Armando Fernandes

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Por quem os sinos dobram

Choram os sinos por todos quantos ao exemplo dos mortos no decurso da guerra civil espanhola são a substância e origem do livro* cujo título é o desta crónica a expobrar o comportamento de todos quantos por omissão, palavras e obras contribuíram para o sofrimento e muitas vezes a morte de mulheres e homens vítimas da pandemia. Dobram os sinos prenhos de raiva porque morreram e morrem pessoas em consequência da vaidade popularucha das decisoras e decisores incapazes de elevarem a prudência na profunda análise dos efeitos da peste nas comunidades portuguesas. Plangem dolentes os sinos na impotência de as suas notas não conseguirem sensibilizar as pessoas a considerarem as normas de segurança sanitária tão importantes quanto a exigência alimentar dos corpos, pois se a comida os vivifica, a sua exposição vírus coloca-os em perigo de serem corroídos antecipadamente. Tangem os sinos cansados de soarem aos ouvidos dos ânimos hábitos ao modo de sopro de revigoramento porque temos de conseguir resistir com mais energia à tormenta esperançados na sua erradicação. Os sinos estão possuídos pela doença de S. Vito, rejubilam na cúspide da propaganda do efeito benéfico após a chegada das vacinas consideradas como elemento primacial da propaganda, para de imediato soluçarem tal qual o velho que não tem culpa de o ser, mas porque o é caiu nas malhas da idade indesejada e, por isso mesmo esvaiu-se a dita esperança agravada pelo emudecimento dos sinos, sinetas e campainhas pascais. As vacinas tábua de salvação tardam, os feitos irão demorar, o que resta? Resta fé nos cientistas escorados na serena análise dos resultados e na coragem de dizer como os fidalgos de D. Afonso IV lhe disseram: senão? Não! Os sinos voltaram a ser cautelosos porque os sinos dos cientistas sabem quão pertinazes e astuciosos se movem os políticos no entrelaçarem redes de conquista e manutenção do poder, a imolação da ciência não os arrepia a favor dos seus desejos. Muitas vezes os homens consagrados ao mundo científico resvalam, ao modo dos sinos grandes travestidos de sininhos amestrados não raras vezes recuam, pensemos no episódio do encerramento das Escolas. O leitor dirá: o autor desta crónica endoidou, uma no cravo, outra na ferradura apesar de as vítimas terem sido arrestadas à traição com as pernas hirtas! É verdade. Nesta questão da pandemia a coerência não é possível medir-se ou avaliar-se, tal qual a lisura de seis candidatos nas recentes eleições presidenciais. Eram sete! Nas noites invernais, nos serões à volta da fogueira no Lar de Lagarelhos fiquei a saber quem era o sujeito da adivinha – Alto está, alto mora, todos o vêm, ninguém o adora –, o que cada um elege como o seu. A pandemia enxameia de todos quantos ao entrarem na eternidade não usufruíram da última vontade neste vale de lágrimas; de poderem ter sido objecto da cerimónia do adeus envolvendo familiares e amigos. Porca Miséria! Os sinos gritam pios de dor ante o aviltamento, escrevo ao som de Wagner, um som só audível por mim pois a pitonisa não me respondeu. Porquê?

Teófilo Vaz

No início de 1976, na Estação de Caminhos de Ferro de Santarém, de segunda a sexta-feira, juntava-se um grupo onde pontificava o saudoso Fernando Salgueiro Maia, caído em desgraça na sequência do 25 de Novembro, que apanhava o comboio das sete da manhã e até Lisboa nada escapava no crivo crítico da actividade política e dos costumes para nosso gáudio e frenesim palavroso a envolver circunstantes. Em Castanheira do Ribatejo juntava-se a nós um rapaz que o Barros da família Barros da rua Direita, em Bragança, nos tinha apresentado. O Barros trabalhava na Segurança Social, na CPN, e continua a residir na capital do gótico. O rapaz era de Bragança disse-nos o Barros, logo «estava em casa», apesar da outorga do passaporte grupal, este salientava-se por ser extremamente reservado, falava quando interpelado, ante a alacridade preferia esboçar prudente sorriso porque «aquela gente» possuía Mundo assanhado pela guerra colonial, a agitação política numa oposição inorgânica cujo ponto focal era a Livraria Apolo escalabitana. O rapaz era o Teófilo Vaz. Passados alguns anos encontro-o em Bragança, ele na qualidade de professor de História, eu enquanto membro da Assembleia Municipal, na bancada do PSD. Retomamos o contacto, recordamos o indómito capitão de Abril, fomos falando. Já desligado da Assembleia Municipal, um compromisso partidário impediu-me de aceitar o convite para nesse órgão continuar, apresentei ao executivo Municipal uma proposta de construção de um livro destinado a assinalar uma efeméride cujo tema foi Bragança antes e depois da restauração da democracia. Obra de vários matizes e representações, convidei o Teófilo Vaz para escrever sobre a Toponímia do burgo brigantino, convite aceite de imediato, daí um texto de grande qualidade que pode ser apreciado na referida obra. As alteridades surgidas no Nordeste Informativo originaram a sua designação de Teófilo como Director do semanário onde já escrevia. De modo sereno, sem brusquidão, chapodou a face do jornal tornando-a glabra, escanhoou-a limpando-a de adornos espúrios, o jornal multiplicou a opinião, os editoriais do Director primavam pela justa análise tendo-se transformado em justificada leitura obrigatória, por isso, amiúde, lhe endereçava merecidos elogios dada a concisão o acertado toque na buba ou exemplo a seguir. O meu Amigo Engenheiro António Jorge Nunes deu- -me a saber do infausto acontecimento da sua morte. Fiquei pasmado, durante largos minutos meditei, relembrei o Teófilo alegre e bem disposto a mostrar-me a sede do jornal e da rádio, entusiasmado, e a apresentar-me as e os jornalistas, bebermos um café de seguida, distendido, rememorou episódios e desfiou projectos exequíveis para fortalecimento da sua paixão jornalística. Estava feliz. Ofereci- -lhe um livro da minha autoria, trocámos um abraço, zarpei. O Teófilo respirava força e vigor. Na altura do passamento de uma personalidade marcante, o caso de Teófilo Vaz, os obituários luzem encómios tal como as placas douradas a indicarem pessoas, alhos e bugalhos, secos e molhados, os chorosos de hoje, riem destemperadamente amanhã. É a vida! Faço um pedido a quem de direito, não deixem apagar a sua memória. A criação de um prémio com o seu nome destinado a jovens jornalistas seria (será) uma forma de o fazer. Assim o penso e escrevo.

Sobre a caça e os touros

O filósofo José Ortega y Gasset escreveu um admirável e penetrante livro com o título desta crónica, que a trago a terreiro em virtude da macabra montaria realizada na histórica Quinta da Torre Bela, que tanta celeuma suscitou no epicentro do PREC, nas proximidades de Rio Maior, capital das barricadas e mocas a modo de heráldica representativa do resistir propiciando mocadas aos esquerdismos, doença infantil do comunismo escreveu o camarada Vladimir antes de ser embalsamado e exposto na Praça Vermelha debaixo do pseudónimo de Lenine. A quinta foi palco de outros episódios da pequena história, desta feita a ineficácia das leis, o aguçado furar através das malhas dos normativos tão lassos quanto as meias de seda de costura atrás que as apanhadeiras da rua Direita de Bragança deixavam escapar, levaram ao despedimento das incautas raparigas no tocante à época dos sensuais revestimentos das pernas das senhoras, no segundo à perda de vida de javalis, gamos e veados de modo tosco, tonto e trapaceiro ao arrepio de tudo quanto o pensador tão bem expôs na obra referida. A prática da caça é tão antiga quanto o homem, esse Homem e outros depressa perceberam os cuidados a terem ao enfrentarem feras no desejo de as despejarem de grutas, tocas e covis, suas moradas no intuito (quase sempre concretizado) de as despejarem sem custas judiciais, dispondo de precioso, fundamental aliado – o fogo – quando aprendeu a criá- -lo, a domesticá-lo a seu belo prazer e capricho. Uma leitura de alguns clássicos de Aristóteles a Xenofonte, passando por Plutarco, Suetónio, Plínio e outros qualificados observadores da vida animal do seu tempo tomaram nota do visto, ouvido, observado, caçado e mastigado, deixando-nos registos em vários suportes acerca das usanças, argúcias e artimanhas no exercício desta nobre arte, que não tardou a ser objecto de observâncias no tocante à época, instrumentos e métodos da captura de cada uma das espécies, o Estagirita escreveu o tratado História dos Animais que as pessoas de bom gosto (gosto de lerem obras universais da cultura Ocidental) teimam em ler. A cultura dos amantes da caça no decurso dos séculos plasmou duas categorias de caça: a maior e a menor. Por causas de casta, a caça maior foi apresada pela nobreza e alto clero, a caça menor ficou dividida, de um lado os proprietários e burguesia de toga, do outro os engenhosos caçadores furtivos de estrela e beta pé descalço que se fundiram com todos quantos caçavam para alterarem a soturna e desenxabida dieta do quotidiano, além de conseguirem moedas pretas de subsistência acabando por envolver caçadores e caçarretas dos burgos de um Portugal rural, pobrete mas alegrete. Como é evidente, em Bragança, coexistiam (não sei de assim continua a ser) caçadores de diferentes famílias sociais (efeito nivelador com recíproco respeito) destacando por virtudes de engenho, golpe de asa, de sociabilidade e perseverança. Dos mais notórios que conheci destaco os irmãos Nogueiro, o esfusiante Manuel Brasileiro (dono se um cão dotado de desmesurado apetite, capaz de esvaziar o tanque de S. Vicente a transbordar de caldo), a sagacidade manhosa do Tio Bloso, além do caçarreta exaltado o Senhor Afonso funcionário do BNU. Nas aldeias, nas vilas, nas duas cidades de então, exibiam-se espingardas de vários tipos, fixei os olhos numa reluzente carabina do sempre bem-disposto gentleman coronel Montanha, o qual preferiu ser tenente-coronel a frequentar cursos e peregrinar entre Seca e Meca na caça às estrelas sobre os ombros, em detrimento das charrelas escondidas nos vales pedregosos e restolhos da nossa província. O ocorrido no «pequeno» latifúndio que pertenceu aos aristocratas Lafões nunca seria possível na época de sua propriedade, conheci alguns, assumiam a condição de membros de influente casa inscrita no «Almanaque Gotha», a qual no referente a caçadas e montarias de pompa e circunstância e/ou de treino dos cavalos e cães seguia o normativo britânico, o que no meu entender não passam de extravagantes reminiscências do Ancien Regime. O morticínio de génese espanhola recupera a tradição da exuberância dos grandes de Espanha e de um nobreza cuja matriz vem de longe, não por acaso a caça era devoção dos nobres, sendo os banquetes carolíngios uma altíssima representação do poder. O ditador Franco, caudilho de Espanha pela graça de Deus, ufanava-se de matar centos de perdizes num só dia no desenrolar de mortandades ao estilo da realizada na Quinta implantada no coração do Ribatejo. A aferição de responsabilidades formais e reais nunca serão conhecidas na totalidade, há muitos actores envolvidos no filme, o actor/canastrão Matos Fernandes imitou o papel de duro risível do ministro Cabrita no começo da fita, a seguir aplainou as farroncas, aguarde-se o The End. Outras fitas foram repostas por o filão estar a render proveitos nas televisões e na imprensa de papel, assisti a um lamentável exercício ao género fundamentalismo Torquemada, protagonizado pelo vanidoso capataz do PAN, palrador insistente quanto uma esfoura após absorção de abrunhos verdes.

Maria Castanha

O investigador Jorge Lage tem consagrado anos de estudo e enaltecimento do fruto/pão das gentes transmontanas que outrora tinham na castanha elemento primacial para o fabrico do pão ganho com o suor do rosto e o sangue das mãos escalavradas no espinhoso amanho dos campos. Se a castanha era o elemento principal das parcas, apagadas e persistentes refeições no denominado reino maravilhoso, maravilhoso apenas para alguns, os povos de onde predominava o montado, azinheiras e sobreiros, tal como os castanheiros, ajudavam a manter as crianças, mulheres e homens tinham na bolota – crua, assada, cozida, frita e estufada – a matéria-prima que lhes saciava a fome de remota ancestralidade. Ora, a Antologia de Jorge Lage pode ser entendida na consumação do desejo de alargar o universo dos amantes e amigos da milenar árvore através do ponto de vista de outros autores, vivos, acerca da árvore que enquadro no universo das hierofanias vegetais que o Homem criou ao longo dos séculos e séculos de existência a lutar contra toda a sorte de medo, terrores e catástrofes que não conseguia decifrar ou entender. O fecundo sábio Mircea Eliade legou-nos profundas reflexões sobre o Sagrado e Profano que obrigam ao cogito e a dizer-nos que existimos. Este propósito agregador de Lage desequilibra/desequilibrou a Antologia porque vários autores não concederam grande atenção ao espírito do Coordenador escrevendo conforme lhe deu na real gana, desde o furoco temático às notas biográficas prenhas de presunção e água benta, porque nestas matérias cada qual expande o que quiser – vanidades, auto-elogios e minúcias de prosápias – cujo ridículo é patente e notório. Obviamente, o antologiador nada podia atalhar, na justa medida de respeitar as regras de boa educação a impedi-lo de sugerir ou proceder a rejeições dado ter solicitado empenhadamente a colaboração aos autores que deram corpo à obra. Como todos sabemos existem Antologias de múltiplos matizes e fórmulas, lembro as famosas Antologias da extinta Portugália, concebidas ao gosto e conhecimento dos organizadores, José Régio, Jorge de Sena, Cabral do Nascimento entre outros escolheram e trouxeram à tona da água do reconhecimento autores que sem integrarem as referidas Antologias ainda agora estariam a jazer no alçapão do esquecimento. Obviamente, as Antologias também são fautoras de invejas e até raivosas ciumeiras de quem não as integra, uma delas, a do também itinerante cultural Herberto Helder (foi responsável pela Biblioteca Itinerante de Santarém, episodicamente de outras quando Serviço de Bibliotecas estava a ser lançado) intitulada Edoi Lella Doura produziu ruído e acrimónias perduráveis no tempo e modo ou não fosse o universo das letras um mundillo no qual até os peões de brega querem ser diestros do talante de Manolete. Estas considerações, talvez impertinentes, escrevo-as correndo o perigo de ser apodado de invejoso ou mal agradecido visto ser um dos antologiados. Sopesei os prós e contras, decidi o acima escrito, procurei contribuir para a qualidade e formosura da Maria Castanha dentro do possível, a mais não fui obrigado em virtude da lhaneza de Jorge Lage a quem testemunho o meu apreço. A obra justifica, ampla, e atenta leitura, morigerada ao gosto de cada um, neste tempo os castanheiros largam a folhagem caduca à espera de nova floração. Reviver superando a maligna peste. PS. Ao contrário do inserido na Antologia acerca da minha pessoa não nasci em Vinhais, sim em Bragança e vim ao Mundo no ano de 1945, ao contrário do indicado ano de 1965. Menos vinte anos agora seriam como princípio do elixir da longa vida!

Pão e água

Duas palavras de ampla projecção simbólica, religiosa, civilizacional, cultural e, na minha meninice e adolescência, significantes de criminosos que além de na condição de presos a fim de pagarem as suas dívidas à sociedade, não eram pagos por trabalharem nas obras de cunho estatal (p.e. o conjunto de edifícios da Praça Cavaleiro de Ferreira em Bragança) e, não raras vezes a sofrerem a punição de ficarem a pão e água. Ainda nos dias que correm restringir-se uma pessoa a pão e água carrega sobre os visados um saco de suspeições, para lá da caridade expressa nas obras de misericórdia: dar de comer a quem tem fome, dar de beber a quem tem sede. Ora, o movimento Pão e água que na passada sexta-feira 13 (há coincidências…) surgiu na laboriosa cidade do Porto, provindo dos profissionais da restauração em protesto conta a avareza governamental na concessão de mais e melhores ajudas no fito de amenizarem as tremendas perdas que o importante sector dos restaurantes, casas de comeres, hotéis e expressões de negócio correlativas estão a padecer em consequência da misteriosa pandemia. A magia e elasticidade das palavras na apreciação de problemas desta envergadura leva- -nos a entrarmos não na caverna de Platão porque o filósofo na sua notável obra A República deixa antever simpatias pelo trabalho obrigatório que os «justiceiros» de agora classificam de escravatura, sim noutras cavernas que ao longo dos séculos homens empenhados na dignificação homem/Homem a todos os títulos e em todas as circunstâncias porque o governo das Nações deve ser para nos amaciar as asperezas do dia-a-dia e, por isso mesmo, trazer-nos felicidade e alegria no viver. Utopia? Sim, q.b., para lá disso quem nos governa tem de se empenhar na harmonização dos contrários e, neste ponto, foca – saúde pública, interesses, educação e conhecimento –, levando em linha de conta a real/realidade sugiro aos próceres do mando/poder consultarem S. Silvestre e o seu burro Mestre ou Doutor, pela simples razão de não ser possível satisfazer os agricultores proporcionando-lhe sol na eira e chuva no nabal ao mesmo tempo, na mesma hora. Se procedermos a uma pesquisa (termo em ascensão) por quem sabe penetrar nas referidas cavernas do conhecimento encontrará doutas palavras meditadas, sopesadas e ao nosso dispor da autoria de asnos do calibre do Burro de Ouro, que Apuleio deu a conhecer. O grande drama da classe política é a de na sua esmagadora maioria não ler para enriquecer a sua cultura, preferindo os tais livros de utilidade ao virar da esquina, daí os decisores entaramelarem o decidido no sentido das folhas das árvores dos interesses tácticos do momento. Os oráculos discretos, como devem ser, têm o cuidado, de nos advertirem para os perigos escondidos na roupagem económica e financeira, como um qualquer cidadão amigo e praticante de contas certas, não de facturas sebosas, receio o futuro, receio a factura a pagarmos derivada da peste em progressão e conflitualidades à la carte empreendidas no dia 14, estou quase a recear a própria a relembrar o Lucky Luke de pirisca no canto dos lábios antes do fascismo higiénico do PAN dos lulus fraldiqueiros. O movimento Pão e Água poderá ou não evoluir de forma a reeditar fenómeno semelhante à revolução das Maçarocas fórmula actual, no entanto, não antevejo casulo de possibilidades de uma Patuleia, porém ingredientes não faltam, o aparato será outro, os genes mamam da mesma teta. Até agora António Costa tem surfado a onda, porém caso o drama dos profissionais da restauração aglutinem mais e mais episódios dramáticos de infectados, famílias e pungentes odres de desgosto em virtude dos óbitos é possível adicionarem-se uns aos outros e daí formar-se um cacharolete de desespero a derrubar muros e barreiras a enlamear o inefável ministro Cabrita, a encharcar a ministra Temido e, por arrasto, todo o gabinete ministerial. O grande simulador Costa tem colocados os tenores socialistas a apagarem a maioria dos ecos da angústia, agora chegam a «roupa ao pêlo a Rui Rio porque os laranjinhas açorianos aceitaram gulosamente o aconchego de Ventura, passado o bruá-bruá da nuvem espumosa, resta a vacuidade do discurso do «tudo controlado», aumentará o fel desesperante. Deixo a interrogação: e depois?

Dá que pensar…

Ao ver através da janela televisiva as longas e demoradas filas de mulheres e homens do credo benfiquista (também sou crente) a esperarem durante horas a sua vez de votarem em tempos de pandemia, de distanciamento, de máscara sobre a boca e o nariz, recordei-me do Tratado de Paixões da Alma do filósofo mais conhecido por Penso, logo existo, ou seja René Descartes. O fenómeno da atracção humana pelo jogo tem motivado a atenção de eminentes figuras das áreas da cultura, da filosofia, da antropologia, da sociologia e disciplinas artísticas. Desde Johan Huizinga a Roger Callois, passando por Georges Simmel, Norbert Elias, Desmond Morris e Lévi- -Strauss, cito os que li atentamente, legaram-nos elementos suficientes para reflectirmos acerca desta paixão não raras vezes a resvalar para o grau zero da irracionalidade, do desprezo por si próprio, da queda na cloaca de todo o género de indignidades. Aquela multidão de votantes receberam incómodos que se lhe fossem impostos soltariam gritos, imprecações e queixas ululantes, a receberem a frialdade da noite, expostos ao contágio de um vírus virulento evidenciando enorme apetite por humanos de grossa e perigosa idade é vibrante exemplo de que as paixões tal como os gostos segundo os Romanos não se discutem. Um apressado regresso a Bragança dos anos sessenta do século passado faz emergir um nutrido conjunto de apaixonados pelos seus clubes, os ora chamados tifosi de gritos, insultos e algumas cenas de pugilato, porém longe do hooliganismo que personifico em A Laranja Mecânica. O benfiquista Sr. Alberto Rodrigues da Sapataria da Moda ostentava na lapela do casaco o emblema ornado de pedras preciosas e o cartão de sócio, não mostrava exuberâncias durante ou após os jogos, ao invés os também sócios. O Sr. Álvaro do Flórida e irmão Manuel inflamavam-se logo que o árbitro silvava a descontento, enquanto o Sr. Augusto Poças (Pincelas) ficava furibundo, o benquisto Augusto deslocou-se a Berna, aparecendo triunfante ao lado do goleador Águas provocando emoções gozosas e invejas na cidade. Sim, noutro patamar, o dos apaixonados sem a insígnia de sócio, caso do Fígaro Carlos Gardel ou o Sr. Cândido Parente o extravasar de paixão pelo clube que, durante muitos anos prescindiu de jogadores estrangeiros pois abastecia-se nas colónias, era total e, todos sofriam quais mártires modernos na altura das derrotas. Então e os «doentes» de outros clubes? Existiam em bom números – calmos, acelerados, furiosos e fanáticos –, recordo a bonomia do portista Sr. Queirós, as birras do também portista Sr. Roque da Silva Moura, os dois faziam reluzir os custosos emblemas, as imprecações do cauteleiro Sr. Guedes, também dos andrades, no entanto, a perder rotundamente no confronto com o sportinguista Toilas que merece a Senhoria mas deu-me vontade de o apelidar sem ela porque assim lhe chamávamos. O pasteleiro Sr. Ribeiro respingava em língua de fogo, de dragão, a torto e a direito ao receber um dichote, mesmo que enrolado num bolo de arroz. Outros nomes ficam no tinteiro da memória porque o espaço não estica, dos mais novos trago à colação o meu estimado amigo Adalberto Castro, adepto do mítico animal dragão, o qual sempre aceitou as minhas ironias, ironias de um benfiquista fiel leitor do trissemanário A Bola, filho de um incandescente que ia rezar nas igrejas pedindo benesses ao Altíssimo destinadas a concederem vitória ao Glorioso. Se as preces não surtiam efeito, salpicava-o, humuradamente, de pouco valerem as orações interesseiras. Não apreciava o comentário. Por influência do Ivo Pinho (águia d’ouro e outros águias douradas e prateados) durante algum tempo frequentei o Estádio da Luz, os dogmáticos eram muitos e vesgos, idêntica visão distorcida pulula no reino dos lagartos e parque dos animais criados pelo medo dos homens o breu do desconhecido. Agora, há indícios de regressarmos à época dos alumbrados, os misticismos derivados da pandemia, a sulcarem as redes sociais e as televisões procuram iluminarmos no emaranhado das trevas pandémicas, por isso o jogo rei, o futebol, que os ortodoxos marxistas e maoístas diziam ser uma das expressões da alienação do povo, sustenta o revigoramento da paixão pelo viver no coração de muitos milhões de pessoas confinadas a pensamentos turvos, tristes e trágicos. Daí a prova de vitalidade no dia e noite de 28 de Outubro. Nos últimos anos vou a Bragança em voo de pássaro, numa dessas viagens fui a uma casa de comeres chamada Copinhos. Trata-se de uma eclatante capela benfiquista à qual espero voltar quando a peste sucumbir. Não se esqueçam: usem máscara!

Túnica de Nesso

A túnica de Nesso é o título de um livro do notável escritor que foi Tomaz Figueiredo o qual considero no restrito naipe de fecundos guardiães e criadores da língua portuguesa a emparceirar com Francisco Manuel de Melo, Manuel Bernardes, António Vieira, Camilo, Eça, Raul Brandão e Vitorino Nemésio. Nesso figura mitológica ofereceu uma túnica confeccionada com o seu próprio sangue e sémen à mulher de Héracles confiando- -lhe o segredo, da peça de vestuário ter o condão de lhes restituir o amor do Herói que ela tinha perdido. O herói, Héracles, recebeu a túnica, vestiu-a, quando a pretendeu retirar a mesma arrancava-lhe pedaços de carne do corpo e tal tortura causou- -lhe a morte. Uma morte horrorosa. Era a vingança de Nesso contra Héracles. O autor de Procissão de Defuntos foi obrigado a suportar túnica semelhante em virtude de conflito eriçado de sofrimento dado ter-se recusado a participar no sistema de influências da poderosa família da mulher, recebendo em paga o ostracismo profissional, forçado a recolhimento no hospício do Telhal, sendo a mais dolorosa a ruptura familiar a envolver a cruel separação da querida e idolatrada filha. A túnica de Nesso em versão dos anos cinquenta do século passado. Se o leitor pretender esmiuçar quão grande foi o calvário do magnífico prosador faça o favor de ler a reedição da Imprensa Nacional do romance A Gata Borralheira, ganhando refulgente alegria de viver nestes tempos sombrios lendo toda a obra do nobre escritor minhoto. Trago à colação o descarnado drama de Héracles como exemplo inventivo dos homens no tocante a representação imagética da terrífica dor moral, do sofrimento que não se apaga, que dilacera o corpo e a mente enquanto os sofredores viverem. Ora, a tragédia causada pela pandemia em geral e na Santa Casa da Misericórdia de Bragança é virulenta túnica Nesso a corroer os familiares dos infelizes que não conseguiram sobreviver. Estranho Mundo este! Um mundo que ao longo dos milénios tem suportado várias pandemias causadoras de milhões de vítimas porque a ciência prodigiosa não conseguir antecipar- -se, totalmente, aos eflúvios deletérios emanados pela própria humanidade. Filósofos e homens de ciência têm construído obras perenes onde abordam a incapacidade de nos anteciparmos ao tempo, fora da órbita maravilhosos sonhadores (Júlio Verne p.e.) e dos muitos génios que povoam as paredes das pinacotecas, bibliotecas e outras Instituições semelhantes. O Museu Arte Antiga exibe sólidos instrumentos pictóricos a testemunharem as nossas formas de evasão capazes de amortecerem ao leve a amargura instalada no coração dos impedidos de acompanharem os entes queridos à última morada. Os estudos acerca dos efeitos da peste enxameiam nas prateleiras das livrarias, os novos videntes encartados ou não atafulham de palavras os noticiários televisivos tal como os bruxos de Londres no decorrer da peste (Daniel Defoe) faziam nas casas ou nas ruas lendo as mãos, as entranhas de animais ou esparsas nuvens vindas dos defumadouros. Os peles-vermelhas provocavam e liam os sinais de fumo, agora um qualquer licenciado em biologia debita nos jornais e nas rádios palavreado oco de substância, cofia o queixo, sem esquecer os membros da confraria do badalo, avolumando o ruído ensurdecedor daqueles interessados em cogitarem profundamente sobre as verdadeiras causas da morte dos seus parentes. Para lá do óbvio e ululante procurei saber a origem do vertiginoso alastramento da maleita na Santa Casa de Bragança levando em linha de conta o nódulo escuro de Requengos de Monsaraz. Recebi respostas tonitruantes, a mais sensata chamou-me a atenção para a deterioração das instalações. E, o respondente remeteu-se ao silêncio. Se o tema fosse frívolo lembrava a frase do futebolista, previsões só no fim do jogo, sendo sério, grave e insondável acerca de quando teremos novas e mandados relativamente à extirpação da maligna fornecedora de pessoas à megera da Gadanha, no que tange à acção governamental estou apreensivo e desconfiado na luta contra a crescente onda de infecções, no que tange à plataforma instrumento de trabalho escrevo não se discute a parvoíce, o erro, já no referente à possível interdição de visitar os cemitérios no Dia de Finados, a túnica arrancará lágrimas, sangue raivas surdas ou gritadas. Nem de outra forma pode ser!

O tramposo estilo Trump

A multidão de comentadores criticou acerbadamente o estilo acídulo e grosseiro do presidente dos Estados Unidos no primeiro debate relativo à campanha eleitoral para as presidenciais nas quais ele é candidato. Têm razão os comentadores em denunciarem o grotesco «cavalheiro de indústria», porém esqueceram-se de fazerem pedagogia enaltecendo as virtudes da contenção expressa no provérbio quando fala um burro, o outro baixa as orelhas. Ora basta assistirmos a uma sessão de uma Assembleia Municipal para verificarmos a consolidação do estilo tramposo assente na arrogante desqualificação do adversário, quantas vezes da mãe dele, e da Instituição que representa. Desde a Antiguidade que os fanfarrões eivados de pesporrência procuram suster a argumentação dos outros recorrendo a toda a espécie de ardis, felizmente, chegaram até nós suficientes textos a referirem uns e outros sem esquecer as frases mortíferas amiúde utilizadas ao modo de muletas de pão de marmeleiro a zurzirem os costados do interlocutor. O grande orador António Cândido, a Águia do Marão, deixou-nos páginas de enorme brilhantismo na arte de desventrar, de demolir, de reduzir a cacos os incautos que se atravessavam à sua frente no Parlamento utilizando magistralmente a nossa língua sem recorrer à linguagem de sarjeta ou taberna. Agora, vale tudo, mesmo tudo, se considerarem um exagero as minhas palavras recordem-se das podres peixeiradas nas televisões a propósito do futebol. O truque obsceno de Trump no interromper a toda a hora e momento o contraditor é velha arma de arremesso nas tertúlias e comandita, na época em que podia frequentar os cafés e locandas em Bragança vigorava, com raras excepções, o falar alto abafante dos educados, fosse no Chave d’Ouro, fosse no Moderno, no Central ou no Flórida, não era preciso muito para prevalecer o grito engalanado tal como o andor do S. Bartolomeu no dia 24 de Agosto, de palavrões suaves e ásperos. Há um saco de anos participei num debate que tudo indicava ser cordato, civilizado, embora duro e aguerrido, a tempestade iniciou-se quando uma senhora inglesou um termo genuinamente latino, não latão. A senhora não aceitou o reparo, desceu ao patamar do mais abjecto calão e o debate soçobrou antes de principiar. A criatura foi deputada vários anos, ensaísta e os maldosos acrescentavam ser boca infecta ao estilo do libelista italiano Pietro Aretino. A má educação exibe-se planturosamente nos múltiplos remoques no decurso dos debates na Assembleia da República, antes da liderança de Rui Rio, o deputado Duarte Marques rivalizava com o socialista João Galamba e a inefável Senhora Cristas, sem esquecer a inefável Teresa Leal ao Coelho, nesta legislatura apareceu um deputado socialista a empregar o termo «chafurdice» a ilustrar quão educado é o honorável representante do povo. No dia 1 de Outubro, a TVI levou a efeito um frente a frente a propósito da disciplina de cidadania e troca o passo, os inter-locutores foram o eurodeputado Nuno Melo e uma senhora apresentada como professora e (missionária da doutrina ministrada na referida disciplina) a qual evidenciou ridente talento trumpista na algaraviada função de não respeitar as regras do asno que fala e o jumento que ouve. O astucioso Nuno Melo não perdia ocasião de lhe avivar a falta de chá e carência de maneiras. A «educadora» que se vangloriou de visitar Escolas na missão de catequista da «cidadania» demonstrou à saciedade o desconchavo pois não possui autoridade para avisar os pequerruchos de dez anos de nunca esquecerem o emprego de boas maneiras, porque a doutrina da vulgata do género a cavalheira deixou indicações de ser especialista na matéria. Ao torto e ao direito, à destra e à sinistra, a referida disciplina motiva chamamento à liça da lei de bases do sistema educativo, por descargo de consciência pedi opinião ao principal autor dessa lei onde participei ao modo de cigarra dorminhoca, o eminente especialista na área das ciências da educação salientou a falta de literacia no estudo desse normativo estruturante ao modo do manga-de-alpaca de um centro laboratorial a perorar pseudo-cientificamente acerca do vírus e suas mutações que no inferniza a vida, quando não a retira aos mais fragilizados de tudo. Os males apoquentam-nos e metem- -nos medo, Medo como o Padre a clamar (descalça-me a bota) infligia a todos quantos se atreviam a passar à meia-noite no monte da forca existente entre Espinhoso e Rebordelo, porém existem fortes probabilidades de as nuvens negras se dissiparem brevemente ao ser executada a directiva do ministro Cravinho no tocante à extirpação da linguagem de caserna…nas casernas. Este governante filho de mãe inglesa nunca foi recruta em lado nenhum e o calão utilizado na linguagem castrense não deslustra ninguém e como a chuva civil, não molha militar.

O País de Pernas Para O Ar

O poeta, jornalista e escritor para crianças escreveu um delicioso livro com o título que surripiei para dar nome a esta crónica e, que caracteriza exemplarmente o País nos tempos correntes. Só de pernas Para o Ar a Pátria Portuguesa pode suportar a generalizada gritaria que nem num dia de feira em Bragança nos tempos idos no Toural onde se apregoavam as qualidades de cobertores e atoalhados, por o Sr. António Costa aparecer qual Fantasma da Ópera numa comissão de honra de colorido do meu clube. O Benfica. Só na Pátria do Diabinho da Mão Furada, tunantes de tomo é possível entender fugas de informação e julgamentos populares de processos judiciários ainda não julgados ficando os visados piores que o mártir S. Sebastião no pelourinho mediático. Apenas neste País à beira-mar plantado temo o privilégio de saber como a ministra da Saúde cortou a cabeça da princesa algarvia Jamila, tão destramente quanto a Dama de Copas saída da toca da Alice no País das Maravilhas. Fazendo todos nós parte desse maravilhoso País não espantamos ante a verborreia de JJ, sim o regressado do sertão de cimento brasileiro de novo envergando a capa de ilusionista pago principescamente. Aqui nada espanta, agora andamos entretidos a ouvir as prédicas do émulo do Dr. Mandrake, refiro-me a Costa e Silva mágico na crença milagreira do rejuvenescimento por decreto da população portuguesa e apego auto- -militante dos jovens ao estudo, à disciplina, sem esquecer a prática do normativo sanitário. Se fosse possível o temível caceteiro padre Lagosta José Agostinho de Macedo varreria os palcos das redes sociais tal qual o esquecido Malhadinhas varria as feiras de Lamego a Viseu conferindo perene fama às Terras do Demo. O espectáculo continua feérico e vibrante, o Homem-Hidrogénio, Galamba do brinco, continua a dizer às orgulhosas gentes do Barroso que o lítio vai ser explorado, e muito. A ministra da Agricultura, minha vizinha, apresentou um plano destinado a fazer do denominado interior o território do sol na eira e chuva no nabal, a Dama Pé de Cabra, do Sr. Alexandre Herculano rejubilou, pudera, vai poder tasquinhar nos parques naturais enquanto as avós desapareceram do Gerês e serras adjacentes. As mulheres vão estar representadas nas próximas eleições presidências, Marisa Matias cuja voz quente acicata a memória de Maysa Matarazo, ao invés a estridente de Ana Gomes obriga os pombos a soltarem dejectos apanhando socialistas das várias tendências incluindo a da outra margem do falecido Fonseca Ferreira a quem Miguel Relvas o facilitador muito ficou a dever, prefácios, estudos e lisonjas. Era a vida! O Sr. Ventura granjeia tempo e espaços mediáticos, ele agradece a deferência dos bacocos de serviço e generalistas do óbvio, a História ensina o modo de combater os Venturas, porém, por cá os rapazões das ciências sociais, incluindo o inefável Boaventura Sousa Santos, vivem obcecados com o desejo de obrigarem a rogar de joelhos perdão não se sabe bem de que pecados cometemos muito depois dos muçulmanos sem ousarem abordar o tema. O pastelão lacrimoso Toutinegra do Moinho a par da Rosa do Adro figuram como exemplo de péssima literatura, o Manuel António Pina escrevia primorosamente, as comparações são odiosas, mas não é odioso lermos romances pavorosos dos literatos regionais amantes de se Bem podiam reflectir lendo António Guerreiro às sextas-feiras no Público. Um tronco de negrilho acabou numa escultura de serrote a represei uma fotografia da obra. Hedionda. Os troncos de negrilho em casa da minha avó materna geravam deliciosas repolgas. Uma coisa é o bom gosto gastronómico, outra, a do gosto bastardo dos émulos do crítico de Apeles. Esculpir e escrever com os pés só os desaparecidos tamanqueiros. O nosso vizinho Zé do Telhado viveu antes do tempo, ele não passou de ladrãozeco de estradas e caminhos na zona do Marão, ora e agora empregaria a astúcia em sugar centenas de milhões de euros digitalizando (a panaceia da moda) ordens de saque sem custo, o custo do processo judicial não passava de propina (gorjeta) aos operadores judiciários lendo O Bispo e o Juiz de Hall Caine autor conhecido nos anos sessenta do século em que o Homem pisou a Lua deserta porque os lunáticos tinham emigrado para Portugal pois de «já de cima» o rectângulo lusíada dava a impressão de ser local aprazível, despido de truques de suborno, golpes no baú e cauteleiros operacionais na candonga. O Jarry (sem leitores) aconselha a não continuar a crónica, no entanto, prometo escrever outra assinalando o dogmatismo de jornais e jornalistas pomposos que ao contrário de Ferreira Fernandes preferem a caixa de ressonância ao fósforo, o Manuel Caetano tinha a fama de ter herdado a caixa, o irmão Marcelo o seu conteúdo.

Por quem os sinos dobram

O ambiente no País está quente porque o sol «baixou» levando em linha de conta o saber empírico da Dona Carminda, minha estimada sogra. Infelizmente já falecida. O ambiente diurno e nocturno está quente apesar do madeirense Sérgio Borges há um saco de anos ter avisado que : «Setembro chegou, o verão terminou». Os tempos são outros, de pandemia, os sinos dobram chorando, chorando, pelas centenas de milhares de mortos, pelas centenas de milhões de desempregados, pelas centenas de milhões de jovens desprovidos de esperança num futuro pleno de entusiasmo por estarem a diminuir as desigualdades de todo o género. Os dias estão crispados, agressivos, impacientes, a perplexidade cresce como crescem os cogumelos no tempo chuvoso, só não vê quem não quer ver, os dados a pensarem a causa das coisas vivem angustiados ante o valimento das «profecias» de George Orwell, raro é a semana que não surgem invenções a castrarem a nossa liberdade, a confinarem-nos ao cárcere do isolamento vigiados pelas plataformas manejadas sabe-se lá por quem. Por ninguém, escondido algures deixando uma ponta de um dos seus muitos rabos de fora a permitir a um qualquer chantagista bufar de modo a ser premiado sem escândalo ou protesto da República, o rocambolesco Rui Pinto é paradigma da «democracia» em curso. O notável prosador Tomaz de Figueiredo escreveu Procissão de Defuntos, está lá tudo quanto é a possibilidade de sermos indignos, eu sei, muito de nós sabem quão enorme é o desconhecimento da obra do émulo de Francisco Manuel de Melo, de Manuel Bernardes, do excelso António Vieira alvo da ira de crápulas analfabetos fanáticos estilo maoismo Pol Pot. O clima favorece os extremismos, a deturpação da linguagem, o banimento das normas de civilidade, os profissionais das televisões chochos de prosápia pontapeiam a senhoria na esteira do plumitivo – oh Manuel, sim José – estribado na besta estrangeirista. Os chochos só têm emenda com um arrocho de marmeleiro que é bambo e flexível. O Setembro deste malfadado ano (a fada má deu um beijo vampiresco, sedento do nosso sangue, à fada boa) prossegue na valorização da insanidade como se fosse um passeio aos domingos (José Régio, David Mourão Ferreira, enquanto esteve na tropa, e outros faziam-nos no sopé da Serra de São Mamede), e não é, é sim a bastardização do intelecto nuns descarada normalização rasteira propícia aos répteis de duas pernas perpetrarem negociatas pagas por um Zé Povinho sem energia capaz de produzir virulento corte de mangas. Há anos passei uns dias em Jerusalém, se a cidade por si só emana respeito e minuciosa observação, a sacralidade do Muro das Lamentações é pungente obrigando-nos a rememorar o fluir do profano no universo do sagrado, agora, em 2020, o desfastio relativamente ao sagrado acentua-se a cada dia que passa, os exegetas estudam e meditam, restam poucas vozes dignas de serem ouvidas, duas delas transmontana – Adriano Moreira e António Barreto –, só que Barreto tem sido atacado porque não teve pejo em parafrasear o Menino: rei vai nu. A ortodoxia passeia-se rotunda e segura que a vindima de Setembro será de boa qualidade. O Zeferino camiliano também foi vindimado! Os sinos, plangentes, continuam a dobrar!