Ter, 13/09/2022 - 15:28
O Governo anunciou, no passado dia 5, medidas de combate à inflação. O Conselho de Ministros aprovou um programa de 2,4 milhões de euros para apoiar as famílias, tendo em conta o aumento do custo vida.
Assim, ficou decidido que serão atribuídos, já em Outubro, 125 euros a cada cidadão que tenha rendimento mensal até 2700 euros. Aqueles que tiverem descendentes vão ainda receber 50 euros por cada filho que tenham a cargo. Quanto aos pensionistas, receberão, também em Outubro, o equivalente a meio mês de pensão. Estas três medidas serão apenas aplicadas no próximo mês, o que significa que as pessoas vão receber este apoio apenas uma vez.
O Governo quer ainda que haja uma redução para 6% da taxa de 13% do IVA sobre a electricidade, por isso, pediu que esta medida fosse discutida o mais rápido possível em Assembleia de República, para que entre em vigor já no próximo mês.
Os consumidores de gás vão também poder regressar ao mercado regulado. Quanto aos combustíveis, o primeiro-ministro anunciou que não vai haver aumento da taxa de carbono, a devolução da receita adicional de IVA e a redução do Imposto Sobre os Produtos Petrolíferos.
A partir de Janeiro do próximo ano vai ainda entrar em vigor a limitação até 2% do aumento das rendas. Os senhorios vão ser compensados através da redução do IRS e IRC.
Os passes dos transportes públicos e da CP também não vão sofrer aumentos no próximo ano e o Governo também compensará as empresas envolvidas.
Os pensionistas também terão um aumento das pensões, 4,43% para as pensões até 886 euros, 4,07% para as pensões entre 886 e 2659 euros e 3,53% para as restantes pensões sujeitas a actualização.
Por Bragança, as pessoas não estão muito convencidas com os benefícios destas medidas para a carteira dos portugueses.
Para Mena Afonso estas medidas “não são suficientes”. “Não é num mês que vai resolver a nossa situação financeira do resto do ano que vem a seguir. A descida do IVA da electricidade pouco ou nada vai mudar. Vamos poupar um euro por mês”, apontou a empresária, que defende que as ajudas ideais seria “não subir os impostos, não pagar tanto de segurança social, não subir a luz, a água e os bens essenciais”.
Tamires Oliveira também considera que é preciso fazer “mais” para minimizar o impacto da inflação, visto que os preços das coisas estão “bastante altos” e os ordenados continuam “iguais”. Admite que já abdicou que comprar alguns bens devido ao preço. “Eu sou da área do fitness e há um ano comprava o frango a 3,99 euros, agora já custa 6,99 euros. Já não dá para continuar a comprar como antes. Antes comprava o peito de frango, agora já compro coxas”, referiu.
Outro dos problemas é as rendas. Quando veio viver para Bragança a renda ronda os 250/300 euros, agora chegou aos 500. A medida do Governo que estabelece um aumento máximo de 2% das rendas no próximo ano, não faz sentido para Tamires Oliveira. “As rendas não deviam aumentar no próximo ano, congelarem os preços ou então aumentarem o salário”, disse, salientado que este ano nem foi de férias para “não gastar muito dinheiro”.
É impossível ficar indiferente à subida dos preços dos bens alimentares, combustíveis e outros produtos. Muitos brigantinos não se lembram de aumentos como estes e, por isso, consideram que são precisos mais apoios.
“Quanto aos 125 euros e a descida do IVA da electricidade, eu penso que não são medidas muito significativas. Eu acho que não vem trazer grandes ajudas. Acho que é muito pouco para pessoas que estejam mesmo com dificuldades”, afirmou Aida Afonso.
A empresária mostrou ainda descontentamento por não terem sido anunciadas medidas para salvaguardar as empresas. “Para as empresas não tenho conhecimento de nenhuma medida, o que é extremamente necessário que aconteça, porque está difícil suportar as despesas do dia-a-dia, de gasóleo, electricidade e todas as despesas. É complicado”, frisou.
Brigantinos reduzem à quantidade de comida que compram
O aumento generalizado de preços que os consumidores pagam pelos bens e serviços marcou o arranque de 2022 e não sai da ordem do dia.
Por Bragança, quem vende queixa-se da falta de clientes. As pessoas não deixaram de comer mas parece que se vê menos gente a comprar e quem compra leva menos.
Luísa Rodrigues, proprietária de quatro Supermercados Frescos, todos eles na capital de distrito, dizendo que "subiu tudo" e que "dificilmente vem um produto que não venha mais caro, sempre mais caro", esclareceu que "toda a gente se queixa". "Todas as pessoas dizem mal disto. Há quem têm noção de que os produtos estão a aumentar e, ainda que se queixem, entendem a nossa parte, mas há outras que pensam que somos nós que aumentamos os preços porque nos apetece. Apanhamos todo o tipo de pessoas", assegurou.
É claro que, perante a situação, o mercado oscila. Comprar há sempre quem compre... mas tanto como antes? Não. Nem pensar. "Temos que comer. Por isso, as pessoas vão comprando. O que se nota é que estão a reduzir na quantidade e a ir para os produtos mais baratos", esclareceu a proprietária dos mini-mercados.
Lamentando a situação e afirmando não saber onde isto "vai parar", porque "está a ficar insustentável", Luísa Rodrigues contou que há muitos produtos dos que vende que quase duplicaram de preço, mas que "os aumentos verificam-se em tudo". "No início foi mais os óleos a subir de preço, mas, depois começou a aumentar, a aumentar, a aumentar, e disparou o preço de tudo. Os aumentos não se notam só nos produtos alimentares mas também, por exemplo, nos produtos de limpeza.
Com o Verão praticamente no fim, sendo que a passagem de turistas e emigrantes em força pela região já terminou, Luísa Rodrigues diz que nos últimos dois meses "até se trabalhou", dando algum animo ao comércio. Ainda assim, "os problemas mantêm-se" porque, além de se vender menos, "as despesas estão a aumentar e a ficar insuportáveis". "O que se paga de luz é um disparate. Ou o nosso Governo toma medidas urgentemente, mas muito urgentemente, para ajudar, sobretudo, estas pequenas empresas, ou há muita gente vai ter que fechar portas", vincou, afirmando que, neste momento, há uma loja na qual acaba de pagar 1800 euros de electricidade. "Estive a fazer contas. Comparei facturas de Agosto de 2021 com as de Agosto de 2022. Numa loja triplicou o preço e nas outras duplicou", disse ainda Luísa Rodrigues, que lembrou que há outras despesas, nomeadamente no que toca ao combustível, algo que gastam "bastante", já que muita da mercadoria têm que a recolher para a vender.
Vitalino Miranda, proprietário de um mini-mercado há 54 anos, também não relata melhor cenário. Tem mais de 80 anos e diz que não se lembra sequer de algo assim, de uma subida tão abrupta de preços. "Duplicar o preço não digo mas uma grande subida as coisas tiveram. Não me lembro de algo como isto", assinalou.
Quanto a compras... os melhores dias que venham de uma vez porque isto não está mesmo nada famoso. Por aqui acontece o mesmo que nas lojas de Luísa Rodrigues, sendo que "as pessoas compram menos do que o que compravam". "Dizem que está tudo muito caro e deixaram de comprar até coisas essenciais, incluindo pão. Às vezes costumavam levar um pão de quilo e agora levam só de meio quilo, por exemplo. Reduzem muito à quantidade", assegurou o vendedor e proprietário deste espaço.
Com mais de 80 anos, Vitalino Miranda também admite que lhe têm passado várias opiniões pela loja. Há quem ainda não entenda bem o que se está a passar. "Algumas acreditam que somos nós os culpados, que subimos aos preços porque queremos. Algumas até nos tratam mal", disse, afirmando que "não se pode comprar caro e vender barato" e que, neste momento, há vendedores a ficar com menos margem de lucro mas "nem assim lá vai".
Com as despesas a aumentar e os lucros a diminuir, Vitalino Miranda admite que só não deixa o negócio porque não paga nada pelo espaço, já que dele é proprietário, e porque "é preciso ir trabalhando".
Nair Pinto também já viu o cenário bem melhor que o que o vê agora e também só não deixa a actividade porquê, enfim, não restam alternativas. "Não aconselho ninguém a ter negócios. É trabalhar para o Estado e nada mais. Eu não saio disto porque, com a idade que tenho, só me resta esperar pela reforma", começou por dizer. E o desânimo é tão grande porque "não se vende nada". "A loja está quase sempre vazia. As pessoas não vêm, não se vê ninguém", assinalou.
Dizendo nunca ter visto os preços subirem tão rápido, esclareceu que "as pessoas agora só compram os bens de primeira necessidade". "Eu vendia aqui produtos da região mas este ano também não há nada, porque as hortas pouco valem, não há tomate, não há alfaces, não há batatas, não há nada. Mas o pouco que há.. se antes levavam um quilo agora levam dois tomates", disse Nair Pinto, que deixou assente que "os clientes praticamente só vêm se for para comprar pão e lá levam mais alguma coisa que precisem". Numa "quase obrigação" em ir gastar dinheiro, "só se compra o essencial e em menos quantidade". "Tenho clientes que antes compravam pão todos os dias e agora aproveitam de um dia para o outro. Não querem saber se está um pouco mais duro", afirmou ainda a proprietária de um mini-mercado na Praça Camões.
Para Nair Pinto o Verão não foi grande coisa. Podia ter sido jeitoso para compor o negócio mas não foi. Os estrangeiros também têm muito menos dinheiro e sentem as diferenças de preços. "Os turistas estrangeiros, das caravanas, levam pouco. Só levam o que precisam para comer no dia-a-dia. Já os emigrantes deixaram de comprar muito. Se antigamente levavam cinco ou seis embalagens de chouriças agora levam uma. E com as alheiras igual", terminou a vendedora.
Pré-recessão ainda não afectou turismo em Bragança
Apesar da inflação e diminuição do poder compra, os turistas que passaram pela região parecem não ter feito contas às despesas em tempo de férias.No restaurante Poças, em Bragança, a gerente Dina Mesquita, diz que o balanço do Verão até agora “é muito positivo” e que “houve uma procura acima das expectativas”. “Voltámos ao mesmo nível de trabalho dos anos antes da pandemia”, garante. Receberam turistas nacionais e também estrangeiros, tanto espanhóis, como franceses e ingleses que regressaram. “Isso é muito bom”, referiu a empresária, que afirma ainda que o estabelecimento ainda “está a funcionar como na época alta”.
No caso dos emigrantes, continuam a frequentar também os restaurantes e sem ter a economia como primeira preocupação. “Não se nota qualquer contenção. No mês de Agosto eles vêm, consomem, e não só na restauração, em todo o tipo de comércio que existe na restauração”, afirmou.
No entanto, em alguns casos há cuidados nos pedidos. “Os próprios estrangeiros pedem doses para partilhar, também é verdade que em Trás-os-Montes temos sempre pratos bastante grandes, mas nota-se que há maior consumo de água e menos bebidas alcoólicas, o que não inflacciona tanto a conta”, refere.
E apesar de os consumidores terem vindo em grande número, a verdade é que o aumento dos custos dos produtos alimentares e da energia engole as margens de lucro. “É muito difícil controlar a nossa margem, que desceu”, sublinha.
João Campos responsável da Marron – Oficina da Castanha também afirma que os últimos meses estiveram um pouco acima das expectativas. A loja no centro da cidade, que vende produtos à base de castanha e outros regionais, abriu em 2019 e tem vindo a registar gradualmente melhores resultados de ano para ano.
“O Verão de 2020 e de 2021 já foram superiores ao período de pré-pandemia e este ano estamos a receber, muitos turistas nacionais, como de há dois anos para cá, e agora há o acréscimo dos turistas espanhóis, que começaram a aparecer mais”, afirma.
Mesmo com a inflação e a diminuição do poder de compra não se tem “sentido um abrandamento” nas compras, para já. No entanto, a abertura das viagens para o estrangeiro sem restrições levou de Bragança “alguns turistas nacionais com poder de compra maior”, mas de resto “o balanço está ao nível pré-covid, período covid”, altura em que também houve muitos turistas. “Estamos com o mesmo volume de negócios ou se calhar até um bocadinho superior”, admite.
E mesmo não havendo um volume de compras tão grande por pessoa, no geral as vendas acabaram por ser compensados com o maior número de clientes. “Não notámos diminuição, tivemos o marron glacé esgotado e tivemos que engarrafar o licor de castanha com alguma rapidez, porque se vendeu de forma rápida numa altura de Agosto, com as pessoas a comprar em quantidade. Não sentimos qualquer sinal de abrandamento ou de pré-recessão e esperemos que assim continue”, afirma.