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Por aqui não se espera um ano novo feliz

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Qui, 28/12/2017 - 09:53


É duro ver passar o tempo sobre esta terra, secando-lhe os últimos sinais de vida, sem que se sinta, ao menos, o abanão da revolta antes do último suspiro.
Quando há quase duas décadas um estudioso da UTAD deixou dito que em 2025 o concelho de Vimioso conheceria o ermamento houve meia dúzia de indignados, num coro quase piado, que desdenharam tal profecia mas, na verdade, tudo indica que o bom homem tinha razão. Relativamente a Vimioso e à generalidade do distrito, com eventual excepção, por mais umas décadas, dos concelhos atravessados pela A4, que ainda apresentavam condições para resistir à razia.
Percorrendo o território, vamos passando por povoações limpas, calcetadas, arejadas, com referências nas ruas e nas praças, sem lama nem esterco por todo o lado, com flores vibrantes a cada Primavera, mas sem promessas de futuro.
Basta observar as inscrições de alunos nas escolas para perceber que, em breve, se justificarão novos encerramentos, mesmo nas cidades maiores, porque nem ali ficam os que poderiam garantir dias vindouros, gente de entre vinte e trinta anos, que aqui não encontra, por mais que se esforce, condições para uma vida com a necessária dignidade. Por isso procura-a na faixa litoral e, cada vez mais, numa diáspora que parece dourada, por enquanto.
Assim se vão consolidando razões para aceitar os argumentos dos que desactivam mais e mais serviços, instalando o ciclo vicioso que enreda, tolhe e asfixia irremediavelmente. Os centros de saúde foram perdendo valências e estão reduzidos ao mínimo, os hospitais são da segunda divisão, os tribunais e as repartições públicas são engolidos na voragem, os postos das forças de segurança estão na penúria de recursos humanos e materiais.
Vive-se com a sensação de que há, da parte dos responsáveis políticos do país, uma espera displicente do fim, para pôr uma pedra sobre este assunto. Depois do abandono consentido dos transportes, que isolou os que restam e nem sequer têm acesso às redes de comunicações, a ligação ao mundo que os serviços de correio representaram durante séculos também está em risco de desaparecer, porque o Estado abdica de milhares de cidadãos que já não têm força para dar o adequado murro na mesa.
De vez em quando chegam-nos discursos em tom de penitência, como quem bate no peito, papagueando palavras rapidamente esquecidas, para voltar ao ripanço do imediatismo sem horizonte. Depois de tais arengas fica-se a saber que oito concelhos do distrito podem perder as farmácias de serviço permanente. Logo se inventa uma historieta fantástica, ao arrepio de qualquer racionalidade, para fazer crer que quem tiver necessidade de medicamentos poderá solicitá-los, sem custos acrescidos, junto de farmácias que continuem em serviço permanente nos concelhos com urgências básicas e hospitalares. Ou seja, um utente de Vinhais solicitaria à farmácia de serviço, em Bragança, o fornecimento do medicamento, que lhe seria entregue “sem custos acrescidos”, por exemplo, na Mofreita, nas duas horas seguintes.
Assim se vai tecendo deliberadamente a mortalha surrada que envolverá a memória difusa da história do nordeste transmontano.