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Vendavais- Um animal de estimação chamado loucura

Acabou-se a loucura do Orçamento que é um animal de estimação de todos os partidos. Contudo, os partidos têm o seu animal de estimação que é a loucura. Há hoje em dia uma tendência para que se tenham animais de estimação que obrigam a quem os tem a uma ginástica temporal diária, o que não é impeditivo a que se mantenham e com direitos de mordomias. Sinais dos tempos. Todos os dias, no bairro onde se vive ou nas ruas que percorremos, lá vão eles presos pela trela ou não, com os donos num amigável passeio digestivo e sanitário. Não dão grandes liberdades para que eles não causem problemas de maior quer aos donos quer aos que com eles possam cruzarse. Mesmo com todos estes cuidados, os problemas surgem quando menos se espera. Mas se uns têm em casa animais desta espécie, outros há que mantêm espécies diferentes como se fossem animais de estimação e que levam a passear por ruas e ruelas bastantes apertadas correndo o risco de saírem machucados. Curioso é que, mesmo sabendo dos riscos que correm, não abdicam de passear os seus “animaizinhos” por estes lugares muito perigosos. A loucura tem vários modos de se manifestar. Uns mais meigos, outros mais agressivos e ainda outros mais exigentes e perigosos. E tem ainda uma forma subtil de se mostrar, de se insinuar e de querer mostrar que não é de modo algum, a loucura que todos apregoam e rotulam. Afinal, ela só é loucura porque as consequências do seu comportamento podem ser demasiado gravosas. Contudo, os seus progenitores não se coíbem de a passear e mostrar quão importante é lidar com ela. No fundo é só mais um animal de estimação no meio de tantos outros. A única diferença é que falam pela voz do dono. Todos os anos assistimos a uma luta de galos para aprovar o Orçamento do ano que se segue. Acabámos de ver o Governo fazer manobras mirabolantes para convencer os partidos de que a solução apresentada seria a melhor para manter equilibrada a balança do desespero económico do Estado. Mas, como vimos, não é fácil consegui-lo. Há que namorar e muito, os possíveis parceiros de quarto. O problema surge quando eles não gostam das investidas namoradeiras e se recusam a fazer parte desse jogo. Aqui exigem e dizem não. Uma autêntica loucura. Todos sabem os riscos que correm os portugueses que assistem a estes namoros de parapeito. E, mais listo que todos eles, o Presidente da República, no patamar superior, foi chamando à atenção de todos eles, para o perigo de o namoro correr mal e a necessidade de se entenderem, deixando as loucuras e as pretensões de vitoriazinhas de lado. É que este animal de estimação é demasiado perigoso para passear pelo orçamento, que é apenas uma das ruas estreitas lá para os lados de São Bento. Mas não pensemos que é só o governo a ter este animal de estimação a que, por sinal, foi dando alguns metros de liberdade nos seus ténues passeios de fim-de-semana. Não. Os outros que com ele se cruzaram fizeram alarde de os mostrar igualmente, com rédea bem mais curta e com exigências bem maiores. Outra loucura de estimação, que lhes deu gozo passear, sem se preocuparem muito com os transeuntes que poderiam ficar afetados ou até mutilados por esta loucura terrível. O que é importante de igual modo, é saber que os nomes dos donos destes animais de estimação a que chamam loucura, são conhecidos de todos e não é por isso que eles se importam. Seja o PC, seja o BE, seja o PAN ou outro qualquer, adoraram passear a sua loucura pelos meandros do Orçamento e pelo caminho foram mostrando onde queriam ir e com quem e, o mais importante, como queriam ir. A companhia era importante, mas só uma servia e se adequava à sua própria loucura de estimação. Mas todos sabiam que as ruas eram demasiado estreitas para esses passeios. Foi pena que assim fosse. Se não servia ao Governo qualquer companhia, o certo é que ele escolheu e delimitou as escolhas somente a alguns e o mesmo aconteceu aos outros. Restava esgrimir a força das suas loucuras e ver qual delas aguentaria mais as outras ou se entendia com elas. No fundo, além de passear a loucura pelo Orçamento, seria ter um Orçamento, mesmo que fosse de loucos. Mas não houve. O Presidente da República tinha avisado. Todas as tentativas se finaram e como estamos em época de finados, até serviu para enterrar a Geringonça de vez. Todos sabiam que corriam o risco de ir a votos para escolher nova loucura. Derrotado, Costa, não se demite e está pronto para ir a eleições. Parece que todos estão. E quer queiramos quer não, teremos de viver todos a loucura que se instalou de novo. Penso que chega de loucuras. Pelo menos destas de estimação. O melhor é comprarem cães e levá-los a passear pelas avenidas da capital, mas com juízo, que chega de brincadeiras.

Travessuras atravessadas

S e são travessuras, são atravessadas, diria o Senhor de La Palice. O que não podia afirmar era serem estes arremedos de construções derribadas movidos pela maldade ou vandalismo ora tão em voga na sociedade portuguesa. As travessuras praticadas nas aldeias do concelho do Vinhais atravessam alfaias agrícolas, barrotes, carros de bois e vacas, cancelas, troncos, e demais parafernália existentes nos cabanais, eiras, quintais e cortinhas das comunidades, numa aleluia silenciosa da noite da véspera do dia de Todos- -os-Santos numa harmonia irregular de modo a suscitar imprecações em chorrilho pelos visados e visadas, numa ingenuidade festiva daqueles mundos circulares que Michel Foucault tão bem descreveu numa folia pálida levando em conta as folias desbragadas registadas genialmente por Hieronymus Bosch e Peter Bruegel. A rapaziada construtora nas trevas de travessuras tinha atingido o estatuto de poder andar na rua sem a ameaça da famigerada galha morigeradora da curiosidade dos «garotos» sempre atreitos a meterem o nariz para onde não são (eram) chamados. Os meninos na manhã seguinte, ao raiar da aurora, saíam de levando na destra um «canoco» de pão, gritavam (gritei) alvoroçados, a chamarem toda a parentela a admirarem o engenho dos criadores de efeitos quantas vezes descalavrados antes de correrem toda a aldeia a fim de contemplarem a efémera volumetria dos objectos apresentados ao modo de semióforos fora do circuito dos museus. A festa das travessuras fez parte da feliz vivência em Lagarelhos, já poucos elementos restam dessa época, não sei se há registos das referidas folias, pelo menos as abóboras ainda resistem, para lá da sua utilidade alimentar de humanos e animais de várias espécies, as meninas abóboras mais as suas irmãs de maior idade serviam como instrumento de amedrontar miúdos e alguns graúdos ao serem transformadas em máscaras ambulantes, tendo dentro de uma vela acesa, as quais giravam no negrume nas noites sem Lua, mais densas do que as mencionadas no livro sagrado – a Bíblia –, espetadas em paus aguçados fazendo percursos ora rápidos, ora lentos nas cercanias das povoações por que não existia electricidade imperavam os medos/medonhos, pavorosos, nas mentes crédulas das crianças e não só, da mesma forma que os fantasmas aterrorizavam os visitantes a dormirem nos castelos medievais escoceses. Um dos malefícios da electricidade na Escócia foi a de extinguir os fantasmas, embora persistam referências a estas estranhas criaturas a suspirarem nos corredores das fortalezas dedicadas ao turismo de excêntricos endinheirados amantes do single malt, pois ao invés dos blended estilo DYC provocavam e provocam alucinações fantasmagóricas de moleza nos lençóis a trazerem à tona usuais nos bons tempos da juventude originários de lágrimas e suspiros corporizados na canção dos anos sessenta do século XX, cantada por António Mourão. Lembram-se? Acerca dos efeitos translúcidos do malte (sei do que escrevo e às vezes falo) nesta crónica é mais assisado não prosseguir, ouvi falar na recuperação do fagueiro bagaço (alcunha de um rapaz nascido nos Batocos), bebida muito requestada até à chegada do corriqueiro uísque em grande parte consequência da forçada e mortífera estadia de dois milhões de rapazes na «força da idade) na obscena guerra colonial. As travessuras em 2021 fazem-se na opacidade dos gabinetes, reservados de restaurantes e locandas de luxo de gosto decorado a granel, de tempos a tempos, as atravessadas travessuras rebentam na comunicação social constituindo o sumo da imprensa amarela, os despojos das derrocadas jazem largos anos em edifícios marcados por estátuas de mulheres de olhos vendados, no entanto, as vendas parecem ser porosas nuns casos, espessas qual burel molhado noutros. Caro leitor: faça o favor de desculpar o autor destas desajeitadas cogitações fruto da insónia provocada pelo gasto de largas horas a ver e ouvir deprimentes intervenções dos Honoráveis no Parlamento a propósito do recusado (e bem) Orçamento. Aqueles apelos lancinantes dos tenores socialistas apenas me suscitam duas palavras: Porca miséria! Ridículo o inefável Ascenso Simões a glosar o Avante camarada. A culpa mão é dele, é de quem o elege!

Inveja: a Arma dos Não Competentes

A inveja, o 5.º dos sete pecados capitais, que, na opinião dos especialistas do comportamento humano, é o sentimento de frustração/incómodo por que é tomado um dado individuo, o invejoso, em consequência do sucesso ou posse material alcançados, com mérito e esforço, pelo Outro, que aquele não consegue obter, por incompetência ou outra razão qualquer. Dizem também os entendidos da mente humana que este comportamento, muito peculiar na tuga gente (um verdadeiro contra - senso, na medida que, na desgraça alheia, damos provas de sermos um povo generoso e solidário), é um transtorno de personalidade, uma patologia do foro mental. Definição científica que parece não se prestar a outros entendimentos ou contraditório, porquanto quem é afectado por tal doença está longe de ser feliz. Por ser um caso que me inspira, não podia deixar de partilhar, com quem está de bem com a vida, o exemplo do meu amigo Jorge Morais, que, estando, como amador, no ramo da restauração, há pouco mais de dois anos (sem “descontar” o período da pandemia e suas restrições), faz inveja a muito boa gente (nomeadamente aos oficiais do seu ofício) que está de portas abertas há vários anos, e se dizem entendidos na matéria. Conheço o Jorge há vários anos. Tive com ele maior proximidade, quando ambos, há uma década, frequentámos um curso de cozinha com o inigualável e famigerado Chef António. É das pessoas melhores, mais simpáticas e honestas que conheço. Diria, a personificação do cavalheirismo e do saber estar. Empresário numa área de negócio distinta, o seu sonho, de longa data, era abrir um restaurante que fizesse a diferença em Bragança. Aquilo que seria, à partida, inexequível, tornou-se realidade: em homenagem à sua querida mãe, que desapareceu há muitos anos, o Jorge deu o nome de “Dona Florinda” ao restaurante que é hoje, na minha opinião, um dos melhores do distrito de Bragança: amplo, airoso e com uma decoração lindíssima, destaca-se da concorrência, quer pela simpatia dos donos ( Jorge e Cláudia, sua encantadora esposa) e dos empregados, quer pela relação preço/ qualidade dos pratos que ali se confeccionam, sendo que ali o requinte, uma das marcas d`´agua, não é reflectido na factura a pagar. O Jorge, a quem lhe tiro o chapéu, pela coragem de arriscar numa área em que se julgava já tudo estar inventado, é daquelas pessoas que contrariam a portuguesíssima crença de que, nesta sociedade, só os desonestos têm sucesso e ganham dinheiro. Os verdadeiros empreendedores, como é o caso do meu venerando amigo, saltam do trapézio sem rede; não precisam de publicidade gratuita, nem de constar dos roteiros turísticos – “património” duma certa “elite”, diria eu. O meu insigne amigo Jorge, ao contrário de muitos, não é materialista nem ganancioso. Motiva os funcionários, valoriza-os e dá-lhes um salário muito acima do praticado no ramo. Como pessoa justa e de bom coração, não se aproveita da indecorosa politica de contratação de estagiários sem vencimento. O Jorge é uma pessoa com valores morais: não se cega com as carteiras recheadas dos estrangeiros, como alguns avaramente o fazem. O Jorge tem sempre a casa cheia, porque, para ele, a paixão pela a arte de cozinhar é incomparavelmente mais importante do que o vil metal. Em jeito de declaração de interesse, e para concluir, deixo aqui a nota de que este texto não foi lavrado por “encomenda”, a pedido – o “interessado” não teve conhecimento prévio do mesmo, nem lhe pedi autorização para mencionar o seu nome -, mas porque gosto de prestar tributo aos jorges deste país, que não desistem de perseguir os seus sonhos, mesmo quando os astros não estão alinhados. Este tipo de gente merece ser reconhecida. Todos os atributos para os qualificar pecam por escassos.

António Pires