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Um bancário humanista

Ter, 06/09/2005 - 15:12


Nasceu em Nogueira (Bragança) há 53 anos e é presidente da Caixa de Crédito Agrícola Mútuo da Região de Bragança. Já desempenhou diversos cargos ao nível dos serviços centrais do grupo Crédito Agrícola e é, hoje, presidente do Conselho Geral desta instituição bancária. Confira a entrevista com Adriano Diegues, que também preside ao núcleo de Bragança da Associação Cristã de Empresários e Gestores (ACEGE).

Jornal Nordeste (JN) – Como se vivia em Nogueira há 50 anos atrás?
Adriano Diegues (AD) – Nasci numa altura em que os tempos ainda eram difíceis, comparando com aquilo a que os jovens têm acesso nos dias de hoje.
Mesmo assim, tenho as melhores recordações dessa época. Nogueira, apesar de só estar a seis quilómetros de Bragança, ainda era longe da cidade. Não havia transportes e a vinda a pé demorava uma hora ou uma hora e meia, de maneira que toda a vida se fazia em comunidade, com as pessoas da aldeia e com a família, na maioria dos casos numerosa.

JN – Onde fez os seus estudos?
AD – A 4ª classe foi feita em Nogueira e depois ingressei na Escola Industrial e Comercial de Bragança, onde fiz o Curso Industrial. Mais tarde fiz o 7º ano liceal e ainda experimentei um curso superior, mas já numa fase adiantada da minha vida, em que os afazeres profissionais não me permitiram ir além de alguns meses de estudo. Tive de abandonar o curso porque, de facto, não tinha hipóteses de o frequentar. Hoje lamento-o, porque um curso superior é uma ferramenta indispensável para qualquer projecto profissional.

JN – De que forma o facto de ter nascido nesta região o marcou?
AD – Marca sempre. Somos muito o produto do que são as nossas vivências e a convivência com os nossos familiares. Crescemos e vivemos numa região fechada e, aparentemente, somos conhecidos como pessoas fechadas, só que temos dentro de nós um profundo humanismo e respeito pela diversidade. Os transmontanos são duma aparente rudeza, mas duma grande humanidade.

JN – Cumpriu o Serviço Militar em Timor, antes da Descolonização. Fale-nos dessa experiência.
AD – Foi muito interessante, porque acabei os estudos numa altura em que havia muita emigração para os países da Europa. Eu que tencionava prosseguir os estudos no Instituto Industrial, que dava continuidade aos cursos técnicos, mas vi-me arredado desse projecto devido a problemas familiares. Aos 18 anos parti para França, onde vivi uma experiência de quatro anos de emigração, até vir fazer o Serviço Militar. Na altura até fui muito aconselhado por amigos franceses e pela própria entidade patronal a não enveredar por este caminho, mas um profundo sentido de dever fez-me regressar a Portugal. Quando cheguei a Timor encontrei uma realidade completamente diferente, que me surpreendeu pela negativa. Parecia que tinha recuado 500 anos, mas com o tempo fui-me habituando, de modo que guardo muitas e boas recordações de Timor, sobretudo da sua gente que, pelas informações que me chegam, continuam a dar grandes exemplos de patriotismo.

JN – Está ligado à banca desde o 27 anos. O que mudou neste sector nos últimos anos?
AD – Dizem os especialistas que sistema bancário português foi o sector económico que mais se aproximou dos padrões europeus e mundiais. Em muitos aspectos a banca portuguesa tem performances muito superiores à média europeia, e estou-me a lembrar do sistema Multibanco, que é um excelente serviço.
Portugal pode orgulhar-se do seu sector financeiro, tanto a nível patrimonial, como no plano tecnológico.

JN – É presidente do Conselho Geral do grupo Crédito Agrícola. Em que consistem as suas funções?
AD – Como presidente de um grupo financeiro, desempenho funções de grande responsabilidade. No entanto, o grupo tem um modelo de governação dualista. Ou seja, é composto por dois órgãos que têm funções distintas. Um é meramente executivo, enquanto o outro tem uma função estratégica e de acompanhamento da gestão. É um modelo que foi ensaiado na TAP e na Caixa Geral de Depósitos, mas que não resultou. Na Caixa Agrícola, felizmente, está a funcionar muito bem. Eu pertenço ao órgão não executivo, aquele que define a estratégia e acompanha a sua implementação.

JN – Fale-nos um pouco da Caixa Agrícola enquanto grupo ligado à agricultura.
AD – É uma instituição fundada em 1947, depois do Crédito Agrícola ter sido criado em Portugal, em 1911. Já havia bancos na altura, mas faltava uma instituição fortemente alicerçada na agricultura, que auxiliasse as pessoas que precisavam de capital para comprar meios de produção e pagar jeiras.
A fundação da Caixa veio pôr fim à agiotagem que se verificava na altura, em que pessoas com posses emprestavam dinheiro aos agricultores, retirando benefícios das suas necessidades de capital.
Hoje, o Crédito Agrícola continua vocacionado para o sector agrícola, mas não só. As coisas mudaram, ao ponto do Crédito Agrícola ser o 6º maior grupo financeiro português.

JN – A nova sede da Caixa Agrícola da Região de Bragança é da autoria de João Ortega e no interior até tem quadros de Graça Morais. A estética é uma das preocupações da instituição?
AD – Há um compromisso da banca com as artes e isso é bem visível na sede da Caixa Geral de Depósitos, em Lisboa. Em relação à nossa sede, quando decidimos lançar este projecto não quisemos deixar de divulgar a qualidade artística da nossa região.
A nova sede é o resultado do trabalho feito nas últimas duas décadas. O difícil não foi a execução da obra em si, apesar de todos os pormenores técnicos que ela envolveu, mas foi dotar a Caixa Agrícola da Região de Bragança de condições para poder embarcar na construção de um edifício desta dimensão.

JN – Nesta época crítica de seca, de que forma tem a Caixa Agrícola ajudado os agricultores?
AD – A ajuda que os agricultores necessitam não está ao alcance da Caixa Agrícola, pois os que eles necessitam, nesta altura, é de medidas de apoio de carácter governativo e comunitário. De qualquer forma, se as medidas de apoio forem de nível financeiro, isso passará pelo Crédito Agrícola, na formalização das candidaturas e concessão das verbas. É o banco com mais vocação para lidar com as especificidades do sector agrícola e o mais apto para ajudar a ultrapassar determinadas barreiras burocráticas.

Entrevista de Marcolino Cepeda, Rui Mouta e Mara Cepeda

“A fundação da Caixa Agrícola veio pôr fim à agiotagem que se verificava na altura, em que pessoas com posses emprestavam dinheiro aos agricultores, retirando benefícios das suas necessidades de capital”