Vitória de Jerónimo foi derrota para interior

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Ter, 12/03/2019 - 10:04


Estamos fartos de chover no molhado e pouco mais haverá a fazer, pelo menos no tempo útil das vidas de cada um, provavelmente da própria existência do país, no que respeita à condição de quem ainda permanece nos três quintos do território a caminho do matagal. 

Pressente-se que qualquer reflexão serena, suportada na análise racional do percurso de séculos, aberta à ponderação das verdadeiras causas e de eventuais soluções, está condenada ao anedotário metropolitano, relembrado de vez em quando, entre imperiais e cascas de tremoços, nos cafés manhosos dos subúrbios, nos intervalos do futebol, principal esteio do patetismo alegre da pátria.

Ninguém se dá ao trabalho de encarar os verdadeiros problemas que se perfilam no futuro, mais próximo ou mais longínquo. Entretanto, as lideranças políticas não se cansam de reivindicar méritos de visão estratégica e de promoção de políticas de igualdade, de equidade na distribuição de recursos e de tratamento justo para todos os cidadãos.

Dos partidos habitualmente dominantes sabemos pouco poder esperar, tendo em conta a dura experiência dos quarenta e cinco anos de regime formalmente democrático que, afinal, não garantiu o desenvolvimento equilibrado das diversas regiões do país.

Mas também os que se anunciam como lídimos representantes de todos os deserdados são facilmente tentados pela gestão da conjuntura.

O Secretário Geral do PCP, Jerónimo de Sousa, não esteve com rodeios quando reivindicou para o seu partido a vitória da redução significativa dos preços dos passes sociais em toda a área metropolitana da capital, pelos vistos conjugada com o presidente da câmara de Lisboa e os dos municípios circundantes, mesmo alguns dos PSD. Fica provada a experiência do partido mais antigo do espectro politico português, que lhe permite lidar com as contradições, a cupidez e o novo-riquismo das várias camadas de uma burguesia que vive para o imediato e, por isso, vai saltando de espanto em espanto com as crises que lhe arrasam o bolso, as expectativas e a vaidade.

Tranquilo, professoral, adiantou que, depois da vitória alcançada, agora será tempo de realizar investimentos massivos nos meios de transporte (barcos, comboios, metro, autocarros) e nas infra-estruturas. À semelhança dos líderes dos partidos maiores, não se referiu ao resto do país, iludindo questões fundamentais.

Na realidade, a redução significativa dos preços, associada a possíveis melhorias na comodidade e eficácia da rede de transportes metropolitanos, sem medidas de compensação no resto do país, vai induzir uma mais gravosa concentração demográfica e mais investimento, que escoarão até à última gota a vida que restava em toda a faixa leste do país, provavelmente para os próximos milénios.

Suporte da solução governativa em exercício, de que não será dispensável, o PCP terá tido uma vitória de que se poderá orgulhar.

Quanto a nós, no nordeste transmontano, mais uma vez derrotados, só nos restará esperar que o tempo se encarregue de tornar claro para os vindouros que tínhamos razão, mas não ganhámos nada com isso.

 

Teófilo Vaz