Pão cozido à moda antiga

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Ter, 09/08/2005 - 16:20


Na aldeia de Palácios, no concelho de Bragança, ainda há quem coza o pão nos tradicionais fornos a lenha, que fazem parte da maioria das casas desta localidade.

Irene Roque é uma das habitantes da aldeia que só come pão cozido em casa, porque diz que o pão comprado “não tem o mesmo sabor”.
Esta tarefa, que faz parte das lides da casa de antigamente, foi prevalecendo na freguesia pela mão das pessoas mais velhas.
Noémia Carvalho é uma dessas habitantes, pois sempre sustentou a família com pão cozido em casa. Esta popular conta que agora há muita fartura mas, antigamente, o pão escasseava e, muitas vezes, não chegava para alimentar todas as bocas.
“Tenho 59 anos e comecei a cozer o pão desde muito pequenina, porque tinha que ajudar a minha mãe nas tarefas domésticas. Desde então, cozo sempre para a família, porque o pão comprado não tem a mesma qualidade que o pão tradicional”, realça Noémia Carvalho.
Esta habitante de Palácios confessa que, apesar de ainda cozer o pão em casa, os tempos são muito diferentes do fado de antigamente.
“Antes o trigo só se cozia para a matança, para a malha e para a festa, porque nos outros dias só se comia pão centeio. Actualmente, o pão centeio acabou e passou-se a cozer, apenas, o pão de farinha triga”, salienta Noémia Carvalho.

O segredo está nas mãos

No dia em que se coze o pão, a azáfama é grande, visto que há uma série de tarefas que têm de ser feitas. Adelaide Lino tem 68 anos e fala dos passos que têm que ser dados para se conseguir fazer uma “boa fornada”.
Antes de se começar a fazer a massa, esta habitante de Palácios conta que é preciso juntar a lenha, que vai servir para aquecer o forno sem parar.
Farinha, água, sal e fermento são os ingredientes necessários para fazer as famosas bolas. Contudo, o segredo para fazer um pão “saboroso” está na agilidade das mãos, enquanto se misturam os ingredientes.
Actualmente, a maioria das pessoas utiliza farinha comprada, mas ainda há pessoas que utilizam farinha obtida através da moagem do trigo que se colhe nas cearas da Lombada.
“O ano passado ainda cozi o pão com a farinha moída no moinho da ribeira. Este ano, não choveu e, nem no Inverno, a ribeira conseguiu acumular água suficiente para fazer trabalhar o moinho”, lamenta Adelaide Lino.
Irene Roque também costumava moer a farinha para cozer o pão, porque garante que as bolas ficam com “outro sabor”.

Tradição pode “morrer”

“Desde que o moinho da ribeira deixou de ter força para moer ainda experimentei esmagar o cereal em moinhos a martelo e a luz, mas não deu resultado, visto que a farinha fica com muito farelo, mesmo depois de peneirada”, realça esta popular.
Cozer o pão, bem como outras iguarias, no forno a lenha é uma das práticas habituais de Irene Roque, que também confecciona bolas com carne e ainda faz a tradicional “respigona”.
Esta popular, que coze a lenha desde os 13 anos de idade, recorda os tempos em que tinha que pôr um pau ao pé da masseira para poder amassar o pão. Desde então, esta tarefa nunca deixou de fazer parte do seu trabalho doméstico, para não deixar perder as tradições que a sua mãe lhe ensinou.
“Ainda faço a tradicional ‘respigona’ com os restos da massa que ficam agarrados à masseira. Antigamente, os homens estavam sempre à espera da ‘respigona’ para beber a pinga”, recorda esta habitante da Lombada.
No Inverno ou no Verão, grande parte das pessoas de Palácios dedicam, pelo menos um dia da semana, para cozerem o pão. Contudo, nesta aldeia do Nordeste Transmontano, onde não existe uma casa que não tenha o tradicional forno a lenha, a tradição já se vai perdendo.
“Já há pessoas que deixaram de cozer, umas pela idade, outras porque as famílias são pouco numerosas, e os mais novos não se interessam por esta actividade”, lamenta Irene Roque.