Henrique Pedro

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Angola! É nossa!

Vale a pena recordar.

Ainda hoje ecoa nos

corações mais saudosos o acorde fundamental do hino heróico Angola é nossa, com que o regime deposto em 25 de Abril de 1974 ousou, com sucesso, mobilizar o país para a guerra iniciada em 15 de Março de 1961, quando a União das Populações de Angola (UPA), massacrou centenas de colonos brancos e trabalhadores negros, nas fazendas do café.

Muito embora a colonização tenha começado no séc. XV a delimitação formal do território só foi reconhecida na Conferência de Berlim, já em 1884.

Todavia, só a partir daquela data fatídica Angola passou a ser plenamente conhecida e a ser tratada como parcela inalienável de Portugal, como rezava a cantiga triunfalista.

E foi no decurso da longa guerra do Ultramar (na designação oficial portuguesa) que se lhe seguiu, (Guerra Colonial ou Guerra de Libertação, segundo os movimentos independentistas), entre 1961 e 1974, portanto, que se operou assinalável progresso daquele território africano, se outorgou aos autóctones a plena cidadania portuguesa e se aprofundou o afecto prevalecente entre portugueses europeus e angolanos.

Com o golpe de estado mi-

litar do dia 25 de Abril de 1974

e a revolução subsequente,

romper-se-iam definitivamen-

te as amarras de Angola à administração portuguesa, mas a

amizade atávica e os laços históricos e culturais que ligam angolanos e portugueses, e que

sobrelevam os pecados colonialistas intrínsecos, não se romperam.

Lamentavelmente, mal a

administração portuguesa

abandonou Luanda outros

países, com Cuba à cabeça, prefigurando obscuros projectos neocolonialistas, procuraram assenhorear-se de Angola, originando uma terrível guerra civil que entre 1975 e 2002 devastou o território e provocou milhares de vítimas. Angola deixava de ser Portu­gal mas, durante 27 longos anos, também não foi dos angolanos. Era terra de ninguém.

Drama que não terminou com o fim da guerra civil porque uma clique dirigente corrupta em que pontificava o clã Eduardo dos Santos, com a colaboração de cúmplices instalados em Portugal, transformou a úbere Angola numa sua coutada privativa.

Felizmente, surgem agora fortes sinais de que esse passado dramático está em vias de se transfigurar num mais justo e prometedor futuro, com a eleição em Setembro do ano passado do novo presidente João Manuel Gonçalves Lourenço, já aureolado de governante probo, pragmático e destemido e que contará com o apoio inequívoco do povo angolano, do MPLA e das Forças Armadas.

João Lourenço que, contrariando os maus augúrios de continuidade do regime político que José Eduardo dos Santos liderou durante 38 longos e sofridos anos, se afirma determinado a devolver Angola aos angolanos.

É este político que acaba de visitar Portugal dando a indicação de fazer uma leitura justa e correcta da História já que valoriza devidamente os afectos e afinidades que unem angolanos e portugueses.

A instauração de um genuíno estado de direito, o desenvolvimento e modernização e o combate eficaz à corrupção, que passa por Portugal, não são tarefas fáceis, porém. Oxalá que a Nossa Senhora da Muxima o proteja, que a obscura justiça portuguesa o não embarace e que o governo português lhe preste a melhor colaboração.

E os saudosistas que se compenetrem desta inexorável realidade: Angola não é nossa, contrariamente ao que proclamava a cantiga, mas o relacionamento de Portugal com Angola pode e deve ser muito mais que um mero jogo económico, porque as relações internacionais também se fazem de afectos e afinidades históricas e linguísticas.

Nesta perspectiva, a partilha de cidadania deveria ser uma prioridade política com benefício imediato e directo dos cidadãos de ambos os países. Sejamos práticos. E sonhemos.

 

Este texto não se conforma

com o novo Acordo Ortográfico.

 

Não! Não são todos iguais

O mais hilariante folhetim televiso dos últimos tempos transmitido directamente da casa da democracia, teve o seu ponto alto num arrojado número de funambulismo de uma senhora deputada que, em defesa ou condenação sabe-se lá de quê ou de quem, argumentou já não haver virgens lá no éden em que paira, donde se infere que os anjos, afinal, têm sexo, ainda que de género indiferenciado.

E se o que viu e ouviu é daquele teor imagine-se o que se passa nos bastidores da dita casa da democracia, atrás do cenário politicamente correcto.

Como se sabe, na democracia mais genuína os políticos, trate-se de ministros, de deputados ou simplesmente de comissários, seja qual for a sua ideologia ou graduação, são meros intermediários entre a vontade do povo e a governação. Em Portugal especialmente, não é bem assim. Comportam-se como uma casta parola usufrutuária de privilégios e impunidades obscenas que ela própria a si mesma se atribui. Representam o pior da Nação.

São essas as primeiras e principais causas do seu desprestígio e da desvirtuação da democracia.

Não é de espantar, portanto, que por tudo e por nada se ouça o povo nas ruas dizer, em jeito de desabafo: “ eles são todos iguais”. Mas será que são todos iguais como o povo afiança?

Pessoalmente entendo que

não, que muito embora a maior parte seja pior do que o que dela se diz, se tivermos em conta os raros que justamente se podem gabar de que desempenham os seus cargos de forma dedicada e honesta, melhor poderemos afirmar que não são todos iguais.

Não são iguais embora sejam igualmente maus porque sistematicamente silenciam, encobrem, branqueiam e habilidosamente relevam as tropelias e crimes de colegas e correligionários e das agremiações viciosas em que militam, sem distinguir credos, cores ou ideologias que, hoje em dia, por muito que custe aos prosélitos da esquerda e da ultraesquerda, não passam de mero palavreado, como a Geringonça o comprova.

E tanto assim é que a direita envergonhada corre mesmo o risco de vir a ser dispensada da democracia lusitana porque a esquerda gabarola faz o trabalho por ela.

Atente-se no degradante arraial de mentiras e traições em que se transformou a Assembleia da República, nos abusos e atropelos à lei que lá se cometem, na desfaçatez e sobranceria com que os deputados tratam a Nação.

E não são apenas maus e desonestos quando se dão ao desplante de faltar ao trabalho e de garantir a senha de presença de forma fraudulenta. Ou quando viciam as moradas para obterem chorudas ajudas de custo. Ou quando se organizam em comissões de transparência que apenas transparecem cinismo e hipocrisia.

São-no sobretudo quando, embora tendo consciência das deficiências do regime, da lei eleitoral fraudulenta ou da justiça coxa, por exemplo, não mexem uma palha para se congraçar e reformar o que deve ser reformado.

É o mexes! É o reformas! Estão como peixe na água nesse ambiente falso e vicioso que é o principal foco gerador de populismos, sendo que o pior é o populismo do poder, pai de todos os demais.

Os Trump e os Bolsonaro que cresçam e apareçam, portanto. Os deputados portugueses cá estão para os destratar, lá nas américas ou caso se atrevam a vir para cá.

Com excepção do déspota venezuelano que continua a ter o afecto silencioso dos deputados da Geringonça e, o que é mais surpreendente, da patética e desnorteada direita lusitana.

Será que o povo tem mesmo razão quando diz que eles são mesmo todos iguais?

 

Este texto não se conforma

com o novo

Acordo Ortográfico.

A invenção de Trás-os-Montes

Custa a acreditar mas é verdade: para os machuchos políticos Trás-os-Montes não existe. Não passa de uma invenção, que o mesmo é dizer de um mito, de uma fantasia, de uma lenda. É produto malsão de sentimentos e tradições cantadas e decantadas por poetas e emigrantes saudosistas transtornados pelo isolamento secular que preservou estranhos usos e costumes sustentáculos de uma fictícia identidade sem relevância nacional.

É por isso que Trás-os-Montes é sistematicamente tratado com mentiras e desdém.

Muitos transmontanos ainda acalentaram a esperança de que Trás-os-Montes, na proposta de regionalização que foi rejeitada no referendo de 1998, pudesse converter-se numa região administrativa. Foi toca donde não saiu lebre ou raposa, porém, pelo que a caça continua a monte.

Assim sendo, Trás-os-Montes é uma coutada livre, uma pobre província, berço do maior número de emigrantes do país e que mais sofre com o desgraçado despovoamento que afecta a maior parte do território nacional.

Uma província mal-amada, maltratada, abandonada, desprezada. Uma mãe que não merece os filhos que tem, (que me perdoem Torga e outros que tais e tão raros eles são), residentes ou ausentes, legítimos ou enteados. Principalmente os deputados, os autarcas e os muitos transmontanos ingratos que nos últimos anos tomaram poiso nos governos da Nação.

Uma pobre província, não uma província pobre, note-se bem, como melhor falam os seus vales e montanhas, os seus recursos humanos, hídricos, agrícolas, minerais e as suas potencialidades turísticas.

Tudo isto é revoltante mas é a triste verdade do presente. Quem não acreditar que leia o artigo intitulado “Se ainda não sabe onde fica o interior do país, nós dizemos-lhe”, que o jornal Expresso publicou na sua edição do dia 2/11/2018 que revela dados altamente significantes sobre o estado do país.

Ficará a saber, se ainda o não sabe, que em dois terços do território continental vivem apenas 20% (um quinto) dos habitantes do país. Esse é o tal “interior”. Território a mais, certamente, para os nossos sábios governantes que só se contentarão quando não houver gente a lá morar.

Dados elaborados pela Associação Nacional de Municípios e ratificados pelo Governo em 13 de julho de 2017, (continuo a citar o Jornal Expresso), quando ainda não tinha passado um mês sobre os incêndios dramáticos de Pedrógão e ninguém imaginava que a tragédia se haveria de repetir três meses mais tarde.

O mais chocante para os transmontanos, porém, será constatar que dos 1856 projetos de investimento aprovados para 159 concelhos do dito interior, apenas 142 projectos dizem respeito a Trás-os-Montes, orçando pouco mais de 190 milhões de euros, apenas 10% da verba destacada para o atrás citado interior que é de 1,9 mil milhões. A disparidade será, naturalmente, mais escandalosa ainda se compulsarmos este valor com o investimento público nas áreas metropolitanas de Lisboa e Porto.

De assinalar que, neste quadro, citando apenas os mais significativos, Bragança tem aprovados 35 projectos representando cerca de 72 milhões, o que é positivo, mas Chaves apenas 15, que recebem parcos 13 milhões, Vila Real 26 projectos com 10 milhões e Mirandela apenas 9 projectos cobertos pela módica quantia de 2,7 milhões, 27 vezes menos que Bragança, portanto.

Na cauda estão Vinhais com apenas 1 projecto que vale 201 mil euros, Boticas com 1 projecto também, que vale 19 mil euros e Freixo de Espada à Cinta com 1 projecto, também, valendo ridículos 10 mil euros. Alfândega da Fé e Vila Flor não têm projectos aprovados, vá-se lá saber porquê.

É este o Trás-os-Montes que os políticos patriotas que governam Portugal inventam a cada ano.

Não será que os deputados e autarcas transmontanos andam mansos demais?

 

Este texto não se conforma

com o novo Acordo Ortográfico.

 

A cereja no topo do bolo da infelicidade nacional

O Orçamento de Estado para 2019, ainda que melhor sirva como orçamento das Áreas Metropolitanas de Lisboa e do Porto, é a coroa de louros, reiterada, do primeiro-ministro senhor António Costa.

Todavia, também ao senhor Jerónimo de Sousa e à senhora Catarina Martins são devidas loas porquanto, não fora o empenhamento destes dois anjinhos da guarda da Geringonça (que não se coíbem de dar bicadas na mão que lhes dá o milho), e o Orçamento de Estado para 2019 tresandaria injustiça e desumanidade, com toques de hossanas ao deus défice.

De facto, fica-se com a ideia, credível em parte, de que se não fossem os heroicos sacrifícios ideológicos do PCP e do BE, o governo do senhor António Costa, no que diz respeito à exploração da classe operária, à promoção da morte prematura de reformados, à escravatura dos funcionários públicos e à austeridade dos serviços básicos do Estado, ultrapassaria o que os mesmos disseram do governo do senhor Passos Coelho, o fiel servidor da Troica que, apesar de tudo, teve o mérito de governar um país que o senhor José Sócrates deixou nas ruas da amargura e às portas da bancarrota.

Nada disto garante, porém, que hipotéticos governos patrióticos dos atrás citados PCP e BE, não converteriam Portugal em algo bem pior, num modelar paraíso socialista de figurino cubano ou venezuelano. Se governassem a sós, claro está.

Também ficamos sem saber se a Geringonça teria sido possível no advento da Troica ou como governariam o senhor António Costa e o senhor Mário Centeno naqueles tempos de vacas magras e, o que é mais importante, se os portugueses poderão contar com o talento desses dois ilustres governantes e com a generosidade do senhor Jerónimo de Sousa e da senhora Catarina Martins se uma nova crise estalar, o que não é de todo improvável. Mais provável será o povo voltar a chamar a tão mal afamada “direita” para governar, como é óbvio.

Uma coisa é certa, porém: Portugal, por força do parco crescimento da sua economia e não só, vai continuar na cauda da Europa, condição que a mediocridade relapsa dos políticos lusitanos transformou numa fatalidade.

Mesmo assim, a sábia governança do senhor António Costa, que muito tem beneficiado da favorável conjuntura económica internacional (o que em nada diminui o mérito do ministro das Finanças), dos abraços solidários do PCP e do BE e da mão amiga da CEE, bem lhe poderá propiciar, a ele, António Costa, a tão ambicionada maioria absoluta.

Considerando também que, quanto à verdadeira oposição, bem pode o senhor António Costa dormir descansado por mais que a senhora Assunção Cristas o irrite e tire do sério e enquanto os ceguinhos do PSD caminharem em direcção ao barranco, aos tropeções.

A verdade, porém, é que a governança do senhor António Costa, apesar de bafejada por muitas dóceis e anafadas vaquinhas tem sido uma continuada desgraça. Basta olhar para Pedrógão, para Monchique, para Tancos, para o Serviço Nacional de Saúde, para a Justiça, para o Ensino, para a Defesa Nacional e para a imparável dívida pública.

Sem falar da crise demográfica, da pobreza crónica, do despovoamento do interior, do combate à corrupção e ao crime económico e da reforma de leis estruturais como a sejam a eleitoral ou da Justiça. Lixo graúdo que o senhor António Costa sorrateiramente vai varrendo para debaixo do tapete.

A maioria absoluta do PS, a verificar-se, será a cereja no topo do bolo da crónica e sistémica infelicidade nacional. Com ela os militantes mais ferrenhos do partido do Rato verão realizado o seu velho sonho de reduzir Portugal a um egrégio Clube Socialista, (uma família alargada, quiçá), em que os seus membros mais proeminentes, por mais mea-culpas que façam, se darão ao desfrute de surfar e caçar, alegres e livres, nas praias e coutadas da Administração Pública.

Os portugueses que se cuidem.

 

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico

 

A odisseia de Tancos

Ainda sobre o famigerado assalto aos paióis do polígono militar de Tancos somos levados a concluir que o bom povo continua a ser endrominado.

Tal como o senhor Azeredo Lopes, ministro da Defesa ao que parece, que só agora ficou a saber que sabe ainda menos do que julgava que sabia, agora que foi acusado pelo seu subordinado senhor Vasco Brazão, major de infantaria e ex-porta-voz da Polícia Judiciária Militar, de ter sido por ele informado da já lendária operação de recuperação do material roubado.

 Não é de admirar, portanto, que o senhor Azeredo Lopes, ministro da Defesa, ao que parece, tenha jurado a pés juntos que é tudo mentira porque ele de nada sabia.

Também o senhor coronel Luís Augusto Vieira, director-geral da Polícia Judiciária Militar e chefe do senhor major Vasco Brazão, diz que também ele não sabia de nada porquanto se limitava a mexer em papéis. Era um simples amanuense, portanto.

Já o senhor tenente-general António Martins Pereira, chefe de gabinete do senhor ministro Azeredo Lopes à altura, declarou, por escrito, que não lhe “foi possível descortinar qualquer facto que indiciasse qualquer irregularidade ou indicação de encobrimento de eventuais culpados do furto de Tancos”, donde se depreende que terá tomado conhecimento dos factos muito embora neles não tenha notado irregularidades.

Em contrapartida, entidades políticas de topo, no poder ou na suposta oposição, que não importa aqui enumerar por irrelevantes, vieram a público declarar ou insinuar que sobre os factos vertentes sabiam muito mais mas que nada diziam. Cala-te boca!

Tudo muito estranho, ridículo e preocupante sobretudo porque o ignorante mor nesta comédia burlesca tutela uma organização alienígena que dá pelo nome de Polícia Judiciária Militar. E também porque, embora sendo certo que “militar” e “judiciária” nem em poesia rimam lá muito bem, tal polícia alguma utilidade deve ter, para lá de representar a charla “A Guerra de 1908”, do imortal Raul Solnado.

É aqui que a porca grunhe e torce o rabo: saber o que é na verdade a PJM e para que serve, saber quem sabia e quem não sabia o que a PJM andava a fazer, saber quem mente e quem fala verdade e até que nível do poder a mentira subiu e a incompetência desceu e alastrou.

Uma coisa é certa, porém: perante uma tão grave ameaça à defesa nacional (em causa estava material de guerra suficiente para paralisar a capital de qualquer república das bananas, designadamente Lisboa), o senhor Azeredo Lopes, ministro da Defesa, de pronto deveria ter accionado todos os serviços secretos e policiais, civis e militares, nacionais e internacionais, coordenado acções com outras entidades, designadamente com o seu colega ministro do Interior, exigido relatórios diários e informado o primeiro-ministro e o próprio presidente da república, precavendo qualquer acção violenta com impacto nacional.

Pelos vistos assim não terá acontecido. O senhor Azeredo Lopes, suposto ministro da Defesa e todo o Governo, ter-se-ão mantido olimpicamente distraídos, a ver o filme sentados no sofá, desleixando uma emergente e séria ameaça à democracia e à soberania nacional.

Permitiram e tacitamente autorizaram, portanto, que meia dúzia de iluminados chico-espertos, a coberto duma surrealista PJM, ousassem salvar a pátria borrando a honra do convento.

Enfim. Dá para perceber, embora a procissão ainda vá no adro, que se tratou dum hino à irresponsabilidade e à incompetência! Duma odisseia de polichinelos que vai ficar nos anais da nossa história recente.

É caso para o povo ir para as portas do palácio de Belém gritar, com as mãos em concha: Senhor presidente da República, olhe que andam a gozar consigo e com os portugueses!

Confirma-se que a pátria está bem entregue!

 

Este texto não se conforma com

o novo Acordo Ortográfico.

 

Da fama não se livram

A não recondução de Joana Marques Vidal no cargo de procuradora-geral da república ainda vai dar muito que falar.

Poderia não ter passado de um normalíssimo acto administrativo, bastando, para isso, que o senhor Marcelo Rebelo de Sousa, presidente da República e o senhor António Costa, primeiro-ministro, não obstassem a que Joana Marques Vidal continuasse a cumprir a sua missão com o acerto com que o vinha fazendo.

Mas não! Optaram por transformá-lo no acontecimento político mais noticiado, comentado e criticado dos últimos tempos o que, por si só, muito diz da sua importância e do impacto negativo que teve e vai continuar a ter na opinião pública e, por antipatia, na atribulada vida do Regime.

É claro que o senhor Marcelo Rebelo de Sousa, tristonho, acabou por ficar muito mal no auto-retrato que partilhou com o sorridente senhor António Costa. Tratou-se, seguramente, da selfie mais enigmática e cinzenta do mandato do presidente da República, podendo mesmo ficar registada na História como o retrato fatal do regime.

Certo é que Presidente da República e Primeiro-ministro, matreiros, fizeram caixinha o tempo todo, deram sinais contraditórios, ouviram quem quiseram e o que não gostaram, mas acabaram por decidir contrariamente aos sagrados interesses da justiça e da democracia, na opinião dos mais categorizados analistas.

É o que se deduz, de resto, das explicações falaciosas que publicamente apresentaram, sem argumentos jurídicos bastantes e com potencial prejuízo da sacrossanta luta contra a corrupção que ironicamente dizem privilegiar.

Não é de admirar, portanto, que nas ruas se ouça muito povo murmurar que se mancomunaram para eventualmente favorecerem certos amigos e correligionários, no presente e no futuro. Da fama não se livram.

Por isso, a opinião pública, apaixonada, vai continuar a julgá-los, habilitada agora pela nova procuradora-geral da república. Se Lucília Gago demonstrar suficiente isenção, lucidez e coragem converter-se-á na pedra de toque que aferirá da pureza do ouro da verdade e boas intenções que nortearam o Presidente da República e o Primeiro-ministro.

Se, pelo contrário a sua determinação e independência soçobrarem funcionará como caixa-de-ressonância de todos os ruídos, suspeições e maledicências que já andam no ar e de tudo o mais que entretanto venha poluir a atmosfera política, muito embora o desempenho de Lucília Gago seja principalmente avaliado pelos potenciais processos escandalosos que ela própria desenterrar ou definitivamente abafar.

Matérias explosivas que poderão abalar os alicerces do próprio Regime dado que a animosidade da grande maioria dos cidadãos se aproxima de níveis altamente preocupantes.

A esmagadora maioria dos cidadãos não controlados partidariamente vai estar, por certo, particularmente atenta ao evoluir dos acontecimentos, de olhos e ouvidos focados no desempenho da nova procuradora-geral da república e de facas afiadas para justiçar as figuras públicas reinantes que durante este tempo todo se constituíram como réus, coniventes, colaboradores ou simplesmente encobridores de actos de corrupção.

Maioria que começou por encarar tais actos com gozo, ironia e diversão, mas que agora está mais compenetrada e crente de que tem sido sistematicamente ludibriada e prejudicada, o que a torna vulnerável a perigosos populismos e radicalismos.

O senhor Marcelo Rebelo de Sousa, Presidente da República, o senhor António Costa, Primeiro-ministro e seus afins, que se cuidem.

 

Este texto não se conforma com o novo

Acordo Ortográfico.

Uma revolução de veludo na democracia portuguesa.

Não foi por acaso que Joana Marques Vidal, procuradora-geral da república em fim de mandato, granjeou o prestígio que na verdade tem, malgrado a maioria dos portugueses não manifeste igual apreço pela Justiça nacional.

De facto, todos que acompanham atentamente os processos de maior impacto político e social unanimemente reconhecem que nos quarenta e quatro anos que o actual regime político já conta, nenhuma outra personalidade desempenhou tão melindroso cargo com tamanho bom senso, coragem e competência.

Conforme o Relatório da Democracia de 2018 o comprova, Portugal continua a ser um problemático estado de direito que privilegia os grandes corruptos, farsantes e falsários a quem permite que toureiem a Justiça na praça pública, livremente, em liberdade e por tempo indeterminado. E para gáudio popular. Situação que é favorecida pelas mais altas instâncias políticas ainda que cinicamente se mostrem desagradadas mas nada façam para corrigir a situação.

Isto é tanto mais surpreendente quanto é a autodenominada “esquerda” que agora manda no país enquanto a dita “direita”, nesta como noutras matérias fundamentais, a si mesma se enjeita.

Joana Marques Vidal, muito embora não deva ser tomada como a redentora da Justiça e muito menos do Regime, cumpriu a sua missão serena e diligentemente, com exemplar sentido de Estado, total independência, isenção e imparcialidade. Acima de tudo demonstrou ter lucidez e coragem suficientes para não se vergar a poderes obscuros e, contrariamente ao que era hábito, não favorecer habilidosamente ninguém.

Trata-se, portanto, de uma personalidade rara no cenário triste e sombrio da vida pública nacional, de uma magistrada com acendrado espírito de missão, que se destaca na classe a que pertence, que tão desprestigiada foi pelos seus antecessores, apesar das muitas e boas oportunidades que tiveram para mostrarem o que valem.

O mandato de Joana Marques Vidal, porém, está a chegar ao fim, pelo que mais se adensa o temor no espírito dos portugueses, em sobressalto desde que ministra da justiça, com intuitos obscuros e despropositados, fez saber que não era intenção do Governo reconduzi-la no cargo.

Também porque, como é público e notório, importantes machuchos do PS se batem por um novo procurador-geral da república mais dócil e moldável aos interesses obscuros em que estarão, directa ou indirectamente, enredados. Indícios e suspeitas que infeccionam o espírito do eleitorado, se distendem e ensombram a ambicionada maioria absoluta do PS, assustadora e pouco recomendável no presente contexto.

É certo que ninguém é insubstituível. Os cemitérios, sobretudo aqueles em que repousam figuras famosas estão a abarrotar de insubstituíveis mas a História nunca parou.

Em qualquer caso, a não recondução de Joana Marques Vidal na procuradoria-geral da república, não havendo impedimentos formais para tal, mais avolumará as suspeitas e descréditos que muito incomodam o PS directamente e o primeiro-ministro por reflexo e que se traduzirá, inevitavelmente, em pesados custos eleitorais.

Tratar-se-á, para lá do mais, de um péssimo serviço que o governo prestará à democracia, à esquerda e ao país e que só poderá ter como intuito fazer abortar a verdadeira revolução de veludo que Joana Marques Vidal em boa hora, honra lhe seja feita, desencadeou na justiça e, por via dela, no próprio regime.

Revolução que deve ter continuidade, custe o que custar e doa a quem doer.

 

Milhões ao Panteão, já!

O Panteão Nacional, fundado em 26 de Setembro de 1836, nunca demonstrou ter suficiente préstimo material ou imaterial. Por isso os responsáveis agora lhe franqueiam as portas para eventos de maior aparato e mais requintada etiqueta, ainda que continue a haver interessados em povoá-lo com fantasmas e mitos da sua estima privada.

Está instalado na Igreja de Santa Engrácia, em Lisboa, cidade que já foi capital de um império pioneiro da mundialização e campeão do humanismo (que muitos lamentavelmente persistem em vilipendiar), destinando-se, de acordo com as Leis que o regulamentam, a “homenagear e a perpetuar a memória de portugueses que muito se distinguiram por serviços prestados ao País, no exercício de altos cargos públicos, altos serviços militares, na expansão da cultura portuguesa, na criação literária, científica e artística ou na defesa dos valores da civilização, em prol da dignificação da pessoa humana e da causa da liberdade”.

Lisboa que está transformada numa desvairada estância turística, pouso oficial de presidentes, ministros e deputados de uma paradoxal república popular, sem lei nem grei, que definha a olhos vistos por mais que o balão da economia infle, com a maior parte do território a ser pasto de chamas e votado a imparável processo de ermamento.

Lisboa que aboca as mais afamadas cabeças pensadoras da política e das artes nacionais, em que pontificam destacados activistas mais moralistas que o Papa, que procuram impor-se aos demais com todas as artes e manhas, se arvoram em donos exclusivos da democracia e que tentam reescrever a História a seu bel-prazer, como o atestam as movimentações públicas para impor os novos inquilinos da Igreja de Santa Engrácia, ao arrepio da Nação.

Acontece que a verdadeira homenagem e perpetuação da memória dos heróis mais genuínos é feita nos pergaminhos e tratados históricos, pelo povo que os admira e reverência, que preserva as suas obras, lê os seus livros, canta as suas músicas, enaltece e beneficia dos seus feitos. Acresce que os verdadeiros heróis demoram um certo tempo a consolidar-se e a libertar-se da mesquinhez dos vivos.

A glorificação ou denegação das personalidades históricas relevantes não pode ser desígnio subterrâneo de partidos políticos, sinédrios, clubes de futebol, associações amadoras e tertúlias, nem resultar do entusiasmo efémero de uns tantos correligionários.

Não contesto o valor das personalidade representadas no panteão de Santa Engrácia embora questione a justeza do mérito de algumas delas para tanto, considerando as que são presentemente apontadas, o que também me leva a estranhar que os brilhantes humoristas nacionais não reclamem um cenotáfio do Zé Povinho, tal qual o imortalizou o seu criador Raphael Bordallo Pinheiro. Sem tirar nem pôr, manguito incluso.

E, a ser verdade que as escolhas obedecem a ditames partidários, clubistas ou a afectos pessoais, pergunto: porque não introduzir também um critério regionalista?

E por que razão não foi ainda conferido tão enaltecido privilégio a Aníbal Augusto Milhais, o mítico soldado Milhões, já que heroicidade a teve de sobejo e os seus feitos transbordaram as fronteiras nacionais? Terá sido por ser transmontano? Por ser soldado raso? Porque mal sabia ler e escrever? Ou pura e simplesmente porque não cantava fado?

A resposta, portanto, só poderá ser: Milhões ao Panteão e já!

Desculpem-me. É o brio de ser trasmontano a falar, o desejo de que Trás-os-Montes de uma vez por todas deixe de ser tratado como uma cortinha e os transmontanos olhados como hortelões, emigrantes in-

veterados, carne bruta para ca-

nhão.

 

Este texto não se conforma com

o novo Acordo Ortográfico

 

Portugal tem, finalmente, uma PFF

Portugal tem, finalmente, uma consequente Política de Fogos Florestais (PFF) que já rendeu catástrofes, negócios chorudos e empregos catitas a bafejados pelo Regime.

Tudo isto depois que foram sacrificados milhares de portugueses, considerando mortos e feridos, imolados milhares de animais indefesos, queimados milhões de hectares de floresta, pomares e hortas e destruídas centenas de fábricas e de lares.

Quer se trate de fogos postos ou não, somos levados a concluir que os crimes recaem, sobretudo, em quem nos últimos tempos tem governado esta desditosa Pátria, já que a verdadeira causa de tamanha desgraça é a reiterada má governação.

Tudo isto depois que os doutos deputados da Assembleia Nacional de São Bento da Porta Fechada, durante anos a fio passaram por este magno problema como cães por vinha vindimada, como sói dizer-se. Isso fazem, de resto, com os maiores desafios que a Nação enfrenta, como sejam a emigração, a crise demográfica, a pobreza ou as assimetrias regionais, mais interessados que estão em saldar as dívidas dos seus partidos e em garantir as suas próprias mordomias e privilégios.

O contínuo “show off” televisivo do primeiro-ministro, do ministro do interior e do segundo-comandante da Autoridade Nacional de Proteção Civil (ANPC), que arengam explicações técnicas politicamente correctas, tem conferido aparência virtual aos funestos fogos florestais, iludindo os portugueses conforme lhes convém.

A estrutura da ANPC é avassaladora: comandantes de tudo e de nada, muitos deles formados às três pancadas, sofisticados postos de comando, coordenação, controlo e comunicação que não respondem com a eficácia requerida, viaturas aos montões e aviões como mosquitos, enquanto povoações e matas continuam a arder, apesar da máquina infernal crescer sem critério nem limite. Felizmente não se registaram mortes em Monchique: como derradeiro recurso o Governo tratou de expulsar cidadãos dos seus próprios lares quando prioritariamente lhes deveria ter garantido a necessária segurança.

A ANPC já se afirma como um Estado dentro do próprio Estado: procura silenciar o Presidente da República, menoriza o Poder Local, canibaliza o Corpo Nacional de Bombeiros em cujas fileiras estão os verdadeiros heróis, marginaliza as Forças Armadas, induz nos espíritos a ideia de que tudo se resolve com mais aviões e mais bombeiros e converteu-se, desde a terrível tragédia de Pedrógão, na guarda pretoriana política do primeiro-ministro.

Tudo leva a crer, porém, que a menos que os deuses do clima sejam arregimentados, os fogos destruidores das florestas portuguesas irão continuar enquanto houver lenha para queimar. É esta Política de Fogos Florestais que o preconiza e a máquina apadrinhada pelo Governo que o exige.

Trata-se, em última análise, da política de terra queimada ditada pelos interesses obscuros do Regime vigente que está a reduzir o país a praias e turismo, concorrentemente com o ermamento do interior.

Depois de Pedrógão, Monchique foi demais. Um sucesso, imagine-se, no dizer do primeiro-ministro que, qual Nero lusitano, cantava vitória quando Monchique ainda ardia. Trata-se, isso sim, da mais relapsa incompetência, do mais habilidoso e descarado malabarismo político, da política mais desastrosa dos últimos anos.

Razões de sobra para o Primeiro-Ministro se demitir ou o Presidente da República dissolver a Assembleia da República. Assim seria numa democracia em a que a dignidade imperasse e o futuro da Nação fosse o interesse maior.

A Assembleia Nacional dos Partidos

No passado mês de Julho, no palácio de São Bento usurpado ao povo, reuniu a Assembleia Nacional dos Partidos, não a Assembleia da República como enganosamente foi noticiado, para mais um empolgante debate parlamentar, alegadamente sobre o estado da Nação.
Mais democrático seria se esses debates fossem feitos na praça pública, ao alcance da mão do povo, correndo-se embora o risco de haver impropérios, fruta podre, estadulhos e fueiros a voar desaustinadamente por tudo quanto é sítio. 
Voltando ao debate bem se poderá dizer que mais uma vez a montanha pariu um rato. Desde logo porque, como já vem sendo hábito, nestes conciliábulos partidários não é o estado da Nação que se debate, como enfaticamente a classe política pretende fazer crer. 
Tão pouco se debate o estado do Estado que é podre, como se sabe. Muito menos se debate o Regime purulento gerador dos miasmas que sub-repticiamente consomem o País, mas que, obviamente, privilegia interesses espúrios representados no próprio Parlamento. 
Também se não debatem a si próprios, os deputados, embora muito discutam entre eles. Cinicamente, por mais imorais e antidemocráticos que sejam os seus procedimentos e o dos partidos que os acoitam, continuam a postergar todas as leis que eventualmente os possam vir a condenar. 
Tudo isto leva o povo a alhear-se, lamentavelmente, da causa pública, com a desculpa sarcástica “eles ladram mas não se mordem”. Mordem-nos a nós, digo eu.
Quanto à música é sempre a mesma, a partitura clássica do costume: os apoiantes do governo entoam loas e hossanas gregorianas às medidas governamentais e os da oposição tocam pandeiros e sanfonas só para chatear. Com a particularidade inédita de uns quantos, esparramados entre o poder e o contra, soprarem pífaros pífios, que soam a falsete, sempre que alguma mosca os pica.
 Mesmo assim, a velhinha Nação portuguesa, ainda que entorpecida por tantos ilusionistas e charlatães, conserva apreciável sanidade e bom senso e não se envergonha do seu passado, por mais que certos iluminados inventores da pólvora, talvez com o único intuito de arranjar espaço nos gavetões do Panteão Nacional para os seus próprios fantasmas, agitem agora tenebrosas assombrações colonialistas, conspurcando o humanismo, o universalismo, a cultura e a fraternidade que os portugueses de antanho espalharam por esse mundo de Cristo além. Que sejam Vasco da Gama, Afonso de Albuquerque, Camões, António Vieira ou Francisco Xavier, a tratar deles.
Nação que é, desde há séculos, uma sociedade de massa, heterogénea, universalista, pacífica e solidária, embora nos tristes dias de hoje esteja a ser constantemente atraiçoada por governantes corruptos que impunemente cometem verdadeiros crimes de lesa-pátria. Por isso os portugueses sempre confiam que verdadeiros estadistas virão para reconduzir Portugal à senda da independência, da democracia e do progresso. 
Não foi, portanto, o estado da Nação que se debateu na mais recente Assembleia Nacional dos Partidos. Não foi a soberania do Estado, criminosamente desleixada, nem a defesa nacional, à mercê de ladrões de paióis, nem a dramática crise demográfica ou a crónica pobreza de milhares de portugueses, muito menos a segurança de bens e cidadãos diariamente ameaçada. 
Quando tanto há que debater, pensar e relançar, tantas e tão profundas reformas políticas e sociais, a reorganização da administração e dos serviços públicos e o aperfeiçoamento da democracia, os deputados dão prioridade a questões de lana-caprina, a benesses, aos subsídios e aos perdões das dívidas partidárias.
Engalfinham-se na discussão do estado da sua nação, a partidária, e do orçamento do seu estado, os partidos, abocanhando as medidas que maiores ganhos eleitorais lhes garantam.
Quando o estado político da Nação é de sonolência e patética abstracção, o estado do Estado é de deboche e sedução de oportunistas e ladrões, o estado do Governo periclitante e o da economia nacional de deslumbramento, os deputados da Assembleia Nacional dos Partidos não discutem nem a Pátria, nem a Nação, porque não é a Pátria nem a Nação que eles servem. 
Ai se o Povo-Nação acorda!