Um rio é um ser vivo, da nascente até à foz… e como tal deve ser tratado! Parte 1

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Aos ecossistemas fluviais que ainda não foram completamente destruídos, devassados, conspurcados, ou “devorados” pelas “incursões bárbaras do progresso”, impõe-se que sejam dedicados fervorosos e quase religiosos cuidados e atenções, desde as montanhas das zonas de cabeceira, passando pelos férteis vales agricultados, até aos lugares onde desaguam. Felizmente estamos a tempo de os preservar…! Convoquem-se, para isso, as vontades políticas e estratégicas das forças vivas que ainda resistem e ocupam estas terras… Sim, um rio é um ser vivo! Tem vida própria e dá vida a uma infinidade de outros seres! A biodiversidade que os habitats dos nossos rios e ribeiros acolhem é essencial à vida humana, nos mais variados aspetos… Os dois principais rios da parte norte da bacia do Douro, no Nordeste Transmontano, que constituem as sub-bacias hidrográficas do Sabor e do Tua, passam, neste momento, por processos de adaptação, nos seus troços finais, à nova condição de reservas estratégicas de água que estão agora na posse de grandes grupos económicos estrangeiros, sociedades anónimas… entidades sem rosto que dispõem do território e dele fazem uso, com total desprezo pelos valores intrínsecos, históricos e identitários das gentes que sempre aqui viveram e foram zelosos cuidadores e guardiões deste extraordinário património natural. Enfim…! Coisas sem qualquer interesse ou importância, dirão alguns…!!! [Nota: A construção das barragens do Baixo Sabor e de Foz-Tua, defendida e acarinhada, a pretexto das energias renováveis, pelas mais altas instâncias do poder financeiro e político de então constituiu, na verdade, dos mais graves crimes ambientais cometidos nos últimos tempos, com incalculáveis prejuízos sociais e económicos para as populações ribeirinhas e não só… Vistos de longe, aqueles “lagos” até podem parecer interessantes, com os lugares-comuns dos reflexos de imagens invertidas dos montes envolventes, do céu e das nuvens, da luz do entardecer ou da alvorada. São objeto da observação de proeminentes representantes dos poderes locais que tentam, a todo o custo, chamar a atenção para um tipo de turismo que se afigura pouco viável e nada atrativo… mas vejamos se valeu mesmo a pena! A riqueza inestimável dos habitats únicos de espécies protegidas da fauna e flora que ficaram submersos; a fragmentação da paisagem que impede trocas de material genético a um sem número de animais, mas sobretudo aos grandes mamíferos; hectares e hectares de olgas e hortas, solos de aluvião fundos e férteis, olivais e amendoais centenários, pomares, vinhas, sobreiros e carrasqueiras que se perderam; a flora melífera e os ecossistemas agrários equilibrados pela presença humana, com técnicas ancestrais simples e eficazes que garantiram o sustento a muitas gerações e, ao longo dos tempos, moldaram a paisagem de modo harmonioso e amigo do ambiente que também desapareceram… Em ambos os casos, no horizonte, restaram os cabeços com enormes e ameaçadores fragaredos, inóspitos e incapazes de produzir alimento…! Ah! E, no caso do Vale do Tua, até a mobilidade das po- pulações continua por re- solver…! Aqui chegados é que se pode mesmo dizer que as pessoas ficaram sem chão…] Por tudo isto, concentremo- -nos nos troços que ainda não foram completamente “priva- tizados” … (Continua…)

Agostinho Beça