Arte de Costa e graça de Marcelo

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Portugal tem um Presidente da República que foi eleito à primeira volta com 52 % dos votos entrados nas urnas, ainda que apenas 24,75 % do eleitorado lhe tenha dado crédito, sendo que 51,34 % se absteve.
Não é desse que falo.
Refiro-me a um santo homem, anjo da guarda de António Costa, o político sagaz que ousou pôr a Geringonça a funcionar e com ela surfar as ondas de feição.
António Costa, consagrado ilusionista que encanta camelos e serpentes sem se deixar morder, caminha descalço sobre brasas incandescente sem se queimar, engole sapos e espadas sem se agoniar e, com um estalar de dedos, converteu o Estado numa agência socialista familiar.
Hábil político palaciano, sem dúvida, mas governante inábil, como ficou demonstrado nos roubos de paióis, nos incêndios florestais, nos escândalos governamentais, nas greves dos professores e dos enfermeiros e agora na dos camionistas em que, mais uma vez, foram os ministros a dar a cara (e uma no cravo e outra na ferradura), sendo altamente preocupante constatar que o PS não resiste à tentação totalitária que cresce no ventre da maioria absoluta.
Também porque o feito maior de António Costa depois da Geringonça foi converter à sua doutrina, promovendo-o a guardião mor da sua capelinha, o santo homem Marcelo, em tempos um brilhante analista político agora transfigurado em avalista governamental. 
É São Marcelo que, com sandálias de peregrino e rosários de selfies na mão, incansavelmente calcorreia Portugal de lés a lés, aplaudindo os melhores truques do mágico Costa e silenciando os seus fracassos mais estrondosos. 
São Marcelo que contemporiza com o descalabro da Justiça nos processos de corrupção, desobstrói as veredas sinuosas que conduzem a extrema-esquerda ao poder, exorciza os diabos da direita moribunda (de cujo alforge esfarrapado ele mesmo, um dia, caiu desamparado) e, por reflexo, franqueia o palco à extrema-direita, convicto de que assegura a estabilidade política varrendo o lixo do Regime para debaixo do tapete.
São Marcelo, padroeiro do Regime em que pontificam traidores da Nação e cujo maior ferrete é a política de alterne, mascarada de alternância democrática, agora em vias de acabar, embora o negócio continue florescente e sem concorrência. 
Quando nenhum serviço público funciona como deveria São Marcelo tudo abençoa com a água benta e a presunção que António Costa toma quanta quer.
Se os portugueses se queixam da Saúde lá está São Marcelo para dourar a pílula. Se há problemas no Ensino apressa-se São Marcelo a virar os professores contra a parede. Se a Segurança Interna derrapa de pronto São Marcelo desautoriza os polícias.
São Marcelo que frequentemente mete o nariz onde não é chamado, embora, quando lhe convém, meta o rabo entre as pernas.
Qual cana que brada no deserto democrático é escutado por multidões embevecidas, como se de Quim Barreiro ou de António Variações se tratasse, indiferente ao descalabro do Estado e ao descrédito do Regime, que continua partido e engessado.
Paradoxalmente, os portugueses andam felizes mas descontentes. 
Arte de Costa e graça de Marcelo. 

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Henrique Pedro