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Carção e Argozelo: os recantos do Judaísmo

Ter, 12/05/2009 - 12:31


Implantada mesmo no centro de Carção, a “Taberna TAI” é um símbolo vivo dos tempos em que os judeus dominavam o negócio na praça. O edifício centenário, que passou de geração em geração, foi recuperado segundo a traça original e, hoje, acolhe pessoas de todos os estratos sociais. Aqui ouvem-se histórias dos tempos em que o Cristianismo e o Judaísmo dividiam a população e, em tom de brincadeira, até se fazem comentários sobre as pessoas que ainda têm ar de judeus.

Os tempos passaram, as mentalidades mudaram e as práticas judaicas que ainda poderão existir fazem, apenas, parte da intimidade de cada um. A proprietária da taberna, Laura Tomé, de 57 anos, afirma que não tem grandes memórias dos tempos áureos do Judaísmo, mas sabe que a “Taberna TAI” foi uma das primeiras a surgir em Carção. “Este negócio já vinha do meu sogro, que pertenceu a uma família que tinha taberna e talho”, recorda Laura Tomé.
Recuando no tempo, as tabernas e os talhos eram alguns dos negócios que pertenciam à comunidade judaica. As famílias de negociantes de Carção instalaram-se na zona da praça e os seus estabelecimentos não eram frequentados por lavradores.
“A aldeia estava dividida. Os judeus tinham os seus negócios na zona da praça, ao passo que os lavradores viviam no cimo do povo e só frequentavam os comércios e cafés da sua zona. Quando os lavradores desciam, o que, por norma, acontecia ao fim-de-semana, havia pancadaria”, recorda o presidente da Junta de Freguesia de Carção, Marcolino Fernandes.
Com 76 anos, o autarca afirma que ainda viveu no tempo em que as rivalidades entre cristãos e judeus estavam bem vincadas. “Embora eu fosse lavrador, vivi sempre no meio dos judeus. O meu pai esteve três anos em França e quando regressou comprou uma casa mesmo no centro da praça, o que para os judeus foi uma afronta. Por isso, desde pequeno que fui assistindo às rivalidades”, conta o carçonense.

Ritual da curtimenta das peles é um dos símbolos do Judaísmo em Argozelo

Há 50 ou 60 anos atrás, Marcolino Fernandes lembra que os casamentos entre pessoas dos dois estratos sociais nem sequer era autorizado, tendo, posteriormente, começado a surgir com algumas reservas. “O meu irmão foi um dos primeiros lavradores a casar com uma judia. Apesar de, nessa altura, já haver mais convivência entre as duas comunidades, a situação ainda deu azo a comentários de parte a parte”, enfatizou o autarca.
A praça que, outrora, foi palco de lutas entre lavradores e judeus guarda, actualmente, memórias dos tempos de perseguição por parte da Inquisição, que condenou à fogueira cerca de 18 pessoas de Carção. Para se livrarem da morte, muitos judeus converteram-se for fora, para mostrar que já eram cristãos, quando na realidade ainda viviam o verdadeiro espírito judaico. Este fenómeno é designado de “Marranismo”. “Convertiam-se porque eram perseguidos. Tudo leva a crer que os judeus usavam as alheiras para mostrar que já eram cristãos, logo comiam carne de porco, quando, na realidade, eram feitas, apenas, de pão e aves”, salienta Serafim João, chefe de gabinete do presidente da Câmara Municipal de Vimioso e natural de Carção.
O responsável enumera alguns locais de presença judaica que prevalecem na freguesia, como é o caso de uma lápide com a sentença de um judeu condenado à morte na fogueira, situada junto à praça, uma pedra com alguns símbolos judaicos gravados, bem como a cruz do Santo Estêvão. Os símbolos que compõem o brasão de Carção também são representações judaicas.
Já em Argozelo, Serafim João lembra que o Judaísmo está ligado à curtimenta das peles, sendo o símbolo de judeu atribuído aos peliqueiros e almocreves. Também a cruz, com mais de 350 anos, que se ergue no largo do Sagrado é associada aos judeus, tal como os locais onde existiram os tanques onde eram tratadas as peles.