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NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - Fernando (Abraham) Dias Fernandes (n. Pastrana, 1665 – Londres d.1742)

Nasceu em Pastrana, Castela, por 1665. Seu pai, Diogo Dias Fernandes, originário de Muxagata, concelho de de Foz Côa, era mercador e certamente andava cá e lá, de um e outro lado da fronteira. Por duas vezes ficou viúvo e o terceiro casamento foi com Joana Correia Solis, natural de Castela que lhe deu 4 filhos machos, entre eles o Fernando.

Era miúdo, menor de 8 anos, quando veio de Pastrana para Muxagata, para casa de seu tio segundo, Luís Francisco, que o meteu a estudar na escola da terra, (1) antes de o iniciar no mundo dos negócios e da cobrança de rendas. E a primeira saída, em tais funções, seria para a região de Chaves, assentando em Rio Torto, onde a família ganharia espaço.

Por 1683, foi casar na vila de Freixo de Numão, com Maria Gabriela Pinheiro, sua prima. Ali estabeleceram morada e lá lhe nasceram dois filhos e uma filha. Seria um dos principais da terra, já que o nomearam mordomo da confraria da Senhora da Carvalha. E sendo mordomo, promoveu uma grande festa com missa cantada, sermão… comédias e danças… “e dando um vestido à dita Senhora, de primavera”. Dirá mais tarde que a festa foi organizada em ação de graças a Nossa Senhora por lhe ter curado a sua mulher de uma grave doença, estando despedida dos médicos. E isso mesmo foi atestado pelo pároco e homens da nobreza da terra.

Em 1691 a família mudou-se para o Porto, seguindo o tio Luís Francisco, atrás nomeado que, na Invicta, conseguiu tomar de arrendamento o consulado da alfândega. E pela mão do tio, que não tinha filhos, e em sua substituição, Fernando desempenhou funções de feitor da mesma alfândega. A sua casa de morada era junto à capela de Nª Sª do Terreiro, freguesia de S. Nicolau, capela que então foi reedificada, sendo ele foi o primeiro a contribuir.

Mas não se pense que ele era um mero burocrata, a fazer despachos, “varejar” navios e taxar mercadorias. Antes se revelou um empresário dinâmico, um mercador de largo trato, atuando em mercados estrangeiros. No Brasil mandava comprar açúcar, tabaco e couros que vendia no reino e exportava para Espanha, Holanda, Inglaterra... dali recebendo tecidos e ferragens. Vejam, em prova, o seu próprio testemunho:

- Do Brasil lhe vieram na frota passada, em diferentes navios, 20 caixas de açúcar, as quais lhe mandou de Pernambuco António Rodrigues Campelo; do Rio de Janeiro, José Gomes da Silva; da Baía, Luís Mendes de Morais, e o seu comissário João Francisco, todas procedidas de efeitos que ele declarante havia mandado para as mesmas partes. (…) E que ele declarante é devedor a Luís da Costa, homem de negócio, em Londres, da quantia de 900 e tantos mil réis, procedidos de fazendas que mandou a ele declarante, da qual dívida lhe havia passado uma letra… (2)

Neste comércio internacional, o transporte marítimo apresentava excecional rentabilidade. E Fernando Dias tornou-se armador, proprietário de, pelo menos, um navio, chamado S. Miguel, o Anjo, que em fevereiro de cada ano zarpava para o Brasil, regressando na frota de setembro. E falecendo o piloto do navio, José Rodrigues Arão, foi o seu filho Diogo Dias Fernandes que assumiu aquele posto, contando apenas uns 18 anos! Aquele barco acabaria por afundar-se no rio Tejo e teria Fernando encomendado a construção de outro, quando foi preso.

As viagens transatlânticas eram deveras perigosas e frequentes as perdas de mercadorias e de navios. Por isso a atividade seguradora apresentava-se a Fernando Dias como um vasto campo a explorar. Obviamente que esta atividade envolvia riscos e quando os percalços aconteciam, Dias Fernandes tudo fazia para fugir à indemnização devida. Temos notícia de um pleito com um segurado cujo navio e mercadoria se perdeu na viagem pelo rio Douro, entre o Porto e Foz Tua. (3)

Em 1700, 9 anos depois de chegar ao Porto, o círculo empresarial da cidade apresentava-se já pequeno para os projetos de Fernando, apoiado pelo tio Luís Francisco. Com efeito, de parceria com Pedro Furtado, eles tomaram o arrendamento do consulado da alfândega de Lisboa. Luís Francisco conseguiu ainda o contrato do tabaco na capital do reino, o qual andava por mãos do contratador Diogo Nunes Pereira. Assim, e como lugar-tenente do tio, em Janeiro de 1701, Fernando Dias e a família abandonaram o Porto e foram estabelecer-se em Lisboa. A sua primeira casa de morada foi junto à Sé, transferindo-se depois para o Rossio, para a denominada “casa dos degolados”.

Do tempo de sua morada à Sé, recordamos um episódio acontecido no Terreiro do Paço em que, queixando-se ele a Gaspar Mendes Henriques da falta de carvão em casa, este respondeu que fosse à loja e que para o conhecerem e lhe darem o carvão “bastava saberem que ele era genro do Medina” e entretanto lhe mandaria vir mais carvão de Abrantes. E esta nota é interessante, pois que ainda hoje é daquelas partes que se faz o abastecimento de carvão a muitas regiões deste país, nomeadamente a Trás-os-Montes.

Estamos então em Lisboa, em Março de 1703, quando a inquisição prendeu Fernando Dias Fernandes. Entre as muitas práticas de judaísmo de que foi acusado, uma se destacava: a de frequentar as “sinagogas” de Diogo Henriques Julião e de Manuel de Aguilar e ele próprio dar “sinagoga” em sua casa, no Porto. (4) Interessante que na sinagoga de Diogo Julião entravam homens e mulheres, enquanto as outras duas eram apenas frequentadas por homens.

Impossível resumir aqui o seu processo. Diremos tão só que a sua defesa é muito perspicaz, com muitos pedidos de esclarecimento e reperguntas aos denunciantes. Muitos interessantes são também as contraditas apresentadas, que permitem vislumbrar quadros muito vivos e reais do ambiente social em que o contratador Fernando Dias se movimentava. A título de exemplo, veja-se a contradita apresentada contra um presumível denunciante:

- Teve ele réu uma pendência com Rodrigo Álvares da Fonseca, irmão do dito Fernão da Fonseca, por causa de umas peças de baeta que se haviam de tirar do navio Nª Sª da Graça, que naufragou na costa de Vila do Conde (…) e um tio do réu, por nome Luís Francisco (…) contratador do consulado, fez tomadia de umas pipas de vinho ao dito Rodrigo Álvares da Fonseca, que importaram em cento e tantos mil réis (…) e também mandou dar varejo em um navio, por nome Madre de Deus, que era do dito Rodrigo Álvares da Fonseca e irmão e cunhado Domingos da Fonseca, que mandavam para Pernambuco, e lhe fez tomadia em diferentes fazendas sonegadas aos direitos, que importou em mais de 4 contos de réis…

Resta dizer que Fernando Dias Fernandes acabou condenado em hábito penitencial perpétuo no auto da fé celebrado ao Paço da Inquisição em 12 de setembro de 1706. Posto em liberdade, fugiu com a família para Inglaterra onde se fez circuncidar tomando o nome judeu de Abraham Dias Fernandes. De Inglaterra continuou comerciando com Portugal e para facilitar contactos e evitar sequestros de mercadorias, usava o nome de Miguel Viana. Em 1743 ainda era vivo, pois que nesse ano fez seu testamento, em língua portuguesa, sendo posteriormente traduzido para inglês. (5)

 

NOTAS e BIBLIOGRAFIA:

1-Na escola, em Muxagata, Fernando teve por companheiro o Dr. António Botelho da Mesquita, homem da principal família de Freixo de Numão e o futuro padre Simão Nunes. Sinal de importância e eficácia daquela escola para chamar alunos de outro município?

2-ANTT, inq. Lisboa, pº 2014, de Fernando Dias Fernandes.

3-ANDRADE e GUIMARÃES, Nós Trasmontanos… André Garcia de Miranda, in: jornal Nordeste nº 1078, de 11.7.2017.

4-Pº 2014, tif 69, denúncia de Francisco da Costa, familiar do santo ofício: - (…) Diogo Henriques Julião, que tinha grande negócio, que vivia na Rua Nova e hoje está na Holanda, aonde logo se circuncidou (…) que em sua casa se fazia sinagoga, porque em certos dias da semana se ajuntavam na mesma casa a maior parte dos homens da nação juntamente mulheres e saíam de noite (…) E que estes ajuntamentos se faziam hoje em casa de Manuel de Aguilar, estanqueiro do tabaco, que viera do reino de Castela e assiste nesta cidade há 8 anos, que é morador ao princípio da Rua da Reboleira (…) porque todo o homem da nação desta cidade e os que a ela veem, todos vão passar a sua casa, e também presume que em casa de Fernando Dias Fernandes fazem também sinagoga, porque também concorrem na mesma casa, e porque são particulares amigos e parceiros no negócio, que o trazem muito grande e Fernando Dias Fernandes é homem baixo, refeito de corpo, a cara cheia, cabelo castanho escuro…

5- Esta informação foi-nos transmitida pela Drª Carla Vieira, da cátedra de estudos sefarditas, a quem, penhoradamente, agradecemos.

 

Tempo de verão

Há um carro de anos o saudoso Carlos Silva improvisava a lendária canção da Ella Fitzgerald no barracão de comes e bebes do Senhor Poças (Bolha) ao final da tarde ou na cave do Flórida no decorrer da noite no salsifré do jogo da moedinha refrescando-se a goela bebendo finos acompanhados de suculento pregos de vitela. Improvisava lindamente o Carlos, ele utilizava a ária da formidável artista embrulhando letras conforme as piadas em voga sempre num tom de crítica à situação social vigente.

Era tempo de verão numa época de guerra colonial, num tempo de horizontes fechados, de cenceno permanente apesar da luminosidade dos dias e a temperança da brisa nocturna. Tal tempo de verão agitado através das quadras dos «baladeiros», do suplemento juvenil do Diário de Lisboa, das lutas académicas na Lusa-Atenas.

Nessas noites a conversa entremeada de vernáculo e sementeira de alhos extravasa para a rua da República e Praça da Sé, ao tempo designada por eira de Espinhosela, discutia-se tudo, Deus, a Igreja comentando-se os textos do Padre Felicidade Alves, os livros do filósofo matemático Bertrand Russell, na altura de soltarmos palavras de azedume político, automaticamente, baixava-se a voz pois as paredes tinham ouvidos, o polícia de giro, sem pressas, aproximava-se soltando as boas-noites em intonação afável e seguia na passada ritmada de quem se obriga a gastar o tempo de turno.

A acutilância verbal de melhor quilate e vibração pertencia ao Carlos, ele emergia certeiro na análise deixando-nos duvidosos dos nossos pareceres e argumentos a escorá-los, sem dúvida, ao tempo entendia-o como guia de referência nos variados campos do meu quotidiano. Era tempo de verão, de leituras apressadas, de balancear a utopia. As utopias.

Não ficávamos isentos de crítica, falávamos de personagens da cidade recorrendo ao acídulo comentário sobre as suas andanças, ninguém era esquecido, clérigos, militares, legionários, bonifrates manga-de-alpaca sem manguitos, burocratas licenciados, professores de diploma e sem possuírem o certificado expresso no diploma, senhoras de bom, e mau porte (estas últimas justificavam particular atenção) incluindo as amásias promovidas a governantas, nesse tempo existiam algumas proprietárias de bustos a rivalizarem com o da sueca Anita na fonte romana. Lembram-se leitores da minha idade?

Não vou retemperar mais vigamentos das ditas noites de verão, as plasmadas neste artigo servem unicamente para acentuar a transformação ocorrida, agora impera a vertigem do telemóvel, o oráculo da Internet, a linguagem cifrada das corruptelas fixadas nas redes sociais infestadas de intrusos atrevidos, nas gloriosas noites estivais não entrava um qualquer, apenas os aceites pelo grupo.

O terem emergido outras formas de comunicação é um extraordinário progresso, no entanto, julgo ter-se acentuado o ascetismo do convívio pessoal beneficiando as relações virtuais, sem esquecer a cacofonia futebolística na maioria dos canais televisivos empobrecedora da salutar e serena autópsia dos diferendos do universo da bola.

A razão animada através do exercício da reflexão leva-me a dizer que ao contrário de Frei Tomás não sou dependente do telemóvel, ainda menos das redes sociais da coscuvilhice apesar de terem algumas virtudes, situo-me entre o escrito nos livros o «Mundo que nós perdemos» de Peter Lasket e o «Admirável Novo Mundo» de Huxley, um a lembrar as virtudes da recuperação do passado, o outro a antecipar um Mundo que ultrapassou largamente o autor, no entanto, não fujo do progresso científico e técnico, antes pelo contrário.

Posso lembrar o Negus do salão do Senhor Adriano (Manco) pai do ágil futebolista Micá trazer ao de cima os cafés nos quais existiam tabuleiros de damas e xadrez, os santuários vínicos especialistas no aprimoramento das famosas masturbações de bacalhau no intervalo de pugnas às vezes virulentas de partidas de sueca.

O tal tempo de Lasket esvaiu-se, não adianta chorar sobre o leite derramado, existe em Lisboa um clube cujos sócios ainda se julgam na época de Dona Maria I, lacrimejam num guisado composto por pragas aos malhados, aos vestidos vaporosos das senhoras e à Igreja inspirada no Vaticano II. Enfim…

 Tempo de verão refrescante para todos. Desejos meus.

Vendavais - Terra queimada

Eu tenho esperança de que todos queremos o melhor para este país sempre em ebulição informativa e quase sempre pelas piores razões. Mas ninguém julgue que somos todos uma cambada de totós que acredita em tudo o que se diz e que engolimos todas as patranhas que nos querem impingir. Isso leva-nos a sermos desconfiados, o que também não ajuda muito, mas pelo menos pode minimizar o impacto final.

Este Verão tem sido demasiado penoso para os portugueses. Depois de se anunciar uma melhoria na economia, o que nos fazia sentir mais animados e ir para férias mais descansados porque afinal o governo tinha feito bem o seu trabalho, eis que vem a público que a dívida pública tinha aumentado substancialmente, ultrapassando todos os valores anteriores. Uma no cravo, outra na ferradura!

Chegada a época dos incêndios e pensando que os anos anteriores tinham dado lições de como combater o flagelo anual, eis que surge a desgraça de Pedrógão e Góis e faz sessenta e quatro vítimas, cujos culpados não se conhecem, além do próprio fogo assassino. Quando ninguém quer as culpas, tenta-se encontrar um bode expiatório, mas nem o tal bode parece querer aparecer. Azar dos Távoras! É fácil falar de prevenção. É bonito e fica bem dizer que as coisas vão finalmente mudar e que se vai alterar o sistema e gastar mais dinheiro na tal prevenção e envolver mais instituições neste combate desigual que todos os anos consome o que de mais rico temos. Mas para trás fica a terra queimada que sustentava famílias inteiras que agora se sentam nos escombros que as cinzas deixaram e nos bancos do desespero e do abandono. Queira Deus que daqui a um ano as pessoas que perderam as suas casas e a quem tanto foi prometido, não se encontrem ainda no meio da rua à espera do teto promissor.

Como uma desgraça não vem só, eis que surge o alarme de Tancos. Chego a questionar-me se tal acontecimento não terá sido forjado com o objetivo de desviar atenções, mas a verdade é que se fosse positivo o que aconteceu, eu talvez duvidasse das notícias que foram dadas, mas mais uma vez vemos a culpas a ser arrastada pelas ruas da amargura e continuar solteira mesmo em tempo dos santos casamenteiros.

O que aconteceu com o paiol de Tancos foi realizado por quem sabe e tem capacidade para o fazer. Pode-se por-se a hipótese que, se por acaso, a ronda militar apanhasse em flagrante o grupo assaltante, muito provavelmente seria neutralizada ou até eliminada. E porquê? É que as sentinelas nos nossos quartéis andam sem carregadores municiados nas armas e apenas dispõem de um outro, nas cartucheiras, com poucos cartuchos e lacrado. Em resumo: não podem defender as instalações que lhes são confiadas, mesmo que o queiram porque retirar o carregador vazio, deslacrar o que levam na cartucheira, colocá-lo na arma e disparar é uma impossibilidade, porque antes já foram desta para melhor.

Por outro lado, se uma sentinela, no exercício da sua missão, disparar a sua arma em defesa do pessoal, das instalações ou do material que lhe estão confiados, uma coisa é certa: está metido numa encrencada que pode resultar na sua prisão e pagar grossa indemnização a um ou mais assaltantes. Resumindo, o nosso exército está a trabalhar com enormes dificuldades e as culpas não podem ser assacadas aos militares, simples comandados das elites e do governo.

Este ataque, se é que ele aconteceu, só pode ter ocorrido através da porta d'armas, a entrada principal, e não através de um buraco na vedação, que foi, segundo consta, por lá que entrou e que depois saiu a viatura pesada de transporte. Quem estava a comandar o portão principal, ou era conivente com a conspiração, ou tinha sido autorizado por algum superior a deixar entrar e sair aquele camião concreto sem fazer perguntas, nem pedir papéis, e que depois nem vasculhou o conteúdo à saída. E na cerca da vedação ninguém falou de rasto de pneus, nem de que género de viatura entrou e saiu por lá. Isto parece um filme de desenhos animados.

Enfim. Tivesse sido um conjunto de responsáveis da Base a fazer uma “exportação” de material bélico a troco de muito dinheiro ou ser somente uma aldrabice para iludir ingénuos e tudo ser orquestrado para encobrir inventários mal feitos ou mesmo uma operação dos serviços secretos destinada a desestabilizar o jogo político e a criar medo e insegurança na opinião pública, o certo é que tudo o que aconteceu em Tancos dificilmente será investigado a fundo como quer Marcelo e nunca se chegará aos culpados verdadeiros.

Deste modo quase patético e inverosímil, Portugal vai continuar a ser simplesmente uma terra queimada onde a culpa arde lentamente ao sabor das vontades políticas.

Uma nota que representa … a vida

Que grande infelicidade constatar que certos professores e direcções de escolas secundárias permitam a certos alunos passar de ano tentando que por vezes as notas subam alguns pontos. Imaginem, fazer com que um aluno passe com 60%, enquanto na realidade só tinha obtido 58%? A fraude do século, muito longe à frente da dos paraísos fiscais ou da dos arranjos políticos. Por conseguinte, concentremos os nossos esforços neste problema endémico criando uma nova comissão de estudo honrada pelos professores mais experientes e sábios de cada escola.     

 

Srs. Professores, esqueçam as grandes expressões deslavadas “estamos a nivelar por baixo”, “ e a excelência?!”, claro que é importante, até porque com esses alunos é fácil trabalhar. Trata-se doutra realidade, vamos aos factos, sabem o que representam estes 2%? A vida.

A destes jovens adolescentes que, apesar das dificuldades maiores no plano da aprendizagem, perseveram bem ou mal, insistem para não desligar ou abandonar, com falta de apoios apropriados a todos os níveis. E nem todos os professores sabem do que falo. Uma vida que, sem o diploma de 12º ano, ficará condenada às maiores dificuldades; inexistência de possibilidade de emprego ou empregos muito precários e mal remunerados, uma estima de si próprio ou autoconfiança cada vez mais débil ligada ao profundo sentimento de não poder concretizar os seus mais pequenos sonhos, os da infância. Eis o que representam estes 2%, um diploma que possa, aqui ou lá longe, assegurar um certo patamar de decência na sociedade. 

 

Vamos ser justos e empáticos em relação a estes alunos que já sofrem bastante para além do mais lhes mostrarmos que continuamos insensíveis à sua situação. Esses jovens que obtêm 58% têm por vezes dificuldades diversas para não dizer problemas de aprendizagem, concentração etc. etc. que explicam o seu fraco rendimento. Em vez de os castigar em vez de os fazer reprovar por 2%, deveríamos valorizá-los e agradecer-lhes por ainda estar presentes, ligados aos estudos, habitados pela dor de aprender.

Sair da caverna é um exercício difícil, Srs. Professores! …

 

Conhecem muita gente que continua presa a uma tarefa dolorosa, e que continua mesmo assim a bater-se ano após ano? Felicitemo-los e paremos de adotar unicamente regras contabilísticas, frias e austeras.

 

Estes 2% devem ser abordados de forma quantitativa, e não qualitativa. Não cortemos as asas a estes jovens corajosos e perseverantes – não são todos sei! – com os nossos princípios racionais de adulto que incita unicamente à performance. Estes comités de pais da performance que se lamentam do Nível que “voa baixinho” e que já viram os filhos voar mas se esqueceram rapidamente de que também estes passaram por dificuldades e deixaram para sempre algumas penas na sua ascensão. Aqueles que inculcam aos seus filhos não a importância de ir além das suas forças, da entrega, do sacrifício, mas da importância de ultrapassar os outros seja qual for o método.