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Sem voz na democracia?

Ter, 06/05/2025 - 09:43


Num país que se diz democrático e onde a representatividade territorial deveria ser uma prioridade, continuamos a assistir a uma preocupante marginalização dos meios de comunicação regional. Nestas eleições legislativas, as rádios transmontanas voltaram a levantar a voz, ou melhor, a silenciá-la, com mais um boicote às ações de campanha para as eleições legislativas. É o quarto protesto formal desde 2019. E, até agora, sem efeitos práticos.

O motivo é grave e persistente: a exclusão das rádios locais da emissão de tempos de antena nas legislativas, uma discriminação inaceitável e que põe em causa os princípios básicos de igualdade no acesso à informação e à participação cívica. Enquanto isso, o Estado distribui mais de 2,8 milhões de euros a rádios e televisões por esse serviço, dos quais mais de 750 mil euros vão para apenas seis rádios nacionais, portanto nenhuma delas local.

É difícil não ver aqui uma incoerência institucional. As rádios temáticas musicais, que nem desejam emitir conteúdos de cariz político, são obrigadas por lei a fazê-lo. Já as rádios locais, verdadeiros pilares da informação de proximidade, que todos os dias servem as suas comunidades com seriedade e compromisso, são impedidas de participar.

Mais de 100 rádios locais, associadas à Associação Portuguesa de Rádios, juntaram-se ao protesto. Uma iniciativa corajosa, mas que não deveria ser necessária se o país valorizasse verdadeiramente o papel destes meios na consolidação democrática e no combate à desertificação informativa do Interior.

As rádios e demais órgãos de comunicação regional não são peças decorativas do sistema! São essenciais à construção de uma cidadania ativa, informada e coesa. Ignorar o seu papel é comprometer a democracia. Esperar que sobrevivam sem apoios dignos, nem acesso equitativo às campanhas eleitorais, é, no mínimo, irresponsável.

Chega de discursos vazios sobre coesão territorial enquanto se perpetua a exclusão de quem dá vida à informação fora dos grandes centros. As rádios regionais têm direito a tempo de antena. Têm direito a financiamento justo. Têm direito a existir com dignidade. O Estado tem o dever de corrigir esta falha com urgência. O interior do país também vota. O Interior também pensa. O Interior também tem voz e exige ser ouvido.

Para agravar, a maioria dos órgãos regionais atravessa uma crise financeira crónica. A publicidade estatal desapareceu quase por completo e as receitas de publicidade privada encolheram drasticamente. Em muitos casos, a sobrevivência depende quase exclusivamente das campanhas publicitárias das autarquias, criando uma perigosa dependência institucional. Alguns órgãos estão amplamente pendurados a esse financiamento, mesmo sendo contra a lei. Quando a liberdade da imprensa depende do orçamento camarário, é a democracia local que se fragiliza.

Esta dependência sufoca a crítica e inibe o jornalismo de investigação. A imprensa livre exige soberania editorial, e essa só é possível com independência económica. É urgente um novo modelo de apoio aos meios regionais, transparente, plural e justo. Um modelo que não os transforme em extensões dos gabinetes de comunicação do poder local. Sem imprensa regional livre, o país fica mais pobre, menos informado e mais desigual. 

Cátia Barreira, Diretora de Informação