Henrique Pedro

PUB.

Na hora da morte do pai do Regime

O seu corpo baixou à terra mas Mário Soares vai continuar na História de Portugal ao lado de António Salazar e de Álvaro Cunhal, isto é, andará na berlinda sempre que o passado recente vier à baila.
Político peculiar, sem dúvida: cosmopolita, inspirado, espontâneo e folgazão. Tinha todos os defeitos dos políticos portugueses e algumas raras virtudes que só muitos poucos possuem.
Não é de espantar, portanto, que o Regime, no passamento do seu mais conhecido demiurgo, se tenha engalanado com pompa e circunstância, que os machuchos políticos se tenham multiplicado em loas e larachas e que as notícias do evento tenham saturado os meios de comunicação social.
Na Sala dos Azulejos do Mosteiro dos Jerónimos, templo sagrado que serviu a odisseia dos Descobrimentos, teve lugar uma comovente manifestação cultural e social do mais alto gabarito e simbolismo, exultação da família eterna e universal, esplendor de sucesso e virtude. A família Soares, no caso vertente, ganhou assim especial relevância na hora da morte do seu patriarca, republicano, socialista e laico.
Depois, fazendo lembrar tempos de glória imperiais, muito embora se não aclamasse rei ou herói de campanhas ultramarinas, nem o povo tenha comparecido em peso como se pretendia, o féretro percorreu, em dia enublado, as ruas de Lisboa, que continua a ser cidade de muitas e desvairadas gentes.
Povo que lamentavelmente se manifestou mais veementemente nas redes sociais com invariáveis comentários, injustos e soezes, que em nenhuma circunstância merecem ser aplaudidos.
Admirado por muitos, detestado talvez por mais, que justa ou injustamente se sentem lesados pela sua acção, Mário Soares marcou indelevelmente o Regime vigente, desde logo com o seu decisivo contributo para a sua formatação.
Os seus mais exacerbados detractores julgam-no, erradamente em meu entender, traidor, mas os seus admiradores mais esclarecidos consideram-no o heróico “pai da democracia”, ou do “regime”, epíteto que segundo certos cronistas, o próprio recusava.
O que me leva a evocar o velho aforismo popular que diz que quando a criancinha nasce linda e escorreita não falta quem queira ser o pai, mas quando é feia e disforme ninguém assume a paternidade. Poderá ser é o caso.
Mário Soares teria a percepção de que o Regime que ajudou a erguer se revelou laxista, corrupto e gerador de crises e desigualdades, contrariamente ao pretendido. Compreende-se que não lhe tenha caído no goto tal título, portanto.
A verdade é que Mário Soares se agigantou na resistência à ditadura comunista que ameaçava amordaçar a democracia nascente e foi o maior obreiro da integração de Portugal na Comunidade Europeia, malgrado os desencantos que a União hoje em dia motiva.
Não foi de Mário Soares que o povo se alheou na hora da sua morte. É com o Regime de que Mário Soares foi o principal inspirador que o povo anda de candeias às avessas.

Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.
 

O que faz falta é avisar a malta

A algazarra em torno da pretensa salvação, ou enterro definitivo, da Caixa Geral de Depósitos, é ainda descomunal e promete continuar. Os portugueses, porém, já anteriormente assistiram a outros concertos desafinados do Governo e das ruidosas bandas partidárias, a propósito do BPN, por exemplo, cujos acordes marciais ainda não esmoreceram por completo. Contudo, o ruído causado pela CGD ultrapassa tudo que imaginar se pode, porque ganhou a dimensão de um antipatriótico desconcerto regimental. 
A parafernália de violinos, címbalos, clarins, bombos, trombones, gargarejos e pandeiretas que os políticos e afins tocam a seu bel-prazer, ao mesmo tempo e sem maestro, só tem conseguido azucrinar o povo e desviar a sua atenção daquilo que verdadeiramente importa. Talvez seja isso mesmo que tais senhores pretendem. Até os acordes de piano que se fazem ouvir lá para os lados de Belém já sabem a papel de música.
O povo está mais que farto dos ruídos celestiais desta democracia cega, surda, viciosa e barulhenta, sobretudo porque ninguém lhe diz onde foi e vai parar tanto dinheiro e quanto mais lhe vão extorquir.
Povo que continua sem saber que descaminho levaram os muitos milhares de milhões de euros que a Administração Pública sonegou aos salários e às poupanças domésticas, e que não utilizou ou não acautelou devidamente. Milhões que os governantes malbarataram ou permitiram que fossem rapinados dos cofres do Estado, às escâncaras ou sorrateiramente.
Muitos milhões que faltam à Economia, à Educação, à Justiça, à Segurança Social, à Saúde e à Defesa Nacional. Milhões que escorreram para os cofres de bancos falidos, luvas, subornos, cambalachos, bolsos, chapéus e sobretudos.
Onde param tantos milhões, afinal? Os portugueses continuam sem saber e esse sagrado direito continua a ser-lhe sonegado. Embora haja governantes, altos funcionários, gestores de topo e líderes partidários que, pelos vistos, até sabem, porque quando se trata de atacar despudoradamente os adversários não se coíbem de lançar mão, a torto e a direito, dos argumentos do crédito malparado, dos paraísos fiscais, das contas suíças e da falta de controlo do Estado e das entidades reguladoras. 
E não deixa de ser muito estranho que políticos ditos de esquerda, que tão ciosos são da sua pretensa superioridade moral, avalizem a escandalosa desigualdade salarial da CGD e silenciem, ruidosamente, estas verdades a que o povo tem direito, acabando por despistar a luta eficaz contra a corrupção de Estado. Deixem-se de “hard rock” festivaleiro, portanto. 
O povo quer que o Governo, os partidos que o apoiam e a oposição, de uma vez por todas, toquem afinados e ao som do Hino Nacional, uma indispensável auditoria, ampla, independente e consequente à CGD, e não só. 
O que faz falta é avisar a malta. É dizer ao povo onde pára o dinheiro e quanto mais lhe vão extorquir. Tout court.
 
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico

«O Arreda»

Sondagem recente da confiável Universidade Católica coloca o PS à beira da maioria absoluta, com 43 % das intenções de voto, enquanto o PSD, com apenas 30%, resvala, aflitivamente, para o seu mínimo histórico.
Bem mais distanciados, ainda assim, surgem o BE, com 8%, e o CDS-PP e a CDU, que apenas recolhem desmoralizadores 6%, cada.
Quanto às duas principais personalidades políticas ficamos a saber que Marcelo Rebelo de Sousa recolhe impressionantes 97% de avaliações positivas e António Costa 81%.
É certo que sondagens há muitas e com propósitos diversos, muitas vezes bem divertidos, até. Umas são feitas no ar para previsão meteorológica, outras são líquidas e muitas são subterrâneas como certos estudos de opinião eleitoral que os políticos depreciam quando não lhes são favoráveis ou não tanto assim se lhes agradam.
Não é de admirar, portanto, que esta sondagem da Universidade Católica tenha deixado Jerónimo de Sousa aos pinotes e António Costa com indisfarçável sorriso de orelha a orelha, não sendo difícil adivinhar porquê.
É evidente que a maioria absoluta do PS ditará o fim da “geringonça” sem apelo nem agravo, não havendo santo de esquerda que lhe valha, por melhores intenções que o BE e o PCP professem. Basta imaginar uma Assembleia da República com o PS sem necessidade de fazer cedências ao BE e ao PCP.
Naturalmente, ao Presidente da República não se percebeu qualquer reacção pública ou privada. A sua popularidade é verdadeiramente comovente o que nos leva a admitir que está a assumir a postura política mais acertada. Ainda que já haja quem diga, sobretudo do lado do PSD, que Marcelo Rebelo de Sousa se está a esticar demais na bênção de Costa e da “geringonça”, fazendo lembrar uma popular figura da monarquia, o Infante D. Afonso, irmão mais novo do rei Carlos I, que anedoticamente ficou conhecido pelo “Arreda”, porque corria pelas ruas de Lisboa, na sua primitiva viatura, gritando «Arreda, Arreda!», procurando que as pessoas saíssem do caminho.
No presente é o primeiro-ministro que vai ao volante mas é o Presidente da República que, sentado a seu lado, vai gritando «Arreda, Arreda!», tendo Catarina Martins e Jerónimo de Sousa como embevecidos companheiros no banco de trás da maravilhosa “geringonça”. Um quadro digno de Rafael Bordalo Pinheiro, sem dúvida.
Ironia à parte, em meu entender o Presidente Marcelo joga claramente no sucesso do Governo da “geringonça” para bem de Portugal, eventualmente por pensar que tal sucesso, traduzido na maioria absoluta do PS, fará com que a “geringonça” se desconchave sem tragédia.
Depois, só com o PS e PSD fortalecidos e purificados, se poderá concertar a reforma do Regime e do Estado que por bem se deseja.
Esperemos que o Presidente da República esteja certo e que a “geringonça” não acabe por atropelar as multidões indefesas e distraídas.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

 

Verdades e pós-verdades.

Temia-se, em Portugal e na Europa de que Portugal ainda não faz parte, que a “geringonça” fosse um tractor revolucionário, que de alguma forma viria pôr em causa a ordem estabelecida no que à União Europeia, à NATO e aos mercados financeiros diz respeito.
Os analistas mais entendidos, muitos dos quais agora se fazem desentendidos, auguraram, por isso, o pior desfecho para o seu desempenho, prevendo que Portugal seria forçado a um novo contrato de assistência com a famigerada Troika, ou coisa parecida.
O próprio ministro Centeno o admitiu quando declarou que faria tudo o que fosse necessário, sem especificar o quê, para evitar que tal acontecesse.
Mas não. A “geringonça”, afinal, não passa disso mesmo. De uma carroça política desengonçada puxada pelo PC e pelo BE, que se arrasta penosamente e com a qual o moleiro António Costa vai ganhando a vida, com a bênção do paizinho Marcelo.
É um tigre de papel, afinal, que com unhas e dentes defende um governo de minora absoluta, considerando que a abstenção é maioritária e que a oposição mereceu o maior número de votos. Acontece que a moda dos governos serem abocado por forças que perdem eleições parece estar a pegar nas democracias ocidentais.
Em Portugal tal só foi possível porque o PC e o BE, honra lhes seja feita, têm sido de uma docilidade exemplar. Meteram a viola no saco a troco de uns tostõezitos para os reformados e pouco mais. Reestruturação da dívida, abandono da moeda única, saída da CEE e coisas tais, que constituem os seus argumentos políticos principais, pertencem ao passado.
A verdade é que, contra todas as expectativas, a economia portuguesa circunstancialmente cresceu, o que não significa necessariamente que esteja a crescer, e os tecnocratas de Bruxelas, que ainda se não refizeram do murro no estômago que levaram com o Brexit, puseram de lado as sanções e deram luz verde ao orçamento português. Até mais ver.
Pelas mesmas razões a senhora Merkel e o seu ministro Schäuble andam tão enfiados.
Depois, ainda ninguém sabe que demónios vão saltar da caixa de Pandora que Donald Trump destapou, sendo certo que PC e BE não deixarão de aplaudir as diatribes contra a NATO e a CEE do seu inesperado aliado, o novo presidente americano.
Aparentemente Portugal segue no bom caminho. O doente que estava em estado comatoso pestanejou. Para quê mudar de políticas, portanto, argumentarão as almas da “geringonça”? Afinal a Justiça que temos funciona. A lei eleitoral serve plenamente a democracia que não temos, a lei autárquica idem, a Assembleia da República só dignifica a democracia, o País está bem como está, e a “geringonça” cumpre plenamente o seu papel.
Acontece que se trata de “pós-verdades” no sentido em que o dicionário Oxford de língua inglesa, que elegeu a expressão como palavra do ano de 2016, define. A verdadeira verdade é que as emoções e as crenças pessoais contam mais na formação da opinião pública do que os factos objetivos.
E o que verdadeiramente importa é segurar o poder e partilhar mordomias com os comparsas.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Golpe de Estado em curso.

O processo de destruição de Portugal já vem de longe, muito embora ninguém possa lucidamente defender que começou com a queda da Monarquia e a consequente implantação da República e muito menos com a perda das colónias.
A culpa também não deve ser assacada aos revoltosos capitães de Abril, que não passaram de meras marionetes no contexto histórico, com é evidente.
Também a nebulosa constituição do actual governo da geringonça, amplamente legitimado em sede da Assembleia da República, não poderá ser vista numa perspectiva negativa de liquidação da pátria portuguesa. O fenómeno é bem mais complexo e subtil.
Os inimigos de Portugal, aqueles que estão verdadeiramente interessados em destruir a secular nação portuguesa, têm vindo pacientemente e com raro engenho, a aproveitar-se de todas as circunstâncias propícias para levar a água ao seu moinho, desde logo valendo-se dos males de que a sociedade portuguesa enferma e à boleia do processo de instauração do regime democrático e dos esforços de modernização do País. Assim é que ousaram arruinar o Estado e desfigurar a Democracia, de que só já resta uma máscara de comédia.
As evidências são muitas e variadas, os indicadores económicos e sociais amplamente demonstrativos e, acima de tudo, os portugueses sentem-nas bem fundo na própria pele. Nem vale a pena falar na dívida pública incomportável, na corrupção desenfreada, nos impostos desregrados, na fatia substancial dos dinheiros públicos que é abocanhada pela Banca, na imigração massiva de quadros qualificados, na perda de soberania ou na humilhação a que Portugal é todos os dias submetido nas instâncias comunitárias.
Já no que à CGD diz respeito, nenhum governo de direita seria capaz de fazer o que este governo de esquerda está a fazer, porque o PC, o BE e os sindicatos já teriam posto o país a ferro e fogo.
CGD onde se trava uma luta feroz e está em curso um verdadeiro golpe de Estado, com a super poderosa nova administração saída da mais fina flor capitalista a exigir vencimentos e regalias imorais e a impor um modelo de salvação do banco público que implica milhares de milhões do erário público, condiciona decisivamente o Orçamento de Estado e o próprio Programa de Governo.
Super poderosa administração que sobranceiramente agora bate o pé e se recusa a entregar a constitucional declaração de rendimentos, sabe-se lá porque obscuros motivos, sendo de admitir que, na passada, venha a determinar a alienação do Banco público, que é o mais certo.
Perante isto o primeiro-ministro socialista desembaraça-se das responsabilidades que lhe cabem remetendo-as para o Tribunal Constitucional, o PS não sabe para que lado se virar, o PSD dá uma no cravo e outra na ferradura, o PCP engole sapos, cobras e lagartos e o BE já ultrapassa o CDS pela direita.
Aos portugueses, que continuam a ser humilhados e ignorados, apenas resta continuarem a sublevar-se silenciosamente, pela via da abstenção massiva.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Mecenas e mercenários.

Entre nós, sabe-se lá porque perversos sortilégios, os governos, por regra e sem pudor, subordinam-se aos banqueiros em particular, mas não só.
É o poder político que se submete ao poder económico com prejuízo do desenvolvimento coeso e coerente do País, assim se explicando que o interior rural esteja cada vez mais pobre e ermado, quando deveria ser o contrário, como a Constituição preconiza, a bem da Nação e não dos interesses de meia dúzia para quem apenas os negócios chorudos interessam.
Nesta matéria, o actual governo, o da dita geringonça, embora batendo válvulas e chapas, segue na peugada dos governos fórmula 1 do PS, do PSD, e do pendura CDS, que andaram todo tempo a acelerar.
Isto por muito que custe ao senhor Jerónimo de Sousa e à senhora Catarina Martins, demiurgos que insuflaram a alma a esse governo de barro.
Governo geringonça que continua deliberadamente a malbaratar milhares de milhões de euros em bancos falidos, sonegados aos contribuintes, e a usar de especial benevolência para com as empresas dominantes como o fizeram os governos topo de gama atrás citados.
Ninguém tem que se admirar, portanto, com a subserviência de uns tantos governantes a tais empresas e bancos que tem sido matéria de muitos escândalos noticiosos.
Esta dependência viciosa do poder político de duvidosa democraticidade, ficou agora mais patente com a contratação de gestores de elite para a Caixa Geral de Depósitos, pagos que nem nababos sauditas.
Não para fazerem milagres, certamente, mas apenas para gerirem como o faria qualquer merceeiro de praceta em crise: despedir empregados, seduzir nova clientela e aumentar o preço das batatas e das cebolas, que é como quem diz, alargar as alcavalas dos serviços bancários. Seguros de que se a mercearia pública continuar a dar prejuízo, nenhum mal daí advirá porque alguém virá a seguir para fechar a porta. Ou será que os salários faraónicos dos administradores garantem que a empresa dará lucro?
Quer se goste quer não, trata-se de salários obscenos, que não deixariam de o ser mesmo se o Estado estivesse a abarrotar de dinheiro. Que ofendem os milhões de cidadãos que sobrevivem na mais penosa pobreza, que são um atentado à justiça, à liberdade e à igualdade e envergonham a democracia, o socialismo, a social-democracia, a democracia cristã e tudo o mais que se quiser.
Salários que postergam toda e qualquer ideia de serviço público e de justiça social ainda que não dispensem as useiras e vezeiras vaidades, condecorações e comendas no final do mandato.
Grave, sobretudo, é que o primeiro-ministro socialista se esqueça que a política possui uma dimensão ética que em nenhuma circunstância deve ser esmagada pela componente tecnocrática e que os mercenários, os ditos soldados da fortuna, nem sempre ganham guerras.
Que estranha política de esquerda é esta que faz dos contribuintes mecenas de banqueiros e dos banqueiros mercenários do Estado!
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Um Papa civil

São muito raras as personalidades do sistema político português que, como António Guterres, se impõem pela sua humanidade, honradez, espírito de missão e abertura ao diálogo. Qualidades que lhe que advêm, em última análise, da sua marcante matriz cristã.
A sua escolha para secretário-geral da Organização das Nações Unidas, a maior e mais representativa associação humana, é, portanto, um acontecimento excepcional na democracia portuguesa, também porque mereceu o empenhamento nacional unânime.
Acima de tudo, António Guterres, como o próprio reconhece e realça, é um campeão do diálogo. Muito embora o espírito dialogante que sempre o animou não tenha produzido os melhores resultados na governação de Portugal que protagonizou porque na política portuguesa impera a bestialidade e o facciosismo.
Contrariamente, os grandes problemas que a Humanidade enfrenta só poderão ser resolvidos pela cooperação e pelo diálogo e, tudo leva a crer, António Guterres comportar-se-á como um verdadeiro Papa civil a quem se augura, desde já, os maiores sucessos.
António Guterres passa assim a ser o português mais universal dos tempos modernos. Antes dele apenas José Mourinho e Cristiano Ronaldo no futebol e Durão Barroso na política haviam ousado alcançar reconhecimento planetário. António Guterres, porém, vai desempenhar funções da maior amplitude, responsabilidade e influência na vida das nações.
Mas uma questão se levanta no espírito dos portugueses: que ganha Portugal com escolha de António Guterres para tão alto cargo?
Em termos prácticos nada, certamente. A economia portuguesa vai continuar a marcar passo, a dívida pública a aumentar, os indicadores sociais a degradarem-se e a democracia envergonhada enquanto não houver uma consequente reforma do regime político despesista e corrupto que nos asfixia.
O acréscimo de prestígio carreado por Durão Barroso e pelos futebolistas Ronaldo e Mourinho também não teve impactos significativos na vida nacional, por mais que Portugal tenha passado a ser falado pelo mundo fora.
Porém, com António Guterres secretário-geral da ONU, ainda que Portugal não seja obviamente favorecido nas instâncias internacionais, passará a ser olhado com mais respeito. Sobretudo pelos burocratas de Bruxelas e pela sua tutelar chanceler Merkel, que tiveram o topete de designar, in extremis, uma funcionária sua para tentar derrotar a candidatura portuguesa, talvez por lhes doer não terem assento permanente no Conselho de Segurança.
Enfim. Mais uma vez se prova que a História de Portugal não terminou com a queda do Império.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

Será que vão fazer de Portugal uma nova Venezuela?

Portugal já é um Brasil em ponto pequeno tendo em conta a corrupção, a aldrabice, a desigualdade e a pobreza. Obra da direita, isto é, do PS, do PSD e do CDS, partidos que foram poder no Portugal democrático.
Acontece que a partir do momento em que António Costa ousou unir a esquerda no imbróglio a que se convencionou chamar geringonça começaram a surgir sinais preocupantes de que Portugal se poderá tornar numa nova Venezuela.
A maior evidência é dada agora por Mariana Mortágua, putativa ministra das Finanças que, mesmo sem ainda ter assento no Conselho de Ministros, já dita a política tributária, ensaiando a pasta que o BE muito provavelmente irá reclamar num eventual próximo governo da geringonça.
Por isso os portugueses estão mais confusos e receosos que nunca. Porque a economia, para a esquerda unida, é um cozido à portuguesa em que se metem nabos, batatas e impostos no caldeirão de São Bento e se distribui o rancho pelos pobrezinhos.
Tudo de acordo com um conceito de igualdade e justiça um tanto primário: passam-se os ricos a pobres e promovem-se os pobres a ricos e tudo fica igual, mas de pantanas, não importando saber o que faz os pobres serem pobres e os ricos serem ricos.
Ora isso não é justiça e muito menos solidariedade e segurança social. Justiça é tratar a todos por igual, sancionar os criminosos e premiar os cumpridores. Há ricos que enriqueceram ilicitamente, sim, mas também os há que geram emprego e desenvolvimento.
Fica-se, portanto, com a ideia de que a esquerda unida está votada a fazer de Portugal uma nova Venezuela, ou uma nova Cuba. Outros modelos não se lhe conhecem, para lá da Coreia do Norte, de formato mitigado, porque, para já, não pensam em bombas atómicas e o BE até defende a extinção das tropas especiais. Embora possa vir a criar a sua própria guarda revolucionária, se o deixarem, para meter os aforradores na cadeia.
Esquerda unida que não tem tido o braço suficientemente lesto e comprido para apanhar aos grandes agiotas nos distantes paraísos fiscais, nem mesmo no próprio palácio de São Bento, mas a quem não escapa o humilde contribuinte.
É com o PS esparramado à esquerda, portanto, que a geringonça tem vindo a derivar para ocidente rumo a Cuba e à Venezuela. Um tanto ao arrepio de Jerónimo de Sousa que vê mais longe, e preferiria, por certo, voar para o extremo oriente, para a Coreia do Norte do senhor Kim Jong-un.
Está visto: lamentavelmente os nossos políticos não sabem como curar Portugal. São aprendizes de feiticeiro que pretendem salvar o paciente com mezinhas de esquerda, ou panaceias de direita, que mais agravam a doença.
Resta-nos a esperança de que mais lúcidos e sensatos governantes surjam enquanto é tempo, ministrem mais adequadas medicinas e coloquem o país em rumos mais saudáveis. Os da Suíça ou da Noruega, por exemplo.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

O que o Povo tem é sede de Justiça

O Presidente da República continua incansável a distribuir simpatia, e ainda bem, porque os portugueses estão carentes de afectos.
Mas os portugueses estão sobretudo sedentos de Justiça porque os políticos não param de os maltratar e não abrem mão dos privilégios imorais que a si próprios atribuíram.
Por isso o Presidente da República também tem distribuído umas boas lambadas a quem bem as merece. A mais sonora de todas deu-a recentemente a governantes, deputados e líderes partidários, na cerimónia de abertura do ano judicial, em que desafiou os operadores judiciários, leia-se magistrados, advogados e funcionários judiciais a acordarem um pacto para a Justiça.
E não se poderá dizer que o Presidente da República isentou os governantes, os deputados e os partidos das responsabilidades que lhe cabem nesta matéria. Passou-lhes sim um atestado público de ausência, incompetência e desleixo porque palram, prometem, mas tudo deixam na mesma se é que não pioram.
Foi ainda mais longe, o Presidente da República, uma semana depois, quando a todos alertou, numa conferência promovida pela Associação Sindical dos Juízes Portugueses, para aquilo que chamou de “bloco central de interesses” que, segundo ele, tudo faz para que “ nada mude, que fique tudo tão ou mais pantanoso”.
“Bloco central de interesses” que, como é óbvio, tem assento cativo nos governos, na Assembleia da República e nos partidos. É visceral do regime político vigente que, embora se inscreva no sistema dito de democracia liberal, tem duvidosa democraticidade e que por isso urge reformar, antes que o Estado estoure.
Começando, claro está, pela Justiça, já que só com justiça se poderá sanear o pântano promíscuo em que chafurdam os tubarões que sugam o erário público e viciam a democracia.
Não é por acaso, portanto, que aos afectos do Presidente da República os portugueses respondem com afectos redobrados que é uma forma efusiva de reclamar justiça.
De facto só a Justiça pode pôr cobro à corrupção de Estado, aos crimes de colarinho branco, à promiscuidade entre governantes e capitalistas e à canibalização dos serviços públicos. É de salvar o Pais que se trata!
A questão que agora se coloca é saber se haverá suficientes políticos livres, honestos e patriotas, e funcionários públicos e magistrados competentes e dedicados capazes de responder ao apelo do Presidente da República e de meter mãos à obra.
Coincidindo, premeditadamente por certo, com a abertura do ano judicial o juiz, e cidadão, Carlos Alexandre veio a público dar a cara, de forma exemplar, e corajosa. Recebeu o aplauso unânime de quantos respeitam a lei.
É desejável que outros magistrados lhe sigam o exemplo, porque a Justiça deve ser transparente e os portugueses têm o direito conhecer o rosto daqueles que a exercem.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

“Politiquíadas” lusitanas.

Esta crónica não pretende ser cómica, nem ridícula, ainda que possa ser de rir ou de chorar conforme o leitor melhor entender.
Os nossos governantes têm demonstrado a rara competência de sempre qualificarem Portugal nos últimos lugares em tudo que é escala económica, social, cultural, e mesmo desportiva.
Este mérito, porém, não deve ser apenas assacado ao actual primeiro-ministro, já que o fenómeno se arrasta há décadas.
De facto, sempre que os mais credíveis organismos internacionais, sobretudo dentro da União Europeia, elaboram as listas dos países mais pobres e endividados, dos que possuem maior défice ou maior taxa de analfabetismo, etcétera, Portugal surge, por regra, no topo da tabela, em disputa cerrada com países do chamado “terceiro mundo”.
Não é de estranhar, portanto, que o frustrante desempenho dos atletas portugueses nos últimos jogos olímpicos se tenha saldado por uma única medalha, de cobre, quando se almejavam muitas mais, e de oiro, até.
Não são justas, todavia, com as críticas disparatadas que foram feitas aos nossos atletas, por mais significativo que tenha sido o investimento realizado pelo Estado e por mais avantajados que sejam os subsídios atribuídos. O problema não é de agora nem dos atletas. É antigo, estrutural, político e cultural.
Os nossos olímpicos são rapazes e raparigas que se dedicam às modalidades de corpo e alma, que treinam arduamente dia a dia, e que só ganham o privilégio de representar Portugal se cumprirem os “mínimos olímpicos” estabelecidos.
Durante anos a fio o Estado esbanjou dinheiro com os clubes de futebol, que foram sustentados pelos governos e câmaras municipais sem lei nem regra, embora não seja o futebol, por mais adeptos que mobilize aos fins-de-semana, que dá o toque da sanidade, do desportivismo e do talento atlético do nosso povo. Contrariamente as modalidades ditas amadoras têm sobrevivido graças ao talento e à carolice dos seus praticantes.
Sabemos bem que o desporto escolar é um fracasso, e que do desporto universitário em particular nem se fala. Os futebolistas Luís Figo, Cristiano Ronaldo ou mesmo Éder nada dizem da vocação desportiva dos portugueses. Carlos Lopes, Rosa Mota ou Aurora Cunha esses sim são a verdadeira alma do povo.
A mensagem com que o primeiro-ministro felicitou os atletas que actuaram nos Jogos Olímpicos do Rio de Janeiro dizendo que “todos subiram ao pódio de Portugal”, não é, portanto, assim tão tola e ridícula quanto se disse.
Deverá ter-se em conta, todavia, que os nossos políticos são atletas de olimpíadas diferentes. Disputam as suas próprias “politiquíadas” que reúnem modalidades bem interessantes e criativas, como sejam assalto a bancos, partir pedra, rachar lenha, tiro aos patos, sacudir a água do capote, ou mugir a vaca dos impostos. O presidente da República, por exemplo, é medalha de oiro no lançamento do “marcelo”, o primeiro-ministro medalha de prata no triplo assalto ao poder e o líder da oposição medalha de cobre em cantigas ao desafio. Já o secretário-geral do PCP sobe ao pódio na modalidade de serrar presunto, a coordenadora do Bloco de Esquerda em “karaoke” e danças de salão e a presidente do CDS em jogos de capoeira.
O leitor melhor fará a sua própria seleção dos políticos mais aptos a subir ao “pódio de Portugal” nas diferentes modalidades
Sendo certo que o povo português é campeão olímpico da paciência e do humor.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.