Mas que parolice!

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As boas notícias sempre chegam a Trás-os-Montes, embora com atraso enfastiante, trazidas pelos diligentes jornais regionais, honra lhes seja feita, que o proveito não é nenhum.
Foi pela imprensa regional, portanto e tão-somente, que só agora tomei conhecimento de um notável evento ocorrido no já distante 1 de Junho, a que os seus sábios organizadores deram o empolgante e artificioso epíteto de Mostra Cultural Transmontana.
Evento cultural que teve lugar no restrito e selecto restaurante da Assembleia da República, organizado pelos deputados de Bragança e que, como não poderia deixar de ser, meteu comes e bebes do melhor que a região produz.
A assistência, também restrita, não teve povo, mas apenas distintos convidados da classe, amigos e correligionários dos organizadores. Aos transeuntes da rua de São Bento foi concedido o privilégio de aspirar aromas e fragâncias e de ouvir o tilintar de copos e talheres.
Uma forma bizarra de dar a conhecer Trás-os-Montes e ignorar os transmontanos.
Claro que a patuscada, a que chamaram Cultural, meteu muito boa cultura da boca. Cultura hortícola, nabos, vinhos, azeites e enchidos da melhor que se produz por esse mundo fora, e que bem merece ser propagandeada nos melhor afamados fóruns comerciais, não no ambiente classista e fechado dos Passos Perdidos.
Ainda se ao menos tivessem montado tendas e fogareiros na escadaria do palácio, vá que não vá! Agora banquetes fechados em assembleias políticas apenas servem para deliciar os estômagos de uns tantos e iludir os espíritos de muitos mais, como convém aos primeiros.
Ainda assim, o inefável José Cid continua a não ter razão, por mais que os nossos deputados lha tenham dado com esta Cultural Mostra Transmontana. Porque em Trás-os-Montes há muita e séria cultura, popular e erudita, para lá do prestimoso Trio de Bombos e de Gaitas de Foles de Malhadas.
Há, sobretudo, jovens e talentosos escritores, músicos, pintores e actores e uns tantos académicos com nomeada afirmada. Há grupos de teatro, escolas de música, academias e grémios literários. Muitos jovens que despontam nas letras e nas artes desejosos de largarem o ninho e por isso aguardam, avidamente, que alguém com responsabilidade e generosidade lhes meta no bico o cibo a que tem direito. Jovens que também merecem ser mostrados ao mundo até porque valem mais que batatas e azeite.
Sem pretender ofender ninguém devo dizer que “cliquei” “likes” em dois comentários num dos raros “posts” que encontrei no “facebook” sobre o assunto e que rezavam assim:
- Mas que parolice! - Dizia um. E outro, ainda mais esclarecedor:
- Que grande merenda!
Enfim! O Presidente da República inaugura, em Chaves o Museu de Arte Contemporânea e em São Martinho de Anta o Espaço Miguel Torga, e os deputados de Bragança dão mostras da sua cultura no palácio privado de São Bento. E pedem meças!
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Por Henrique Pedro