Uma história de amor

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Um dos trabalhos jornalísticos que mais me marcou foi sobre um casal. E por bons motivos. Era Dia de São Valentim, e pedia-se uma reportagem cheia de amor. Foi precisamente o que encontrei, com aquele casal de idosos, juntos há tantos anos que nem consigo precisar. Anos multiplicados por décadas de coisas em conjunto. E ainda assim, não deixaram de segurar a mão um do outro enquanto partilhavam a história deles. E os olhos brilharam com as memórias. Ele subia a uma árvore, só para a poder ver passar na rua, de longe, porque os tempos eram outros. As famílias eram contra, e no dia em que noivaram, ninguém apareceu para comemorar. Ficaram só os dois, no local combinado. Ele teve que ir para o estrangeiro, saber de melhor vida, e ela aguentou os pilares da casa. Nunca sequer pestanejaram, porque era aquele amor que sabiam que nunca ia morrer. Com uma paciência de santo, e com bastante gosto, acrescentaria eu, deram beijinhos repenicados para a câmara, vezes sem conta. O truque, partilharam, é nunca ir dormir de costas voltadas, e dar, precisamente, um beijinho antes de fechar os olhos até ao dia seguinte. E depois tudo vai parecer melhor, ao acordar. É um caso de amor e de resiliência. Terminou com os dois a desejarem-me que, um dia, pudesse encontrar o mesmo. E agradeci, genuinamente, percebendo que lhes ganhei a simpatia, pois desejavam-me algo igual ao que de mais valioso tinham. No outro dia, fui almoçar com uma cara amiga. E o amor veio à baila. Falar de amor, quem nunca? Afinal, o amor faz parte da nossa vida, de tantas maneiras. E ocorreu-nos esta reflexão: nestes tempos modernos, da internet, da vida à velocidade da luz, que histórias de amor se vão contar daqui a algumas décadas? Será que ainda alguém vai querer ficar com a mesma pessoa para toda a vida, como os cisnes? “Começámos a falar nas redes sociais. Ele costumava pôr “adoro” nas minhas publicações. Depois, um dia, enviou-me uma mão a acenar e perguntou o que estava a fazer”. Ok, pode ser realístico, mas não tem a mesma pujança de subir a uma árvore só para ver passar, ao longe, a pessoa amada. “Gostava das fotografias que ela postava nas redes sociais. Parecia bonita, mas claro que sabia que tinha alguns filtros e poses à mistura. Mesmo assim, resolvi convidá-la para um café, num sítio bem público, para que ela não achasse que era um tarado, daqueles que enviam mensagens aleatórias a dizer “és linda” ou “desejo-te”, com smiles a mandar beijinhos. Ou nudes não solicitados”. Para quase todos nós, pelo menos numa determinada faixa etária, tudo isto será um lugar-comum. E a internet trouxe, de facto, tanta coisa boa, também às relações. Deixa-nos matar saudades, falar de tudo e de nada, combinar encontros futuros e trocar impressões. Mas o que é certo é que nunca nada vai superar aquilo que dizemos cara a cara, olhos nos olhos e, para os mais atrevidos, de mão dada e tudo. Porque afinal, o amor continua a ter que preencher um forte requisito em todas as gerações – o amor quer tocar, mexer e estar próximo. E isso, as redes sociais (ainda) não conseguem contornar.

Tânia Rei