O prometido era de vidro

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Ter, 10/09/2019 - 01:21


Nós, por cá, somos pouco dados a pantominices e, por isso, dificilmente ficamos fascinados com protestos de arrependimento e promessas de nova atenção, que marcam as passagens apressadas dos responsáveis nacionais pelos caminhos desta santa terra, onde a dureza da vida nos tempera o corpo e a alma.
Percebemos há muito tempo que só podemos contar com as forças que nos restam, porque de solidariedade nacional, correcção de injustiças, procura de soluções globais para o país estamos conversados.
A situação do distrito não tem conhecido alterações significativas que justifiquem renovado alento. O envelhecimento continua, a renovação de gerações já parece impossível, notem-se os números de crianças a iniciar a escolaridade, os eleitores estão em perda, o que conduzirá à redução da representação parlamentar para dois deputados, a produção pecuária já caiu para níveis impensáveis e os investimentos mobilizadores de emprego nunca mais chegam, apesar das arengas redondas destes e daqueles.
A próxima legislatura pode tornar-se no último suspiro de uma região onde gerações sucessivas construíram relação empolgante com a natureza, carregada de potencialidades que a modernidade podia explorar com proveito para o país e para o mundo. 
Pelo menos foi disso que ficámos convencidos quando nos disseram que a beleza das paisagens, a qualidade dos produtos, os sabores construídos séculos fora eram verdadeira riqueza. Se lhes fossem associadas vias de comunicação rápidas e seguras, não faltariam interessados nas actividades industriais, porque sendo o mercado europeu fundamental para a economia nacional, nada melhor do que estar mais perto das grandes artérias que conduzem à Europa central.
Afinal, os transportes do futuro, dizem agora, devem passar pelo caminho de ferro, que só tivemos de terceira categoria e foi deitado ao lixo da história triste. A auto-estrada chegou tarde e sem garantias de conexão com grande parte do território, o que pode torná-la numa via pelo meio de nenhures. Mesmo as cidades que sobrevivem no seu eixo correm o risco de ficar sem capacidade de resistir à atracção do litoral festaroleiro, onde se compram votos com medidas que satisfazem a soberba dos que confundem os destinos do país com a mesa farta de fast food ou as confortáveis almofadas onde alapam o traseiro.
Assim temos perdido tempo, numa espera insensata por um país a sério. Houve momentos penosos, quase ridículos, quando aplaudimos promessas de reposição no mapa, quando aceitámos que a região fosse relegada para o isolamento com a desvalorização da E82, quando ninguém tomou posição perante o fim dos transportes públicos na maior parte das povoações, quando voltámos a aplaudir quem nos acenou com as vantagens de viver numa zona transfronteiriça, quando se continuaram a garantir ostensivamente ao litoral condições para consumar o esvaziamento populacional da região, transformando-nos no lar de idosos, que acabará no amontoado de ruínas assombradas pelos fantasmas do remorso.
Pode ser que os deuses se compadeçam de nós a partir do próximo dia 6 de Outubro.