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Falta de acessibilidades e de ensino secundário ainda são problemas no concelho de Vimioso

Ter, 18/08/2020 - 13:04


O concelho de Vimioso, como muitos territórios do interior, foi apanhado pelo flagelo da desertificação humana.

Em 9 anos, segundo dados da PORDATA, publicados no mês passado, o concelho perdeu 691 habitantes. Comparativamente com outros concelhos do distrito de Bragança, terá sido dos que mais sofreu. No ano passado tinha 4047 habitantes, 334 idosos por cada 100 jovens. Recuamos há década de 60 quando uma grande percentagem de pessoas deixou a vila e o país à procura de uma vida melhor. Talvez tenha sido o princípio do fim. Alguns antigos presidentes de câmara acreditam que sim. Depois do 25 de Abril, Joaquim Marrão foi presidente das Comissões Administrativas e, em 1976, foi eleito o primeiro presidente da câmara. Pode dizer-se que os anos que se seguiram foram prósperos no que toca à criação de infra-estruturas de água e saneamento. Vimioso foi dos primeiros concelhos a nível nacional dotado destas infra- -estruturas. “Quer estradas, quer abastecimento de água, quer saneamento básico estava bastante atrasado e então quando saí da câmara, em 1982, o concelho já era dos mais adiantados em infra-estruturas desse nível”, referiu. Ainda assim, apesar das condições que se criaram, o autarca considerou que o concelho nunca teve muita população e que a desertificação já é um problema antigo. Terão as políticas centrais contribuído para o agravamento da situação? Quando foram publicados os últimos dados da PORDATA, o actual presidente da câmara, Jorge Fidalgo, salientou que a perda de população se vai manter se algumas políticas, que dependem do Governo, não forem repensadas. “Concelhos como o nosso, do interior profundo, onde faltam serviços públicos básicos, como a educação, e onde a população é muito idosa, obviamente que temos uma grande percentagem de óbitos quando comparado com uma reduzida percentagem de nascimentos”, disse. Quanto a este assunto Joaquim Marrão considera que “foi sempre assim” e que há “problemas cuja resolução não compete ao poder local”. “Já quando entrei para a câmara, em 76, os nossos lamentos perante o governo central era esses”, referiu, acrescentando que, ainda assim, o Governo “alguma coisa fez”, mas que não foi o suficiente para fixar as pessoas. O incentivo à natalidade e o apoio social será para Luís Mina, presidente de câmara que sucedeu a Joaquim Marrão, uma das formas de tentar diminuir a desertificação deste território. “O que têm que fazer as câmaras é o apoio social, seja a crianças, seja a idosos, seja aos próprios casais no incentivo à natalidade”. Em 2002, José Rodrigues criou o apoio “Bebé do Ano”. Tinha como objectivo incentivar o nascimento de crianças na vila, que actualmente ainda vigora. O município oferece um apoio monetário às famílias com bebés nascidos no último ano e ainda ajuda com bens alimentares e pagamento da creche e vacinas. Porém, José Miranda, autarca entre 1989 e 2001, considera que é “quase impossível reverter a situação neste momento”, uma vez que não há indústria no concelho e, por isso, torna-se difícil fixar pessoas. “No tempo em que me criei todas as famílias eram grandes, com 6 ou 7 filhos, e não havia condições de habitabilidade. Hoje há condições de habitabilidade e não há gente”, afirmou, apontando que a falta de condições de habitabilidade também contribuiu para que muitos emigrassem há décadas. O ex-autarca frisou ainda que se o interior for “repovoado”, será benéfico tanto para a região como para o litoral, que deixa de estar sobrelotado. Também José Rodrigues, penúltimo presidente da câmara, apontou que a falta de investimento, por parte do Governo, no concelho de Vimioso terá contribuído para a sua desertificação. “O que falta em Vimioso, relativamente à educação e acesso rodoviário, compete ao Governo fazê-lo”. Disse ainda que deveria ser dado um incentivo para atrair pessoas, visto que a câmara já o fez, durante o seu mandato, por exemplo na zona industrial, com a venda dos terrenos a um cêntimo o m2 .

Perto mas longe

A falta de estradas ou de acessos rápidos entre a vila e a capital do distrito, Bragança, sempre foi um problema com que os autarcas se debateram e continuam a debater. Já na altura em que Joaquim Marrão entrou para a câmara isso era um problema. “Tinha aqui no concelho aldeias que, no inverno, ficavam totalmente isoladas e os carros não conseguiam andar. Quando saí da câmara todas as estradas estavam asfaltadas”. O antigo presidente da câmara lembrou ainda que numa visita do político Francisco Sá Carneiro foi recebê- -lo ao limite do concelho, onde havia estrada de ambos os lados, mas não havia ponte. “A estrada com boas condições para ligar à capital de distrito continua por fazer embora tenha tido melhoramentos”, afirmou, sublinhando que, uma vez que a estrada dá acesso a concelhos como Mogadouro, Freixo de Espada à Cinta e Miranda do Douro, “justificava-se uma estrada em boas condições”. No mandato de José Miranda, numa vinda de um secretário de Estado da tutela foi anunciado que iria ser lançada a estrada, que há muito reivindicavam, que ligaria Vimioso a Outeiro e serviria também outros concelhos. “Batalhou-se muito, trabalhou-se muito, fez-se um protocolo com essas quatro câmaras, com a junta autónoma de estradas e com o secretário de Estado da tutela. Estava o anteprojecto da estrada feito, mas entretanto eu saí da câmara, em 2002, e perdi o rasto da situação”, contou. Mais tarde soube que a estrada não chegou a ser feita, porque punha em perigo a espécie rato-de-cabrera. “O que aconteceu é que alguém não quis que estrada fosse pelo trajecto que estava definido”, apontou, defendendo que esta via iria ser “mais uma motivação” para as pessoas ficarem no concelho. A reivindicação da estrada ficou então para José Rodrigues, presidente a seguir a José Miranda. “Foi sempre uma das nossas solicitações, até que ambientalmente essa estrada não foi possível fazê-la”, explicou, dizendo que foi uma “desculpa” para não avançar com a empreitada. No verão foi dado o parecer positivo, pela Agência Portuguesa do Ambiente, para a construção de uma ponte entre Carção e Vimioso que irá encurtar a ligação à A4 e a capital de distrito. Há quatro anos que esta empreitada era anunciada. À época estimava-se que as obras começassem ainda este ano, mas o projecto ainda não está concluído.

A falta de emprego

A oferta de emprego, no concelho de Vimioso, estava maioritariamente relacionada com a actividade agrícola e a pecuária. Outra actividade de relevo terá sido o comércio. A vila de Argozelo, à época, terá ficado conhecida pelo número de comerciantes que ganhavam o seu dia-a-dia a vender produtos, mas também pelas minas que deram emprego a dezenas de pessoas. Actualmente são poucos os que ainda se dedicam às actividades mencionadas. Luís Mina confirma que já ninguém se quer dedicar à agricultura e pastorícia e, por isso, “fogem das aldeias”. Outro dos problemas que afecta os poucos agricultores do concelho diz respeito ao emparcelamento de terrenos. Segundo José Rodrigues as burocracias são um entrave e, dessa forma, não é possível fazer grandes investimentos agrícolas, porque os terrenos são pequenos. Apontou ainda que outros não entendem a vantagem de fazer o emparcelamento de terrenos e, por isso, dedicam-se apenas à agricultura de subsistência. O antigo presidente da câmara acredita que com incentivos, como a criação de prémios e a facilidade de união de terrenos, o interesse pela agricultura aumentaria.

40 anos depois Vimioso ainda não tem escola secundária

Quando Joaquim Marrão foi autarca de Vimioso eram poucas as localidades que tinham escola secundárias. Quem queria ter acesso a este grau de ensino deslocava-se para Bragança. Hoje, quarenta anos depois, Vimioso continua sem ter ensino secundário. “Isto é uma pescadinha de rabo na boca. Não há alunos suficientes e como não há alunos suficientes não fazem a escola e como não fazem a escola, se calhar, também não há alunos”, salientou. Argozelo, a aldeia que entretanto passou a vila, é das maiores do distrito e chegou a ter oito professores para 100 alunos. Em Santulhão e Carção era idêntico. “Se não há alunos como quer que haja escolas?”, questionou Luís Mina, adiantando que quando foi professor em Argozelo, na altura, havia nove professores, cada um com 40 alunos. “Se não há 12º ano, as pessoas com filhos pensam que eles têm que seguir uma carreira e ter que estudar, então têm que sair do concelho”, explicou José Rodrigues. No seu mandato disse ter feito os possíveis para fixar a população, nomeadamente com a oferta dos livros escolares.

Jornalista: 
Ângela Pais