PUB.

A.F.Bragança recebeu deputada da Assembleia da República

ESTA NOTÍCIA É EXCLUSIVA PARA ASSINANTES

 

Se já é Assinante, faça o seu Login

INFORMAÇÃO EXCLUSIVA, SEMPRE ACESSÍVEL

Ter, 14/02/2017 - 11:33


A deputada do PS do distrito de Bragança na Assembleia da República reuniu, esta segunda-feira, com a direcção da A.F. Bragança. Foram abordadas questões “essenciais da realidade diária” do futebol e futsal no distrito, referiu António Ramos, presidente da A.F.B.

Alterações Climáticas e o Futuro das Cidades

Há atualmente concordância no seio da Comunidade Cientifica Mundial e do Governo das Nações de que, as alterações climáticas são uma realidade, com efeitos à escala global, que as medidas para reduzir os estragos devastadores provocados por fenómenos climáticos extremos, tem que ser assumidas por todos os Governos. Trata-se de proteger a permanência da vida humana na Terra, a nossa casa comum! Existe, igualmente, concordância de que essas medidas devem proporcionar uma nova oportunidade de prosperidade para os povos e de uso sustentável dos recursos do planeta. 
Os efeitos de situações Climáticas extremas, como inundações e secas, incidindo com maior intensidade em algumas partes do planeta, refletem-se á escala global. São exemplo, os grandes fluxos migratórios de população, a alteração de preço de matérias-primas e alimentos essenciais. Na Europa são os países do Sul os mais vulneráveis, enfrentando danos nos ecossistemas, na agricultura, na silvicultura, nas infraestruturas em geral, nas zonas costeiras, na saúde pública.
O elevado impacto dos danos provocados na natureza, na economia e na vida das pessoas, em resultado das alterações climáticas está a contribuir para uma mudança na forma de pensar o desenvolvimento. Emerge a transição do modelo de economia baseado nos combustíveis de origem fóssil para um novo modelo de desenvolvimento, baseado na economia verde e do conhecimento, gerador de novas atividades económicas, novos empregos, o regresso a uma cultura mais exigente no relacionamento do homem com a natureza.
Esta nova visão do futuro é uma aceitação de mudança, é ter consciência de que o movimento global contra as alterações climáticas é tarefa de todos os países, uma reação de sobrevivência à escala mundial, é compreender que, se a humanidade sempre foi capaz de resolver os graves problemas com que se defrontou, seguindo em frente, o mesmo será feito pelas gerações do presente.  
Esta visão do futuro apoia-se numa atitude de confiança e de esperança, tem presente uma forte aceleração da inovação, do conhecimento, da tecnologia que na cidade nos fará conviver cada dia com mais inteligência artificial, nos espaços públicos e privados. Escreveu o visionário AlvinToffler, no ano de 1970, em o “Choque do Futuro”, “a aceleração da mudança, no nosso tempo, é em si mesma uma força da natureza”. O mesmo autor escreveu no ano de 1990 em “Os Novos Poderes”, acerca da “mudança em aceleração” – à medida que avançamos pela terra incógnita do amanhã, é melhor ter um mapa geral incompleto, sujeito a revisão e correção do que não ter mapa nenhum -.
É neste enquadramento que as cidades se posicionam, adotando princípios e compromissos, agindo no âmbito do “Pacto de Autarcas para o Clima e a Energia”, planeando, mapeando tarefas para a sustentabilidade energética do seu território, envolvendo agentes económicos, sociais, instituições públicas, cidadãos, trabalhando para um futuro melhor que inclua todos os cidadãos, construindo uma cultura de maior sustentabilidade e competitividade, agindo num dos seus fatores críticos.
Nesta linha de orientação, a União Europeia, em março de 2007 adotou o pacote “ Energia para o mundo em mudança”, comprometendo-se a reduzir as emissões de CO2. No ano de 2009 adotou o pacote “Clima – Energia” como ato legislativo para o compromisso das metas de redução de pelo menos 20% das emissões de GEE em relação aos níveis de 1990, assegurando que 20% do consumo energético da EU seria proveniente de energias renováveis, assegurar uma redução de 20% nos consumos de energia primária. 
A experiência de envolvimento das cidades na Agenda 21 Local e na rede de Cidades Sustentáveis contribuiu para que o “Pacto de Autarcas”, em pouco tempo tivesse evoluído para uma iniciativa urbana global que envolve milhares de autoridades locais e regionais. No ano de 2015 evoluiu para “Pacto de Autarcas para o Clima e a Energia”, adotando os objetivos da EU para 2030, de reduzir as emissões de gases com efeito de estufa em 40% e uma nova visão partilhada para 2050, no sentido de acelerar a descarbonização da economia; reforçar as respostas às alterações climáticas; garantir o acesso a energia segura, sustentável, a um preço razoável.
A estratégia do Programa Operacional da Região Norte inclui os desafios da sustentabilidade ambiental, nos quais se inclui a eficiência energética, a qualidade do ar, a qualidade da água e a preservação da biodiversidade. Apoia, nos Eixos 3,4 e 5 com cerca de 705 milhões de euros as políticas de sustentabilidade no território, através de estratégias integradas no âmbito dos Planos de Mobilidade Urbana Sustentável, visando a qualidade de vida e a redução da intensidade energética nos transportes, através do aumento do transporte público e dos modos suaves, da gestão integrada da mobilidade e dos transportes.
Inclui os Planos de Ação para a Regeneração Urbana, visando a qualidade e atratividade dos territórios urbanos nas dimensões ambiental, paisagística e urbanística, com o objetivo de melhorar o bem-estar da população, fortalecer a coesão social e territorial, o sistema urbano e a competitividade regional.
Inclui os Planos para a regeneração física económica e social das comunidades desfavorecidas em zonas urbanas e rurais, envolvendo a intervenção em territórios críticos, visando a integração no mercado de trabalho, a habitação social, a promoção do sucesso escolar.    
Há hoje uma preocupação crescente com a política de cidades e o seu futuro. Não é de hoje essa preocupação, desde há sempre o homem se preocupou com o futuro das cidades, como fazer melhor cidade. Acontece que há hoje motivos novos de preocupação com o futuro das cidades, ampliados pelo forte crescimento da população mundial, pela urbanização da população e concentração nas grandes cidades, tendências de nível global e de que resultam problemas globais que se cruzam com os fenómenos das alterações climáticas, resultando em desequilíbrios territoriais e sociais.
No último século a população urbana do planeta passou de 13% no ano de 1900 para mais de 50% no ano de 2008. A ONU prevê que no ano de 2050 dois terços dos 9,6 mil milhões de habitantes previstos residam nas cidades. No século XX, a União Europeia de continente maioritariamente rural transformou-se num continente predominantemente urbano, 70% da população vive em aglomerados urbanos com mais de 5000 habitante, apesar disso, alguns autores referem que a estrutura de crescimento e de desenvolvimento do sistema urbano europeu é a mais equilibrada do mundo.
Nos países da União Europeia os problemas não se colocam na mesma escala que em países como a India, a China, a Indonésia ou a Nigéria, que enfrentam grandes problemas demográficos relacionados com o crescimento da população e a concentração em mega cidades, o que coloca grandes desafios associados à construção de novas redes de acesso à energia, à água, aos transportes, ao ensino, à saúde, à logística, à segurança e à sustentabilidade.
A estes e outros grandes desafios, reage a humanidade estimulando o desenvolvimento do conhecimento e de novas ferramentas para os enfrentar, processo potenciado pela globalização permite muito rapidamente partilhar os problemas e as soluções.  
No ano de 2008, James Canton, consultor de diversos governos em todo o mundo, escreveu em “As principais tendências que redesenharão o mundo”, a propósito dos desafios da China para acolher milhões de cidadãos que abandonam os campos e procuram as cidades, com a seguinte resposta – construir “Cidades Inteligentes”.     
Em Portugal, apesar de no século XX a população ter duplicado, 80% concentrou-se numa estreita faixa do litoral, ficando o interior despovoado. As previsões demográficas não são animadoras, apontam para uma perda global significativa. As cidades continuarão a concentrar a população, os processos de inovação, o conhecimento, a atividade económica, continuarão a assumir-se como principais motores do desenvolvimento e da competitividade. No futuro das cidades joga-se muito do futuro dos países, assim como na relação destas com a sua área envolvente, se joga muito do futuro da coesão territorial. A união Europeia reconhece não ser possível resolver os problemas da coesão territorial sem uma forte interação entre as cidades e a sua área envolvente, em particular as populações rurais.
É nos problemas da coesão territorial que Portugal tem um dos seus principais problemas a enfrentar, tem que fazê-lo com respostas inteligentes em territórios inteligentes. As pequenas cidades, vilas e aldeias são essenciais para travar o êxodo da população, reduzir a pressão sobre as grandes cidades, promover o desenvolvimento regional equilibrado.
São estes centros urbanos que conferem imagem distintiva a territórios específicos, constituem a maioria do território, asseguram a preservação da biodiversidade, essencial à vida humana, garantem que o sistema urbano do país mantenha escala humana, habitabilidade, convivência social, ancoragem geográfica, carácter histórico e identitário. 
A União Europeia e estados membros, com a construção da estratégia Europa 2020, incluíram nas suas agendas o recente movimento de escala mundial de Smart Cities, como uma prioridade nas suas políticas para a agenda da reindustrialização, da agenda digital e das estratégias de inovação para a especialização inteligente, com reflexos nos programas de ajudas comunitárias. A União Europeia adotou recentemente o conceito de “ Cidade Inteligente e Humana”, conceito que o efeito da globalização permitiu absorver por centenas de cidades espalhadas pelo mundo que criaram a “Human Smart Cities Network”.
Portugal lançou no ano de 1998 a rede de cidades digitais, um primeiro passo para alguns municípios se dotarem de sistemas de informação geográfica, criarem espaços abertos aos cidadãos, de acesso às tecnologias de informação. Tem constituída a parceria “Smart Cities Portugal”, que integra autarquias no âmbito da rede RENER, parceiros estratégicos da indústria, centros de investigação e de competitividade, o cluster Habitat Sustentável, assumindo a INTELI o papel de entidade gestora da parceria que tem como missão afirmar Portugal como fornecedor de tecnologia, produtos e sistemas de elevado valor acrescentado para cidades inteligentes a nível global.  
Também em Espanha, o Governo lançou em 2015, o “Plano Nacional de Cidades Inteligentes” com o objetivo de assegurar a liderança de Espanha no mercado global das cidades inteligentes. O Plano tem um orçamento e inclui diversas iniciativas, desde soluções para impulsionar melhorias de gestão dos serviços municipais, até ao desenvolvimento de soluções tecnológicas urbanas de grande escala para melhorar a eficiência e sustentabilidade das cidades.
Portugal e Espanha não estão sozinhos, há muitas outras redes competitivas, de âmbito regional e mundial, todas pretendem algo muito próximo, ser parte neste mercado global em forte desenvolvimento. As receitas para transformar ou construir novas cidades “smart cities”, não são únicas, evoluem na direção de integração de todas as dimensões da inteligência: humana, coletiva e artificial, disponíveis nas cidades.
O Programa das cidades inteligentes, é um desafio no presente e no futuro, de planeamento dos espaços urbanos, redes de energia, de comunicações, de transportes, de serviços e outras atividades humanas de otimização em termos de sustentabilidade e de recurso às novas tecnologias e de evolução para uma cultura institucional mais favorável à melhoria das perspetivas económicas, do espirito empreendedor, da criatividade, da modernidade e da liberdade cultural e religiosa.
Portugal está neste movimento, as suas cidades, a indústria e os serviços são a extensão dessa política, de presença no mundo global onde se constroem as cidades do futuro. O futuro das cidades é sem dúvida um futuro afirmativo, é feito dia a dia com elevado empenho dos seus autarcas, agentes económicos, instituições e cidadãos, acompanhando um processo de mudança acelerada à escala global. O futuro das cidades é um pouco do futuro do País.

Falando de... Gostar de ser Português

Se é verdade que os últimos anos têm sido prósperos em crises, corrupção, escândalos e desvios à legalidade que quotidianamente preenchem as páginas dos periódicos nivelando por baixo os índices de optimismo dos portugueses que, em surdina, praguejam a sua desdita, não vá algum elemento da hierarquia delactar. É certo, também, que a troika trouxe a Portugal um sentimento de portugalidade pouco usual.
Factores outros, também, contribuíram para que se enchesse o peito de ar e mostrássemos ao mundo que afinal ser português não é uma arte, como afirmava Teixeira de Pascoaes, mas algo que nos é intrínseco. Não confundamos com a raça tão apregoada e comemorada em tempos de Salazar, no dez de Junho, cujo feriado não mereceu decapitação no anterior governo.
Portugal, campeão europeu de futebol. Ronaldo, melhor jogador do mundo. Mourinho um dos melhores do planeta. Durão Barroso, na União Europeia e, agora, António Guterres, Secretário Geral das Nações Unidas, na unanimidade dos votantes, depois de ter sido Alto Comissário para os Refugiados, vale a pena dizer que pedimos meças a quem nos julgar.
Portugal, país à beira-mar plantado, segundo Tomás Ribeiro, produtor de escritores, de artistas, de Literatura vasta e apetecida, de prémio Nobel que não se esquece, com Saramago a ditar novas regras à escrita, de muitos e variados poetas e prosadores a mostrar à saciedade que a arte da escrita é semente que germina há oito séculos, suscitando olhares curiosos àqueles que do livro e da leitura constroem prazer no mundo da ficção ou da realidade. Camões, Pessoa, Eça e Lobo Antunes, são alguns que à língua portuguesa emprestam o seu talento e se afirmam como baluartes de um país de história ímpar e de fronteiras centenárias.
Língua utilizada por cerca de 261 milhões de falantes, ele é a quinta mais falada a nível global e são muitos os países que reclamam a sua presença. Nas Universidades de Xangai, Oxford e Bogotá, a Literatura Portuguesa não passa ao lado dos interesses dos estudiosos. É possível ler na imprensa que, actualmente, em trinta universidades chinesas o ensino do Português é disciplina requerida pelos estudiosos. E se a Literatura se conformava com o estudo de Camões e de Pessoa, a Cátedra Saramago e a poesia trovadoresca são objecto de estudo para todos os que a Portugal dedicam as suas vontades.
País pequeno, dos mais pequenos da Europa, apresenta na exiguidade da sua superfície, uma diversidade geográfica e gastronómica, digna de adjectivação.
De clima ameno, população simpática e apetecível, é razão de ser para um turismo em crescendo. Este é o nosso Portugal muito amado, solidário quanto baste, respondendo à chamada desde os tempos gloriosos de Aristides de Sousa Mendes, da invasão da Hungria, do êxodo das gentes austríacas, até à recepção dos refugiados, sem esquecer a integração dos ex-repatriados  do Ultramar. Portugal atento ao que vai pelo mundo, está na Grécia a salvar vidas e a dizer sim aos apelos, tal como se desloca para o Chile cooperando nos desastres naturais  provocadores de miséria e indigência.
Neste Portugal, onde o entendimento dos políticos, dificilmente se constrói de palavras, o quotidiano vai evoluindo a muito custo. A paz edifica-se a pulso, viver, porém, não é fácil. A felicidade ganha-se a palmo. As lágrimas, também, nos ajudam a ser melhores. Aprende-se com o insucesso e a falta.
E 2017 abriu com a partida de um homem coberto de encómios. Não agradou a todos. Era lá possível! Mas não nos coibimos de ler algures “Mário Soares foi o civil mais memorável do painel que a história do seu tempo de português conseguiu”.
Pelo sonho vamos, terá afirmado Sebastião da Gama. Ousemos fazer nossa a frase e metamo-nos a caminho, desbravando uns séculos da nossa história, quantas vezes feita de sacrifícios, talento e génio por homens que com a inteligência se mediram ao lado de outros mais possantes e poderosos.
Debruçados a um mar que nem sempre era atractivo, fomos chegando mais além levados por um espírito de cruzada que marcou, afinal, o alargamento do território na Ibéria, confirmado no reinado de D. Afonso III, finalmente rei de Portugal e dos Algarves.
E o mar, além, deixou de ser uma miragem.
Esta é a Pátria que tento conquistar, conquistando-me todos os dias…

Não foi adoptado o Novo Acordo Ortográfico.

NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - Manuel da Costa (n. Bragança – f. Granada)

Manuel da Costa nasceu em Bragança, no primeiro quartel do século XVII, no seio de uma importante família de mercadores cristãos-novos. Cedo começou a viajar por Castela. Por 1635 casou em Torre de Moncorvo com sua parente Isabel da Costa e ali fixou residência. Continuou fazendo viagens de negócios para além da fronteira, e conhecia “todos os lugares grandes de Castela”. A situação alterou-se com a revolução de 1640 e o encerramento das fronteiras, motivado pela guerra entre os dois países.
A guerra, as dificuldades financeiras do governo, a política do rei D. João IV em desfavor da inquisição, fizeram os cristãos-novos assumir o compromisso de uma avultada contribuição monetária destinada sobretudo à compra de barcos para a “carreira do Brasil”. E para repartir esta contribuição foram nomeados, em cada comarca, os chamados “fintadores da bolsa”. Pois na comarca de Torre de Moncorvo, um dos fintadores nomeados foi exatamente o nosso biografado. Isso mostra como ele ocupava um lugar de destaque no seio da comunidade marrana da região. (1)
E no desempenho desta missão criou ele muitos inimigos, alguns deles bem poderosos e influentes. Um deles foi Domingos Lopes Bastos, homem muito rico, que se dizia cristão-velho e se preparava para assumir um cargo na governação. Porém, o nosso “fintador” teve notícia que ele tinha parte de cristão-novo, tal como sua mulher, Helena da Cruz. E então lançou-lhe a “finta” de 70 mil réis. Protestou Domingos, mas acabou por confessar que efetivamente tinha uma costela de judeu e pagaria os 70 mil réis mas às ocultas, debaixo de outro nome pois assim ficaria desacreditado e não entraria para o cargo na governação. Manuel da Costa não foi pelos ajustes…
Problema semelhante arranjou ele com Manuel Lopes, o tio bom, de alcunha, mercador de Viseu que, em Moncorvo morou algum tempo e preparava-se para abalar para Viseu levando uma cavalgadura e fazendas. Dizia-se também cristão-velho, mas o “fintador” tinha informação diferente e não o deixou partir sem pagar o “dinheiro da bolsa”.
Alvarenga e Montes eram nomes de duas das famílias mais nobres de Vila Flor, sem gota de sangue judeu – diziam eles. Vejam como o Costa se lhes refere:
- Disse que Manuel Alvarenga e Gregório Montes, de Vila Flor, são inimigos porque, sendo ele réu um dos fintadores da bolsa e sendo eles fintados para a bolsa, tiveram para si que ele réu os manifestava dizendo terem parte de cristãos-novos e sendo que eram cristãos-velhos, e que ele réu fizera muitas diligências para os descobrir e infamar. 
Prova também da influência e poder económico de Manuel da Costa é o facto de ele ter sido contratador do sabão, substituindo Francisco da Cunha, marido de sua cunhada Beatriz da Costa, (2) quando esta foi presa pela inquisição, em setembro de 1647 e aquele se abalou de Moncorvo.
Acrescentemos que Beatriz acabou condenada à fogueira e que a história da família Costa nas cadeias do santo ofício era já então mais longa que a linha do comboio. E por isso mesmo a mãe, os irmãos e muitos tios e primos de Manuel da Costa tinham fugido para Espanha e quase todos eles viviam em Granada onde tinham o monopólio da distribuição do sal. E quando chegava o “dia grande” do Kipur, a família reunia-se na celebração desta festa, a mais sagrada do calendário judaico. Vejam como ele próprio contou para os inquisidores:
- Disse que há 22 anos a esta parte, até ao levantamento do Reino, do qual tempo para cá deixou de ir a Castela, se achou muitas vezes com a sua mãe e a sua irmã Maria da Costa, agora casada em Granada com Luís da Costa, e com Leonor da Costa, também sua irmã agora casada em Granada com um mancebo de Trancoso, e com seu irmão Diogo Nunes, casado em Antequera com Catarina da Costa e são tratantes e estão ora juntos, ora separados, e faziam juntos o Kipur e outras cerimónias.
Como que respondendo ao apoio dos cristãos-novos ao governo do rei D. João IV, a inquisição lançou uma verdadeira “guerra” contra o rei. E promoveu autênticas campanhas de extermínio da “gente da nação” em algumas terras, nomeadamente em Trás-os-Montes. Foi o caso de Torre de Moncorvo onde, em 1641, o comissário Pedro Saraiva de Vasconcelos, despachava a seguinte informação para o Conselho Geral:
- Lembro a vossas mercês (…) que a Torre de Moncorvo é terra nova em que importa ao serviço de Deus entrar a inquisição, que fez muito fruto entrando em Quintela e Sambade. (3)
No meio do furacão foi também apanhado Manuel da Costa, preso pela inquisição de Coimbra em 14 de Junho de 1651. Foi mesmo acusado de ser o “ escrivão chamador”, ou seja: era ele que convocava os outros para as reuniões em “sinagoga”. Como geralmente acontecia, acabou por confessar-se culpado de judaísmo e que foi sua mãe, logo em pequeno, que o catequizou. Do rol das suas confissões, vamos apenas retirar um excerto narrando uma cerimónia judaica feita em conjunto com o cirurgião Domingos Lopes Bastos, no sítio da quinta do Cuco. É uma narrativa cheia de lirismo e ritualidade judaica. Vejam:
- Haverá dois anos, indo para a Açoreira, em companhia do referido Domingos Lopes Bastos, no caminho que vai pela Senhora da Riba Cavada, entre umas vinhas, por donde corre a água, se apeou e lavou as mãos e os olhos e a boca, e correu a mão pelo rosto abaixo três ou quatro vezes, e rezava baixo, de sorte que não ouvia, com o rosto para o céu, e lhe parece que era mais para o nascente, antes de nascer o sol. E porquanto ele confitente usava também da dita cerimónia por observância da lei de Moisés, por lha ter ensinado sua mãe.
Não sabemos que oração era aquela, mas podia ser a mesma que depois ele próprio ditou para o processo e costumava rezar quando lavava as mãos:
- Bendito tu Adonay nosso Dios y de nuestros padres que nos fizeste e nos creaste e nos santiguaste sobre o lavar de nuestras manos. Amen.
Manuel da Costa saiu condenado em cárcere e hábito penitencial, no auto público da fé celebrado em 14 de Abril de 1652. Podia regressar à terra mas… teria de apresentar-se na missa de domingo vestindo o saco amarelo por cima do fato. E isso era infamante para um homem da sua posição social. Porventura mais difícil de suportar do que a própria cadeia.
Regressou a Torre de Moncorvo mas ninguém o viu com o sambenito vestido. Aliás, teria confidenciado que “mesmo que o queimassem, não havia de trazer o hábito”.
A notícia chegou ao comissário Pedro Saraiva que o mandou chamar e “lhe mandava que cumprisse a dita penitência muito inteiramente, trazendo o hábito por cima das suas vestiduras, de modo que possa ser visto por todas as pessoas”. Manuel da Costa prometeu cumprir a penitência mas…
O pior é que a sua mulher e outros parentes que com ele saíram no mesmo auto condenados em hábito andavam igualmente sem o sambenito. E essa era uma situação intolerável, um ato grave de desobediência e desprezo pelo santo tribunal. Por isso foram todos chamados pelo comissário que os admoestou e avisou das perigosas consequências de tal procedimento. Veja-se o resultado, conforme escreveu o mesmo comissário para a inquisição de Coimbra:
- Tanto que foram admoestados, não apareceram mais nesta vila, sendo público que fugiram para Castela (…) Uma irmã de Manuel da Costa disse, o dia antes que fugissem, que eles se iam para não cumprir a penitência (…) Fugiram desta vila e como não tinham fato, por ter sido confiscado, não foram sentidos, nem tive notícia da sua fugida, para os mandar prender pela justiça secular. (4)
Manuel da Costa e a mulher fugiram para Granada onde tinham vasta parentela trabalhando na distribuição do sal, sendo o seu primo Francisco de Albuquerque, administrador daquele monopólio. Mas foi com Francisco Lopes Pereira, natural de Mogadouro e que com ele partilhou as celas da inquisição de Coimbra, que Manuel da Costa fez uma sociedade comercial, arrematando a venda do tabaco na mesma região.
Foram poucos os anos de vida de Manuel da Costa em Granada pois que, em 1660 já era falecido e o estanco do tabaco andava só por conta de Francisco Lopes Pereira. (5) A sua mulher e o seu filho Don Luís da Costa, então com uns 18 anos, traziam arrendada a venda do sal na região de Vellez.
NOTAS:
1-ANTT, inq. Coimbra, pº 9486, de Manuel da Costa.
2-IDEM, inq. Lisboa, pº 790, de Francisco da Cunha; inq. Coimbra, pº 1952, de Beatriz da Costa.
3-IDEM, pº 5022, de Francisca Vaz.
4-Henrique Dias da Costa e sua mulher Beatriz Marcos foram outros dos que fugiram. Pedro Rodrigues Brandão foi apanhado pelo comissário Saraiva de Vasconcelos que “ o achou fugindo escondido sobre uns telhados (…) e achando-o saindo do dito telhado, disse que para não trazer o hábito se havia de ir para Castela e que todos haviam de fugir e despovoar o Reino”.
5-ANTT, inquisição de Lisboa, processo 2744, de Gaspar Lopes Pereira.

Vendavais - Os piores cegos….

As últimas sondagens dão ao partido socialista uma subida notável e à beira de dispensar o apoio tanto do BE como do PCP. Ou seja a geringonça está prestes a desfazer-se!
A simplicidade com que se faz um telefonema e se juntam respostas a uma ou duas questões pré formuladas e com objetivos claros, levam a ter percentualmente um resultado que pode interessar ou não a quem for o objeto do inquérito. As sondagens são o que são e embora não sejam infalíveis, também não são totalmente despiciendas. O interesse delas é que animam as guerrilhas internas especialmente no que diz respeito aos partidos envolvidos nelas.
O facto do PS estar a subir nessas sondagens e situar-se no 42%, faz supor que, a continuar esta subida, o partido socialista irá dispensar o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista, desfazendo assim a tal geringonça que lhe permitiu governar numa situação em que tinha perdido as eleições nacionais. Os amigos de ocasião passarão assim aos eternos opositores, dispostos a lutar novamente contra aquele que os ajudou a ter igualmente, alguma visibilidade política. Mas não nos enganemos. Estamos longe das eleições e as polémicas estão agora a começar.
De facto, são várias as vertentes em jogo neste tabuleiro político. A iniciar está no centro Centeno, que se vê acossado pela oposição quanto ao problema da Caixa Geral de Depósitos e sua administração. É uma nódoa que se alastra e que pode não sair facilmente por mais que se lave o fino tecido em que caiu. Será que a ida à Comissão parlamentar para prestar esclarecimentos vai resolver alguma coisa? Afinal há cartas escritas e, segundo parece, o rabo está preso aí mesmo. Quem o irá soltar? Domingues acederá a esclarecer alguma coisa, entalando quem o tentou ajudar? É certo que Domingues fixou salários, incluindo o seu e Centeno aceitou. Há ou não acordos entre os dois? Terá de passar ainda muita água debaixo desta ponte para limpar as nódoas que se vislumbram. E não nos esqueçamos que ela alastra até Belém.
Mas se o PS continuar a subir nas sondagens e acabar por ganhar as eleições, é necessário prepararmo-nos para deixar de ouvir falar de benesses e passar a ter atenção aos cortes que se avizinham passando novamente a uma austeridade galopante. Sim, porque não há milagres a este nível na economia. Ou se tem para pagar, ou não se tem e nós não temos. Todos sabemos disso. A divida portuguesa é astronómica e iremos pagá-la durante os próximos cem anos. Parece muito? Pois parece. O Governo disse que vai entregar ao FMI uma tranche nas semanas próximas no valor de 1,6 mil milhões e até adiantou já os valores aproximados das próximas entregas. Com este ritmo de entregas anuais, levaremos cerca de 80 a 100 anos para liquidar a dívida. Claro que as coisas não se processam com esta simplicidade, pois admito que alguma coisa melhorará neste ciclo económico de crise. Mas são muitos milhares de milhões para pagar e a divida não pára de crescer diariamente. Quem vai herdar este fardo enorme? Parece, no entanto que, segundo informações do governo, já se pagou cerca de 42,5% do empréstimo inicial e a ser assim, talvez consigamos pagar tudo em menos tempo. Talvez! O que nos deixa um pouco descansados é que seremos sempre fiscalizados enquanto não chegarmos a um nível inferior a 200% da dívida. Já imaginaram? 200% da dívida! Uma enormidade.
Se, num laivo comparativo um pouco marginal, dissermos que em Lisboa todos os meses fecham cinco lojas comerciais históricas, isto não ajuda nada a resolver o problema da dívida.
Seja como for, podemos preparar tudo para a suposta vitória do PS nas próximas eleições, mas sem esquecer que se eles endividam cada vez mais o país, será bom que sejam eles a pagar essa dívida, porque estar à espera que outros venham pagar o que eles ficam a dever é pouco ético. É que, em terra de cegos, quem tem olho é rei. E os piores cegos…

Judeus. Judeus em Belmonte

Eu não sei se algum leitor tem lembrança das «aulas» de catequese nos claustros da Sé, da Praça onde anos mais tarde a rapaziada engodava o tempo enquanto observava e atirava parvoíces, piadas e dichotes as raparigas a colorirem o passadiço fizesse chuva, frio ou calor.
Eu recordo-me da alacridade reinante, do ar imponente do então Padre Luís Afonso Ruivo e de algumas catequistas.
Nos intervalos corríamos todas as partes do claustro, numa das paredes, atrás do gradeamento, uma pungente imagem do Senhor da Cana-Verde contemplava-nos. E, nós parados, também olhávamos Jesus e um de nós afirmava terem sido os judeus os culpados de Ele apresentar tão lastimoso estado.
À saída da catequese afoitos ou não, estúpidos sim, passávamos em frente de uma oficina de sapateiro existente na Rua Direita e gritávamos: judeu, judeu. A arruaça podia prosseguir na Rua Abílio Beça. Não me perguntem sobre o princípio da injúria, nem como sabíamos onde ficava a desactivada Sinagoga, muito menos o uso de termo judeu quando queríamos qualificar maldosamente este ou aquele. Era assim.
Longe de ter lido Mendes dos Remédios (curiosos apelidos), nem o Abade de Baçal e Leite de Vasconcelos, só para referir os de maior saliência no saber sobre os judeus de Trás-os-Montes ainda agora, menino tamanino ficava zangado quando me chamavam judeu na sequência de ter cometido alguma falta.
E, chegada a idade de adquirir princípios e noções sobre os valores universais, passei da curiosidade a interessar-me por tudo quanto respeita à civilização judaica na sua matricialidade, irradiação e construção de realizações artísticas, científicas, culturais e técnicas debaixo do postulado religioso ético e moral.
Por assim ser na próxima deslocação a Bragança irei ao novel equipamento cultural dedicado aos judeus em geral e à comunidade sefardita bragançana em particular, pedindo, novamente, desculpa pelos dislates gritados ainda fedelho de nove ou dez anos.
                                            
                                       Judeus em Belmonte
Nos alvores deste ano a Âncora Editores ofereceu-me a obra O Judaísmo em Belmonte no Tempo da Inquisição, da autoria de Jorge Martins. O Editor conhecendo o meu interesse pelo tema e das investigações que tenho realizado no domínio da História da Alimentação, concedendo particular atenção às usanças alimentares judaicas.
Ora, os trabalhos deste empenhado historiador têm-me facilitado informações relativas ao que procuro, as quais estudo, comparo e contrasto com outras de autores portugueses e estrangeiros levando as indagações a separar o trigo do joio (existe joio repetido) no tocante aos costumes culinários uns de forma deliberada, outros de maneira forçada.

Nesta obra, como noutras, é nas forçadas confissões que os atormentados e atormentadas explicam detalhadamente as práticas alimentares, as matérias-primas transformadas em comida e o modo de a conservar quente e em condições no decorrer da observância da não realização de trabalhos aos sábados. 
Historiadores espanhóis defendem argutamente a ideia de a adafina ser base do conhecido cocido (cozido) o qual em Espanha, tal como em Portugal é apresentado debaixo de centenas de expressões, assim ao modo de cada roca com seu fuso, cada terra com seu uso, quer dizer cozido. Os leitores sabem bem do que falo.
Já na obra POPES, PESASANTS, and SHEPHERDS, de Oretta Zanini de Vita, a vila de Belmonte é referenciada como importante entro judaico, salientando produtos, e na CHARLEMAGNE’S TABLECLOTH, de Nichola Fletcher, encontramos referências aos comeres judaicos de antanho a indiciaram pistas referentes à Península Ibérica.
Ora, este trabalho de Jorge Martins é novo e importante contributo no tocante a melhor entendermos as vicissitudes dos judeus para cumprirem os preceitos alimentares contidos no TALMUDE, em terras onde campeava a intolerância escorada na inveja, no obscurantismo e na sórdida avidez de tomar os bens dos acusados de judaísmo.
O revigoramento do interesse pela cultura judaica no âmbito das usanças culinárias e gastronómicas não podem ser desligadas do miolo teleológico, onde os agravos, as inquietações, as perseguições, a tortura e a morte, não impediram, nem impedem, de dentro dos preceitos talmúdicos a construção de criações culinárias fluorescentes fruto da sua milenar história, das incorporações decorrentes da continuada peregrinação de país para país, e prioritariamente devido talento e perspicácia das mulheres, notáveis Mestras cozinheiras.
Árvores genealógicas, estatísticas, gráficos e mapas ajudam à compreensão de um universo comunitário obrigado ao segredo dos segredos, a permanecer no casulo, mas segundo o autor a legitimar “a tese de que a actual Comunidade Judaica de Belmonte tem a ascendência secular belmontense.”