UM POVO PERANTE O SEU FADO

PUB.

Ter, 17/05/2005 - 16:53


Recentemente, num canal televisivo nacional, um cidadão luso-brasileiro, de descendência portuguesa, residente no Brasil há mais de cinquenta anos, descrevia os habitantes do Pais da saudade, com o seguinte traço comportamental: “ quando vejo, no Brasil, um homem de bigode a escarrar e a deitar o maço de tabaco vazio para o chão, sei que é português.”

Embora os nossos irmãos do lado de lado do Atlântico não sejam, neste aspecto, propriamente os melhores exemplos ( quem sai aos seus …), a verdade é que, de bigode ou sem ele, este povo, que outrora deu novos Mundos ao Mundo, e se miscigenou, ao longo dos séculos, com várias culturas e raças, tem, contra si, ao lado de indesmentíveis qualidades, a pesada herança de maus hábitos de higiene pública.
Este fenómeno, iminentemente social, tem a ver com a forma como nos posicionamos perante a vida e nos relacionamos com os outros. Porque se, em toda a Europa, segundo li numa revista credenciada, os portugueses são os únicos que tomam banho todos os dias, tratando convenientemente da sua higiene íntima e pessoal, significa que a nossa maneira de estar na sociedade é completamente egoísta.
Como cidadão que me incomoda a imundice, e partindo do (mau) exemplo da cidade de Bragança, realidade que eu bem conheço, vou fazer algumas considerações, as quais, levadas a sério, podem constituir a chave para a inversão daquilo que se julga ser a irreversível fatalidade lusa, habitualmente atenuada pela resignada expressão “ os portugueses são mesmo assim”.
Em matéria de Ambiente, parece ser consensual a ideia de que a Câmara Municipal de Bragança prestou um bom serviço aos munícipes, ao entregar, há meia dúzia de anos (?), a concessão da limpeza à Resin. E ainda que se reconheça que nesta empresa se trabalha sob o signo do profissionalismo, esta cidade, por culpa do tão enraizado espírito de labreguice de muitos que nela vivem, está longe de ser limpa.
Considero, pois, que todas as bem intencionadas campanhas de sensibilização promovidas, com esta temática, ao longo destes anos, quer pelo município, quer pelas juntas de freguesia, ou pelas próprias escolas, dirigidas essencialmente à população escolar mais jovem, tem o mesmo efeito de aplicação da cola em superfície húmida. Ou seja, por mais que se tentem consciencializar os petizes para as questões da higiene e do ambiente, eles dificilmente podem seguir boas práticas, porque se deparam, no meio familiar, com falsos modelos.
Na zona onde eu vivo – Avenida Abade Baçal -, por exemplo, a utilização dos contentores, para lixo doméstico, é feita, por alguns residentes, em total desrespeito pelo resto da vizinhança, como se em pocilgas vivessem. Só o comodismo e a preguiça, como sinónimos de má educação, podem explicar que se larguem os sacos do lixo no chão, junto aos recipientes destinados para esse fim, estando estes aquém da sua capacidade volumétrica, e se deixem, por outro lado, os contentores abertos sempre que deles fazem uso. Estes inqualificáveis e vergonhosos gestos, tidos, quantas vezes, por quem se arroga na sua pavoneada educação académica, leva ao previsível caos: os cães sem dono, em resposta ao natural instinto de sobrevivência, espalham a lixeirada por tudo quanto é canto e esquina; situação que poderá potenciar eventuais focos de doença.
Em relação aos contentores distribuídos pela cidade e respectivo concelho , há um pormenor, ainda que alheio aos utilizadores, que pode ser reajustado. Estes receptáculos são lavados e desinfectados uma vez por mês; quando o ideal seria, a não pedir muito, duas vezes, pelo menos na época de Verão. Confrontando pessoalmente o máximo responsável da Resin, para o distrito, Dr. Nuno Pequito, com esta situação, justificou-a, mostrando bastante sensibilidade e abertura para, pontualmente, remediar o problema, como sendo uma das cláusulas que figurava no contrato estabelecido com a autarquia. Segundo as suas palavras, a viatura que executa esta tarefa ( filha única e excessivamente cara) cobre os Concelhos de Bragança, Vinhais, Vimioso e Miranda do Douro; pelo que se torna impossível fazer esse trabalho com a frequência desejável. E a solução, por assim dizer, passaria por rever o contrato que liga as duas entidades; o que obrigava o município local, ainda que por uma boa causa, a abrir os cordões à bolsa.
Outra situação de que os Bragançanos não se podem orgulhar, diz respeito ao novo conceito de utilização dos passeios públicos e das zonas verdes. À parte da errância indevida de certos animais de elite – os donos continuam, com total impunidade, a passear as suas preciosidades, sem trela nem açaime, sendo raças consideradas perigosas, o que se torna mais grave quando se trata de pessoas que ocupam e exercem cargos de alguma relevância social, como são os casos de dois professores do Instituto Politécnico de Bragança, que ostentam os seus exemplares como troféus de guerra – os seus donos fazem destes espaços públicos autênticos defecadores e mictórios.
Qual seria final a solução para travar gente que tão grosseiramente se comporta em sociedade?
Em primeiro lugar, quem assim procede, devia ser obrigado a frequentar programas de polidez cívica, equivalentes a reuniões de incivilizados anónimos. Em segundo, a Câmara de Bragança devia criar uma Polícia Municipal, tipo Brigadas Verdes, com o objectivo de desencorajar, com a aplicação de pesadas multas, aqueles para quem a palavra cidadania nada lhes diz.
Já que não somos capital do fumeiro, nem do folar, nem da tosta mista, tenhamos a veleidade de querer pertencer a uma cidade cujo cartão de visita seja o civismo e a limpeza.