Uvas em “razoável quantidade” prometem vinho de boa qualidade em Trás-os-Montes

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Ter, 24/08/2021 - 11:38


Vindimas arrancam no começo do próximo mês mas ainda há vinho da campanha passada para vender

Já começou, no distrito de Bragança, mas ainda com alguma timidez, a campanha das vindimas. Por agora, dos cerca de 110 produtores que há em Trás-os-Montes e Alto Douro, apenas um ou dois estão já em campo, a encher os cestos de uvas. À semelhança dos outros anos, pouco tarda então para que a campanha arranque “à séria”, estimando- -se o seu começo, em força, para o início de Setembro.

Uva boa em quantidade “razoável”

Em termos de produção, prevê-se, pelo menos para já, que 2021 seja um ano pautado por franca normalidade. Segundo Francisco Pavão, presidente da Comissão Vitivinícola Regional de Trás-os-Montes (CVRTM), este “é um ano médio”. Já no que toca à qualidade o cenário melhora. “Não houve grandes problemas fito- -sanitários nem climatéricos, portanto espera-se um ano bom. Neste momento, temos uvas de boa qualidade”, rematou o presidente da entidade. Jorge Afonso, produtor, desde 2009, no concelho de Bragança, onde, mais concretamente na aldeia de Parada, reconstruiu uma adega para dar ao “Alto do Joa” o que o vinho e a marca precisavam, confirma as palavras de Francisco Pavão. “A uva está muito boa”, começou por dizer, justificando que o fruto, apesar de ainda não se estar em fase total de maturação, para já, está numa “boa fase de maturação alcoólica”, portanto, “será um ano muito bom de vinho”. Apesar de as uvas se apresentarem com um “aspecto muito bom”, quanto à quantidade, o produtor considera, pelo que a experiência lhe diz, que 2021 é um ano “normal” para a zona. A Cooperativa Agrícola Ribadouro, sediada em Sendim, no concelho de Miranda do Douro, tem mais de dois mil associados. Destes, são cerca de 800 os que entregam as uvas à entidade para as transformar e comercializar. Nesta região, as vindimas só começarão em Setembro, segundo confirmou Paulo Teixeira, responsável geral pela cooperativa. Apesar de ainda não se estar no terreno, as previsões, ao contrário da colheita, já se começaram a fazer. “À partida, será um ano regular, em termos de produção, mas não será de extrema qualidade”, esclareceu Paulo Teixeira.

Vindimas à porta com algum vinho da campanha passada por vender

Apesar de já não faltar assim tanto para se começar a ver os trabalhadores, de cesto às costas e tesouras em punho, em direcção às vinhas, a verdade é que, das duas colheitas passadas, ainda há vinho por vender. A pandemia rebentou-nos nas mãos no ano passado e o sector não conseguiu escapar aos efeitos. Apesar de tudo, Jorge Afonso fugiu à tendência e tornou-se num dos poucos que não tem assim tanto a reclamar. “Não tive problemas de vendas no mercado nacional, não houve nem quebra nem aumento”, esclareceu o produtor, assumindo que a exportação, essa sim, ficou à espera de melhores dias. Desta forma, “o plano de crescimento de vendas no mercado internacional acabou por não acontecer” e “está agora a ir muito devagarinho”. Os principais clientes de Jorge Afonso são as garrafeiras, os restaurantes e os hotéis. Apesar de o sector da restauração e hotelaria ter levado um valente abanão, “o tipo de pessoas que procura este vinho procura-o nas garrafeiras, que foi o principal cliente no ano passado”, salvando o que havia a salvar. A trabalhar ainda com algum stock anterior, Jorge Afonso diz que o atraso, em termos de vendas, mesmo assim, é de cerca de um ano e admite que irá ter problemas se não vender “rapidamente” o que ainda tem por comercializar. “Este ano acredito que vou conseguir escoar mais 30% em relação ao ano anterior, mas o ideal seria 60%”, vincou. Paulo Teixeira, da cooperativa de Sendim, também tem pouco a dizer a nível de quebras. “Este ano não notámos nenhuma quebra em relação às vendas na cooperativa. Estamos a crescer, mas o ano passado, comparando os dois, foi mau”, frisou, dizendo que 2021 se “safou” por ter sido já um ano de transição, depois de todo aquele impacto inicial. Opinião um pouco diferente tem o presidente da CVRTM. Segundo Francisco Pavão, escoar “fácil é que não foi”. “Os produtores tiveram que se redescobrir, promovendo os vinhos, sobretudo, nas redes sociais. Com a abertura da restauração, há bem pouco tempo, tem-se vindo a tentar esgotar o que se pode. É um problema de Norte a Sul do país”, esclareceu.

Mão-de-obra, quem a viu?

Foi no escoamento que a pandemia mexeu forte com o sector. Ainda assim, este não foi o único problema, que agora, em 2021, se prevê que atenue: a falta de mão-de-obra. Considerando que as vendas foram o maior problema, Jorge Afonso também esteve relativamente em “maus lençóis” na hora de arranjar quem vindimasse. “As pessoas tinham algum receio e acabavam por não querer trabalhar, mas não quer dizer que não tenha encontrado solução”, sublinhou. O responsável pela cooperativa de Sendim, fortemente direccionada para a exportação de vinhos, também garante que há falta de mão-de-obra, quer disponível quer qualificada, e que, por isso, é preciso ajustar a vida. “Muitas vezes, isto faz com que se antecipem os trabalhos ou que estes tenham que se prolongar no tempo para haver mão de obra disponível para toda a gente”, esclareceu. A falta de gente para trabalhar não é menos evidente para Francisco Pavão, até porque “na terra quente transmontana e no planalto mirandês, a vindima coincide com a apanha da amêndoa”. Ainda assim, segundo garantiu, “tem- -se tentado trazer mão-de- -obra de fora mas, nesta altura, não é fácil” o que vai valendo é a ajuda familiar que os vários produtores vão conseguindo angariar.

Vinhos transmontanos tem vindo a conquistar o país

Pode dizer-se que, sobretudo nos últimos dez anos, muito mudou. Segundo Paulo Teixeira, a reconversão das vinhas, na última década, foi “muito importante” para mecanizar o processo e dar aos produtores a possibilidade de “produzir a um custo menos elevado”. Além de se conquistar terreno na produção, a qualidade acompanhou o processo, basta olhar-se para a panóplia de prémios que vários dos nossos vinhos têm arrecadado. Francisco Pavão também admite que a reconversão das vinhas foi “fundamental” mas que se apostou muito forte na promoção do que é bom. “O reconhecimento tem motivado e tem, sobretudo, potenciado, a imagem de Trás-os-Montes como uma região produtora de vinhos de bastante qualidade”, finalizou, admitindo que agora “é importante que localmente se consuma cada vez mais vinhos da nossa própria região” e estes estejam também cada vez mais “presentes” nos pequenos comércios e nos restaurantes, acompanhando o que de melhor por cá se come

Jornalista: 
Carina Alves