Henrique Pedro

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Desculpem qualquer coisinha.

A coroar quarenta anos de escândalos e de crises, portadores dos piores males e misérias e nos quais a democracia mais genuína seguramente se não revê, Portugal acaba de ser devastado por catastróficos incêndios florestais que horrorosamente sacrificaram mais de cem inocentes cuja memória não está a ser devidamente respeitada. Que as suas almas descansem em paz!
Incêndios florestais sempre os houve mas não há memória de que tenham ardido tantas casas e morrido tanta gente e a culpa por tal não pode ser imputada às alterações climatéricas.
Seria de esperar que imediatamente a seguir a Pedrógão Grande se ouvisse o ruído das motosserras a desbastar as matas que sufocam as aldeias e as estradas mais críticas. Mas não! Prevaleceu o barulho dos discursos políticos feitos de palavras ocas e cínicas que não cortam árvores nem apagam fogos.
Inacreditavelmente, a Pedrógão Grande seguiu-se uma tragédia ainda mais devastadora o que levou o Presidente da República, a declarar, alto e bom som, num compreensível assomo de repúdio dos acontecimentos e das políticas, que o Primeiro-ministro, enquanto tal, deveria apresentar um pedido de desculpas público às famílias enlutadas em particular e aos portugueses em geral.
O chefe do governo, porém, que na véspera já havia proferido um discurso peregrino, frio e calculista, limitou-se a tirar partido de uma deixa do debate parlamentar para responder, a contragosto e contrafeito, como se cantarolasse o conhecido fado de Paulo de Carvalho: desculpem lá qualquer coisinha.
Depois disso, porque tomou consciência da gravidade do gesto e do desgaste da sua imagem e porque é verdadeiro mestre em golpes de rins, entendeu convocar, com popa e circunstância, um conselho de ministros extraordinário para anunciar um chorrilho de medidas e contramedidas urgentes, pondo vários ministros, como é seu timbre, a bolçar milhões. Falta saber quando, como e se tais medidas chegarão a ser postas em prática e se não acabaremos todos a contar tostões. A ver vamos como dirá qualquer ceguinho que veja.
Ficou ainda mais claro que, para o Primeiro-ministro, o que verdadeiramente importa é que se faça silêncio para que o seu naipe de fadistas e guitarristas possa continuar a cantar e a tocar o fado vadio da demagogia eleitoralista.
É de elementar justiça, contudo, que se diga que tudo que de mal tem acontecido a Portugal não é apenas da responsabilidade do actual governo e do Primeiro-ministro António Costa que, como sabemos, tem uma já longa vida dedicada à governança pública, com experiência comprovada em matéria de incêndios florestais.
Sobram motivos e é já tempo dos principais governantes, do presente e do antecedente, se reunirem na praça maior e mais simbólica do país para em uníssono pedirem perdão, não um mero pedido de desculpas, a toda a Nação, pelos muitas e sofridas provações e vergonhas a que submeteram a Pátria portuguesa.
Falta saber se perante a gravidade dos acontecimentos, que extravasam os incêndios florestais, não deveria já o senhor Presidente da República ter dissolvido a Assembleia pondo termo ao governo de “boys” e “teddy boys” que, ao arrepio da vontade dos eleitores, embora com a conivência da Assembleia da República, governam Portugal como se governar fosse uma festa de amigos e compinchas.
Falta saber se o próprio partido socialista não deveria já ter desmantelado a “Geringonça” que está a aproveitar-se da conjuntura económica favorável para iludir os portugueses com o aumento ilusório dos vencimentos públicos e das pensões, a bloquear reformas indispensáveis à sobrevivência da Nação e a reduzir a cinzas os símbolos maiores da História pátria.
Mas já não restam dúvidas de que é já tempo de restaurar a Democracia e de reformar o Estado por forma a torná-lo mais transparente, democrático, justo e melhor defendido do assalto de corruptos e aventureiros.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Estourou uma bomba em Mirandela

O regime político vigente em Portugal, embora formalmente se inscreva no sistema da democracia liberal, também dita representativa, enferma de graves anomalias que são, quanto a mim, a causa essencial dos males de que o nosso país padece nos domínios político, económico e social.
As culpas não devem ser imputadas ao carácter dos portugueses, portanto, até porque são milhares os compatriotas que se evidenciam fora da pátria, em todos os domínios, mas obedecendo a regimes democráticos diferentes.
É a permissividade do regime político instalado em Portugal, volto a frisar, que explica que na vida política nacional prevaleçam a mediocridade, a mentira, o oportunismo e a multifacetada corrupção que tantos males origina.
Fenómeno que tem maior impacto, embora mais silenciado, em terras do interior. O concelho de Mirandela, que até às últimas eleições autárquicas foi, durante décadas, governado de forma hegemónica pela mesma força partidária, não foge à regra.
Tratou-se de um longo e obscuro período em que as reais potencialidades da capital da Terra Quente foram subaproveitadas e a maioria dos pacatos mirandelenses se fartou de ver as mesmas personalidades a ocuparem os organismos públicos de influência partidária. Com uma apertada teia de amigos e correligionários a partilhar sinecuras e a conduzir a vida económica e cultural do concelho a seu bel-prazer, a inventar empregos camarários para empregar clientes e colaborantes, com as freguesias amordaçadas e manipuladas numa lógica de domínio partidário e a presidência da Câmara assegurada por astucioso mecanismo hereditário.
A mudança de poder em Mirandela por força das últimas eleições autárquicas, ainda que para outro partido igualmente vicioso, ambos pilares do actual regime, soou, por isso, que nem uma bomba. Surpreendentemente, o município mirandelense irá ser governado, a partir de agora, por uma força política diferente e tendo à cabeça, o que também é inédito, uma mulher.
Trata-se da veterinária Júlia Rodrigues, destacada militante do partido socialista, que ousou ganhar a confiança massiva do eleitorado mercê, também da sua condição feminina, de pertencer a uma alargada geração mirandelense que está na força da vida e que nela se revê e, como é óbvio, de uma campanha eleitoral criativa e eficaz.
Beneficiando, naturalmente, da conjuntura favorável que o seu partido atravessa, do seu relacionamento privilegiado com o poder central, do desejo de mudança que a maioria dos mirandelenses, agora se constata, calavam no peito, duma maior maturidade do eleitorado rural e ainda e sobretudo, do facto saliente dos seus adversários não possuírem nem perfil nem predisposição eleitoral para tanto.
É por tudo isto que as expectativas que agora se abrem são fantásticas. Importa, para tanto e para começar, que Júlia Rodrigues saiba valorizar a equipe pouco qualificada e mal preparada que chefia, que não deixe vingar os sentimentos revanchistas que, é público e notório, grassam nas suas hostes e que não proceda a uma limpeza cega da administração municipal na lógica do olho por olho dente por dente.
A nova presidente da Câmara de Mirandela será grande se for capaz de ser justa, humana e generosa. E se souber colocar os interesses regionais acima dos partidários.
Júlia Rodrigues já anteriormente deu provas de ser determinada bastante e granjeou carisma suficiente para fazer história em Mirandela, como ela mesma diz pretender. Oxalá a faça pela positiva.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Poder Local - a lei da selva

O papel do Poder Local na democracia portuguesa, sobretudo no que às freguesias diz respeito, é simbólico, para não dizer de papel de embrulho, ainda que a Constituição da República lhe confira importância fundamental na governação do país, articuladamente com o Poder Central, (que compreende, como é sabido, o Presidente da República, a Assembleia da República, o Governo e os Tribunais) e o Poder Regional, que apenas se encontra estabelecido nas regiões autónomas da Madeira e dos Açores, já que o Portugal continental, lamentavelmente, continua não regionalizado.
Melhor dizendo: Portugal é na verdade governado como se estivesse divido em três regiões, considerando que o Continente, depois das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira, é tratado erradamente como uma terceira região, una, homogénea e autónoma relativamente à União Europeia.
Isto explica a diminuta importância que as Câmaras Municipais provincianas e as Freguesias rurais merecem dos órgãos do Poder Central em geral e do Governo em particular o que, como é óbvio, mais afunda as escandalosas assimetrias regionais que estigmatizam o país, sendo que a maior de todas se consubstancia na macrocefalia de Lisboa.
Basta olhar para as competências das freguesias, seja qual for a sua população, como sejam o Equipamento rural e urbano, o Abastecimento público, a Educação, a Cultura, tempos livres e desporto, os Cuidados primários de saúde, a Ação social, a Proteção civil, o Ambiente e salubridade e o Desenvolvimento e o Ordenamento urbano e rural para concluirmos que o Poder Local vegeta num mundo de fantasia e penúria.
O panorama não é mais prestigiante para os Municípios provincianos que estão praticamente confinadas ao trato de parques, jardins, feiras e romarias, com total omissão das suas atribuições fundamentais como sejam o Ordenamento do território, a Energia, os Transportes e as comunicações, a Saúde, a Proteção civil, a Polícia municipal, a Promoção do desenvolvimento e a Cooperação externa, áreas em que o Governo central põe e dispõe a seu bel-prazer, sendo em Lisboa, capital do império fracassado, que tudo se decide ou se adia.
Neste quadro ganha especial gravidade o despovoamento de vastas regiões do interior, a principal causa, ainda que não a única, da manifesta inutilidade das Freguesias que são, por regra, canibalizadas pelas Câmaras Municipais, que por sua vez são canibalizadas pelos partidos instalados em Lisboa, que procuram conquistar autarquias como se de troféus de caça se trate, lançando mão de todas as armas e argumentos, tendo em vista a tomada do poder central e alimentar as clientelas com benesses e mordomias. É a lei da selva no Poder Local!
Só haverá vantagens, portanto, em estabelecer constitucionalmente que apenas movimentos de cidadãos independentes e partidos locais podem concorrer em eleições autárquicas para governar democraticamente as autarquias.
Na versão actual o Poder Local não passa de um enfeite democrático de duvidoso efeito, já que o próprio acto eleitoral autárquico, que se requer autêntico e dirigido aos assuntos locais, é sistematicamente adulterado e anulado em proveito dos interesses partidários centrais.
Os nossos doutos governantes não se demovem com verdades e crises sistémicas, porém. Tratam as autarquias provincianas como inúteis, subservientes ou mesmo escusadas e como se as populações remanescentes estivessem a mais, melhor servindo os seus propósitos nas metrópoles litorais.
Há mesmo muitos que gostariam de responder às necessidades locais com meia dúzia de serviços, públicos e privados, contratados em Lisboa, ainda que, politicamente correctos, afirmem o contrário.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Diga-me lá em quem devo votar?

Sempre que um acto eleitoral se aproxima, a maior parte dos eleitores não sabe, à partida, em quem votar ou está predisposta a não o fazer. A questão coloca-se com maior acuidade aquando da eleição de uma nova Assembleia da República.
Por isso as forças políticas habilitadas ao acto eleitoral em jogo respondem com encenações vistosas baseadas em cartazes com fotografias cuidadosamente retocadas e chavões ridículos, que pouco ou nada dizem, mas sempre despertam a curiosidade dos transeuntes, como se de um produto de supermercado, detergente ou pasta de dentes, se tratasse.
No próximo dia 1 de Outubro vão ser eleitos novos e reeleitos velhos autarcas em processos eleitorais que continuam a ser, em muitos casos, deturpados pelas forças que detêm o poder.
Tanto assim é que o hábil exercício do poder autárquico conferia claramente aos seus detentores o condão de se fazerem reeleger até se fartarem, razão pela qual a limitação de mandatos veio pôr fim, justamente, à gesta heroica dos chamados autarcas dinossauros. O que ainda não acontece, lamentavelmente, com os deputados vitalícios.
A decisão de votar ou não votar, e em quem, não é linear para a maioria dos eleitores, portanto. Vários amigos meus, confrontados com este dilema, porque não se sentem devidamente informados e pensam, erradamente, que eu o estarei, ou porque nenhum candidato ou partido seja de seu agrado ou lhes inspire confiança, vêm ter comigo para, em privado, me fazerem esta pergunta embaraçosa: Diga-me lá em quem devo votar? Situação que, por certo, não só a mim é colocada.
Apetece-me dizer-lhes que também eu não sei e tenho as mesmas dúvidas, mas resisto à tentação de aconselhar que não votem, que se abstenham, porque entendo que devemos ir às urnas sejam quais forem as circunstâncias. Porque, mesmo se for inconciliável a aversão pelas forças partidárias e candidatos em presença sempre nos é dada a possibilidade de chegar à mesa de voto e escrever no boletim uma mensagem, politicamente correcta, do género “Viva a democracia” ou “ Abaixo a mediocridade”.
Também porque a lei em vigor e a inteligência política instalada olham os abstencionistas como cidadãos de segunda categoria e os tratam como comodistas, marginais, ausentes em parte incerta ou mesmo defuntos, não lhe reconhecendo a justa relevância política.
É por tudo isto que eu partilho a ideia de renomados estudiosos destas questões de representatividade que defendem, face ao peso esmagador da abstenção, que deveriam ser deixadas vagas nas Assembleias as cadeiras correspondentes aos abstencionistas.
De facto, se a abstenção não conta como voto, então, se não há votos não deve haver atribuição de mandatos, pelo que é abusivo os partidos elegerem deputados excluindo os abstencionistas. E o que se diz para a Assembleia da República diz-se para as Assembleias Municipais. Seria, além do mais, uma forma simples e espontânea das Assembleias mais fielmente espelharem o sentir da Nação e de reduzir o número de deputados e os gastos correlativos.
E mais! Entendo que os boletins de voto, da mesma forma que têm quadradinhos para colocar a cruzinha correspondente ao partido preferido, também deveriam ter um, de igual tamanho, com o dizer “ Abstenho-me”. Ou mesmo “Não voto em ninguém”.
Será pedir demais? Será que os portugueses, mesmo não gostando, são obrigados a engolir a caldeirada do regime e a render-se à lei do “come e cala-te”, apanágio da generalidade dos nossos políticos?
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

O partido que falta à Região de Trás-os-Montes e Alto Douro

Trás-os-Montes, e o Alto Douro, têm tido autarcas excelentes. Presidentes de Câmara e de Junta de Freguesia. Poucos. Não tantos quantos os necessários para provocar o progresso definitivo da Região, é certo.
Conheço e reconheço a obra de alguns, que não cito porque não é esse o propósito central desta crónica, porque não quero ser injusto e ainda porque, sendo amigo pessoal de muitos, também não quero dar aso a que digam que me movem motivos pessoais.
Trás-os-Montes e Alto Douro também têm tido muitos políticos famosos, de alto gabarito, embora ser-se famoso não signifique que se é herói. Poderá ser-se simplesmente vilão e ser vilão e famoso não é glória nenhuma.
O problema reside, sobretudo, quanto a mim, no regime político vigente que lançou o país, e em especial as suas regiões interiores, em becos sem saída mas que convém distinguir do sistema democrático teórico que possui virtudes incontestáveis.
Trás-os-Montes e Alto Douro são disso exemplos mais que evidentes porque estão amordaçados pelos partidos que em Lisboa ditam leis e que fazem dos autarcas meros moços de recados. Por isso os seus olivais, soutos, vinhedos, saudosos trigais, hortas, paisagem genuína, ares e rios não ousaram, até hoje, ser devidamente valorizados. Por isso os transmontanos e os alto-durienses continuam a emigrar em procura de melhor vida. 
Veja-se o caso dos rios, ou das águas em geral, sector em que Trás-os-Montes e Alto Douro, felizmente, ainda não vivem o drama de outras regiões. Águas que continuam a correr livremente para o oceano sem que as populações ribeirinhas delas tirem outro proveito que não seja refrescarem-se em meia dúzia de praias improvisadas, ditas fluviais, na época estival.
Por isso a EDP, verdadeiro negócio da china, ousou emparedar o Tua e o Sabor para seu consumo privado, a troco de uns amendoins que atira às populações como a macacos enjaulados: jogos florais a premiar meia dúzia de aldeias, um tímido plano de mobilidade que faz que anda mas não anda e tabuletas alienígenas nas entradas de Mirandela com o sibilino dizer Parque Regional do Vale do Tua. Tudo só para calar os mais contestatários. 
Falta um partido a Trás-os-Montes e Alto Douro, portanto. Livre. Independente. Ambientalista. Regional e regionalista. Que pugne pelos interesses da Região como um todo e acima de tudo e que não sirva aqueles que apenas projectam ganhar dinheiro para levar para fora.
Partido vocacionado para eleger verdadeiros autarcas e deputados transmontanos e alto-durienses e que se não enrede nos ditames políticos e corruptores da Lisboa macrocéfala e centralizadora. Que ouse, entre outras coisas, promover uma política de repovoamento coerente e consequente, privilegiando, naturalmente, os milhares de transmontanos e alto-durienses emigrados.
Só desta forma as universidades, os centros culturais, as bibliotecas, os museus, os teatros, as cooperativas, os jornais, os grupos desportivos e as empresas transmontanas alcançarão o brilhantismo que almejam, libertando-se da caridade de Lisboa e do estigma da emigração.
Exemplo maior deste atávico marasmo provinciano é Mirandela, eterna princesa do Tua, sempre adiada e adormecida à espera do príncipe que tarda, apesar de reunir as melhores condições naturais, designadamente água corrente, centralidade, pujança agrícola e suficientes atractivos turísticos para se transformar numa exemplar metrópole regional, capaz de dar guarida a 50 000 habitantes, que se estima ser o seu óptimo populacional, inseridos nos 500 000 que a Região claramente comporta e de que precisa.
Só por esta via a região de Trás-os-Montes e Alto Douro se poderá converter na terra de eleição com que os transmontanos e alto-duriense sempre sonham e trazem no coração.
 
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

O pai, a mãe e o avozinho das assimetrias regionais

As tão propaladas “assimetrias regionais”, metáfora para a injustiça e a incompetência governativas, distribuem-se por todos os domínios do foro público, apesar da pequena dimensão de Portugal.
A maior de todas, porém, reside em Lisboa, nas sedes do Governo, da Assembleia e da Presidência da República que são o pai, a mãe e o avozinho de todas elas. É lá que se gera o centralismo e a macrocefalia lisboeta e se concretiza a subalternização do poder local pelo poder central que a Lei Fundamental da República não estabelece, mas que os partidos políticos subvertem.
Donde advém, entre outros males, a subserviência das câmaras municipais provincianas ao governo central e das juntas de freguesia às câmaras municipais.
Assimetrias que teimam em persistir e a agravar-se apesar dos muitos milhões de euros que foram destinados a combate-las desde que Portugal aderiu à Comunidade Europeia.
É certo que novas e modernas vias, jardins e rotundas foram rasgadas e as condições de vida medievais banidas, sobretudo no mundo rural, mas Trás-os-Montes, por exemplo, continua a ser uma região socialmente depauperada, em contínuo processo de despovoamento, sem expressão cultural visível e de economia restringida à pouco rentável agricultura subsidiada.
Também as cidades e vilas transmontanas foram dotadas de vistosos centros culturais, museus e bibliotecas, menos frequentados que os campos da bola, mas a cultura regional praticamente se confina a espectáculos de música dita pimba que as Câmaras Municipais oferecem aos seus munícipes, em dias festivos, com o intuito de induzir nos espíritos uma ilusória sensação de dinamismo.
 Acresce que a iliteracia crónica continua a esmagar todas as ideias de modernização e desenvolvimento e apenas serve os mais esconsos propósitos de sujeição social e partidária.
Já a dinamização económica propriamente dita não vai além das feiras de produtos tradicionais, com destaque para os enchidos, que as mesmas Câmaras Municipais promovem e custeiam, e que são claramente insuficientes para sustentar, sequer, uma significativa indústria artesanal. 
Sendo Trás-os-Montes uma região eminentemente agrícola o sector continua a não dispor das necessárias e suficientes plataformas transformadoras e comerciais, dos vitais sistemas integrados de regadio e dramaticamente dependente de meia dúzia de prestimosas cooperativas, insuficientes para alavancarem as suas reais potencialidades.
Como se vê, a questão é iminentemente política e radica-se na asfixia e subalternização das autarquias provincianas pelos partidos cuja ambição maior é a governança nacional. Partidos e governos que tratam as assimetrias regionais como tratam os incêndios florestais: protelar e iludir, até o escândalo ou a tragédia acontecer.
 Agora que novas eleições autárquicas se avizinham já os partidos políticos mais uma vez se preparam para, desprezando o poder local, as reduzir a mero escrutínio intercalar do governo da Nação. Quando não em instrumento das suas guerras intestinas.
É por tudo isto que eu, e julgo que serei secundado por muitos mais eleitores, desde já declaro que não reconheço a nenhum partido o direito de gritar vitória nas autárquicas contando com o meu voto. 
Porque não é a pensar nas políticas partidárias, de esquerda ou de direita, que eu irei votar, mas tendo em conta, isso sim, o progresso da minha terra e os candidatos mais aptos para o promover.
Ao líder partidário que não respeitar este princípio lanço, desde já, o meu olímpico desprezo.
 
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.
 
 
 
Errata: Na minha crónica intitulada O Estado da Nação é crónico e continua crítico, anteriormente publicada, onde se lê Aljubarrota deve ler-se Alcácer Quibir este sim o nome do maior desastre militar da História de Portugal. 

Pela independência de Trás-os-Montes

Um dos maiores males que presentemente afectam Portugal é o despovoamento persistente de vastas regiões do interior, que em muitas áreas rurais assume mesmo a gravidade do ermamento desolador. Fenómeno que não pode, nem deve ser atribuído a causas naturais, e muito menos ser chamado de desertificação, como levianamente se vem fazendo.
Os, transmontanos, por exemplo, procuram empregos melhor remunerados e com trabalhos mais agradáveis longe da sua terra natal porque, apesar da Mãe Natureza que os criou ser pródiga e diversificada, as prevalecentes actividades agrícolas e pecuárias, continuam a ser árduas, desprestigiadas e pouco rentáveis e, por tudo isso, nada atractivas. Acresce que, até hoje, não se conseguiu que o turismo e negócios correlativos alcançassem significativa expressão local e os empregos que o Estado faculta não são solução.
O problema é sobretudo grave porque a economia nacional continua débil e distorcida por culpa das más práticas políticas, ainda que, verdade seja dita, os resistentes, aqueles que teimam em viver nas cidades, vilas e mesmo aldeias do interior, regra geral, vivam melhor que muitos que vegetam encafuados nos bairros sombrios das grandes cidades.
Fiquei literalmente de olhos em bico quando, um destes dias, ouvi dizer a um político responsável, ainda que de segundo plano, da geringonça ou da oposição não importa (nem mesmo me dei ao trabalho de saber se seria transmontano), que Trás-os-Montes só progredirá quando for vendido aos chineses. E mais argumentava ele, com duvidoso sentido de humor, que “já lhes demos (ou deram eles, digo eu) tanta coisa de mão beijada, de maior dimensão até, como a EDP, por exemplo, que bem lhes podíamos vender agora Trás-os-Montes inteiro, por atacado”. É verdade, pensei para comigo, aos vales do Tua, do Sabor e do Rabagão, que já lhes pertencem, transformaram-nos em albufeiras imensas. Aos transmontanos resta agora aprenderem a “surfar” sem ondas.
Pessoalmente, ironia à parte, duvido, portanto, que essa fosse uma solução aceitável ainda que o problema do despovoamento ficasse resolvido com a caterva de chineses que por cá se radicaria, mesmo que não fosse para arar e semear arroz, que seria o mais certo.
Embora tal ideia não seja mais disparatada que as tão propaladas discriminação positiva e descentralização que muitos insuspeitos governantes alardeiam com o palavreado do costume, mas que não passam de boas intenções ou mesmo de presentes envenenados.
Eu tenho outra ideia melhor e mais séria que passa por dar plena expressão ao Poder Local num contexto de regionalização. Libertem Trás-os-Montes. Soltem-no das amarras partidárias. Inibam os partidos políticos de concorrer em eleições locais e de, por essa via, se apossarem das Câmaras Municipais e das Juntas de Freguesia para as converter em coutadas privativas. Acabem com os autarcas delegados políticos dos partidos no poder ou na oposição e com os deputados simbólicos, honorários, vitalícios.
E, claro está, não vendam mais olgas e olivais para a EDP afogar. Deem vida aos rios transmontanos e às suas margens com projectos agrícolas, turísticos, energéticos e culturais convenientemente dimensionados. Façam em Trás-os-Montes os investimentos públicos mais justos e ajustados à Região e não apenas os que melhor servem os interesses do Terreiro do Paço e maiores réditos conferem ao grande capital. E não insistam na loa de discriminar positivamente Trás-os-Montes porque essa é a pior forma de descriminação.
Tornem Trás-os-Montes independente!
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico

O Estado da Nação é crónico e continua crítico

O pensamento político dos nossos doutos governantes, actuais e outros que tais, é muito simples: basta que dois ou três indicadores macroeconómico melhorem para reclamarem victória, increparem os oposicionistas e gritarem aos sete ventos que o país está melhor, mesmo que a situação continue crítica.

É o seu jeito de iludir o povo. Tudo o mais é irrelevante a menos que ganhe foros de escândalo ou de tragédia. É o fado lusitano da alternância do poder e da esperança com música de desgraça.

O Estado português continua atolado numa profunda crise moral e funcional que extravasa o plano financeiro. Senão, vejamos os exemplos mais expressivos.

A subordinação do poder militar ao poder político democraticamente constituído é uma das pedras de toque da democracia. O mesmo se diz do poder económico. Por isso a Constituição da República estabelece estes princípios inequivocamente.

Na práctica, porém, nada disto se cumpre. O poder económico continua a dominar governos e políticas, lesando escandalosamente o erário público, o desenvolvimento coeso do território nacional e as famílias, como bem o demonstram os muitos casos de alta corrupção que a comunicação social a toda a hora noticia.

Já quanto à subordinação do poder militar ao poder político verifica-se o inverso, com sucessivos governos a menosprezar as Forças Armadas e a desdenhar os militares, com o beneplácito servil dos mais altos chefes castrenses, ou estes não sejam escolhidos a dedo com esse propósito, pelo próprio poder político.

Pior situação do que a presente só a vivida na I República, em que soldados pediam esmola à porta de armas, e que haveria de redundar no maior desastre militar da História depois de Aljubarrota, a batalha de La Lys.

Nem mesmo durante o consulado de Oliveira Salazar, a quem se atribuía a “boutade”: “as forças armadas são um mal necessário”, a instituição militar foi tão desprezada e humilhada. Tenha-se em conta que males reconhecidamente necessários, ontem como hoje, são muito raros.

Hoje em dia, porém, quer para a esquerda oportunista e bem comportada que integra a “geringonça”, quer para a direita do ao Deus-dará, as Forças Armadas não passam de uma inutilidade. Esquerda e direita marcham com o passo certo, porém. São a grande ameaça, interna, que paulatinamente tem vindo a destruir Portugal.

 Esquecem-se que não há Estado democrático forte e respeitado sem Forças Armadas credíveis e prestigiadas, e que é criminoso reduzir o Exército a pequenas unidades mercenárias, destinadas a actuar longe do território nacional, a mando sabe-se lá de quem.

Elucidativo é o triste episódio do assalto aos paióis de Tancos, que o Governo procurou resolver com um “remake” da célebre Brigada do Reumático de triste memória, em que o primeiro-ministro e líder da geringonça, se mostrou à Nação rodeado de quatro patéticos generais, para iludir a desmoralização que grassa nas fileiras e a insegurança que afecta o país, como diariamente se constata com a evidente incapacidade da Prevenção Civil para combater calamidades de grande dimensão.

Enquanto Estado independente e livre, se é que ainda existe, Portugal trava a sua derradeira batalha. Que poderá ser breve ou arrastar-se por algumas décadas mais, mas da qual dificilmente sairá vitorioso.

O que resta da soberania nacional, depois que foi alienada a Bruxelas, sem a justa reciprocidade e equidade, aos credores internacionais, ilicitamente, e aos interesses estrangeiros que dominam as empresas de importância estratégica, continua a desagregar-se na emigração qualificada, no despovoamento do interior, no défice demográfico e no enfraquecimento de instituições fundamentais como sejam a Justiça e as Forças Armadas.

Contrariamente às melhores e mais justas expectativas que se abriram com a adesão à CEE e que apontavam aos mais evoluídos países europeus da sua dimensão, Portugal é hoje um Estado falhado, sendo que a culpa não deve ser assacada à democracia em si mesma mas ao Regime político vigente que não acautela, e antes favorece, a manipulação do poder por bandidos e aventureiros

 Andam agora os governantes deslumbrados com o turismo que inopinadamente lhes bateu à porta, e Lisboa já corre o risco de se converter numa espécie de emirato turístico, sem petróleo, ou talvez pior, num Rio de Janeiro com praias de sonho e favelas de pesadelo. E o resto do país num deserto queimado.

O Estado da Nação é crónico e continua crítico.

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Portugal morreu, a minha Pátria, não!

A poesia é, sem dúvida, a forma mais delicada e civilizada de expressar sentimentos de amor, tristeza, raiva e revolta. Também de partilhar ideias, unir vontades e reacender a esperança.

Os portugueses têm tido, nos últimos tempos, demasiados motivos de indignação e descrença produtos do egoísmo, da mentira, da incompetência e da desfaçatez prevalecentes nas elites dirigentes, muito acima do que seria admissível.

A recente tragédia de Pedrógão Grande e o assalto aos paióis do polígono militar de Tancos, são os exemplos mais expressivos da profunda crise moral e de identidade em que o Estado português se encontra atolado, e que extravasa o plano financeiro.

Talvez este poema possa trazer algum alento e conforto ao cidadão comum e demovê-lo de desistir.

 

Portugal morreu,

a minha Pátria, não!

 

Portugal morreu!

 

Jaz morto às mãos da corrupção

e das teias que ela teceu

 

A minha Pátria, essa não!

 

A minha Pátria é o meu povo

a Língua que fala

a História que conta

a Verdade e a Democracia

e toda a sua poesia

 

A minha Pátria não é afronta

terreiro de paço

espaço de intriga e traição

políticos, banqueiros e outros vilões

os coveiros da Nação

 

A minha pátria é Camões

é Gama

Vieira e Pessoa

Santo António de Lisboa

do Quinto Império nostalgia

futuro que o povo reclama

 

É o meu Trás-os-Montes natal

suas lágrimas, suas fontes

meu Santo Graal

 

Portugal morreu

às mãos da corrupção

feito fogo e fumo

terra queimada

Nação emigrada

gente que chora

à procura de novo rumo

 

Portugueses, é agora!

 

(Este poema também poderá ser lido em: http://henriquepedro.blogspot.pt)

O triste sucesso de Pedrógão Grande

Todos os primeiros-ministros da história recente de Portugal já tinham larga experiência política e partidária quando ascenderem a esse cargo fundamental. Salazar à parte, que não é para aqui chamado, e Álvaro Cunhal que, felizmente, nunca ousou sê-lo, muito embora tenha andado lá por perto.
António Costa, o actual titular, é o paradigma, o padrão, o perfil que melhor se encaixa neste modelo, sobretudo agora que estamos em tempo de redes sociais.
E bem se poderá dizer que nasceu na política e para a política. A sua militância partidária é notável e a sua experiência como autarca insuperável, ou não tivesse dirigido o mais importante município do País. Os seus conhecimentos teóricos e prácticos de governação são igualmente de assinalar, já que exerceu, entre outros, o cargo de ministro do interior, precisamente, num governo chefiado pelo controverso José Sócrates.
Confrontado com a realidade trágica de Pedrógão Grande que aconteceu, com o pesar de todos nós, no momento em que a vida lhe corria surpreendentemente bem, com êxitos nas finanças, no futebol e nas cantigas, que partilhava com o seráfico e indefectível seu amigo presidente da república, António Costa disse que tudo funcionara bem, sem falhas, que fora um sucesso, portanto.
O mais certo é o primeiro-ministro ter ficado emocionalmente afectado com tão tristes acontecimentos. Tanto que nem se deu conta de que esse é o argumento do terror, a lógica dos que defendem que quanto maior é a tragédia maior é o sucesso.
Não haverá mesmo razões humanas, claras ou encobertas, para explicar tamanha desgraça, para lá da madrasta Mãe Natureza que sacrifica cruelmente os próprios filhos? Uma distração, um funcionário a menos na cadeia de prevenção, um plantador de eucaliptos que abusivamente os planta até à berma da estrada? Ou será que a culpa, para desgraça maior, deve ser imputada às infelizes vítimas que estavam no lugar errado, no momento menos conveniente?
António Costa, porém, não se ficou por aqui na sua perturbação. Sobre a questão fundamental que é a prevenção, o planeamento e o ordenamento, do território e das florestas rematou que é assunto para a próxima década.
Valha-nos Deus! Então há quantos anos anda António Costa na política? E em que se ocupou todo o tempo em que foi ministro do interior? Será que andou apenas a apagar incêndios?
António Costa é, portanto, justiça lhe seja feita, um primeiro-ministro paradigmático dos inúmeros que Portugal já teve, para desgraça dos portugueses.
Daqui a cinquenta anos, se Portugal ainda existir, haverá certamente um governo ainda a reflectir como pagar a dívida pública nos cinquenta anos seguintes. E talvez seja então mais fácil atacar o problema do planeamento e do ordenamento das florestas e da prevenção dos fogos florestais, quando já não houver mais florestas para arder nem portugueses para socorrer.
Assim se explica, e melhor se compreende, a razão pela qual os eleitores sistematicamente respondem com abstenção em massa: não encontram ninguém credível em quem votar.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.