Caça tem cada vez menos praticantes na região e enfrenta dificuldades

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Ter, 26/11/2019 - 11:55


O número de animais de grande porte, como o javali, o corso e o veado, tem aumentado na região transmontana e isso tem contribuído para o aumento de caçadores associados a esta vertente.

No entanto, a diminuição da caça menor, nomeadamente do coelho bravo, designado como “a espinha dorsal da caça na Península Ibérica”, também tem levado a que os caçadores matem outro tipo de espécies selvagens. “Os caçadores que tradicionalmente caçavam coelhos caçam, neste momento, javalis”, avançou Nélson Cadavez, presidente do Clube de Monteiros do Norte, que acrescentou que considera “sensacionalismo” afirmar que o javali é uma “praga” e que a quantidade destes animais na região é idêntica à dos anos anteriores. O número excessivo de animais selvagens pode pôr em causa as colheitas agrícolas dos produtores, assim como interferir na segurança pública. Deste modo, segundo Nélson Cadavez a caça tem o papel de manter o “equilíbrio sustentável” dos ecossistemas. Jacinto Amaro, presidente da Federação Nacional de Caça (Fencaça), parece partilhar da opinião no que toca a este assunto. “Fala-se tanto nas questões ambientais e na manutenção da biodiversidade e conservação da natureza e uma forma de participar nessa mesma conservação é ser caçador”, afirmou acabando por explicar que também contribuem para o “melhoramento de habitats” e “recuperação de espécies”. De alguns anos a esta parte o número de pessoas a praticar esta actividade cinegética tem vindo a diminuir. Segundo Fernando Castanheira Pinto, presidente da Confederação Nacional de Caçadores Portugueses (CNCP), “há um decréscimo muito grande do número de caçadores, principalmente jovens” o que se deve “à diminuição drástica do número de espécies cinegéticas disponíveis, aos processos burocráticos para obtenção da carta de caçador, da licença de uso e porte de arma e aos custos associados”. Para além de que, a população de caçadores é hoje mais envelhecida, “60% estão acima dos 55 anos”, o que é visto como uma “situação preocupante”. Outro dos motivos apontados por Castanheira Pinto para o declínio da caça está associado aos “movimentos fundamentalistas relacionado com o animalismo” e destaca que os caçadores defendem o mundo rural” e a sustentabilidade das espécies, porque, diz, “se não houvesse actividade cinegética nem zonas de caça, com pessoas a geri-las, a sustentabilidade das espécies era colocada em causa”. Os entendidos dizem que a falta de informação, em Portugal, acerca da caça e do que está associado ao sector, tem vindo a criar opiniões menos boas, uma vez que é vista como uma actividade “bárbara” e “arcaica”. Este é também um dos motivos, segundo Nélson Cadavez, pelo qual os jovens, actualmente, não se interessam pela caça. A desertificação é, outra das razões, o que leva à descida do número de caçadores “A caça é uma actividade ligada ao mundo rural e, se há o afastamento das pessoas das comunidades rurais, é natural que haja também estas rupturas no âmbito da caça”, disse o presidente do Clube de Monteiros do Norte para explicar a diminuição do número de caçadores. Já o presidente da Fencaça aproveitou para salientar que actividades desportivas relacionadas com a caça, como a montaria ao javali, atraem muitas pessoas ao interior. “Nos municípios do interior e nas freguesias os grandes dias de festa são os dias de montarias e de caça”, referiu. Mas em contrapartida da redução dos praticantes masculinos, o número de mulheres a tirar a licença de caça tem vindo a crescer. Além do convívio associado a esta actividade cinegética, a imagem que os caçadores passavam há 30 anos é diferente daquela que é transmitida actualmente e, para Jacinto Amaro, essa é talvez uma das razões que tem vindo atrair cada vez mais mulheres ao sector.

Dificuldades das associativas

As associativas têm vindo a passar por dificuldades financeiras e também no que toca à gestão cinegética e exploração de recursos. Esta é uma ideia partilhada por Nélson Cadavez, que explicou que a baixa do número de caçadores e de coelhos, uma das caças mais atractivas, são algumas das razões para a situação complicada que enfrentam. “Do ponto de vista de gestão cinegética, o trabalho que se tem feito ao longo destes quase 30 anos eu diria que está muito aquém do que seria desejado e daquilo que seria possível, por falta principalmente de competências profissionais”, afirmou, explicando que há um “défice considerável” nesta matéria. Por outro lado Castanheira Pinto, considera que “hoje já não haveria caça se não fosse o fomento e a gestão que os caçadores, que ainda vão fazendo sementeiras, desmatação e controlo dos predadores”. Por isso entende que o papel das associativas “é fundamental”, apesar de admitir que “não se pode considerar que todas tenham um papel exemplar e nem todas trabalham ao mesmo nível em prol da caça”. O responsável acusa ainda o Estado de se “demitir da sua principal função: a fiscalização” e aponta o furtivismo como outro dos problemas para a caça. Cada vez são mais as associações que têm parcerias com universidades e investigadores como forma de tentar arranjar soluções para as pragas que afectam os animais selvagens. Um exemplo é a Fencaça, que está a tentar “recuperar a população de coelhos bravos”, através de uma vacina. Já no caso da CNCP, está a desenvolver um projecto para a recuperação das rolas. E, por isso, sustentam, as associativas têm vindo a tentar arranjar soluções para contrariar a diminuição das espécies de caça menor. Ainda assim, os fundos económicos são reduzidos. A maioria vive das quotas dos sócios e de candidaturas em quadros comunitários, que grande parte das vezes financia os melhoramentos nas zonas de caça.

A prevenção da peste

A peste suína africana pode estar perto de chegar a Portugal e os javalis são os portadores. Neste momento, o papel do caçador parece ser importante para o combate e prevenção desta doença, uma vez que poderão reduzir a população de javalis.

Caça troca de ministério

Com este governo as áreas da floresta e da caça passaram do ministério da Agricultura para o do Ambiente. “Ter uma coisa num ministério e outra noutro parece-me desfasado, parece não contribuir para uma organização menos burocrata e obriga a que o agricultor e o produtor florestal, que muitas vezes é o mesmo, tenha que andar a repartir-se por vários ministérios”, afirmou Jacinto Amaro, que criticou também a falta de medidas tomadas pelo Governo e outras que põem muitas vezes em causa as actividades praticadas no interior, nomeadamente a caça. Já Castanheira Pinto considera que tem de se “dar o benefício da dúvida”, mas diz que está “esperançado” e que a confederação vai preparar um caderno reivindicativo, que inclui a necessidade de libertar a carga financeira dos caçadores. Destacou ainda que a ligação da caça com a agricultura é centenária e é preciso ter os agricultores do lado dos caçadores, no entanto, admitiu que a “dupla tutela” do ICNF “não era boa”

Jornalista: 
Ângela Pais/Olga T. Cordeiro