Mudar o destino

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Seg, 28/12/2020 - 19:35


Não foi o destino que nos trouxe até à condição a que chegámos no Nordeste Transmontano. Foram nove séculos de história que não podemos reescrever, mas que devíamos observar com serenidade, para descortinar as razões profundas das dificuldades que nos tolhem o futuro: actividades económicas com peso diminuto, insignificância política e agonia demográfica, a alimentar um círculo vicioso que ameaça tornar-se uma espiral desgraçada, um turbilhão que não poupará sequer a memória. Estaríamos então no inferno absoluto.
A história do reino de Portugal, hoje república de uma nação que tem dado provas de resistir às surpresas que o tempo tece, condicionou o devir destas terras e destas gentes, para o bem e para o mal. Durante muito tempo não se pressentiu que a tragédia se insinuava, porque as fronteiras não surgiam eriçadas, os fluxos humanos e materiais não estavam barrados por proteccionismos decididos por poderes centrais que, deliberadamente ou não, em nome do sucesso nacional, criaram condições objectivas para que extensões amplas do território conhecessem ameaças difusas à sua viabilidade.
Os séculos de oitocentos e novecentos tornaram evidentes as consequências da sobrevalorização do imediatismo que, pelos vistos, pode comprometer irremediavelmente a viabilidade de uma economia, de regiões inteiras, de um país, talvez até de um continente.
Então já fôramos envolvidos pelas malhas tecidas por outros impérios, que nos impuseram dependências e nos tornaram simples instrumentos dos seus objectivos utilitários, desapiedados das misérias que marcavam a vida de gerações inteiras, num mapa crescente da desgraça. O alívio estava sempre prometido noutros lugares, brasis, áfricas, franças e araganças ou, pelo menos, na feira lisboeta de vaidades.
Pouco ou nada foi feito, décadas e décadas, pelas lideranças nacionais, na monarquia constitucional, na breve república e no longo Estado Novo, com a excepção heróica do grande projecto de Camilo de Mendonça para a agroindústria no distrito de Bragança, que morreu às mãos das febres infantis do novo regime democrático, que não tem dado mostras de recuperação do sentido de responsabilidade na gestão do território, das oportunidades económicas, da equidade na relação com os cidadãos, nem de capacidade para conceber uma estratégia de desenvolvimento global e equilibrado do país.
A condição de interioridade, em vez de estar delimitada, alastra continuamente, e qualquer dia 90% do país será constituído por arrabaldes esconsos de um longo areal, também ele sem futuro.
O desinvestimento agressivo das últimas décadas anulou muitos esforços, aniquilou esperanças, instalou o desânimo. No entanto, nem todos desistimos ainda, apesar da tempestade histórica perfeita, que pode varrer a vida e a coragem que ainda restam.

Teófilo Vaz