Estranhos sinais

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Ter, 23/07/2019 - 00:38


Volta o calor a sério e pega tudo a arder, apesar de todas as medidas anunciadas no últimos dois anos, depois das tragédias impensáveis que semearam a morte nesse outro malfadado Julho, com réplicas inauditas no Outubro seguinte, com mais mortes para uma estatística que não se devia ter registado, porque a política também passa por aprender com os erros.
Todos sabemos que as políticas de florestação não se recomendam desde os tempos do Estado Novo. A verdade é que já passaram mais de 45 anos e houve tempo de sobra para reverter políticas erradas, para encontrar um modelo adequado e, principalmente, para garantir um aparelho de controlo, fiscalização e prevenção de riscos.
Acresce que a experiência devia ter conduzido à vigilância apertada de actividades potencialmente criminosas, todos os anos referidas, de forma mais ao menos clara, deixando a sensação de que se trata de crimes quase perfeitos, porque só têm sido acusados alguns alcoólicos e meia dúzia de tontos.
Se há uma rede criminosa associada aos incêndios, não se percebe porque não se constituíram, há décadas, brigadas específicas da polícia judiciária vocacionadas para a vigilância permanente, que permitiria condicionar-lhe os movimentos. Tal vigilância apertada talvez tivesse evitado recorrentes tragédias e o desânimo que se apodera dos que resistem no mundo rural.
Estamos perante sinais preocupantes de incapacidades crescentes do Estado relativamente a garantias fundamentais para a tranquilidade dos cidadãos que tenderão a convencer-se da necessidade de autoprotecção, de garantir justiça pelas próprias mãos, soluções primitivas que nos poderão fazer recuar a tempos de má memória.
No entanto, o país está aparentemente tranquilo e os responsáveis da condução política embandeiram em arco, acreditando que o próximo Outubro será tempo de festa.
Observando o panorama geral da sociedade portuguesa, pressente-se que o manto aveludado pode esconder turbulências que, mais cedo ou mais tarde, irromperão na realidade política para surpresa de muitos e lancinante desilusão para os que têm confundido os seus caprichos imediatos com a mudança sólida das condições de vida na comunidade.
A agitação latente nos sistemas de educação e de saúde pode tornar-se um problema grave, que não se resolverá com vanguardismos anacrónicos, capazes de nos precipitar em verdadeiros recuos civilizacionais, como se vai observando noutras zonas do planeta.
Por outro lado, as forças de segurança continuam inquietas, sentem-se desautorizadas e reclamam mudanças na sua condição profissional, a estrutura judicial é objecto de análises tendenciosas, ao sabor de conveniências de conjuntura e o aparelho militar tem sido alvo de um desgaste, que pode resultar num desvio potencialmente perigoso para o regime democrático. 
Descuidados pilares fundamentais, parecem restar medidas avulsas, contraditórias, por vezes ridículas, protagonizadas por fanáticos pretensamente iluminados, numa expressão do mesmíssimo populismo que arrebanha multidões ignaras.
A humanidade constrói-se com outra coragem, inconfundível com o comodismo, o hedonismo bacoco e o egoísmo sem horizontes.

Teófilo Vaz