A lenda da vaca sagrada e do bezerro de oiro

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Para uma maioria muito significativa de próceres políticos, com maior pendor à esquerda, a Constituição da República é uma vaca sagrada e o Regime político vigente, que à socapa enche os bolsos e garante tachos chorudos a gente afamada, é um bezerro de oiro. Duas instituições políticas sagradas em que é pecado tocar, nem que a vaca tussa. Ainda que o bezerro de oiro em apreço tenha pés de barro e produza dejectos democráticos tais como a lei Eleitoral, o Sistema de Justiça, a lei da Nacionalidade, a corrupção generalizada, o compadrio, o nepotismo e, acima de tudo, o endividamento público desregrado. Não se confunda, porém, sistema político com regime político. O sistema de democracia liberal e representativa, por exemplo, que se caracteriza, resumidamente, pelo voto livre, pela separação de poderes e representação política de todas as opiniões, para lá de garantir as liberdades e direitos fundamentais, consubstancia-se em regimes políticos distintos, podendo ser republicanos, presidencialistas ou nem tanto, ou mesmo monárquicos, com reis ou rainhas. Para os próceres políticos atrás citados, muito embora periodicamente se envolvam em competições de discursos eruditos sobre a matéria, o regime político vigente, repito, é único e intocável e quem se atrever a criticá-lo não é democrata, podendo mesmo ser considerado fascista ou pior que isso. Ainda que o PC e o BE que integram esse alargado grupo de fiéis do regime, adorem outros sinistros bezerros que de democracia e de democráticos nada têm, como sejam os venerados regimes políticos da Coreia do Norte, da Venezuela ou de Cuba, para não irmos mais além. E manda a verdade que se diga, também, que a generalidade dos regimes políticos europeus e partidos mais representativos, de que o PS português é paradigma, se converteram em verdadeiros pântanos ideológicos e éticos, em que chafurda a generalidade dos seus líderes. É neste cenário político institucional do mais alto nível que Portugal, apesar da nobreza do seu povo, da sua riqueza histórica e cultural, se afirma como um Estado pobre e marginal no contexto da União Europeia, dependente das ajudas comunitárias e com uma dívida pública explosiva, que o coloca à beira da banca rota sempre que uma crise internacional estala. Como se verificou com a crise da dívida soberana iniciada em 2008, mais recentemente com a crise pandémica e agora com a guerra que Vladimir Putin desencadeou na Ucrânia. Tudo isto passou indiferente à discussão inútil e inconsequente do Orçamento de Estado de 2022, que o PS desdenhou do alto da sua maioria absoluta parlamentar. Indiferença que já anteriormente se verificou na vigência da tristemente célebre Geringonça, uma vaquinha que o PS, o PC e o BE fizeram sem que se saiba bem porquê e para quê, mas que salvou António Costa do apagamento político e acabou por lhe dar de bandeja e mão beijada a presente maioria absoluta. É por demais óbvio que uma economia saudável é indispensável para o progresso e bem- -estar de uma Nação. E é por demais evidente que em tempo de vacas gordas não há governos maus e que os bons governos se veem em tempo de vacas magras. Por norma, para sanear os grandes males económicos os economistas apontam múltiplas medidas e soluções, qual delas a mais rebuscada, que os políticos recondicionam para que também sirvam da melhor forma os seus interesses pessoais e partidários. São mil estratagemas administrativos como o desdobramento dos escalões do IRS, os “autovoucher”, o congelamento de salários, os subsídios a granel, o salário mínimo, o rendimento social de inserção, as mexidas manhosas nos impostos, etc., etc, etc. Uma coisa é certa porém: com o regime político vigente a economia portuguesa jamais sairá da cepa torta, por mais mesinhas e estrangeirinhas, porcas e parafusos que os políticos atarraxem e desatarraxem. Mesmo que circunstancialmente cresça acima da média europeia quando pode, deve e é necessário que cresça acima do máximo europeu. Sem as indispensáveis reformas das leis fundamentais e do Estado, sem o combate eficaz à corrupção, o controle racional da despesa pública, o fim dos empregos políticos chorudamente remunerados, sem leis de trabalho que valorizem quem trabalha e promova a rentabilidade, jamais a economia portuguesa poderá garantir desafogo e bem-estar a todos os portugueses e suportar serviços públicos de qualidade. Mas quem irá fazer tais reformas, quando e como?! Serão aqueles para quem a Constituição é uma vaca sagrada e o Regime um bezerro de oiro? É aqui que a porca, a vaca e o bezerro torcem o rabo.

Henrique Pedro