Ter, 06/07/2021 - 15:59
Os sectores da restauração, construção civil e agricultura parecem ser os mais afectados. Dina Mesquita é proprietária de um restaurante em Bragança e com o Verão já a decorrer, o aumento da procura pode ser um problema, visto que não consegue encontrar mão-de-obra qualificada. “Temos anúncios no IEFP, tanto para área da cozinha, como para as mesas, e nunca conseguimos recrutar ninguém, sem ser os estudantes que vão aparecendo, mas sem experiência, sem qualificação”, referiu. Nesta altura do ano, os estudantes que procuram ganhar algum dinheiro podem ser uma ajuda, mas o problema mantém-se já que continua a não haver mão-de-obra qualificada. A solução passa por aceitar quem não tem formação, mas surge mais um problema: ter que ensinar e o desgaste associado. “Não há mão-de-obra especializada, principalmente para as cozinhas. A formação de cozinha não existe em Bragança, a que tínhamos mais perto era em Mirandela, que foi fechada há cerca de dois anos, e não há pessoas com qualificações”, afirmou. E assim surge a chamada pescadinha de rabo na boca: a falta de funcionários não permite aceitar mais trabalho ou então faz atrasar o serviço. “As pessoas não se mantêm no posto de trabalho, estão sempre a entrar e a sair, o que para nós é bastante complicado e muita das vezes leva-nos a que não tenhamos a capacidade de trabalho que tínhamos antigamente”. Neste restaurante, a cozinha está a cargo do pai de Dina Mesquita, que se adoecer ou tiver que se ausentar, não há quem o possa substituir. É aqui que se põe em causa o futuro do negócio. “Uma das coisas que me faz pôr em causa, hoje em dia, em continuar com a restauração é a falta de mão-de-obra qualificada. É um negócio que está há mais de 40 anos na família, mas o esforço que fazemos a nível pessoal é enorme, o que nos leva a não ter tempo para nós e a ter um desgaste físico e psicológico muito grande, porque não temos quem nos ajude”. Mas afinal porque há cada vez menos pessoas a querer trabalhar num restaurante ou a querer tirar formação na área? Dina Mesquita acredita que um dos motivos é os horários. Quanto à remuneração, disse não ser um problema, já que tem consciência que “têm que pagar acima do salário mínimo pelas horas que se fazem”. Segundo a empresária, os estudantes de cozinha também não querem ficar no Interior e preferem procurar emprego no Porto ou no Douro. Na construção civil, o cenário é idêntico. Pedro Nogueiro é gerente de uma empresa em Bragança e também se queixa do mesmo: falta de pessoas formadas. Este é um problema que se arrasta ao longo dos anos, mas que é está cada vez mais agravado. “A mão-de-obra qualificada está praticamente a desaparecer. Se precisarmos de contratar um carpinteiro, um picheleiro, pessoas com alguma qualificação na nossa área, simplesmente não há”, afirmou, acrescentando que muitos dos funcionários da empresa estão a atingir a idade da reforma e precisam de ser substituídos. Encontrar pessoas sem formação que estejam interessadas em trabalhar nas obras também é um problema. Pedro Nogueiro considera que a “subsidiodependência” é uma problemática, ou seja, “as pessoas preferem ter um pequeno subsídio e depois fazer um biscate aqui e ali e vão-se governando desta forma”. A empresa está no activo há cerca de 50 anos e dedica-se essencialmente a obras públicas. Com a falta de funcionários, muitos trabalhos são rejeitados. A pergunta coloca-se: esta problemática põe em causa o futuro da empresa? “Nós, a gerência, temos falado várias vezes nesse aspecto e, às vezes, em jeito de desabafo, dizemos que a prazo vamos ter que fechar. Se isto continua assim, não há milagres. Como vamos poder executar as obras se não temos mão-de-obra?”, respondeu. O empresário critica a falta de escolas de formação para esta área e a despreocupação das entidades com o assunto. Mais uma vez, é a empresa que aposta em formar os funcionários, já que não consegue encontrar quem já tenha a especialização. “Temos que ser nós a darmos-lhe oportunidades para aprenderem e irem progredindo”, disse. Outra das soluções passaria ainda pela importação de funcionários, de fora do país, e melhores remunerações. Mas para aumentar o valor da remuneração, Pedro Nogueiro referiu que é preciso também aumentar o “preço base“ das obras públicas. “Para nós pagarmos mais, os concursos ou quem nos paga a nós também tem que subir o correspondente valor das empreitadas. Se não for assim não conseguimos ajustar os vencimentos. Essa é uma problemática que também tem que ser discutida”, concluiu. Dinis Crisóstomo, também é proprietário de uma empresa de construção civil e ainda realização de estradas, descreve a actividade como “um trabalho um bocado ingrato”. Esta será outra das razões que afasta os mais novos da construção civil, segundo o empresário. Por isso, começa a pensar como conseguirá arranjar funcionários para substituir quem se reformar. “Começamos a pensar que amanhã, quando estes se reformarem como é que será”, disse. A empresa chegou a ter 120 empregados, neste momento tem 40. “Antigamente tínhamos duas equipas de espalhamento de massas e só tínhamos duas máquinas de tapete. Neste momento temos seis ou sete máquinas de tapete e só temos uma equipa a espalhar”, contou, acrescentando que, se não fosse a falta de mão-de-obra, a empresa tinha capacidade para ter duas equipas de trabalho. O empresário destacou ainda que a falta de funcionários faz atrasar as obras e ainda fazer uma gestão minuciosa das obras que irão ganhar, já que também concorrem a concursos públicos. “A obra que tinha antigamente um ano de prazo, neste momento tem 70 dias e isso acarreta que os empreiteiros tenham uma capacidade de execução rápida”, referiu. Este é outro dos problemas que leva Dinis Crisóstomo a negar obras com prazo de execução curto. Na agricultura a situação repete-se. Manuel Malhão trabalha com máquinas agrícolas e quando quer encontrar jovens para estes trabalhos, não consegue. “Mão- -de-obra não há”, afirmou, referindo que se houvesse mais interessados podia aceitar também mais trabalhos. O pouco rendimento e o trabalho duro serão razões para afastar os jovens deste sector da agricultura, segundo Manuel Malhão. Segundo dados do Centro de Emprego de Bragança, em Maio deste ano havia 3744 pessoas desempregadas na sua área de abrangência, ou seja, nos nove municípios da Comunidade Intermunicipal das Terras de Trás-os-Montes, Alfândega da Fé, Bragança, Macedo de Cavaleiros, Mirandela, Miranda do Douro, Mogadouro, Vinhais, Vimioso e Vila Flor. O ano passado, no mesmo período, havia mais 310 desempregados. Já em Maio de 2019, antes da pandemia, havia 3592, ou seja, menos 152 que no mesmo período homólogo este ano. No concelho de Alfândega da Fé havia 240 desempregados, no de Bragança, 853. No concelho de Macedo de Cavaleiros, 560 pessoas não tinham trabalho, no de Miranda do Douro 158 pessoas estavam desempregadas, no de Mirandela 919 e no de Mogadouro 328. No concelho de Vimioso 128 pessoas não tinha emprego, no de Vinhais 279 pessoas estavam no desemprego e em Vila Flor havia 283 desempregados.