OS TRÊS “R” E OUTROS TRIOS 2 - OS TRÊS JOSÉS I - O GAMA

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José Gama costumava dizer que o seu sucesso político se devia à sua arte e engenho de pegar num fósforo aceso e fazê-lo brilhar como um canhão. Desconte-se o exagero característico dos políticos e a trajetória do autarca nordestino justificava tal aforismo. Naquele tempo, no distrito de Bragança, ninguém dominava a arte da comunicação como ele. Sabia construir uma história, facilmente entendível pelo público alvo, acrescentava-lhe um bordão já devidamente estudado e testado e repetia-a até à exaustão. “Há verdades que existem e têm de ser respeitadas, há outras que se constroem e é preciso revelá-las”. Aos que lhe criticavam as “novidades” costumava rotulá-los como sendo do tempo do carro de bois em contraponto consigo próprio que se autointitulava de ser da era do TGV. E tudo lhe corria bem. Porém, é sabido, não há regra sem exceção! E o ambiente, nessa altura, sobretudo o tratamento dos resíduos sólidos não podia ser tratado como a construção de uma rotunda. Por alguma razão, até aquela data, em Bragança, não havia concelho que não tivesse rotundas, pavilhões, piscinas e terminais de camionagem... mas não havia nenhum aterro sanitário, nem tão-pouco a definição concreta da sua localização, a primeira e mais difícil de todas as etapas necessárias. Obviamente que a sua concretização, apesar de não haver ainda uma consciência ambiental parecida com a de hoje, seria um feito assinalável que caía como mel na sopa, ao autarca mirandelense, numa altura em que sonhava já com novos voos. Porém, a morosidade do processo não se compaginava com o “timing” das suas ambições. O verdadeiro feito seria a inauguração do equipamento, mas como não tinha tempo para esperar resolveu, imprudentemente, fazer da escolha do local de implantação, um “acontecimento mediático nacional” e resolveu convidar a televisão para o terreno para, em direto (outro erro crasso!) fazer o anúncio do arranque da obra. Para piorar, soube-se depois, tinha telefonado ao Primeiro Ministro de então, chamando- -lhe a atenção para a reportagem da recém-inaugurada delegação da RTP de Bragança. Uma pequena, mas aguerrida e ruidosa manifestação destruiu o efeito pretendido. Gama sentiu-se humilhado e ficou furioso. Obviamente que a culpa, não podendo ser sua, caiu-me em cima, apesar de ter ignorado os avisos que lhe fiz, no próprio dia sobre o risco elevado da sessão por causa do que então já se sabia. O projeto ficou ferido de morte e podia ter terminado ali! Tal como sabia fazer brilhar como um canhão, um simples fósforo, José Gama sabia bem que havia fogos cujo brilho, por ser prejudicial para a sua imagem, era melhor escondê-los, colocá-los debaixo de um alqueire por antítese ao que é recomendado pelo Evangelho (São Mateus 5:13) que Gama bem conhecia. A missão da Associação de Municípios, estava em risco, apesar de, entretanto, ter lançado o projeto MATER de modernização administrativa e informática das Câmaras associadas. Nesse tempo eu ainda presidia à Comissão Política do PSD de Moncorvo e, nessa qualidade, na disputada e “dramática” reunião distrital para indicação dos candidatos, propus e defendi, aguerridamente, o nome de José Gama para liderar a lista distrital para a Assembleia da República. Mais por causa do nome em si, do que da minha intervenção, a proposta foi aprovada por unanimidade. Em boa hora. As eleições de 1995 haveriam de trazer, para o palco ambiental do nordeste e que seriam decisivos na retoma da iniciativa que seria concluída, com sucesso, em 1997, dois outros Josés, de que falaremos na próxima crónica, a saber José Silvano e José Sócrates.

José Mário Leite