Falando de…. Portugal na Semana de Arte Moderna em São Paulo, Brasil, em 1922

Nunca se sabe tudo de coisa nenhuma. Falar de Fernando Pessoa é sempre tentar ir mais adiante buscando algo que ainda não foi dito ou escrito e que não chegou ao nosso conhecimento. Se foi ao Brasil e participou na Semana Cultural do Modernismo em São Paulo em 1922, era matéria que não nos tinha interessado, ou porque a limitação do nosso saber não atingisse esses horizontes ou porque nenhuma leitura pessoana o tenha abordado. E ler Pessoa ou sobre Pessoa é entrar num mundo fascinante onde não faltam surpresas, numa transversalidade que alarga os horizontes sobre um escritor que em vida pouco divulgou e nos deixou ignorantes de cerca de vinte e oito mil documentos.
Sabendo que Fernando Pessoa era avesso a viagens, para além das que havia feito para a África do Sul, não era provável a sua ida ao Brasil em 1922 para estar presente na celebração do Modernismo na cidade de São Paulo. A comemoração do centenário da independência do Brasil e a realização da primeira travessia aérea protagonizada por Gago Coutinho e Sacadura Cabral eram factos a ter em conta na vida dos dois países.
Em Portugal vivia-se o apogeu do Modernismo. Em 1915 são publicados os dois primeiros exemplares do Orpheu, revista trimestral de Literatura. São directores, para Portugal, Luís de Montalvor e Ronald de Carvalho para o Brasil, no primeiro número. Fernando Pessoa e Mário de Sá-Carneiro para o segundo número. Para editor é escolhido António Ferro, que à data tinha dezanove anos e que tinha sido colega de Mário de Sá-Carneiro no Liceu Camões.
De notar que entre os colaboradores estão dois poetas brasileiros: Ronald de Carvalho e Eduardo Guimarães, sendo a revista destinada a Portugal e ao Brasil.
Em artigo publicado na Seara Nova em Novembro de 1959, sem nome do autor, o articulista dá conta que tanto Portugal como o Brasil desconhecem o que se passa nos territórios de um e de outro, no âmbito cultural. Reconhecendo que “Coimbra fora, ao longo do século XIX, a fonte em que culturalmente se dessedentava o Brasil. Ali vinham formar-se as suas elites da cultura e da política, ali emparelhavam os aspirantes a escritores dos dois países em comum seguindo movimentos feitos ou erguendo o pavilhão de revolta dos movimentos novos”.
Incontestável verdade, contudo a partir da segunda década do século passado, dificuldades resultantes da segunda guerra mundial e um melhor apetrechamento e desenvolvimento cultural do Brasil, com o Atlântico de permeio, impuseram uma separação que, malgré tout, não se manifestou em todos os domínios.
Nos meios intelectuais brasileiros, os ecos do Modernismo já se tinham feito sentir.
A Águia saída em 1912, tinha assinantes e leitores no Brasil. Luís de Montalvor que partira para o Brasil nesse ano, é natural que tenha falado sobre o Modernismo e Fernando Pessoa, cabendo, também, a Luís de Montalvor, a introdução do Orpheu. Na biblioteca de Fernando Pessoa consta um livro com data de 1914, oferecido por Ronald deCarvalho que, também, colabora no Orpheu I, com Poemas – A Alma que passa, Lâmpada Nocturna, Terra Ignota, Elogio dos Repuxos e Reflexos.
A Semana da Arte Moderna Paulista não passa ao lado de António Ferro, director da revista semanal de O Século, Ilustração Portuguesa, desde 1 de Outubro de 1921, onde pontificavam nomes como Almada Negreiros, Fernando Pessoa, António Sardinha, João de Barros, Júlio Dantas e Rocha Martins.
A ida ao Brasil de um membro do Modernismo Português não se afigurava fácil, tanto mais que para António Ferro, director da revista há pouco, não estava nos seus horizontes abandonar o cargo.
Segundo Orlando Raimundo, autor de António Ferro, O Inventor do Salazarismo, a Semana Paulista teria lugar no Teatro Municipal, assentando a programação em sessões de poesia, intercaladas por palestras sobre modernidade e arte, sendo promotores os escritores Mário de Andrade, Oswald de Andrade, Ronald de Carvalho, Sérgio Costa e Silva e Plínio Salgado; os jornalistas Paulo del Picchia, Tácito de Almeida e Guilherme de Almeida; o escultor Víctor Brecheret; os pintores Di Cavancanti, Anita Malfatti e Tarsila do Amaral.
António Ferro não podendo estar presente, pede a Ronald de Carvalho que o represente, pedido que foi aceite, lendo o texto Nós, em forma de Manifesto, tão ao gosto dos Modernistas, que virá a ser publicado no n.º 3 da revista Klaxon, de São Paulo, em 15 de Julho de 1922. Nós é um texto constituído por quatro páginas e duas personagens – um Eu esclarecido e a Multidão que se limita a dizer que não ouve nada e a apodar de Doidos varridos e Insolentes os representados pelo Eu que domina todo o discurso e que inicia, afirmando:
Somos os religiosos da Hora. Cada verso – uma cruz, cada palavra – uma gota de sangue. Sud-Express para o futuro – a nossa alma rápida. Um comboio que passa é um século que avança. Os comboios andam mais depressa do que os homens. Sejamos comboios, portanto!
Ser de hoje, Ser de hoje!!!... Não trazer relógio, nem perguntar que horas são. Somos a Hora! Não há que trazer relógios no pulso, nós próprios somos relógios que pulsam…
Um manifesto em forma de futurista, antecedido de uma epígrafe de Jean Cocteau “L’avenir n’appartient à personne. Il n’y a pas de precurseurs, il n’existe que des retardataires”.
A ausência de António Ferro e a leitura de Nós valeu-lhe os maiores encómios. Esquecidos os nomes de Fernando Pessoa e de Almada Negreiros, António Ferro fora projectado no universo futurista na cidade de São Paulo.
A possibilidade de António Ferro ir ao Brasil continua em aberto. Aproveitando a circunstância da Companhia de Teatro Lucília Simões /Erico Braga ter sido convidada para uma tournée no Brasil no âmbito das comemorações do Centenário da Independência, representar Mar Alto, de António Ferro, é o autor convidado a integrar a Companhia que parte para o Rio de Janeiro em Maio de 1922. Carlos Malheiro Dias, exilado monárquico no Brasil, profere o discurso de recepção a António Ferro, no Teatro Lírico, do Rio de Janeiro em 30 de Julho de 1922, de que retiramos o seguinte extracto “Na vossa fantasia inesgotável, na novidade das vossas imagens, no sorriso das vossas ironias, há o sangue novo, que já foi nosso, circulando em elásticas artérias, e uma alma que tem asas e voa, contemporânea dos aeroplanos”.
Do escritor brasileiro Menotti del Picchia, na recepção a António Ferro, no Teatro Municipal de São Paulo, em 5 de Dezembro de 1922, é possível realçar:
Mas António Ferro é sempre um paradoxo: antes de aqui vir, já aqui estava. Encontrou-se consigo mesmo nos seus versos, que sabíamos de cor, nas suas frases-lápides, que sabíamos de cor.
Desvinculado da revista Ilustração Portuguesa que, entretanto, tinha sido gerida por João Ameal, António Ferro mantém-se no Brasil, onde conferencia e vê o Mar Alto ser estreado em 18 de Novembro em São Paulo, no Teatro Sant’Ana, protagonizando o papel de Henrique.
Com grande sucesso no Brasil, António Ferro com uma “proposta muito vantajosa para série de conferências no Brasil” dirige um telegrama à namorada, Fernanda de Castro, propondo-lhe casamento por procuração.
Com 21 anos, Fernanda de Castro celebrará o casamento, no dia 12 de Agosto de 1922, na Igreja de Santa Isabel, em Lisboa, com o cunhado Augusto Cunha a fazer o papel de noivo. No Brasil, António Ferro terá como testemunhas Lucília Simões e o Almirante Gago Coutinho, chegado ao Rio de Janeiro em Junho, depois da travessia aérea começada em Lisboa a 30 de Março no hidroavião Lusitânia. Fernanda de Castro partirá para o Brasil no final do mês no navio Arlanza, da Mala Real Inglesa, segundo afirma “comum vago enxoval nas malas e uma grande ansiedade no coração”.
No Brasil, António Ferro proferiu conferências. Salvador, Recife, Belo Horizonte, Santos, Ribeirão Preto e Campinas são algumas das cidades por onde passou. Fernanda de Castro, com grandes cartazes a anunciar recitais de poesia, a princípio temerosa, ela que mal conseguis aprender de cor dois ou três poemas seus, quanto mais os dos outros, conforme confessa. Os tempos passaram. O sucesso acabou por se confirmar, as amizades consolidaram-se e proliferaram. Chegaram a Lisboa por volta de 15 de Maio de 1923, tendo nascido o primeiro filho a 14 de Julho: António Gabriel de Quadros Ferro que virá a ser grande especialista de Pessoa. Gabriel em homenagem ao italiano Gabriele d’Annunzio, precursor do fascismo italiano, que António Ferro tanto admirava.
Com a chegada a Lisboa do casal, tinha terminado o périplo em torno da Semana Cultural Paulista. António Ferro tinha visto o seu prestígio afirmado além-fronteiras; partiria para outros lugares que lhe abririam portas para Ministro na Suíça e depois em Roma, vindo a falecer a 11 de Novembro de 1956, em Lisboa, no Hospital de São José. Tinha 60 anos.
Fernando Pessoa distante do cosmopolitismo brasileiro, escrevia, escrevia e desmultiplicava-se. Não fora a São Paulo, mas mandara um dos seus heterónimos para a emigração. Ricardo Reis, nascido em 1887, educado num colégio de jesuítas, médico, vive no Brasil desde 1919, expatriado espontaneamente por ser monárquico. Apoiando-me em João César das Neves, num texto datado de 23-10-1988, de São Paulo, intitulado Ricardo Reis, o heterónimo imigrado, publicado pela Secretaria do Estado da Cultura em Lisboa, em 1990, no âmbito do Encontro Internacional do Centenário de Fernando Pessoa, realizado em Lisboa, Ricardo Reis terá escrito 35 poemas em Portugal e 89 no Brasil. Para Saramago que o ficcionou terá voltado a Portugal em 1935, para se inumar em 1936 – O Ano da Morte de Ricardo Reis.
São Paulo e os brasileiros não esqueceram Pessoa. Admiraram-no, comemoraram-no e celebraram-no. E a Fundação Engenheiro António de Almeida esteve presente. Afirmativamente colaborou na elevação do busto de Fernando Pessoa na Avenida de Sagres, Jardim Lusitânia na cidade de São Paulo, de autoria de Maria Irene Vilar, de Matosinhos, e que na sua terra contribuiu para a criação de um Museu de Arte.
Fernando Pessoa, de forma icónica, a encerrar o centenário do seu nascimento em São Paulo, Brasil, nas comemorações que aí decorreram de 26 a 30 de Abril de 1988.
Ditosa Pátria que tal filho teve – Os Lusíadas, canto VIII, estrofe 32.

Não foi adoptado o Novo Acordo Ortográfico

Por João Cabrita

Verdades e pós-verdades.

Temia-se, em Portugal e na Europa de que Portugal ainda não faz parte, que a “geringonça” fosse um tractor revolucionário, que de alguma forma viria pôr em causa a ordem estabelecida no que à União Europeia, à NATO e aos mercados financeiros diz respeito.
Os analistas mais entendidos, muitos dos quais agora se fazem desentendidos, auguraram, por isso, o pior desfecho para o seu desempenho, prevendo que Portugal seria forçado a um novo contrato de assistência com a famigerada Troika, ou coisa parecida.
O próprio ministro Centeno o admitiu quando declarou que faria tudo o que fosse necessário, sem especificar o quê, para evitar que tal acontecesse.
Mas não. A “geringonça”, afinal, não passa disso mesmo. De uma carroça política desengonçada puxada pelo PC e pelo BE, que se arrasta penosamente e com a qual o moleiro António Costa vai ganhando a vida, com a bênção do paizinho Marcelo.
É um tigre de papel, afinal, que com unhas e dentes defende um governo de minora absoluta, considerando que a abstenção é maioritária e que a oposição mereceu o maior número de votos. Acontece que a moda dos governos serem abocado por forças que perdem eleições parece estar a pegar nas democracias ocidentais.
Em Portugal tal só foi possível porque o PC e o BE, honra lhes seja feita, têm sido de uma docilidade exemplar. Meteram a viola no saco a troco de uns tostõezitos para os reformados e pouco mais. Reestruturação da dívida, abandono da moeda única, saída da CEE e coisas tais, que constituem os seus argumentos políticos principais, pertencem ao passado.
A verdade é que, contra todas as expectativas, a economia portuguesa circunstancialmente cresceu, o que não significa necessariamente que esteja a crescer, e os tecnocratas de Bruxelas, que ainda se não refizeram do murro no estômago que levaram com o Brexit, puseram de lado as sanções e deram luz verde ao orçamento português. Até mais ver.
Pelas mesmas razões a senhora Merkel e o seu ministro Schäuble andam tão enfiados.
Depois, ainda ninguém sabe que demónios vão saltar da caixa de Pandora que Donald Trump destapou, sendo certo que PC e BE não deixarão de aplaudir as diatribes contra a NATO e a CEE do seu inesperado aliado, o novo presidente americano.
Aparentemente Portugal segue no bom caminho. O doente que estava em estado comatoso pestanejou. Para quê mudar de políticas, portanto, argumentarão as almas da “geringonça”? Afinal a Justiça que temos funciona. A lei eleitoral serve plenamente a democracia que não temos, a lei autárquica idem, a Assembleia da República só dignifica a democracia, o País está bem como está, e a “geringonça” cumpre plenamente o seu papel.
Acontece que se trata de “pós-verdades” no sentido em que o dicionário Oxford de língua inglesa, que elegeu a expressão como palavra do ano de 2016, define. A verdadeira verdade é que as emoções e as crenças pessoais contam mais na formação da opinião pública do que os factos objetivos.
E o que verdadeiramente importa é segurar o poder e partilhar mordomias com os comparsas.
Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico.

A mendicidade

Face à mendicidade, cada um de nós é regularmente solicitado, sente-se incomodado ou não, dá uma resposta refletida ou impulsiva, sem ser fácil nomear o que fazemos ou não. 
Alguém tem uma receita ou doutrina quando cruza um mendigo na rua? Coloco-me esta questão sempre embaraçosa e frequente quando passo à sua frente aqui ou ali, cada vez com mais frequência.
Observo os que passam e têm mais ou menos o mesmo comportamento que eu. O que fazer? Frente aos comércios, restaurantes, lugares turísticos, igrejas, nos semáforos cruzam-se homens e mulheres acompanhados de crianças, de animais, sentados ou em pé, por vezes algo afetados mentalmente. Cada um com a sua forma diferente de abordar os transeuntes.
O que se pode fazer ? Antigamente o mendigo tinha sempre um défice cognitivo qualquer e era alvo de brincadeira ou troça, contudo parecia-nos um ser alegre. Agora aparecem-nos cada vez em maior número, sobretudo nos grandes meios urbanos, é porque a precariedade aumenta ou será uma simples impressão por se encontrarem em lugares de passagem? Sem quaisquer restrições, a mendicidade só se torna delito se for desenvolvida de forma agressiva e sob ameaça dum animal perigoso, o que não se revela ser frequente.
Cada um de nós é portanto regularmente solicitado, encontra-se incomodado ou não, dá uma resposta refletida ou impulsiva, sem que seja fácil nomear o que fazemos ou não como já referi. Não existe, em meu conhecimento, nenhum estudo ou inquérito sobre os que dão, talvez haja algum estudo de terreno do Instituto de Filantropia sem projeção ou interesse para o grande público. 
Tentei fazer a minha pequena pesquisa e inquérito pessoais perto das pessoas que conheço aqui e nos centros urbanos maiores. 
Na rua, o seu ponto comum é não dar nunca dinheiro às crianças a fim de não encorajar a sua exploração. Assim, cada um pratica-o à sua maneira anteriormente refletido em função do humor do dia. Um não dá nunca na rua sem se encontrar num determinado estado de espírito. Muito generoso além do mais, acha que é um dever dar, sente-se outro por ser responsável pelo que deu. Outros escolhem dar sempre às senhoras, ou ao contrário, nunca dar às senhoras ou sempre e exclusivamente aos músicos. À saída da igreja ou da pastelaria ao lado, os fiéis sentem a obrigação de fazer uma boa ação.
Não conheço ninguém, apesar de isso existir, que agrida um mendigo pelas suas observações despropositadas, mal- intencionadas ou agressivas, mas a indiferença ou o facto de passar ao lado evitando o olhar ou negando a existência da pessoa podem constituir uma forma de agressão. Esta indiferença é uma máscara de cada um de nós, pois é raro que a presença dum mendigo não suscite qualquer reacção- seja ela negativa – seja ela positiva.   
São mais os sentimentos do que a razão que determinam o ato de dar ou não dar. Estes têm a ver com a relação que se prende com o olhar, com os gestos, com as palavras. Uma vez que o medo ou a desconfiança se encontram ultrapassados, quando o diálogo acontece, é por vezes um bairro inteiro que adota um mendigo, um arrumador, assegurando-lhe uma forma de sobrevivência, levando-lhe comida ou roupas quentes mais do que dinheiro. Afeto também: um deles a quem desapareceu o cão ou o gato vê-se ser-lhe oferecido outro em pouco tempo. As crianças gostam de dar apesar de terem que ultrapassar o seu medo ou não compreendem que não se lhes dê nada. Estamos longe do altruísmo eficaz.
Li em qualquer lado que é preferível salvar dez vidas lá no fim do mundo a salvar a dum próximo. Porém, fazer o bem à distância não impede que nos sintamos mal perante a miséria dos mais próximos que não têm nada a ver com os nossos estados de alma. Espero que ao ler estas linhas, não continuem a ver os mendigos da mesma forma.

OH DIABO!

A Pedro Passos Coelho estão, insistente e repetitivamente a atirar-lhe à cara a sua desastrada previsão da vinda do diabo em setembro, sobretudo quando o governo geringonçal pôde apresentar resultados que, provisórios ou não, conjunturais ou definitivos, constituem autêntico hino celestial para os cidadãos em vésperas de se prepararem para a quadra festiva e consumista que se avizinha. Foi um erro grave do ex-primeiro ministro, sem dúvida. A sua incapacidade de antecipar o cenário que se aproximava uma evidência de um handicap sério para quem se prepara para regressar ao ringue da disputa para a liderança governativa. Também o é. Mas não são os mais graves nem os que mais o penalizam. Os seus erros e incapacidades não são de agora antes têm de ser procurados em tempos anteriores a factos que remontam a maio de 2010 quando o líder laranja pedia desculpa ao país pelas medidas do governo que não liderava. Nunca mais o fez apesar da aplicação, já da sua lavra, de muitas outras mais duras e dolorosas que depois veio a protagonizar. Não foi esse ato de humildade que o catapultou para a ribalta política lusitana. O seu primeiro erro foi exatamente esse. Não ter percebido a verdadeira razão pela qual foi o escolhido para liderar os destinos desta nação valente e imortal. E esta foi simples e clara. Em 2011, quando o resgate se tornou inevitável o antigo líder da juventude laranja veio dizer o que, obviamente, era necessário ser dito: que não tinha qualquer objeção em governar durante a intervenção do FMI. Ora se era o FMI que nos vinha evitar cairmos na bancarrota o que era necessário era uma chefia que encarasse essa situação de forma normal e natural. Coisa diferente e bem diversa era a vontade posteriormente revelada de ser mais papista que o papa demosntrando uma vertinginosa determinação de ir muito além da troica. Esse foi o seu segundo erro. Muitos outros se seguiram. A par disto veio o primeiro dos handicaps: a vitória nas legislativas acabou por se revelar mais fácil e concludente que o que era esperado. Isto privou-o da aprendizagem que as dificuldades e, ainda mais, os falhanços necessariamente trazem. É hoje uma verdade totalmente aceitável, nos cursos de empreendedorismo, mesmo na europa, já que nos Estados Unidos há muito que é um axioma: quem erra aprende melhor e de forma mais marcante. São vários os investidores que procuram e valorizam jovens talentosos que já tenham soçobrado numa ou várias iniciativas anteriores. Passos teve poucos revezes e chegou a primeiro-ministro sem, na verdade, ter harduamente trabalhado para isso. Foi fruto das circunstâncias. Aconteceu-lhe.
Tal como lhe “aconteceu” deixar de o ser depois de ter conseguido obter mais votos, para o projeto que liderava, do que o seu opositor. Depois dos vários erros cometidos no quadriénio em S.Bento, veio o erro maior e esse sim é o que nesta altura o atira para a cauda da apreciação dos portugueses. Decidir não apresentar uma única proposta durante a discussão do orçamento para 2016 foi-lhe fatal. Dizer que vem aí o diabo ou que estamos a caminhar para o abismo, passe embora o exagero, faz parte do papel reservado ao chefe da oposição. Qualquer coisa que corra mal poderá sempre dizer vêem como eu tinha razão? O problema é quando a coisa corre bem não ter uma única ação, um único gesto, um único contributo para poder também partilhar parte do sucesso, mesmo que não fosse fácil demonstrá-lo por a mais b. Ninguém o poderia impedir de reclamar que o que há de bom também se deve à atuação e participação do PSD.

Perguntas que alguém saberá responder porque eu não tenho ideia nenhuma

Outro enigma que não se me apresenta resolúvel é o que diz respeito à venda do BPN. Todos sabemos que o BPN foi vendido ao banco BIC por 40 milhões de Euros umas semanas depois de o Estado ter injetado nele 700 milhões. Parece um negócio das Arábias, só que às avessas. É evidente que isto não pode ser o que parece. Possivelmente o procedimento nem estará mal de todo, a ver pelas reações das oposições. Mas o negócio visto como nos é dado ver, foge a qualquer lógica, não tem nada de racional. Ora uma vez que fomos nós que pagámos este “fòrróbòdó” financeiro cumpria aos intervenientes no processo, Governo, partidos, Banco de Portugal e também aos “gurus” da Economia e aos comentadores políticos, uma explicação sobre os estranhos mecanismos da referida transação.
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A Comunidade Europeia tinha tudo para começar bem e assim foi. Saídos da Guerra, cheios de espirito solidário, com tudo por fazer e com o dinheiro do plano Marshal, bom, tudo eram flores. Mas mal surgiram problemas económicos em alguns dos seus membros logo acabou o espirito solidário. Todos nos lembramos das proclamações, quase delatoras, “não somos como a Grécia!”, não somos como Portugal!” etc, numa tentativa de sacudir para longe um vizinho incómodo. E a nós, que nunca atingimos, sequer, a média Europeia foi-nos dito, em tom ameaçador, que já tínhamos gasto demais. Então entrámos para ficar em que lugar?
( falo na média dos 27, já nem falo da média dos 12 que era o número de países da Comunidade quando a integrámos)
Com o problema dos refugiados, em parte criado pela própria Europa, assiste-se a comportamentos muito díspares e alguns inenarráveis. A Europa finalmente perdeu o verniz e mostrou a razão primeira que presidiu à sua criação. E a razão é a de evitar que haja guerra dentro da Europa (fora dela pode haver e até se podem promover) confiando na sabedoria popular que “gatos no saco não se guerreiam”. E tem conseguido este objectivo, o que não é pouco, convenhamos. Porque de resto, está-nos a falhar em todos os domínios. (Aliás, tenho para mim que quando um grande propõe sociedade a um pequeno, se a coisa dá para o torto, já sei quem se lixou.)
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  A lógica capitalista que nos rege, e não temos alternativa, exige um crescimento económico de x por cento para criar emprego e para melhorar as condições de vida dos cidadãos. Por outro lado para um país crescer tem de haver investimento, logo endividamento. E o endividamento, assim, cresce inexoravelmente. Até quando? Mas o crescimento económico assenta na produção e a produção tem o seu próprio limite, não pode crescer indefinidamente. E a pergunta, é: quando esse limite for atingido, que é que vai acontecer?
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Outro dos meus assombros é o facto de todos os Países do mundo terem dívida pública. Até os Países Árabes exportadores de petróleo, outrora autênticas tesourarias do Mundo, têm dívida pública. A dívida pública mundial tem números absolutamente astronómicos (no caso Português, só os juros da dívida pública é tanto como o que é gasto no Serviço Nacional de Saúde). Não existe no mundo esse dinheiro. Curioso é não existir o dinheiro da dívida mas existir dívida. Quem é o enigmático credor de todos os Países? Quem é o estranho credor dessa montanha de dinheiro? Quem é este credor que não obstante a gigantesca dívida a haver, além de não ter falido ainda tem capacidade para conceder mais créditos, penso, até, que indefinidamente. Os Estados criaram as suas próprias sanguessugas? Em que sinistra teia estamos enredados?
Marx vaticinou que “o capitalismo gera os genes da sua própria destruição”. Será verdade? Não sei, mas não sinto grande segurança.

Por Manuel Vaz Pires

NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - João (Abraham) da Costa Vila Real (1653 – depois de 1729)

O pai (João da Costa) era natural e morador em Bragança. A mãe (Leonor da Costa) era de Torre de Moncorvo. Mas os Costa de Bragança estavam ligados com os de Torre de Moncorvo e uns e outros com largo historial na inquisição. Por isso mesmo, a maioria dos membros da família acabaram por fugir para Castela. Foi o caso de António da Costa, irmão de João da Costa, que foi residir para Toledo e ali exercia o ofício de estanqueiro do tabaco. Aliás, acabaria por ali ser preso pela inquisição daquela cidade de Espanha. 
E também para Castela abalaria João da Costa ao atingir os 20 anos, conforme resulta do seu processo. Mais: ele disse que em Espanha foi doutrinado na lei de Moisés. Vejam:
- Há 30 anos, estando a morar em Zafra, reino de Castela, em casa de Pedro Catalão, homem de negócio, casado com Luísa de Salinas, lhe parece que era francês, morador na dita vila, na rua das Feiras, estando juntos e um irmão da mesma chamado Francisco de Salinas, lhe disse o dito Catalão que se queria salvar a sua alma havia de ter crença na lei de Moisés. (1)
E por ter vivido em Villa Real, terra da comunidade de Valência, Espanha, João da Costa terá ganho aquele sobrenome toponímico, quando regressou a Bragança ao findar da década de 1670 para casar com Isabel de Sá, da família Lafaia (2) que lhe deu dois rapazes e duas raparigas (3). E falecendo Isabel, por 1702 João casou em segundas núpcias com Leonor Nunes, viúva de Luís Pereira d´Eça. (4)
Os negócios de João da Costa não se limitavam a Bragança, antes o encontramos em constantes viagens pelo Porto, Lisboa, Madrid e outras muitas terras de Portugal e Castela. E se nas denúncias mais antigas ele é referido como torcedor de seda, logo depois é tratado por mercador e tratante. E sendo Bragança uma terra pequena para o seus negócios, este homem do trato mudou-se para Lisboa, cerca de 1698, fixando residência em Mata Porcos, na freguesia de Santa Justa e ali abrindo também uma loja. Nessa época ele é apresentado como contratador de açúcar.
A casa de João da Costa em Lisboa era local frequente de reuniões em sinagoga e nela se juntavam familiares e amigos de Bragança, como aconteceu na celebração do dia grande (Kipur) de 1698 em que foram 12 os congregantes que ali passaram o dia “e se juntaram na sobredita casa por ser mais isenta de criados e poderem mais livremente sem serem pressentidos, jejuar e guardar o dito dia e porque a casa tinha salas grandes e retiradas”, conforme o testemunho de Gaspar Mendes Henriques, um dos participantes.
Sobre a guarda do sábado como dia de descanso semanal, há dois episódios muito interessantes contados por João da Costa. Um deles teve como protagonista um tal Bento do Couto que se recusava a receber o dinheiro de uma dívida que lhe iam pagar pois que, sendo sábado, “não era dia de cobrar dinheiro”. O outro episódio aconteceu com André Garcia, de Bragança que ele acompanhou ao correio a levantar umas cartas e depois se recusou a abrir e ler as mesmas “por causa de ser sábado”. Imagine-se: o sábado era um dia tão sagrado que nem mexiam no dinheiro e nem sequer abriam as cartas vindas no correio!
Em Lisboa a vida de João Vila Real aparece muito ligada à zona da Trindade, à igreja da Conceição (antiga sinagoga de Lisboa) e o claustro da Trindade era então o sítio mais procurado pelos marranos para enterrar os mortos “por ser a terra mais alta”. Disso mesmo nos dá conta o nosso biografado, comentando a morte e o enterro do famoso médico Simão Lopes Samuda, em 1702:
- Há 2 anos em Lisboa foi a casa do médico Samuda, sendo chamado por António da Mesquita, genro do mesmo encomendando-lhe este fosse à Trindade encomendar um hábito para amortalhar o dito seu sogro, e indo com efeito ele confitente a fazer a dita diligência, o trouxera a casa do mesmo e achando que o dito Dr. Samuda tinha já falecido, e perguntando ele confitente aos filhos do mesmo (…) porque não ia seu pai enterrar à freguesia, lhe responderam que era melhor à Trindade e enterrarem-no no claustro e no hábito da Trindade do que de S. Francisco, do que ficou presumindo ele confitente que os mesmos eram observantes da lei de Moisés porque indo a enterrar-se a sogra de João da Silva Henriques ao mesmo convento da Trindade, lhe dissera Manuel da Cunha Falcão que aquela terra do claustro da Trindade era melhor por ser mais alta e costumarem ir ali a enterrar os cristãos-novos.
Sobre António de Sá Mesquita, (5) diremos que ele, tal como o seu irmão Francisco, foram denunciantes do nosso biografado e de sua mulher Leonor Nunes, que foram presos em 23 de Agosto de 1703, saindo ambos penitenciados em cárcere e hábito perpétuo. João passaria cerca de um ano nas masmorras e sua mulher dois. Isso ficaria talvez a dever-se à vigorosa defesa por ele apresentada e aos sólidos depoimentos das testemunhas de defesa por ele nomeadas e que incluíam gente da maior nobreza e fidalguia de Bragança entre eles o alcaide do castelo e o governador militar. E um dos factos que mais terá pesado no ânimo dos inquisidores foi assim contado por ele e confirmado pelas testemunhas:
- Sendo morador em Bragança, servia todas as irmandades da igreja de S. João, de onde era freguês, com muita devoção e dispêndio de sua fazenda (…) E na igreja de S. Vicente servindo de mordomo do Senhor Jesus, concorrendo com as maiores despesas que se costuma fazer, em tal forma que vindo para Lisboa, deixou todas as dívidas que se lhe deviam na cidade de Bragança para a irmandade do Santo Cristo.
Livre das masmorras da Inquisição de Lisboa, João da Costa Vila Real, foi acabar os seus dias na Inglaterra. A fuga de Lisboa, com toda a sua família (17 pessoas), foi espetacular. Chegado a Londres, aderiu abertamente ao judaísmo fazendo-se circuncidar e tomando o nome judeu de Abraham. Tinha 73 anos quando foi circuncidado, em 28 de Agosto de 1726, sendo seu padrinho Abraham Dias Fernandes, originário de Freixo de Numão. Três anos depois, em 18.5.1729, Abraham Vila Real, seria padrinho da circuncisão de um seu neto, como ele chamado Abraham da Costa Vila Real, filho de Isaac (José) da Costa Vila Real,  Real. A madrinha foi a mulher deste. (6)
Terminamos esta biografia com uma oração recitada por João da Costa que terá aprendido em Espanha, em casa de Pedro Catalão. Ou terá sido em Bragança com Jerónima Salinas, cunhada daquele e sua madrasta?
En tu furor mi Señor no argüías mi
Airado mi miseria reprehendas,
Usa mi Dios de grandezas tuyas,
E aparta de mi alma las contiendas,
Y con piedad mi juicio le concluías,
Sana mi alma pobreza afligida,
Pues eres su salud su gloria y vida,
Desata de mi alma las contiendas
Y con piedad mi juicio le concluías.

NOTAS e BIBLIOGRAFIA:
1-ANTT, inq. Lisboa, pº 2366, de João da Costa Vila Real.
2-Pedro Lafaia Pissarro, irmão de Isabel de Sá foi o tutor nomeado dos filhos de João e Isabel. Ele próprio era casado com Leonor da Costa, sobrinha de João Vila Real,  - ANTT, inq. Lisboa, pº 1535, de Pedro Lafaia Pissarro. IDEM, pº 8161, de Leonor da Costa.
3-Todos os 4 filhos foram processados pela inquisição de Lisboa. A filha Mariana foi casada com António Machado Coelho, que faleceu nas cadeias da inquisição de Lisboa em 15 de Outubro de 1705, com a sentença a ser lida 4 anos depois, no auto da fé de 30.6.1709, nela se determinando o confisco de bens e declarando “que por sua alma se podem fazer sufrágios da Igreja e que seus ossos se entreguem aos herdeiros se os pedirem”. Ficando viúva e posta em liberdade, Mariana fugiu com a família para Inglaterra e ali assumiu publicamente a condição de judia, tomando o nome de Sara. Casou segunda vez, com Alexandre (Abraham) de Morais, irmão do porteiro da sinagoga Bevis Marks, Luís Sá, também originários de Bragança.
4-ANTT, inq. Lisboa, pº 3605, de Leonor Nunes.
5-IDEM, pº 153, de António de Sá Mesquita. Seu irmão, Francisco Sá Mesquita terá sido um dos grandes denunciantes da história da inquisição portuguesa. – IDEM, pº 1330 e 16326, de Francisco de Sá Mesquita.
6- Bevis Marks Records, posted by SteinHE@aol.com. R.D. Barnett and others (ed)  The circumcision  register of Isaac  and Abraham  de Paiba ( 1715- 75) In the Archives of the Spanish an Portuguese Jew’s Congregation of London , Bevis Marks Records , 4 (1991)

Por António Júlio Andrade / Maria Fernanda Guimarães

SIDA – Saiba como se prevenir

Todos têm de se prevenir: homens, mulheres, casados ou solteiros, jovens e idosos, todos, independentemente da cor, raça, situação económica ou orientação sexual.

O que é a sida?
A sida - Síndrome da Imunodeficiência Adquirida é uma doença não hereditária causada pelo vírus da imunodeficiência humana (VIH ou HIV, na língua inglesa), que enfraquece o sistema imunitário do nosso organismo, destruindo a capacidade de defesa em relação a muitas doenças.

O adeus a um amigo

Ter, 29/11/2016 - 10:21


Olá familiazinha. Mais uma semana passada na história da nossa vida. Quero homenagear, nesta página, o nosso saudoso e grande amigo pessoal desde criança e da família do Tio João desde a sua formação, o Tio Dinis Carteiro. Tenho a certeza que nos levou a todos no seu coração. Era um participante nato da família e foi, juntamente com a sua esposa, um dos casais que mais viagens fez connosco. À nossa peregrinação a Fátima só faltou este ano…
 

Fidel e os puros

Ter, 29/11/2016 - 10:19


Aos 90 anos partiu Fidel Castro para a aventura, última quanto sabemos, da eternidade, o tudo ou nada da existência de cada um de nós.
Marcou mais de seis décadas da história recente, um perfil de profeta, com barba e tudo, a prometer, como sempre fazem os profetas, a salvação para lá do horizonte e a justiça implacável para os incréus, que seriam comidos pelas pragas que ele próprio lançava da sua praça em Havana.