Paciência para a política com humor de Agosto

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Ter, 27/08/2019 - 01:40


A intervenção política requer paciência e serenidade, mas também coragem para persistir na defesa de princípios e valores que a civilização consagrou, ao longo de milénios, de que não devemos abdicar.
É natural que se entenda com virtude o pragmatismo que não se deixa arrastar pela evolução caprichosa da espuma de cada dia e, por isso, vejamos celebradas personalidades a quem se reconhece coerência, mesmo quando estão próximas da rigidez moral, do atavismo cultural, do preconceito na vizinhança do fanatismo.
Mas também é vulgar ouvir elogios às capacidades de gestão de contradições evidentes por parte de responsáveis políticos da conjuntura, que até merecem generalizado aplauso pela elasticidade que lhes permite proclamar, com toda a calma, qualquer coisa hoje e o seu contrário amanhã, sem que ninguém se dê ao trabalho de franzir o sobrolho.
Chamam-lhe adaptação e atribuem-lhes qualidades como astúcia, sentido de oportunidade, calculismo, que podemos integrar no rol dos méritos, porque a vida se confunde com um jogo de sombras e muitas habilidades pelo meio.
O actual primeiro ministro passou quatro anos a alardear méritos negociais com os partidos à sua esquerda, o que garantiu mandato tranquilo como poucos, mesmo se o compararmos com as maiorias absolutas de Cavaco Silva ou de José Sócrates, que deixaram memória de teimosia e desprezo pela comunicação social.
No mandato que termina em Outubro viveu-se num caldo morno, pé de salsa aqui, pitada de sal acolá, toucinho rançoso quase a estragar a sopa, dentes de alho para purificar e cebola picada a fazer chegar às lágrimas. Pelos vistos, ninguém se queixou, mesmo aqueles que preferiram ficar-se por pão e água.
Estranhamente, rapada a panela, com promessa de repetir esta verdadeira sopa de pedra, o renomado chef encontrou, afinal, defeitos ao cozinhado, prevendo que o próximo poderá azedar se não for ele a determinar as proporções de legumes e hortaliças, o grau do fio de azeite e a quantidade de sal.
Assim se deixa o povo em verdadeiro espanto. Então a solução encontrada dera provas de eficácia, de tranquilidade social, de recuperação de rendimentos, de progressos no emprego, de crescimento das exportações, mas agora corre-se o risco de ingovernabilidade como aqui ao lado, no reino da Espanha, onde parece caminhar-se para uma desgraça de caldo entornado.
Percebem-se esgares de repúdio dos que não querem confundir-se com repolhos rejeitados, cebolas moles e ossos estilhaçados, que tornariam perigoso o próximo repasto. Mas outro parceiro, revolucionariamente paciente, pragmático quanto baste, com uns pozinhos mágicos na mão para afinar o tempero, já vai tratando, cuidadosamente, da colher de pau que há-de garantir a finura do produto.
Nada melhor do que não levar muito a sério a representação, porque o fundamental não se decide amanhã: é uma construção que exige resistência ao desânimo. Apesar de estarmos fartos de esperar pelo tempo da política como verdadeira manifestação fundamental da dignidade humana.