Paulo Quintela: o ilustre desconhecido

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Ter, 12/07/2005 - 15:16


Natural de Izeda, Germano Lima licenciou-se em Engenharia pela Universidade do Porto. Depois de passar pelas Minas da Borralha, decide dedicar-se ao Ensino, sendo presidente do Conselho Executivo do Agrupamento de Escolas Paulo Quintela, cargo que exerce há sete anos.

Jornal Nordeste (JN) – O que levou um engenheiro, que trabalhou nas minas da Borralha, a enveredar pelo ensino?
Germano Lima (GL) – As minas da Borralha foram o meu primeiro emprego. Foi lá que fiz o estágio, em 1985. Na altura ganhava 30 contos por mês, mas tinha casa e comida, pelo que os 30 contos eram líquidos, no verdadeiro sentido da palavra.
Nessa altura tive a primeira experiência no ensino como professor de Matemática na Escola Profissional das Minas da Borralha. Adorei e foi assim que ficou mais ou menos marcado o meu destino como profissional.
Acresce que, na altura, a minha namorada era professora em Bragança e era difícil ela estar num sítio e eu noutro. Isso também pesou na escolha, até porque, nessa época, ainda era possível optar. Lembro que, no primeiro ano em que dei aulas, fiquei logo vinculado.
Além disso, a minha mãe vivia em Izeda e a vontade de regressar à terra também era grande, pelo que o primeiro ano em que dei aulas foi na Escola 2,3 de Izeda.

JN – É de Izeda, mas vive em Bragança há 17 anos. É esta a cidade onde, verdadeiramente, gosta de viver?
GL – Foi a cidade eleita desde muito cedo. A partir do momento em que deixei a parte prática do meu curso de Engenharia e enveredei pelo ensino, nunca tive outra perspectiva que não fosse Bragança como o meu local de residência.

JN – Há sete anos que preside ao Conselho Executivo da Escola EB 2,3 Paulo Quintela. Fale-nos um pouco da sua escola.
GL – É uma escola onde encontrei uma grande família e penso que é, hoje, uma referência a nível local. Lá encontrei uma família de professores, uma família de alunos e uma família de funcionários. É uma escola que tem evoluído com esta família, que entretanto foi crescendo. Somos, dentro da Escola Paulo Quintela, cerca de 100 professores e 50 funcionários, a que acrescentamos, de há um ano a esta parte, as escolas que compõem o Agrupamento. Assim, somos 1300 alunos, cerca de 300 professores e 55 funcionários.
É uma escola onde queremos que as pessoas se sintam em casa, para que o trabalho renda e tenhamos sucesso e vontade naquilo que fazemos.

JN – Este é o ano do centenário Paulo Quintela, que nasceu em Bragança, com origens humildes, e tornou-se numa referência mundial. É uma lição de vida para todos nós, não acha?
GL – Certamente que sim. Paulo Quintela nasceu em Bragança a 1905 e era o oitavo de dez filhos da família Pires. Na década de 40 adoptou o cognome de Quintela, supostamente pelo facto do seu avô materno ser da aldeia com esse nome, no concelho de Vinhais. Foi sempre um aluno distinto e, na altura em que completou o 7º ano no Liceu de Bragança, foi convidado para um banco, porque sabia muitas línguas e tinha sido um aluno brilhante. Quiseram contratá-lo e ainda chegou a fazer uns testes, porque o pai e o irmão lhe pediram, mas fez tudo para não passar. Deu erros de Português e não conseguiu traduzir porque o objectivo dele era, mesmo, ir para a Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Depois foi para a Alemanha com bolsa de estudo e regressou quando o Nazismo estava no apogeu, pois sempre esteve mais ligado a uma Esquerda já existente em Portugal.

JN- Deve ser uma grande responsabilidade ter como patrono uma figura como Paulo Quintela?
GL – De facto é. O Paulo Quintela, para muitos bragançanos, é um ilustre desconhecido. E é assim porque ainda não fizemos o esforço suficiente para dá-lo a conhecer. A cidade e as entidades competentes, para além do nome do Auditório e da Escola, não têm feito muito na divulgação de Paulo Quintela. A Escola já estava à espera do centenário do nascimento para poder fazer o lançamento definitivo de Paulo Quintela. Por isso é que pedimos apoio financeiro à Câmara para fazer o busto e a medalha comemorativa.
Avançamos, também, para o lançamento duma revista que vai sair em Dezembro e que tem o apoio directo da Porto Editora. Nessa altura vamos lançar um livro sobre Paulo Quintela, da autoria de João Cabrita.

JN – Acha, então, que a obra de Paulo Quintela não tem tido a atenção merecida da parte dos bragançanos?
GL – Acho que sim. Paulo Quintela é um ilustre bragançano a quem a terra não deu o devido valor. Em Coimbra é nome duma rua e do auditório da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Em Bragança, tirando o auditório e aquilo que estamos a fazer agora, pouco tem sido feito para divulgar o seu trabalho.
A sua principal actividade era a tradução do alemão, que lhe valeu duas medalhas, uma de prata e outra de ouro, do Goethe Institute. Fundou e esteve à frente do Teatro de Estudantes da Universidade de Coimbra durante mais de 30 anos e a sua acção em Portugal também lhe valeu uma condecoração do Governo português, em 1985.

JN – Para quando uma rua com o nome de Paulo Quintela?
GL – Temos posto essa questão à Câmara Municipal de Bragança, inclusive com uma proposta muito concreta. Ao que sabemos vai ser aberta uma nova rua entre a Avenida D. Sancho e o Mercado Municipal, passando pelo Campo do Trinta. Como essa rua ficará contígua à nossa escola, gostávamos que fosse baptizada com o nome de Paulo Quintela. Gostávamos, também, que uma das rotundas da cidade fosse embelezada com uma escultura alusiva a Paulo Quintela.

Entrevista de Marcolino Cepeda, Rui Mouta e Mara Cepeda