Quarta vaga. O baile das máscaras.

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Muitos se lembrarão, certamente, do livro A Terceira Vaga, da autoria do nova-iorquino Alvin Toffler, publicado em 1980 e que mereceu a atenção de meio mundo. Justamente porque Alvin Toffler antecipou inúmeras inovações, hoje em dia triviais, delimitando com objectividade a dilatada Civilização Agrária e a mais incisiva e fugaz Revolução Industrial. Os primeiros efeitos de uma quarta vaga já se fazem sentir na economia, na sociedade e na ética, sendo difícil prever quanto tempo durará e como terminará, muito embora esteja a ganhar forma de catástrofe niilista. Desejável seria que redundasse num mundo mais saudável, sereno, livre e justo, epílogo feliz da sofrida civilização greco/latina/judaica/ cristã, que continua a iluminar a Humanidade com a luz da Esperança. As também designadas vagas da pandemia Covid constituem um dramático pronúncio dessa quarta vaga que inexoravelmente varrerá toda a Terra, porque todas as nações estão irremediavelmente amarradas pelos laços da mundialização e da globalização, ainda que os primeiros efeitos se sintam mais intensamente no chamado mundo livre. Desçamos à terra, porém, que é como quem diz ao pequeno Portugal, por agora. Mais do que nunca é hoje verdadeiro o rifão “quem vê um povo vê o mundo todo”, muito embora nas modestas aldeias transmontanas ainda se não se sinta, felizmente, a miséria e o descalabro moral que grassa um pouco por todo o mundo. Oportuno, embora altamente simbólico e paradoxal, é o uso de máscaras em Portugal: os cidadãos são compelidos a andar mascarados enquanto os políticos e os partidos se veem forçados a desmascararem-se. Foi o que aconteceu na discussão do Orçamento de Estado para 2021,por exemplo. Digo discussão porque não se tratou de um digno debate democrático. Foi mais um baile de máscaras em que os dançarinos principais se foram desmascarando, à vez. Ao primeiro-ministro caiu, desde logo, a máscara de grande timoneiro da “gerigonça”, hipotético veículo de paz e progresso. Ao de cima veio, como aconteceu noutras trágicas situações, a sua incapacidade para coordenar eficazmente o Governo. O BE deixou cair a máscara da social-democracia com que se vinha fantasiando, para mostrar o que na verdade é: um partido de extrema-esquerda que tem como bandeira a ideologia de género e destino a Venezuela ou Cuba, na melhor hipótese. O PCP aliviou, circunstancialmente, a máscara de paladino da democracia e da liberdade confirmando ser um espectro vivo do anacrónico sovietismo. O PSD e o CDS apresentaram-se como realmente são: duas matronas, sem máscaras, alapadas no salão de baile da manjedoura pública, à espera de vez e par para dançar. O próprio Presidente da República viu-se forçado a reciclar a máscara de santinho bonacheirão para afivelar a de pessoa grave e sofrida, mais adequada ao momento e à campanha eleitoral que se avizinha. Resumindo: a crise, se por um lado obriga os cidadãos a andar mascarados, por outro arranca as máscaras aos políticos, pondo-lhes a descoberto os verdadeiros rostos e propósitos. Compete aos portugueses fazer uso escrupuloso da máscara sanitária, lavar bem as mãos e manter as distâncias, no dia-a-dia e, sobretudo, quando chamados a votar. Para evitarem ser contagiados pelo Covid e conspurcados com os dejectos da porca política portuguesa.

Henrique Pedro