Ter, 06/09/2016 - 09:46
A festa foi grande no aeródromo de Bragança, no domingo. Milhares estiveram de nariz no ar, seguindo evoluções, acrobacias e até ousadias de pilotos e máquinas, num dia em que o sol mordia a pele, mesmo dos mais favorecidos pela melanina.
Oscilava-se entre o sorriso de satisfação e a euforia, que partilhava o risco das manobras dos aparelhos de cores vibrantes ou se deixava envolver pela energia arrasadora dos caças F-16 da Força Aérea, que vieram de Monte Real, em dez minutos, para gáudio das gentes.
Ali estavam a ver os aviões, à maneira da canção de Miguel Araújo, numa partilha de fantasias e expectativas, ainda que difusas, sobre o papel que puderam, poderiam, ou ainda podem ter os aviões no presente e no futuro da região.
Trata-se de um assunto que tem pontuado longas décadas, desde, pelo menos, o meado do século XX, quando os aviões estavam a tornar-se utensílios do quotidiano, num mundo que conhecia já mudanças em catadupa, que o tornaram na aldeia global, aspiração entusiástica, mas também dura desilusão, para quem não encontra forma de voar sobre os penhascos da miséria, os desertos da morte e os mares encapelados da violência.
Então, nesta região ainda se sonhava com futuros que não se ficassem pelas silhuetas escurecidas das mulheres sobretapadas e pelos rostos lavrados pelas rugas da dureza de cada dia. No entanto, sem pressa de chegar ao futuro, escoavam-se os dias no ramerrame, enquanto lá por fora as páginas da história se viravam sofregamente. Falava-se na possibilidade de instalar um aeródromo de dimensão suficiente para se tornar numa estrutura complementar de navegação aérea em Morais, no concelho de Macedo de Cavaleiros, onde não havia problemas com os azares do clima.
Entretanto, em Bragança dispunha-se de uma pista de terra batida, onde está hoje o bairro de Santiago, Mirandela também teve a sua pista, assim como Mogadouro e Macedo. Não se ia além do recreio, para meia dúzia de bafejados pelo lado bom do destino.
Com a chegada à presidência do município bragançano de José Luís Pinheiro a aposta numa infra-estrutura aeroportuária de alguma dimensão foi avançando e resultou no aeródromo de Baçal/Sacoias, que serviu para o lançamento da primeira carreira aérea entre Bragança e a capital, alimentado expectativas de outros vôos.
Tem havido alguma continuidade na gestão autárquica, especialmente nos mandatos de Jorge Nunes, que garantiu nova ampliação da pista e apetrechamento técnico. Chegou a haver vôos charter a partir de França, que não tiveram continuidade. A própria linha aérea para Lisboa tem sobrevivido de forma intermitente, apesar da sua reconhecida utilidade.
O aeródromo de Bragança podia estar a despertar para horizontes além da malta, inebriada, a olhar o céu. De facto, há condições para aqui instalar uma estrutura complementar do Porto, um aeroporto regional de distribuição de viajantes de lazer e negócios, assim como de acesso a companhias que explorem circuitos alternativos à massificação turística.
A instalação de novas indústrias, a exportação de produtos agrícolas e agro-industriais e o turismo destinado ao norte interior e às regiões limítrofes de Espanha poderiam ser boas surpresas, mesmo espantos, como aqueles que encheram a tarde tórrida de anteontem.
Por Teófilo Vaz