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Luís Ferreira

Vendavais - Nefrologistas precisam-se

O  bem mais precioso que podemos ter é a saúde. E quando ela começa a escassear, só nos resta recorrer aos serviços que a podem oferecer. Para isso, é necessário ter um bom serviço nacional de saúde.

Deixou-nos, ainda não há muito tempo, aquele que foi o mentor e implementador do Serviço Nacional de Saúde. Homem de visão e sagacidade que apostou no colmatar de uma falha existente para bem de todo o povo português. Dar saúde a todos por direito, num Estado de Direito. Uma das maiores conquistas de abril.

A sua implementação levou algum tempo, mas foi crucial para a saúde portuguesa. Altos e baixos, como em tudo o que se quer fazer bem, esteve sempre dependente dos dinheiros públicos, levando a ajustes dos vários orçamentos de Estado. Nos últimos tempos, a justeza dos orçamentos, levou os governos a retirar alguns serviços e a diminuir outros, alterando o que se pretendia com o bom funcionamento.

Lembramo-nos certamente que ao longo de todas estas décadas em que contámos com o Serviço Nacional de Saúde, nem sempre houve bom entendimento entre a administração e os médicos, o que levou à criação de serviços de periferia, que muito aborreceu corpo clínico que se viu afastado dos principais centros urbanos, como se as pessoas do interior não tivessem direito a ser assistidos ou os hospitais dispensassem algumas valências, descurando os seus utentes e a sua saúde. Foram tempos de exigência e em que se pensou mais neste interior votado ao abandono. Contudo, ficou a necessidade de não se descurarem os doentes crónicos, que a expensas do Estado, são atendidos mais ou menos bem, mas de acordo com premissas previamente estipuladas, tendo sempre ou quase em atenção a vertente económica do sistema.

É o que se passa com algumas valências, onde existem os doentes e muitos, mas não há médicos especialistas para todos eles, remetendo para o setor de enfermagem os cuidados a ter com eles. É o caso dos doentes sujeitos a hemodiálise, que deveriam ter sempre obrigatoriamente por lei, um médico nefrologistas diário, mas não têm.

O hospital de Bragança teve até há um ano atrás uma médica nefrologista que atendia os cerca de 80 doentes a fazer diálise. A médica saiu para um hospital do Porto e embora dissessem que seria substituída, o certo é que não foi. O serviço de hemodiálise do hospital de Bragança está sem médico nefrologista residente, valendo-lhe um médico da especialidade que vem uma vez por semana de Mirandela, onde tem uma clínica particular. Como é possível que isto aconteça?

A explicação dá-la-á quem souber ou quiser. Não sei se foram abertos concursos e ficaram desertos ou se nem sequer foram abertos para economizar dinheiros públicos. Mas uma coisa é certa: os doentes não podem estar todos os dias a fazer diálise e não ter um médico especialista que possa obviar a algum contratempo que possa surgir a um doente qualquer. A lei obriga a que o hospital tenha um especialista no serviço. Não pode ser ao sabor de quem manda, de quem quer ou não, ou mesmo do que interessa aos serviços. E se a vaga não é preenchida em concurso, então que se arranjem estratagemas que obriguem um médico nefrologista a ocupar o lugar. Se a lei existe e obriga, então que se cumpra.

O corpo de enfermagem tem assegurado esse serviço dentro das limitações a que se vê obrigado, mas não pode substituir o clínico. Neste trabalho insano, há que louvar esses profissionais, mas muito fica por fazer e cumprir. Como diz o povo, não se fazem morcelas sem sangue. Assim, correm-se riscos desnecessários e perigosos. Felizmente que no serviço de Diálise há médicos que por lá vão passando, pois que é necessário observar outros parâmetros dos doentes, mas não são nefrologistas e ninguém pode querer tapar o Sol com a peneira!

Quando o Serviço Nacional de Saúde foi criado não esperava certamente que estas situações se viessem a verificar. Infelizmente. De há uns anos para cá, a saúde tem andado aos trambolhões e só se pensa em como arranjar dinheiro ou em poupá-lo à custa dos doentes que estão à espera de ser bem atendidos. A crise de 2008 veio agravar toda a situação e como os dinheiros públicos eram escassos, os governos logo equacionaram um meio de os utentes terem de pagar e bem, para usufruir dos serviços. O problema agrava-se quando os serviços não são prestados porque não existe corpo clínico adequado. Culpamos os dirigentes, culpamos o Estado, mas não nos culpamos a nós porquê? Alguém tem de alertar para esta situação antes que seja tarde.

É pois urgente que no hospital de Bragança se faça cumprir a lei e que seja preenchida a vaga de nefrologia antes que seja demasiado tarde. Os riscos que os doentes em diálise correm são imensos e podem surgir quando menos se espera. Queira Deus que não se chegue a tanto!

Vendavais - Os trambolhões do Orçamento

As conclusões a que alguns investigadores chegaram sobre o que se passou  quanto ao suposto roubo de armamento de Tancos, vem no seguimento das desconfianças que muitos de nós tínhamos sobre o caso. Tudo era demasiado estranho e sem sentido plausível.

O desvendar de uma série de situações incriminatórias ao mais alto nível, acabou por levar à demissão do Ministro da Defesa e para passar um pano sobre o pó que se estava a levantar em alguns ministérios, Costa resolveu, num golpe de mágica, fazer uma remodelação governamental. Deste modo desviou a atenção da comunicação social e dos portugueses para outro nível, deixando para trás não só o caso de Tancos, mas também a análise e discussão do Orçamento.

O país está a fervilhar. Há um descontrolo total. Uma série de greves com impacto nacional para além do desejável, limita muito o sentido de análise particular sobre determinados assuntos. Na verdade, não sabemos o que devemos discutir ou sobre o que devemos supostamente dar opinião, tal é a dispersão de assuntos graves em curso no país e sobre os quais não há soluções à vista. Desde a greve dos professores à greve dos enfermeiros, passando por muitas outras situações como a dos taxistas, e a dos médicos, tudo tem sido confusão.

O ministro das Finanças entregou no último minuto do tempo disponível, o Orçamento pronto para ser analisado e discutido. Foi um trabalho árduo, suponho, até porque era necessário encontrar pontos de convergência e acordo com os partidos de esquerda. Havia ameaças no ar e não eram veladas. Foi necessário ultrapassá-las.

Para amenizar a situação e acalmar os portugueses, o governo desvendou alguns pormenores do Orçamento como o aumento das pensões, aumento dos salários, descongelamento de escalões da função pública, a descida do IRC, os incentivos ao emprego no interior do país e até a aposta de uma Secretaria de Estado nova em Castelo Branco. Se as coisas fossem tão simples assim, tudo estaria muito melhor e o Orçamento seria um luxo para quem anda há tanto tempo a penar sob uma austeridade destroçadora. Mas não são.

Ninguém dá nada a ninguém sem querer algo em troca. Ora o governo não seria um mãos largas se não tivesse outros trunfos na manga. Para dar por um lado, tem de tirar por outro. Todos sabemos disso. E ele vai tirar e muito. Os supostos aumentos anunciados no Orçamento para 2019, não são reais, pois serão retirados através de impostos diretos e indirectos, como por exemplo o IRS e o IVA e o corte nas reformas antecipadas, para não falar de outras situações como o aumento do imposto sobre veículos ou mesmo os salários que ao passar de escalão passam a ser taxados por outro índice, ficando a receber menos do que antes. Enfim.

Se a comunicação social por vezes dá realce a certas notícias menos interessantes, desta vez tem primado pelos pormenores orçamentais desvendando alguns itens que nos fazem pensar mais pausadamente sobre isto tudo e mostrando o quanto este Orçamento pode ser altamente lesivo para os bolsos dos portugueses.

Por outro lado, as situações que têm vindo baralhar esta discussão têm servido de distracção pura e simples para que o pensamento e análise dos portugueses se disperse o mais possível. Todos sabemos que o Orçamento em ano de eleições tem muito de eleitoralista e este não foge à regra. Nada contra, porque qualquer outro partido que estivesse no governo faria o mesmo, mas não é necessário tomar os portugueses por lorpas. Divulga-se o “toma lá” para que todos fiquem contentes e não se refere o “dá cá”. Mas a cantiga não se altera!

A verdade é que o que aconteceu em Tancos foi demasiado grave e teve gente graúda envolvida. Todos soubera, todos sabiam, todos participavam, todos estavam em conluio e resta saber com que finalidade. É muito triste quando nem nos quadros superiores da defesa nacional se pode confiar. É uma vergonha terrível. Já não bastavam os casos de corrupção e roubo como o caso do Turismo do Norte onde os responsáveis máximos desviaram cerca de cinco milhões, como ainda ficamos a saber que os ministros também andam metidos em situações, no mínimo, altamente comprometedoras.

De qualquer modo e por mais voltas que dê a todo este emaranhado de situações, ficamos sempre com a sensação de que o Orçamento, mesmo aos trambolhões dentro da geringonça, acabará por ser aprovado, mesmo com os votos contra do PSD. E se Tancos acaba por ser esquecido mais tarde ou mais cedo, o Orçamento terá de vigorar durante o próximo ano e é com ele que teremos de viver. Resta saber quem vai ficar a ganhar alguma coisa com ele.

 

Vendavais - Piores, pelas melhores razões

Todos gostamos dos monumentos, de os ver de perto, de os fotografar, de os estudar e até pagamos para os poder admirar e visitar. O homem tem o dom inato da observação e admiração do que o rodeia e isso nutre nele, sentimentos agradáveis ou não, consoante o que se lhe depara. Não é nem nunca foi preciso frequentar a escola para aprender a admirar a beleza, seja ela qual for. Homem e mulher têm essa possibilidade admirável e posicionam-se na sociedade, um pouco ao sabor dessa condição, até porque ela pode e é melhorada a cada dia que passa.

Se a tudo isto juntarmos um pouco de sorte e saber, tanto o homem como a mulher que o conseguem, passam a ter alguma projecção social que acarreta fama e inveja à mistura, numa amálgama explosiva.

A busca da fama, com ou sem proveito, sempre foi um objectivo de todos os tempos para todos os que tinham essa ambição. Nem sempre se consegue fama e glória e muito menos por dá cá aquela palha. Heróis, havia-os na antiga Grécia e esses só depois de ganharem os jogos que disputavam com os melhores. Hoje os tempos são outros. A comunicação social promove rapidamente quem quer ou o seu contrário. De um dia para o outro tudo pode mudar.

Pois é o que está a acontecer com o nosso Cristiano Ronaldo. A comunicação social não se cansou de o elogiar e promover durante anos. Em Portugal e no estrangeiro, é considerado o melhor do mundo. A fama e a riqueza são a sua imagem de marca. É natural que a inveja e as críticas de uns, sejam o gáudio de outros. Ele sabe disso. O seu nome, o seu físico, a sua performance, são capas de todas as revistas e programas de televisão, publicidade de muitas marcas, que à sua custa ganham fortunas e com ele repartem, obviamente, algum desses ganhos.

Rapaz de poucos estudos, subserviente e amigo da família, lutador incansável, subiu as escadas da fama à sua custa e sem ajudas de terceiros. Impôs o seu estilo, o seu saber, a sua arte futebolística e guindou-se ao último patamar da fama. Ao longo de quinze anos, subiu a pulso cada degrau dessa imensa escadaria. Muitos quiseram subir com ele ou ao seu lado essa escada imensa. Aproveitou-se de alguns, mas depressa foram afastados. As razões, sabe-as ele.

Ronaldo e mulheres e mulheres e milhões, são duplas explosivas e incontornáveis. Que mulher em busca de fama e poder não se vê tentada a interferir no seu caminho? Houve muitas e nós nem sabemos quais. A comunicação social deu-nos a conhecer alguns nomes dessas aventureiras pretensiosas a que ele deu mais ou menos atenção, em determinado momento. Casos passageiros e sem grande projecção. Nada de mais, sem ditos e contos, o normal de qualquer paparazzi para uma revista de mexericos.

Hoje, Ronaldo vê-se confrontado com um caso diferente. Esta rapariga americana com quem ele contracenou numa noite de verão num hotel de Las Vegas, vem, dez anos depois, dizer que ele a violou. Francamente! O que a comunicação social divulgou em vídeo e fotografia, dá para ver perfeitamente que ela está satisfeitíssima ao lado dele numa discoteca, sem qualquer objecção, pretendendo passar um bom bocado com o jogador mais famoso do mundo, o que lhe daria um pouco de visibilidade publicitária, já que era, parece, uma simples modelo. Aliás, ela era acompanhante de luxo e angariadora de clientes VIP dessa discoteca que pertencia ao hotel onde trabalhava. Ela aceitou ir para o quarto do Ronaldo, não para aprender a dar uns toques na bola, mas para passarem uns momentos de sexo escaldante a troco de dinheiro e muito. Violada!

A verdade é que ela foi para a cama pelas melhores razões e com a pior das intenções. Na cama com o melhor do mundo é caso para se gabar, nem que sejam dez anos depois, já que na altura não conseguiu mais do que alguns milhares de dólares. Agora é a possibilidade da fama fácil. Eu sou contra qualquer tipo de violação sexual. Não está isso em causa e defendo as mulheres que têm a coragem de o denunciar e provar cabalmente. Provar é que não é fácil e muito menos dez anos mais tarde. O que Kathryn Mayorga quer agora é acesso fácil à fama, pelas piores razões. Claro que louvo a sua coragem em expor-se a muitas opiniões, a favor ou contra, tanto tempo depois e sem ter como provar essa suposta violação. O que existe são fotos e vídeos onde aparece a rir, contente e feliz, ao lado de um engate bem-sucedido e com propósito bem definido. Nada mais. Se ele fosse um simples jogador, ou empresário medíocre, ela não se dava ao trabalho de denunciar o seu ato, seja qual for, até porque casos desses, ela tem todos os dias, pois é para isso que lhe pagam.

Perante isto, temos um Ronaldo que passa a ser considerado dos piores, mas pelas melhores razões. Gostar da beleza e mesmo ter de pagar por ela para a ver de perto e usufruir dela, é o mais comum quando queremos observar a arte. Pena é que esta arte, seja efémera e banal.

Vendavais - A fraqueza dos ministros

Quando se quer fazer crer que alguma coisa vai ser feita em prol de uma qualquer reivindicação, surgem as promessas e de igual modo se faz se queremos atingir um objetivo imediato ou mesmo retardar um determinado processo.

Antes do governo fechar as portas e ausentar-se para férias “administrativas” ou outros se ausentarem em férias legislativas, foram feitas algumas negociações ou pelo menos tentativas, com diversos sindicatos, deixando para depois do período de férias, uma agenda bem preenchida de promessas de resoluções, com uns e com outros. Todos foram gozar os seus merecidos dias de lazer na firma convicção de que na devida altura tudo se iria resolver ou no mínimo, elencar soluções possíveis para levar a um termo justo e digno, quer para o governo, quer para os que reivindicavam, essas soluções.

Agora, no tempo em que se esperavam algumas resoluções, eis que o país está, na sua plenitude, em manifestações de greve, arrastando para o caos a maior parte dos serviços nacionais dos diversos ministérios. O governo parece ainda estar de férias! Nada se diz e nada se faz. Os taxistas esperam que António Costa regresse do estrangeiro para conseguir chegar a algum entendimento, já que com o ministro do ambiente nada se consegue e eles também não estão interessados em conversar depois das últimas afirmações face ao problema que querem resolver. A lei não justifica tudo, pelos vistos.

Os enfermeiros entraram em greve nacional e entravaram completamente os serviços mais essenciais como as urgências e os Centros de Saúde que se vêm completamente entupidos. As cirurgias deixaram de se fazer por falta de profissionais suficientes do setor e os tratamentos mais prementes ficaram adiados por mais dois dias. Ao que chegámos!

O novo ano letivo iniciou-se este mês de setembro com alguns contratempos e com algumas esperanças no que se refere ao diálogo com o ministério da tutela. O senhor ministro não quis conversar e o governo continua a dizer que tem razão e que o orçamento, sempre o orçamento!!, não comporta os ajustamentos exigidos pelos professores.

Depois da greve nacional dos professores no final do ano letivo anterior, que criou alguns constrangimentos nas avaliações finais e nas entradas nas universidades, ficou prometido que o governo se sentaria à mesa das conversações para nova ronda de negociações. Promessas. Só promessas. Valeram somente para que durante as férias todos estivessem calados e esperassem calmamente pelo início do presente ano letivo. Mas no ar pairou sempre uma ameaça de greve se as negociações não fossem efetivas. E não foram. Até agora tudo continua na mesma e o governo mantem-se firme à margem de todas as promessas. Diálogo de surdos.

Assim, não admira que a convicção dos sindicatos de levar a cabo uma greve no início do ano letivo, se vá confirmar em outubro. Era uma promessa dos sindicatos. Pelo menos alguém cumpre as promessas. Mas se o objeto da greve é a contagem do tempo de serviço e a sua reposição perfeitamente legal e em tempos negociada e aprovada, já o mesmo não se verifica por parte do governo que continua a esgrimir o orçamento como uma espada de Dâmocles a cair não se sabe bem em que pescoço.

Para fazer esquecer toda esta problemática das carreiras dos professores e dos quase dez anos roubados, o governo inventou um processo para entreter os professores e levá-los a perder horas numa análise de uma ou duas leis sem sentido algum e que em nada contribuem para a melhoria do sucesso escolar. Estamos a construir escolas para alunos que supostamente, deveriam ser óptimos, mas que acabam por não ser, perante as alcavalas que lhes são impostas e o tempo que lhes é roubado ao seu currículo e aos professores que com isso têm de lidar. Não tem nexo esta alteração, principalmente quando este sistema, copiado, falhou completamente no norte da Europa. Nós copiamos sempre o que não presta. Como haveríamos nós de encaixar num sistema feito para um povo de mentalidade completamente diferente da nossa e cujos padrões de vida não se coadunam com os do sul da Europa? Impraticável. Aliás, já é a segunda vez que o tentamos e parece que não se aprende. Queremos uma escola inclusiva. Pois bem, a nossa escola sempre o foi, mas tem sabido fazer as adequações necessárias. Não se pode ser inclusivo quando se levantam barreiras para todos os alunos. Sempre tivemos e teremos alunos bons, menos bons, normais e com deficiências e não foram excluídos quer uns, quer outros. Seguiram sempre um rumo com objetivos certos e corretos. Agora este ministro quer abrir uma auto-estradas onde todos circulem, independentemente de saber ou não o código da estrada. Claro que vai haver acidentes. Aqui reside a grande fraqueza deste ministro. As outras já são conhecidas.

Vendavais - De portas abertas

Quando pensamos que as férias são para usufruir de um descanso merecido e até poderão ser, o certo é que para outros elas são um tempo de ocupação, mais ou menos séria, que acaba por dar alguns frutos. Lógica do objetivo laboral.

Esgotado agosto e pensando em fechar a porta do lazer, eis que se abrem outras portas que nos deixam entrar em compartimentos menos estanques e revelam pormenores menos lógicos de azáfamas igualmente menos lícitas.

Embora se soubesse ou desconfiasse do que se passava lá para as bandas da Luz, inesperadamente abriu-se uma porta imensa que revelou pormenores de manobras menos lícitas que poderão levar a sanções terríveis, pelo menos em termos desportivos. O que veio a lume recentemente, trouxe-nos uma teia de corrupção, que não pára somente na Luz. As possíveis sanções, em termos desportivos, com base nas declarações já pronunciadas pela comunicação social, arrasta para a lama a verdade desportiva e os clubes que a ela faltaram, manchando completamente o que de melhor ainda tínhamos no país.

Quando damos por nós a pensar que existem pessoas que se dedicam a comprar favores para adulterar completamente os jogos e com conhecimento dos dirigentes máximos desses clubes, sabendo que a verdade virá sempre ao cimo, como o azeite, indignamo-nos e começamos a desacreditar no que conseguia arrastar multidões para ver jogar os seus atletas preferidos em defesa dos clubes em palco. Mentira! Jogos de mentirinha.

O que se está a passar no Benfica é o descalabro completo se tudo se provar devidamente. É uma tristeza. Imaginemos que realmente o Benfica fica castigado de participar no campeonato nacional durante 6 meses ou mais, já que pode ir até três anos. Se forem seis meses, perde a possibilidade de lutar pelo campeonato, se for um ano ou dois ou mais, o Benfica vai completamente ao charco. Desaparece! Os jogadores terão de sair e ir para outros clubes e o Benfica não vai comprar nenhum jogador e pagar-lhe para estar sem jogar. Fica inanimado. Uma desgraça para o futebol nacional e para o clube, já para não falar dos adeptos e sócios. Como é possível correr riscos destes em nome de vantagens desportivas ilícitas?

Não está aqui em questão ser deste ou daquele clube. Não, nada disso. Está em causa a verdade desportiva de que tanto nos gabamos, da veracidade dos nossos clubes, da paixão que nos movimenta quando vamos a um estádio. O que fica depois disto tudo? Uma vergonha imensa e um desânimo atroz. Dá-nos vontade de castigar cada um dos culpados de modo a que nunca mais se pudessem esquecer que andaram a brincar com os sentimentos dos que os apoiam, com o dinheiro de quem lhes paga e até com a justiça como se ela fosse efetivamente cega. Mas não é. Nem deve ser.

Quando Bruno de Carvalho veio a lume com os vouchers do Benfica, todos o criticaram e, embora provado, não foi objeto de sanções, mas no ar ficou a desconfiança e nem Vieira conseguiu apagar esse sentimento. Apesar de conhecermos as razões de Bruno de Carvalho e o modo arruaceiro de se pronunciar, além do ódio figadal que nutre pelo rival da segunda circular, ele tinha alguma razão no que revelou. Foi uma porta aberta, na ocasião, que acabou por levar a outros corredores que por sua vez desvendaram salas maiores. Infelizmente.

De toda esta panóplia de acontecimentos, de diz e que não disse, a justiça tirará as suas conclusões e dará o castigo ajustado, ou não, a tudo o que se provar. É com muito pesar que vejo a possibilidade de o Benfica ser afastado do campeonato nacional durante algum tempo. A ser assim, os sócios e adeptos deveriam castigar fortemente este tipo de atitudes e quem as levou a cabo. É inadmissível.

Mas também outra porta se abriu. O Moreirense está metido em igual lamaçal. Compraram a verdade desportiva. E o que lhe pode acontecer? Já foi proclamado culpado e o tribunal já decretou a sua suspensão por um ano, do campeonato nacional. E agora? A suspensão só fará sentido no próximo ano, já que este ano seria difícil continuar o campeonato depois de se terem jogado alguns dos jogos do campeonato onde se envolveram todas as equipas que dele fazem parte. Mas como vão jogar os atletas sabendo que estão a jogar a feijões? Como vão jogar sabendo que no próximo ano estão de fora do campeonato e do clube? No próximo ano, o que fazer aos jogadores que têm assinado contratos por alguns anos? Pagar-lhes sem jogar? Mandá-los embora e ressarci-los de acordo com o que for negociado? E como preparar o clube para um próximo campeonato? De onde vem o dinheiro para comprar jogadores?

Por favor fechem a porta da corrupção o mais depressa possível. Assim, ninguém aguenta.

Vendavais E eis que se acaba Agosto

Mês por excelência, para gozar férias merecidas após um ano de labuta, agosto esgota-se na tenência mundana de todos os dias e fins-de-semana. Não interessa muito se os dias são passados na montanha, no litoral, à beira-mar ou no remanso de um rio que, alindado com uma areia fina, se lhe impõe uma praia apetecível para que os veraneantes se apaixonem e por ali fiquem a desfrutar momentos inesquecíveis deste mês de agosto que teima em ser demasiado quente. O que interessa, no fundo, é que os dias de férias sejam gozados com alegria junto dos que mais se amam. Assim, enquanto uns vão ver as ondas a espraiarem-se nas areias finas dos mares do sul, outros apreciam as ondas de mares mais revoltos no litoral atlântico ou chegam-se ao litoral algarvio para apreciar as águas mais quentes e dar conta do que o fogo queimou num ápice de ironia como se por ali quisesse fazer férias à custa dos que por ali moram, rouban
do-lhes a vida, a dignidade e até a própria identidade. Enorme ironia do destino num fado tristemente cantado em dias do mês de agosto! Outros ainda, longe das praias e dos fogos, passeiam-se pelos passadiços com a família a levando a reboque a comunicação social para que todos saibam que por ali andou o mayor de Portugal, desfrutando da frescura do interior e da beleza do rio que por ali serpenteia, o Paiva. Porém, outros há que, não gozando as férias que mereceriam certamente, passam os dias quentes de agosto pelos montes fazendo as malhas de colheitas mínguas e se enchem do pó da terra dura que espera pela chuva que teima em chegar. Concepções diferentes de férias e de momentos que não se esgotam nos magros exemplos apontados. Um pouco por este país de História tão rica, aproveita-se este mês de agosto para realçar os feitos que os antepassados marcaram, escrevendo nas páginas desse livro imenso, o que em 
tempo oportuno, lhes aprouve fazer. Deste modo, assaltaram-se castelos fazendo da História uma festa para mostrar aos mais jovens o que muito lá para trás nas esquinas do tempo, se fazia para manter a integridade do nosso país nos diferentes locais em que eram chamados a defender a todo o custo. Perfeito medievalismo em exibição, enaltecendo a História de Portugal em numerosas facetas. Tempo de lutas sérias e de feitos gloriosos. Outros tempos! Pois também eu fui passar uns dias de férias por este Portugal de nós todos. Nunca conhecemos demasiado destes recantos que por cá temos. Montes e serras, praias fluviais de águas serenas e praias de marés vivas, temos para todos os gostos. Constatei, contudo, que se lê muito pouco em qualquer desses lugares. Estendidos nas areias sublimes sob um sol escaldante, usufrui-se mais do astro rei, do que das páginas de um bom livro. É pena. Recordo tempos em que não se ia para a praia sem um livro em parceria 
com a toalha. Bons tempos! Mas em vez do livro, lá está o telemóvel ou o tablet para apaziguar o vício ultrajante da conversa necessária que se esfuma nos clics que as pontas dos dedos se apressam a dar. Outros tempos! Claro que as férias não se esgotam em agosto. Elas passeiam-se por junho, por julho e até por setembro. Por aqui, estamos habituados a que também o verão se esgote depois da novena da Senhora da Serra. Assim, depois do dia 9 de setembro preparemo-nos para dias mais frescos. Nada de novo, mas com estas alterações climáticas, nunca sabemos se o verão se prolonga até outubro. Disso temos exemplo há dois anos atrás. De chuva é que nem rasto. É um bem que poucos apreciam e imploram, a não ser o agricultor atarefado e muito preocupado com a incerteza do porvir. A chuva é a sua apólice de seguro, o seu ouro escondido que nem sempre brilha e que faz jus ao ditado popular, já que não é necessário brilhar para ser uma riqueza imensa. Estamos à espera que chegue. Os solos estão secos e o fogo espreita. Já estão em perigo alguns frutos. Acaba-se agosto, acabam-se as férias, mas que não se acabem as colheitas das necessidades prementes. Deste modo, incutiu-se na mentalidade dos portugueses que agosto é o mês das férias e que em setembro tudo recomeça. De facto, é um pouco assim. Lá vai o tempo em que se falavam de férias grandes, quer para os alunos, quer para os professores, já que só eles as gozavam ou disso tinham menção. Hoje tudo se esgota em agosto. Setembro traz de novo o início de um ano letivo que vai dar passos de enorme incerteza já nos primeiros dias. As escolas e os alunos não têm a certeza de um começo pacífico. Anunciam-se greves de professores face à ineficácia do governo na resolução de pontos acordados e incluídos no orçamento. Tudo está em stand by. Gozemos então, os últimos dias de agosto que setembro vir não parece sereno.

O fogo que nos consome

Passou quase um ano depois do fatídico braseiro que incendiou o centro do país e que matou umas dezenas de pessoas e atirou outras para o desespero da ignorância, para a pobreza arrastada, para a ingratidão e para o esquecimento. O país sofreu imenso com tudo o que aconteceu. Todos lamentaram e todos prometeram que não mais haveria de acontecer semelhante atrocidade. Promessas.

De tudo isto ficou essencialmente o nome de Pedrógão e o da estrada da morte. Sinais indicadores da localização da tragédia. Não são placas. Não são necessárias! Mas são avisos que deveriam levar os responsáveis a evitar repetição. Teatros de tragédias tão grandes, que os atores pereceram em plena cena de dois atos.

Depois disto, alimentou-se o ego dos portugueses com a interajuda em prol dos que tudo perderam. Era necessário ajudar a reconstruir o que se perdeu. Chegaram muitas ajudas e em várias formas, desde roupa a dinheiro. E o que não deveria acontecer, aconteceu. Uma confusão tremenda para saber como distribuir o dinheiro e por quem. Quando há dinheiro à mistura, há confusão! Por que será?

Quase um ano depois, vem a lume a triste notícia de que o dinheiro foi manipulado por quem não devia e não chegou a quem deveria. Alguém se aproveitou do que não lhe pertencia. Será possível? Claro que sim e não me causa estranheza. Estamos um pouco habituados a estas atitudes, infelizmente.

Assim, muitos que esperavam ter a sua casa de volta, ainda não têm porque alguém resolveu desviar para proveito próprio o que a outros pertencia. E as mentiras? Mais que muitas!

As promessas do governo e as certezas de atuação em massa com milhões à mistura para assegurar o bem-estar das populações, soaram como calmantes no coração dos portugueses. Não mais haveria de se correr riscos de tamanha enormidade. Assim se esperava!

Pois assim deveria ser. Mas eis que surge de novo o fogo que nos consome a alma e nos desestabiliza o ser. Monchique volta a ser notícia pela pior causa. Uma dúzia de anos depois de ter ardido e ter reduzido toda a serra a terra queimada, volta a arder e a invadir propriedades alheias, roubando casas, terras, herdades, automóveis num autêntico caos e desorganização total. Ninguém estava à espera de coisa semelhante depois de todas as promessas feitas e de todas as garantias de segurança, quer a nível de comunicações, de organização, de meios de combate e de homens no terreno. O governo ordenou que se limpassem as bermas das estradas e dos terrenos e isso foi feito. Gastou-se dinheiro e parece que valeu de muito pouco, pelo menos nas povoações da serra por onde agora lavra o fogo terrível que põe o Algarve em sobressalto.

No ano passado acusaram o Presidente Marcelo de andar pelo meio dos locais afectados, levando algum consolo a quem precisava de se sentir amparado. Este ano, ele afastou-se e preferiu banhar-se nas águas calmas dos rios por onde o fogo lavrou no ano transacto, mas não desligou do que está a acontecer no sul do país. Mas as críticas chovem de igual forma e se elas se transformassem em chuva, certamente que o fogo se apagaria bem mais depressa.

Se daqui a uma dúzia de anos voltar a acontecer, como no Algarve, o que aconteceu em Pedrógão e em Santa Comba Dão, voltaremos a falar da tal segurança que nunca mais chega e dos riscos que todos corremos quando chega o Verão. Oxalá que tal não aconteça!

Sem haver ainda culpados e explicações plausíveis para o desaparecimento do dinheiro que deveria ser aplicado em Pedrógão e nas localidades afetadas pelo fogo no ano passado, deparamo-nos com outra situação idêntica onde casas e terras desaparecem com a voracidade das labaredas infernais que tudo consomem e deixam na miséria os seus proprietários. E agora? Questionemo-nos pois, sobre o que poderá acontecer. Quem vai movimentar os dinheiros e as ajudas para estas pobres pessoas que ficaram sem nada? O governo? As Misericórdias? Os grupos (!!!) arranjados à pressa para levantamento dos prejuízos e para a aplicação do dinheiro destinado à reconstrução das casas?

Ainda os de Pedrógão não têm as suas casas todas pelas razões que sabemos e já estas estão perante situações iguais que levam, desde já, a desconfianças do mesmo teor. Ficaram sem as suas casas e quando voltarão a ter outra? Até lá, onde vão ficar?

Afinal o fogo não consome somente a floresta e as casas, consome do mesmo modo, o nosso interior, o nosso ego e a nossa identidade.

Vendavais - Barba rente

O homem faz a barba desde que é homem. Primeiro com pedras aguçadas, com conchas e outros objetos cortantes. Para facilitar a operação e proteger a pele, mais tarde, usou o azeite, a banha e outras gorduras.
Com a descoberta dos metais apareceu a faca que, neste domínio, prestou muito bons serviços, durante séculos. 
Em finais do século XVIII, a grande descoberta deve-se ao francês Jean Jacques Perret que criou uma navalha especial, dobrável e de aço extraordinariamente fino e cortante. Foi a navalha que todos ainda conhecemos, mas que poucos usam. Só nos barbeiros e não é em todos, é que ainda se faz a barba com a célebre navalha.
Esta navalha foi já objeto de grandes discussões e análises e já esteve proibido o seu uso em alguns locais e épocas variadas devido ao uso ameaçador do proprietário quando alguém mais comprometido se sentava na cadeira do barbeiro. 
Realmente ter a navalha no pescoço, era estar a um passo da morte pois a ameaça do manejador sentenciava muitas discussões e também igual número de chantagens. Coitados dos que tinham alguns rabos-de-palha.
Hoje, seria talvez um bom instrumento para endireitar caminhos menos claros que muitos dos nossos políticos percorrem. Tal como a necessidade aguça o engenho, também o medo faz arrepiar caminhos.
Todavia, considerando o elevado preço desta navalha, o americano King Kampfe Gillette fez a grande descoberta que havia de chegar ao mundo inteiro e conquistar todos os mercados: a lâmina de dois gumes, de usar e deitar fora.
Esta não trazia ao mundo nenhuma ameaça e era de uma ligeireza extraordinária, quer no desfazer da barba, quer no seu tempo de utilização e não precisava de ser afiada constantemente como a célebre navalha ameaçadora de pescoços.
Instalada numa pequena máquina de baixo custo, para uso individual, facilmente conquistou os utilizadores. Contudo, os barbeiros não se desfizeram do antigo instrumento de barbear. Resta saber se por comodidade ou se para sua defesa e não só. O barbeiro com a navalha na mão, é juiz em sede própria, ainda que a sentença possa tombar para qualquer lado.
Apesar de tudo, o espírito de economia e poupança breve levou à criação de uma maquineta capaz de afiar estas lâminas já em fim de vida, prolongando-lhes o tempo de duração. A fábrica Allegro, na Suíça e também em Inglaterra, entre os anos 30 e 60 do século XX, criou e difundiu este dispositivo de fácil utilização e de resultados satisfatórios. Tinha o inconveniente do seu custo, relativamente elevado, razão por que a sua generalização se ficou pelas pessoas com maior poder aquisitivo. E se ao tempo, alguns se dedicavam nos tempos mortos a afiar essas lâminas da Gillette, outros que não tinham tempo para essas modernices, limitavam-se a usá-las mais tempo e depois deitá-las fora.
Entretanto, a criatividade do homem encontrou outras alternativas, mais baratas e descartáveis e que não oferecem perigo de maior.
Contudo, o homem imbuído nas andanças das modernices e do progresso, inventaria de seguida a máquina eléctrica de barbear. Mais cara e menos versátil, não é de todo o instrumento preferido para fazer a barba.
A velha navalha de barbear, essa sim, continua a marcar pontos quer no desfazer da barba, quer nas ameaças para quem se senta na cadeira da justiça popular que no dizer do barbeiro, “aqui só senta quem não está comprometido”. Pudera!

 

Vendavais Obesidade mental

Sabemos bem que a obesidade, tão falada nos últimos tempos e olhada como causa de variadas doenças é excesso de gordura física devida a uma alimentação desregrada, mas não só. Há outros tipos de excessos que conduzem aos excessos físicos.

As notícias que hoje circulam tão rapidamente, alertam-nos para os perigos da obesidade, contudo, as próprias notícias são, por si só, tantas e tão alarmantes que são o exemplo da própria obesidade informativa.

É altura de notarmos que os nossos abusos no campo da informação e conhecimento estão a criar problemas tão ou mais sérios que os decorrentes da obesidade física. A nossa sociedade está mais atafulhada de preconceitos que de proteínas, mais intoxicada de lugares comuns que de hidratos de carbono.

As pessoas viciam-se em estereótipos, juízos apressados, pensamentos tacanhos e condenações precipitadas, de tal modo que todos têm opinião sobre tudo, mas conhecem pouco ou nada sobre as coisas. E isso parece não interessar muito. A opinião é livre.

Os jornalistas são hoje os “cozinheiros” da “fast food” intelectual e, os comentadores, editores e filósofos contribuem para isso. Dizia alguém, com prioridade, que os telejornais e as telenovelas são os hambúrgueres do espírito e as revistas os donuts da imaginação. Cada vez é mais verdade. Uns pela informação doentia e outros pela informação viciante.

Embora se queira escamotear a situação e dar outras justificações para tudo, o problema central de toda esta panóplia calamitosa está na família e na escola. A verdade é que qualquer pai responsável sabe que os seus filhos ficarão doentes se comerem só doces e chocolates! Engordarão imenso se comerem só hambúrguers. É pois urgente que se informem sobre o que não se deve comer, ou sobre o que não se deve fazer. A sociedade é um palco enorme e complexo, tão mais complexo pela diversidade e quantidade de pessoas que nele contracenam. Então não se entende como é que tantos educadores aceitem que a dieta mental das crianças seja composta por desenhos animados, videojogos e telenovelas para não falar do uso excessivo do telemóvel. Com uma alimentação intelectual tão carregada de adrenalina, romance, violência e emoção, como é que os jovens vão conseguir uma vida saudável e equilibrada?

Quando nas escolas se mencionam disciplinas curriculares como Educação para a Cidadania, leva-nos a equacionar o porquê de querer transmitir aos jovens como comportarem-se na sociedade, quando ao lado, mesmo os pais, lhes deixam espaço para a controvérsia comportamental.

A informação que se transmite tem que ser racionada, no bom sentido, no sentido positivo da realidade. Ora os jornalistas alimentam-se quase só de detritos de escândalos e de restos mortais das realizações humanas. A imprensa não informa, seduz, agride e manipula. Só a parte morta e apodrecida da realidade, chega aos jornais ou são por eles transmitidas. O importante, o cerne das questões, não interessa. Todos sabem que J.F. Kennedy foi assassinado, mas não sabem quem foi ele; todos sabem que a capela Sistina tem um teto lindíssimo, mas não sabem para que é que ele serve; todos acham que Saddam Hussein foi mau e que Mandela era bom, mas nem desconfiam porquê; todos ouviram falar de Pitágoras e do seu célebre Teorema, mas ignoram o que é um cateto. Ou seja, as realizações do espírito humano estão em decadência. Perdem importância.

De tudo isto resulta o quê? É simples. A família é contestada, a tradição é esquecida, a cultura banalizou-se, o folclore entrou em queda e a arte é fútil e paradoxal. Em contraponto, floresce a pornografia, a imitação e o egoísmo. O âmago de todas as questões, não interessa. O que importa é a superficialidade das coisas. Interessa o quê e não o porquê. É quase uma falsidade compulsiva o que nos chega todos os dias, quer como informação, quer como saber.

É tudo uma questão de obesidade. E não é física. É mental.

O homem moderno está adiposo no raciocínio, nos gostos e nos sentimentos. O mundo precisa de uma dieta mental urgente.

Vendavais - A incapacidade de meia dúzia e o desespero de milhões

Continuará ser uma eterna redundância dizer ou admitir que os portugueses são perpétuos sofredores na perseguição de objetivos que raramente atingem. Diremos o mesmo daqui a um século e os que vierem depois continuarão a dizer o mesmo. Penso que não é por burrice nossa ou desinteresse intelectual. É da própria natureza das pessoas. Somos assim.

A verdade é que quando conseguimos atingir objetivos concretos, tornamo-nos heróis e, se para os atingirmos sofremos como loucos, tanto melhor, pois o sofrimento valoriza substancialmente a vitória. É o caso do que aconteceu com a nossa seleção.

Perdemos ganhando! Claramente. Sofremos etapa após etapa, vitória após vitória, mas ultrapassámos a fase de grupos. Ganhámos e ultrapassámos essa dificuldade para chegarmos aos oitavos. Todos estavam esperançados em mais vitórias para conseguirmos chegar aos quartos. O Uruguai era uma seleção ao nosso alcance. Todos acreditaram nisso. Contudo já muitos sofriam por antecipação. Todos acreditavam que Ronaldo poderia resolver a questão. Puseram aos seus ombros um peso tão grande que quase não se conseguiu mexer em campo perante o muro defensivo do Uruguai.

A tarefa foi da seleção, mas o sofrimento foi de milhões. Portugal parou para ver o jogo. O Brasil parou com os olhos postos nos ecrãs de televisão. No Uruguai, a incerteza cruzava-se com a ansiedade e a esperança. Tudo e todos estavam em suspenso. Parecia que o mundo inteiro dependia do resultado de um só jogo. Até o governo português se mudou para a Rússia! Enquanto a Catarina Martins se insurgia contra a lei das rendas e dos despejos em Portugal, na Rússia apostava-se na vitória da seleção.

A par de tudo isto, em Portugal inteiro não se ouvia falar de política. Tudo se calou. A vitória da seleção resolveria todos os problemas certamente. A alegria colmataria os possíveis problemas que surgissem e faria esquecer todas as desavenças. Mas era necessária a vitória.

Não aconteceu. Ronaldo não resolveu, a seleção não venceu e a vitória resumiu-se ao desespero de milhões que ansiavam por ela. Não podemos dizer que sobreveio a desilusão. Não. Não tivemos sorte. A incapacidade de meia dúzia foi notável perante a eficiência de um só. Nada que não se desconfiasse.

Arredado do mundial, Portugal terá de continuar o seu caminho e agora torcer por quem julgar que merece. Mas quem? Afinal as grandes selecções foram afastadas. Alemanha, Espanha, Portugal, Argentina. Atípico, mas real. Até Madona sofreu com a derrota de Portugal. Seguiu o jogo, minuto a minuto, jogada a jogada na esperança de uma vitória do país que escolheu para viver. Desiludida, manifestou-o publicamente. Nada a fazer. Mesmo parcialmente descontente com o que ainda não conseguiu ter por cá, pelo menos tem a seu favor o facto de a Câmara Municipal de Lisboa lhe ter cedido terrenos para parqueamento das quinze viaturas que lhe pertencem, pela módica quantia de 720 euros por mês. Ou seja 2,78€ por cada viatura por dia. Barato, não? Pois também não é para qualquer um. É que estas mordomias só são para quem tem muito dinheiro!

Pois, mas voltemos à ansiedade dos portugueses. À conta do futebol, tudo passou para segundo plano. Não ouvimos falar os governantes em questões de política interna. Só futebol. A comunicação social só fala e transmite futebol. E agora que a seleção foi afastada, há que realçar o feito de ter chegado aos oitavos de final. Os heróis nacionais foram recebidos de braços abertos no aeroporto de Lisboa. Claro que sim. Mereceram mesmo perdendo. No ar ficou a mensagem de que a seleção continua a ser a melhor e que daqui a dois anos ainda temos algo a dizer. Quem dera!

No meio de toda a confusão até a greve dos professores passou ao lado. Mas só por dois dias, porque ela continua esta semana, mesmo com os serviços mínimos decretados ilegalmente pelo ministro. Ofuscado pela seleção, também ele se esqueceu das leis e começou a esgrimir decretos ilegais em vez da bandeira nacional. Coisas de quem está confuso!

Agora que o futebol ainda tem quinze dias para arregimentar algumas atenções internacionais, cá por dentro também mexe com os sentimentos de muitos e continua a ser manchete de jornais. É claro que o Sporting está na frente ao ter já novo treinador e um Conselho Diretivo a trabalhar para reintegrar jogadores que se “ausentaram”. A ver vamos! As eleições serão um desafio. Mas também aqui, um sportinguista ferrenho quer criar um novo partido político. Outro? Que desespero! Já não bastava o futebol? Francamente!