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Autarcas dos municípios com pouca rede móvel e internet reivindicam instalação do 5G

Ter, 12/10/2021 - 18:17


Os autarcas dos municípios onde há pouca rede móvel e de internet reivindicam fundos nacionais e comunitários para a instalação do 5G nestas regiões. A Associação Nacional de Municípios Portugueses quer que o processo de cobertura seja como o da rede de saneamento e electricidade.

Varanda de memórias

Todos os domingos ia a Rebordainhos, uma pequena aldeia no Distrito de Bragança, visitar o meu avô paterno, César Ramos (ou Tio César para os mais próximos). À chegada, já era previsto que ele estivesse de pé, na varanda de casa, à espera de que eu e os meus pais passássemos de carro para nos acenar. Enquanto o meu pai estacionava o carro, eu abria a porta e corria para as escadas onde se encontrava o meu avô e dava-lhe, como o habitual, um beijo “na careca”. No lado direito estava a porta da sua pequena e humilde casa por onde entrava a pensar nas torradas feitas ao lume que já sabia que tinha à minha espera. Apesar de suportar as dores de costas que carregavam a sua vida inteira dedicada ao trabalho árduo no campo, levava-me à loja ver a Burra e os restantes animais. Era a minha parte favorita e sei que a dele também. Tal como o Tio César, eu adorava, e adoro, animais. Menos vacas. Sempre que elas passavam pela aldeia, eu escondia-me e ele soltava aquele sorriso contagiante da sua boca, já sem dentes. Durante o caminho, o cheiro a alecrim e a ar puro deixava-nos num mundo à parte – no nosso mundo. No fim do dia, regressávamos a casa e eu voltava para Bragança com os meus pais. As semanas passavam. As mãos dele já tremiam pela idade. A sua incapacidade física já não lhe permitia levar-me à loja ver a Burra nem o resto dos animais. Eu não percebia porquê. A cada semana, mais uma ruga lhe nascia no rosto. Vi-o envelhecer. A idade não o perdoou e ele só piorava. Com o passar dos anos, o meu avô começou a adoecer cada vez mais. Na varanda, continuava a acenar-me, mas, agora, sempre sentado. Em 2011 foi levado para o lar de Bragança. Continuei a visitá-lo todos os domingos. Aquele já não era o nosso mundo. Já não havia campo. Já não estava no cantinho de conforto de sua casa onde brincávamos. Agora, era só o lar. Sabia que ele tinha saudades de casa, de brincar lá comigo e de passearmos por aquele ambiente campestre, mas não havia solução. Já não conseguia tomar conta de si próprio. Continuava a ir visitá-lo aos domingos, agora, não tão coloridos como no campo. Com a minha chegada, os olhos dele brilhavam e, ao mesmo tempo, soltava um sorriso como se o tivesse guardado a semana toda para o soltar ali, naquele momento. Os domingos eram os dias dele. O beijo “na careca” à chegada não podia faltar. A cada domingo, ele parecia mais distante. O pior avistava-se e os meus pais foram-me preparando. - O avô, um dia, vai ter de ir para o céu. – diziam-me eles. Eu não queria acreditar. Do que eu ouvia, o céu era um lugar para pessoas boas, mas eu não queria que ele fosse. Queria-o perto de mim. À hora de ir embora, voltava a dar-lhe o beijo “na careca”. -Adeus, avô. - Despedia-me acenando-lhe. No dia 17 de junho de 2012 às 23h45, o meu pai recebe um telefonema. Como eu já dormitava, acabei por não o ouvir. No dia seguinte acordei e vi, pela primeira vez, o meu pai chorar. Era pequena, mas senti-o, já sabia do que se tratava. O meu avô morreu. Aquele foi o último adeus, o último beijo “na careca”, a última vez que o vi. Foi o pior dia da minha vida. O pior das nossas vidas, nunca me vou esquecer. Os domingos passaram a ser cinzentos. Escrevo agora com a mesma dor que senti na altura. As saudades aumentam. O coração aperta. A pessoa mais bondosa que alguma vez conheci e que me fez crescer partiu. Imagino, várias vezes, na minha cabeça, a reação dele se soubesse que hoje estudo Jornalismo na Universidade de Coimbra, pois a última vez que me perguntou, queria ser médica pediatra. Para me sentir mais próxima dele, às vezes, vou à aldeia. Ir lá devia aliviar-me, mas a verdade é que isso não acontece. Ao passar à frente de sua casa olho para a varanda, mas já não avisto ninguém. O seu canto transformou-se numa varanda de memórias. A ti, avô, que no próximo ano faz cem anos que vieste ao mundo e dez que me deixaste, até um dia.

Ana Sofia Pereira 

Cinismo e Abstencionismo

É por demais sabido que o Sistema Democrático (liberal e representativo, em que o princípio um homem um voto, a separação de poderes e a representatividade das diferentes ideologias são práctica e são lei) não se esgota num único Regime político. E é por demais óbvio que os políticos do Regime vigente em Portugal, que favorece a adulteração sistemática do Sistema Democrático, nada têm feito para aumentar a participação dos portugueses nos sucessivos actos eleitorais e trazer a abstenção para valores minimamente aceitáveis. Para lá de discursos relapsos e de desenxabidas promessas de reforma. Sobretudo desde que senhor António Costa pôs em marcha o PRREPS (Processo Revolucionário de Redução do Estado ao Partido Socialista), com a conivência do BE e do PCP e a inação do PSD. A persistente taxa de abstenção eleitoral, vergonhosamente elevada, como mais uma vez se verificou nas últimas eleições autárquicas, é uma marca do Regime e um instrumento de que os manda-chuvas partidários, não só socialistas, se servem para sobreviver, adiando sistematicamente reformas fundamentais. Como é o caso da lei eleitoral e do recorrente processo de recenseamento de eleitores, precisamente. Tomemos o exemplo das eleições presidenciais de 24 de Janeiro de 2021, as mais recentes do género, em que a taxa de abstenção excedeu os 60%, com menos de ¼ dos eleitores legalmente habilitados a credenciar pelo voto o Presidente da República em exercício. Ora, é por demais evidente que nenhum Regime político, mesmo revestido de roupagens democráticas, se poderá assumir como genuinamente democrático quando mais de ¾ dos eleitores se alheia da eleição do mais alto magistrado da Nação. A verdade nua e crua é que mais de ¾ dos eleitores não abonaram expressamente tal eleição o que não preocupou nenhum político, mais interessados que estão com a sobrevivência, ainda que contra natura, do Regime corrupto. O abstencionismo, sistémico, e o cinismo político, atávico, coexistem na perfeição, como se vê. O problema fundamental, porém, não está na deficiente educação cívica dos portugueses como muitos pretendem. Bem pelo contrário, a abstenção tem razões diversas ainda que a maior parte delas não tenham o peso que muitos lhe querem dar. Desde logo a eventual doença, ausência ou simples comodismo dos abstencionistas cujos números não serão, quanto a mim, significativos para justificar a anormalidade da abstenção. Também há quem invoque a desatualização dos cadernos eleitorais que igualmente terá um peso marginal, para lá de que são por demais conhecidos episódios lamentáveis em que defuntos e ausentes milagrosamente também votam, por interpostas pessoas, claro está. A razão maior, isso sim, é que a grande maioria dos abstencionistas não se sente motivada a votar, indiferente e desgostosa que anda com o dito sistema, os ditos partidos, os ditos políticos, a dita corrupção e coisas que tais. Ou porque, pura e simplesmente, se não revê nas soluções e nas alternativas eleitorais que lhe são apresentadas. E também porque as forças políticas que têm poder para tanto, promovem a viciação das sondagens eleitorais com o propósito de desmotivar aqueles que, à partida, reconhecem como adversos. Já no que aos votantes diz respeito muitos são, por certo, os que louvavelmente votam só porque entendem que devem assumir o direito e dever de votar sem outros interesses associados. Honra lhes seja prestada. A maioria, porém, fá-lo porque obviamente serve, se serve ou espera vir a servir ou a servir- -se do sistema. Claro que os partidos que granjearam clientelas e militantes seguros não estão interessados em que haja votantes que não sejam seus simpatizantes. O seu único interesse é ganhar eleições, com maioria absoluta se possível, nem que seja um só cidadão a votar. Daí que não lhes interesse promover a ida às urnas dos abstencionistas porque sabem, de antemão, que isso os prejudicaria. Assim se compreende que os políticos mais influentes do presente regime menosprezem o voto obrigatório mesmo se configurado de forma justa, adequada e democraticamente persuasora. Não o fazem por opção ideológica, seguramente, (qual marxismo, qual liberalismo, qual esquerda, qual direita!), mas por meras razões corporativas. E porque sabem que só a democracia livre e representativa é verdadeiramente revolucionária, desde que genuína e plenamente assumida. A verdade é que quem não cumpre o dever de votar também não pode reclamar direitos correlativos, porque o voto é simultaneamente um direito político e um dever cívico. Havemos de concluir que cinismo atávico e abstencionismo sistémico são a alma do regime. Servem o sistema prevalecente mas corrompem a democracia.