convenção do Bloco de Esquerda, onde a ameaça de um Portexit foi anunciada, lançando a inquietação entre os parceiros que apoiam o governo.
Diz-se que já há ingleses arrependidos, especialmente os que perceberam que a Escócia pode ser um banho gelado que os deixará a bater o dente.
Precisamos todos de manter a calma e esperar que os ingleses venham reconhecer que a aposta foi um equívoco e se possam ainda travar os que nesta Europa insistem em fazer o caminho do abismo.

Por Teófilo Vaz