E agora, a educação sexual

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Qua, 21/02/2007 - 16:28


Uma vez que tanto os defensores do Sim quanto os defensores do Não à despenalização do aborto, até às dez semanas de gestação, estão de acordo quanto a que o aborto é uma coisa a evitar porque é má para a mulher e quanto a que o aborto deve ser despenalizado, será possível construir um acordo relativamente a estratégias para conseguir o menor número possível de abortos.

Este objectivo, útil nos planos da sustentabilidade da segurança social, da renovação da população e da solidariedade intergeracional, só será alcançável pela valorização da maternidade e da criança, por um lado, e pela educação sexual com vista a evitar a fecundação (junção do óvulo e do espermatozóide).
Com efeito, num mundo dominado pelo pragmatismo e pelo hedonismo, já não se me afigura uma estratégia correcta apregoar aos adolescentes e aos jovens que evitem a vida sexual precoce quando tudo à sua volta (televisões, reclamos, telenovelas, Web, cinema, revistas) os convida e incentiva a introduzirem-se nela. O melhor será ensinar-lhes a proteger-se das doenças, no sentido de preservarem a saúde pública, a evitar a fecundação e a só procurarem esta quando o queiram e tenham condições para isso. Melhor do que abortar será não fecundar.
Curiosamente, este tópico de discussão pareceu-me estar ausente do debate da Assembleia da República, esta semana (a semana após o referendo). Seria bom que os partidos do Centro (PS e PSD) e o da Direita (PP) não o perdessem de vista. A sua negligência por parte dos partidos do Centro constituiria uma irresponsabilidade já que constituiria um virar de costas a um problema real, que existe e que se manifesta através de consequências graves. Em termos sociais, o aborto é sempre um mal, um mau remédio para uma situação que não se preveniu. Por isso, deve ser evitado, tanto quanto for possível, com actos responsáveis e conscientes.
É preciso ver que a legalização do aborto, até às dez semanas de gestação, vai trazer consigo a propaganda ao aborto, através das clínicas de abortização. É um fenómeno das sociedades capitalistas e de mercado. As empresas apostam na publicidade e muitas mulheres que não abortariam serão induzidas na prática do aborto como solução mais fácil. Contra isto, só podem militar a educação e a consciencialização social da importância da maternidade e das crianças.
Por via desta necessidade de militância, o Estado vai ter de acrescentar aos gastos em clínicas abortivas, maiores gastos em Educação Sexual e Cívica e no apoio à maternidade, às crianças, aos adolescentes e aos jovens. Só este apoio económico e social poderá compensar maiores perdas em nascimentos. É um apoio que já devia existir muito antes do debate sobre o aborto mas que agora se vai tornar premente.
Analisando o que se passou nos outros países, com a legalização controlada do aborto, Portugal perderá, nos próximos dez anos, entre dez mil e quinze mil crianças por ano. Depois, a consciencialização social e as medidas económicas e sociais farão regredir aquele número.
Neste cenário, não admira que os líderes do PP e os cristãos católicos mais radicais se entricheirassem na manutenção da penalização sobre o aborto. Mais do que defender a vida, eles defendem a estabilidade da população como forma de solidariedade intergeracional, de sustentabilidade da segurança social e como forma de a mão-de-obra continuar barata. A metáfora de «crescei e multiplicai-vos» é uma criação sócio-económica das elites egípcias no sentido de obterem mão-de-obra fácil e barata. E o sistema capitalista adoptou, obviamente, o princípio como hipótese de desregulação da relação entre a oferta de emprego e a procura deste para assim desvalorizar os salários.
Porém, esta relação está, actualmente, invertida face ao envelhecimento da população. E, perante este envelhecimento, é necessário importar mão-de-obra estrangeira. No caso de Portugal, país de economia capitalista, desde 1956, é não só necessário importar esta mão-de-obra desqualificada para assegurar funções sociais consideradas erradamente inferiores, como exportar a nossa mão-de-obra qualificada para assegurar o desenvolvimento das nações mais desenvolvidas. O sistema capitalista impõe assim ao nosso país uma estratégia de empobrecimento e de descaracterização da população pela necessidade de regulação da economia europeia e mundial.
Em todos estes cenários, parece-me, os portugueses devem tomar consciência de que diminuir a sua população e a capacidade da sua regulação, é aprofundar a crise demográfica e, com ela a da Segurança Social e a da solidariedade intergeracional.
Educação e consciencialização para os nossos problemas são agora, e cada vez mais, um grande desafio.

Henrique Ferreira