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Administração Local Transparência e Qualidade

A Ordem dos Economistas publicou, recentemente, o Ranking Municipal Português da autoria de Paulo Caldas. O autor teve a amabilidade de me enviar cópia do documento síntese onde, os resultados dos municípios do nosso distrito, não são famosos, excetuando Bragança, o melhor município médio do país e com excelentes classificações nalguns critérios e ainda Alfândega e Vila Flor muito bons na Governação. Obviamente que estas listas ordenadas têm algumas fragilidades e não esgotam todas as análises possíveis. Levantam sempre comentários e justificações quer para as boas como para as más classificações. Mas será um erro minimizá-las e, muito menos, ignorá-las. É bem relevar que este Ranking está em linha com um estudo de 2018 da Fundação Francisco Manuel dos Santos.

Não vou analisar em detalhe todas e cada uma das dimensões (não só porque não tenho qualificações para tal mas também porque não caberia numa crónica semanal), mas não quero deixar de olhar para esta avaliação à luz de um conceito que me é muito caro e pelo qual me bati, enquanto eleito e continuarei a fazer sempre que o ache útil para os eleitores: A Prestação de Contas da atividade municipal evidenciada pelos documentos da Contabilidade Analítica.

Sendo curioso que é com o argumento da prestação de contas e informação aos munícipes que os autarcas justificam a proliferação de propaganda e publicidade da “obra feita” não se entende que este mecanismo, obrigatório por lei, desde 2003, continue a ser ignorado, por alguns Municípios. Como é que é possível que um organismo público que tem, entre outras, funções de fiscalização e de imposição de normas legais aos cidadãos, possa auto-excluir-se do cumprimento integral e exemplar do normativo legal? Com que autoridade pode alguma instituição brandir a Lei quando não a cumpre reiterada e afrontosamente? 

Mas há mais.

Para além da imposição de obedecer ao desígnio do legislador, tem o poder executivo a obrigação de informação aos cidadãos. Que esclarecimento pode conter a apresentação, diretamente aos munícipes ou aos seus representantes na Assembleia Municipal, das várias listagens do Balanço e da Demonstração de Resultados com os valores agregados por rubricas onde, pasme-se, em vários capítulos, a de maior expressão tem a designação de “diversos”!!!!

As “justificações” para a não implementação da Contabilidade de Custos determinada no DL 54-A/99 de 22 de fevereiro sendo variadas, nenhuma convence.

Há quem alegue que vindo esta obrigatoriedade desde 2003 tal legitima a continuidade da ilegalidade. Será que o Presidente da Câmara também entende que quem se conseguir furtar ao pagamento das licenças municipais durante alguns anos, fica isento para sempre?

Também defendem que havendo vários municípios na mesma situação, tal situação, mesmo que ilícito, não seria grave. Incrível!!! Uma ilegalidade não perde a essa qualidade por ser cometida por vários. Além disso é muito estranho que quem se proponha liderar uma Câmara, querendo estar à altura da mesma, dos seus pergaminhos e da sua história, se dê por satisfeito a integrar a cauda do pelotão, desde que não esteja sozinho, nessa situação.

Para além disso reclamam que a execução prática dessa norma é complexa, consumidora de recursos e está dependente de requisitos ligados aos trabalhos para a própria entidade. Nada mais errado. Uma afirmação destas é reveladora de uma ignorância total, ou de uma tentativa grosseira de manipulação. Depois de vários anos à frente da Equipa de Gestão da Câmara só não se implementa a obrigatória Contabilidade de Custos por incompetência total ou então por um incompreensível, inexplicável e inaceitável medo da transparência resultante de uma verdadeira prestação de contas!

Roubar o Estado não é crime, é serviço público

A corrupção é porca de muitos leitões que chafurdam nas pocilgas partidárias, em pântanos de perfume e falsidade, de bem vestir e melhor viver.

Veio agora à tona uma nova porcada, a das autoestradas, em que estarão indiciados cinco membros do governo Sócrates que inadvertidamente terão caído nas malhas de pesca artesanal do Ministério Público.

Entretanto o país assistiu, mais divertido do que sério, à representação do reputado comediante Joe Berardo na Assembleia da República que, na opinião de conceituados analistas, teve a colaboração eventualmente dolosa de altos dignitários, pelo que terá muito mais que dizer e que se lhe diga, o que também explica o seu riso galhofeiro e ter feito gato-sapato das inocentes deputadas inquiridoras.

Este despropósito de Joe Berardo poderá custar-lhe, nada mais que isso, a perda das comendas com que foi agraciado por dois excelsos presidentes da República vigente. Mera cosmética, contudo, com que pretendem agora limpar a face do Regime.

Enfim. Mais uma vez a casa da democracia a funcionar como caixa-de-ressonância das misérias do Regime que nela se alberga e que muitos continuam a taxar de democrático e a relacionar com o 25 de Abril quando, verdade seja dita, nada tem a ver uma coisa com a outra.

Consagra-se, isso sim, o lema da mal-afamada elite política lusitana: Roubar o Estado não é crime, é serviço público.

Entretanto o presidente da República Marcelo de Sousa apelou encarecidamente, mais uma vez, ao voto e alertou para os riscos dos populismos, embora sem esclarecer a quais deles se refere, se ao de esquerda, se ao de direita, se ao do poder instalado que é o pior de todos porque é pai de todos os demais.

Caso para perguntar: Portugal é o que é e os políticos são o que são só porque os portugueses se abstêm de votar, ou será que os portugueses se abstêm porque os políticos são o que são e a democracia portuguesa é o que é?

A verdade é que os portugueses têm feito uso do voto válido de forma pouco sábia, raramente do voto nulo e do voto em branco, os mais devotos do voto a Nossa Senhora de Fátima para que salve Portugal dos maus governantes e maioritariamente do voto por abstenção, perfeitamente legal contrariamente ao voto obrigatório que seria um atentado à liberdade individual, se tal viesse a ser deliberado.

Imagine-se o que seria retirar aos digníssimos deputados da Assembleia da República a faculdade de se absterem, obrigando-os a votar ou sim ou não fosse em que circunstâncias fosse!

Querem agora fazer-nos crer que o Estado está finalmente a ser gerido com rigor, que o País progride a todo o vapor, que a Democracia não fraqueja, que a corrupção já passou e que todos os corruptos estão ser meticulosamente julgados.

Nada mais falso. A corrupção, que é mãe da abstenção e avó do populismo de que a democracia portuguesa anda grávida e está prestes a dar luz, é cada vez maior e mais sofisticada, a impunidade prevalece mas os políticos dão a entender que assim é que deve ser.

O voto só terá bondade, sentido e força se for capaz de forçar a real democratização do Regime.

 

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Deus e césar

Tendo começado a sair da escassez quando o século vinte já se encaminhava para o fim, as gerações que a tinham suportado acharam que deviam às seguintes mais desafogo material, níveis de vida dignos, saúde e escolaridade gratuitas, pensões de reforma, subsídios de desemprego. Nessa altura, tal como hoje e sempre, era vital tratar das necessidades do corpo, o que não se discute. Se a sua satisfação conduz diretamente à felicidade, isso já é mais problemático. O que então eram utopias materializou-se em grande parte. Não só o significado de pobreza não tem hoje nada que ver com o de há cinquenta anos, como as gerações mais novas da atualidade são as primeiras, em toda a nossa história, que viram satisfeitas aquelas necessidades cuja não-satisfação coloca a vida em risco.

Sentimo-nos agora mais realizados? Duvido muito. É bem provável que nos sintamos menos. Para já, tirando talvez aspetos óbvios tais como alimento, agasalho, abrigo, proteção, não existe forma de determinar o que são necessidades, tanto pela subjetividade sempre implicada nesse julgamento como pela criação constante delas a que o sistema económico induz. Por isso procurar satisfazê-las é muitas vezes como perseguir a linha do horizonte: quando se pensa estar a chegar lá, descobre-se que afinal se impõe outra caminhada para a alcançar. Dada a ausência de limites para o que somos capazes de necessitar e desejar, tendemos geralmente a adiar a satisfação para quando possuirmos mais isto ou mais aquilo, enredados em ciclos de procura que podem não ter fim.

Daí, tantas vezes, ao contrário do que se pretendia, a sensação de saber a pouco deixada pelos objetos adquiridos, pelos prazeres experimentados. E há mais. As coisas que elegemos como objetos de satisfação raramente são dadas de graça. De um modo geral, não só nos saem do corpo como exigem que nos acorrentemos a essa servidão consumidora dos nossos dias a que chamamos trabalho. Assim, a despeito de proporcionar algum prazer, pagamos com desprazer o que adquirimos, mesmo sem contar com a possibilidade de nos vendermos ao demónio para o conseguir, um tráfico frequente que está longe de trazer felicidade.

Mas quando se trata de identificar coisas materiais com bem-estar e satisfação, os que mencionei não são ainda os maiores enganos. É que uma porção considerável destes sentimentos não depende de indicadores económicos, nem aliás de nada exterior, antes de vivências íntimas, não-quantificáveis, embora bem reais e poderosas. De há umas décadas para cá a sociedade foi sendo sub-repticiamente impregnada de um desprezo (ou mesmo de vergonha) de inspiração marxista pelas coisas do espírito, pela ideia de que o ser humano é um corpo sem alma. Até podemos convencer-nos disso, mas nenhuma ideologia conseguirá alguma vez eliminar o facto de termos sentimentos, apreciarmos ou não o mundo e a vida, gostarmos ou não dos outros e de nós, amarmos ou odiarmos apaixonadamente.

Acima de tudo, havendo muitas coisas mais para lá do que podemos ver e compreender, a existência nunca deixará de ser para nós um mistério carregado de emoção. Acontece que mente e corpo, energia e matéria se produzem reciprocamente, algo em que albert einstein e as velhas escrituras estão de acordo. A realidade material das nossas vidas cria pensamento e sentimento, que por sua vez criam a realidade material das nossas vidas. É indiferente chamar a essa dimensão energia, psique, sopro divino, prahna, ki, matriz do universo, santa rita de cássia. O que importa mesmo é saber que ela alicerça e condiciona tudo o que somos tanto pela positiva como pela negativa.

Daí a necessidade de a cuidar com mais desvelo do que o corpo. Não o fazer deixa um vazio que geralmente tentamos preencher de muitas formas: acumulando bens, relações, experiências excitantes, procurando fama, idolatrando pessoas, expondo barrigas de gravidez no instagram, louvando fanaticamente a vitória do benfica no marquês. Mas nada desta ordem consegue eliminar o vácuo, o que nos coloca no fio da navalha, em risco de deslizar para vários tipos de pobreza, a começar pela económica. Pelo contrário, acarinhá-la pode abrir portas a um estado de satisfação que permita sobreviver com poucos alimentos ou, se o clima o permitir, achar a camisa dispensável e viver até na rua.