Secretarias de Estado e foguetes antes da festa

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Ter, 22/10/2019 - 02:19


Num tempo em que as aparências invadem o espaço público, servindo para nos distrair da essência dos processos políticos, viveu-se verdadeiro frenesim com a divulgação, às pinguinhas, dos membros do novo governo.
À semelhança da agitação que tomou conta dos media de impacto nacional, também por cá os dias têm sido animados por revelações, algumas requentadas outras quase estranhas, que nos levaram à constatação de que cinco secretários de Estado têm ligações com o distrito.
Dito assim, pode parecer que, finalmente, este território e as suas gentes estão a ser tratados como merecem. Só nos longínquos tempos do Estado Novo houve governos que integraram números semelhantes de governantes com ligações ao distrito.
A presença de personalidades como Cavaleiro de Ferreira, Trigo de Negreiros, Sarmento Rodrigues, Águedo de Oliveira e, depois, Gonçalves Rapazote não se traduziu em alterações na condição de subdesenvolvimento que fazia da região um escoadouro de gentes para o litoral, os territórios africanos ou a Europa central nas décadas seguintes. Desde então ficámos a saber que ter gente de cá no governo de Lisboa não torna os tons da nossa tragédia mais suaves.
No tempo democrático poucos bragançanos se têm sentado nas cadeiras governamentais. Depois de passagens efémeras de Alberto Machado e Domingos Jerónimo, foi considerada conquista importante que Armando Vara chegasse a secretário de Estado, com breve subida a ministro, cargo de que caiu com algum fragor, começo de penosa subida ao calvário, para ele e de desilusão para os que esperaram que a sua ascensão significasse outra atenção do poder lisboeta.
Pouco depois chegou a secretário de Estado da saúde Adão Silva, num mandato de pouco mais de dois anos, que se traduziu em obras nalguns centros de saúde e preparação de serviços de proximidade para os utentes, desígnio logo abandonado, reconduzindo aqueles equipamentos à função de centros de despacho para os hospitais das três cidades do eixo da A4, então IP4. 
Uma dúzia de anos depois o distrito viu Jorge Gomes numa secretaria de Estado. Mas os incêndios de 2017 ditaram que fosse arrastado na queda da então ministra da Administração Interna.
No último ano Sobrinho Teixeira, que deu provas à frente do IPB, tem sido secretário de Estado do ensino superior. As novidades para o próximo governo foram confirmadas ontem: outros quatro secretários de Estado, oriundos ou relacionados com o distrito, razão da quase festa que se instalou, com alguns a arriscar que agora é que a nossa sorte vai mudar.
Seria melhor terem contado até dez e respirado fundo, antes dos saltos de júbilo. Na verdade, os membros do governo terão sido escolhidos pelas suas capacidades políticas, competências técnicas e perspectivas estratégicas nacionais. A representação compete aos deputados, que só são três, bem menos que os secretários de Estado.
De qualquer modo, sempre nos consola o reconhecimento de que, apesar de tudo, no interior podem estar personalidades capazes de decisões que dizem respeito a todos os portugueses.