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A família gozou férias em Benidorm

Ter, 11/07/2017 - 11:18


Olá familiazinha. Depois de oito dias de férias em família, cá estamos novamente para vos contar as aventuras das férias em Benidorm 2017.
Durante a nossa estadia, com espírito de família, fomos vivendo o nosso dia-a-dia, tentando enriquecer as férias de cada um. Este ano, mais de metade do grupo, aventurou-se, pela primeira vez, a passar as férias em família (segundo dizem, ficaram aprovados).

Nós trasmontanos, sefarditas e marranos - André Garcia de Miranda (n. Bragança, 1673)

André Garcia de Miranda era filho de Gaspar Garcia e Leonor Nunes de Miranda. Como o sobrenome indica, a família era originária de Miranda do Douro, cidade onde viveram os seus avós: Pedro de Miranda e Ventura Nunes. E foram as cerimónias e ritos judaicos em volta da morte e amortalhamento de Pedro Miranda, por 1635, que originaram a maior parte das denúncias feitas perante o licenciado Diogo de Sousa, inquisidor de Coimbra, na visitação que fez à cidade de Miranda em fevereiro de 1638 e levaram mais tarde à prisão de Ventura Nunes.(1)

Não sabemos se Leonor Nunes nasceu antes ou depois da morte de seu pai. Sabemos é que por 1652 ela já vivia em Bragança e estava casada com Gaspar. Em 1664, ela e o marido foram apresentar-se na inquisição de Coimbra, sendo mandados regressar a casa.(2)

Em Bragança, por 1673, nasceu André Garcia de Miranda, que cedo começaria a correr mundo, a mercadejar, internando-se por Castela, assistindo nas cidades de Madrid, Valhadolid, Rio Seco, Medina del Campo… Em Portugal, disse que conhecia “a maior parte das cidades e vilas”.

No ano de 1694 ainda morava naquela cidade trasmontana, sendo eleito mordomo da confraria de Nossa Senhora da Rosa, sita na igreja de Santa Maria, conforme registo no competente livro, folha 141:

— Aos 6 de Setembro de 1694, nesta igreja de Santa Maria, aonde está a dita confraria de Nossa Senhora da Rosa, aí em mesa, se fez eleição dos oficiais que haviam de servir a dita confraria e foram eleitos para juiz Manuel George; para mordomos André Garcia e António Rodrigues Chisme; para escrivão o padre Francisco Pires e para procurador António de Afonseca, tecelão de veludo…(3)

Aos 30 anos, quando a inquisição o prendeu, André continuava solteiro e a trabalhar por conta do pai, “um velho que se ocupava de rendas e mandava fazendas para fora do reino”, então residente em Lisboa, na Fancaria de Cima. Uma das culpas que lançaram, e a principal, referia-se à celebração do Kipur (a maior festa do calendário judaico) no ano de 1699, em casa de Alexandre Pimentel onde se juntou um grupo de cristãos-novos Brigantinos moradores na capital e aparentados entre si, a saber:

— Eliseu Pimentel, irmão deste, administrador das cartas de jogar e solimão (…); e dois filhos de Alexandre Pimentel (João e António); e Manuel da Costa Miranda, parente dos ditos Pimentel, morador na Correaria; e Alexandre da Costa Miranda, irmão do dito Manuel, que embarca fazendas para fora; e outro irmão dos mesmos, chamado Domingos da Costa Miranda, contratador; e António de Morais, parente dos mesmos, homem preto, más cores, homem doente; e André Garcia de Miranda, parente dos mesmos; e João da Costa Vila Real, torcedor de sedas a Mata Porcos, natural de Bragança; e com um sobrinho do mesmo…(4)

Resta dizer que Domingos da Costa Miranda era casado com Filipa Garcia, irmã de André e que o casal tinha já uns 7 filhos. Ambos seriam presos de seguida.(5)

André tinha outra irmã, chamada Isabel Nunes, então com 45 anos, a qual era já viúva e mãe de 3 filhos. Ela e os dois mais velhos, seriam também processados pelo santo ofício logo em seguida.(6)

Fiquemos agora com o nosso biografado, que “se ocupava de rendas e de mandar fazendas para fora do reino”, por conta do pai “que se acha já velho e não pode escrever”. Significa isto que o devemos incluir na classe dos rendeiros, uma classe prestigiada e necessariamente endinheirada. Para além de rendeiro, André seria um importador/exportador e a sua rota comercial ligá-lo-ia essencialmente ao Brasil, de onde importava açúcar e tabaco, entre outras mercadorias. Uma parte era vendida no reino, a retalhistas, e outra parte era encaminhada para Castela. Ali, o seu correspondente chamava-se João Garcia de Guinea, que, por seu turno, lhe remetia fazendas, referindo-se estamenhas, sedas, tafetás...

Ignoramos quem fosse este João Garcia de Guinea, colocando, no entanto, a hipótese de serem parentes, dado que na generalidade as redes comerciais eram de natureza familiar. Na rede de distribuição de tabaco na região de Zamora – Salamanca dominava Gabriel Sola, originário da Guarda, e também para ele o nosso biografado despachava “partidas de tabaco em folha”, o que causava rivalidades com outros fornecedores/distribuidores como era o caso de um João Dias Pereira, de Lebução, termo de Chaves.

No mundo dos negócios aconteciam percalços, muito em particular tratando-se de mercadorias e transportes marítimos e fluviais. Por isso as taxas cobradas pelos seguradores eram particularmente elevadas, acima de 15% sobre o valor segurado.

Em determinada altura André Garcia e o cunhado Domingos da Costa Miranda procederam à importação de dois barcos de açúcar do Brasil. E a empresa proprietária barcos, assim como a seguradora pertenciam aos Dias Fernandes, cristãos-novos originários de Muxagata/Freixo de Numão. A mercadoria foi desalfandegada na cidade do Porto e uma parte foi metida em barcos, seguindo pelo rio Douro até ao porto de Foz Tua, de onde seria transportada em bestas ou carros de bois, para Bragança. Aconteceu que um dos barcos se perdeu em um ponto do rio e… segurados e seguradores andaram em demandas na justiça, já que estes se negavam a pagar os prejuízos, lançando a suspeita de perda fraudulenta dos açúcares. O caso foi resolvido na justiça. Mas ficaram ódios, como consta da confissão de Fernando Dias Fernandes:

— Vindo a esta cidade, dali a alguns meses o dito Alexandre da Costa Miranda, com outro seu parente a fazer o mesmo negócio de açúcares e carregá-los também pelo Douro  acima  de que ele testemunha lhe fez a apólice não quiseram que lhes segurasse  o réu  e seu tio Luís Fernandes  dizendo que não queriam nada com essa canalha.(7)  

Este episódio, bem interessante para o estudo das comunicações em Trás-os-Montes, foi apresentado por ele aos inquisidores e é uma das contraditas do processo. Este é um processo normal, em que o réu começa por negar tudo, mas, face às evidências da acusação, acaba por confessar e admitir que andou errado na fé. O que tem de especial o processo de André Garcia é o seu comportamento na cela, as rezas e jejuns que fazia e que foram contadas pelos vigias.

Não vamos descrever os pormenores da separação da carne e dos ossos, o esmiolar do pão para meter migalhas no fundo da malga do caldo, a fim de mostrar que comera, quando, na verdade, nada metera à boca, nem sequer uma gota de água. A carne, bem desfeita, e o caldo vertia-os em seguida no vaso dos dejetos. E a palangana, depois de lavada, a punha “emborcada sobre um ramo de alecrim”.

Depois, lavava as mãos por 3 vezes e... Melhor do que nós falam as próprias testemunhas, em linguagem bem típica e saborosa. Vejam:

— E logo veio aos pés da cama, e de cima dela tirou um roupão de baeta encarnado e o vestiu e se pôs em cima de uma esteira de palma, que tinha à ilharga da cama, e em pé se pôs em oração, olhando para a parede (…) e na grade onde tinha um fumo pendurado (…) fazendo com as mãos repetidas ações, pondo-as abertas no ar e fechando-as (…) e no fim da oração fez duas cortesia com o pé para trás, de mão beijada…

Gostaríamos de terminar com uma oração que ele recitou perante os inquisidores. É uma oração em castelhano, muito longa, pelo que a não podemos aqui reproduzir. Transcrevemos apenas uns trechos:

— Diós soberano y eterno, princípio de los princípios, sin princípio ab eterno, de quien todo el depende, infinito y inmenso, majestad de las majestades, glória y honra de tu mismo (…) Quisiera Señor tener echo un altar en mi pecho y ser sacrário mi alma (…) Fuisteis quien me sacaste del no ser al ser que tengo…

 

Notas e Bibliografia:

1 - ANTT, inq. Coimbra, pº 1943, de Madalena Garcia; IDEM, pº 8228 e 8228-1, de Ventura Nunes. No seguimento deste processo, Ventura Nunes foi condenada em degredo para o Sardoal, depois comutado para Torre de Moncorvo, de onde fugiu para Castela.

2 - IDEM, inq. de Lisboa, pº 4110, de Gaspar Garcia; pº 7526, de Leonor Nunes Miranda.

3 - Repare-se que, à exceção do juiz e do padre, cuja “nação” ignoramos, todos os outros são cristãos-novos, com “ficha” na inquisição.

4 - ANTT, inq. Lisboa, pº2781, de André Garcia de Miranda.

5 - IDEM, pº 11846, de Filipa Garcia; pº 1811. De Domingos da Costa Miranda.

6 - IDEM, pº 3040, de Isabel Nunes; pº 9995, de Luís Álvares Nunes, estudante de filosofia; pº22, de Brites Nunes.

7 - IDEM, pº 2014, de Fernando Dias Fernandes, tif 439.

Portugal morreu, a minha Pátria, não!

A poesia é, sem dúvida, a forma mais delicada e civilizada de expressar sentimentos de amor, tristeza, raiva e revolta. Também de partilhar ideias, unir vontades e reacender a esperança.

Os portugueses têm tido, nos últimos tempos, demasiados motivos de indignação e descrença produtos do egoísmo, da mentira, da incompetência e da desfaçatez prevalecentes nas elites dirigentes, muito acima do que seria admissível.

A recente tragédia de Pedrógão Grande e o assalto aos paióis do polígono militar de Tancos, são os exemplos mais expressivos da profunda crise moral e de identidade em que o Estado português se encontra atolado, e que extravasa o plano financeiro.

Talvez este poema possa trazer algum alento e conforto ao cidadão comum e demovê-lo de desistir.

 

Portugal morreu,

a minha Pátria, não!

 

Portugal morreu!

 

Jaz morto às mãos da corrupção

e das teias que ela teceu

 

A minha Pátria, essa não!

 

A minha Pátria é o meu povo

a Língua que fala

a História que conta

a Verdade e a Democracia

e toda a sua poesia

 

A minha Pátria não é afronta

terreiro de paço

espaço de intriga e traição

políticos, banqueiros e outros vilões

os coveiros da Nação

 

A minha pátria é Camões

é Gama

Vieira e Pessoa

Santo António de Lisboa

do Quinto Império nostalgia

futuro que o povo reclama

 

É o meu Trás-os-Montes natal

suas lágrimas, suas fontes

meu Santo Graal

 

Portugal morreu

às mãos da corrupção

feito fogo e fumo

terra queimada

Nação emigrada

gente que chora

à procura de novo rumo

 

Portugueses, é agora!

 

(Este poema também poderá ser lido em: http://henriquepedro.blogspot.pt)

Onde estão os planos?

Era com esta frase que os inspetores dos anos oitenta se faziam anunciar nas escolas do primeiro ciclo, aterrorizando professores que se iam adaptando a um outro método de ensinar e fazer pedagogia. Os alunos já estão em férias, os professores continuam nas escolas e não é sobre tais planos que se irá refletir, pese embora, o campo da educação esteja minado por casos que colocam em causa a credibilidade da equipa ministerial. Não bastava a fuga de informação do exame de português, vem ainda a Sociedade Portuguesa de Matemática afirmar que há um erro no de matemática e, sem fonte, mas com constatação, a impressa informa que há diretores a pressionar os Conselhos de Turma para que passem os alunos com cinco ou mais negativas. O gabinete do ministro nega; a imprensa reitera; e a realidade confirma: sem sucesso não há crédito; sem crédito não há financiamento e o conceito empresarial chega à escola pública tão ou mais sub-repticiamente do que a municipalização dos estabelecimentos escolares. Certo e sabido é que a educação deixou de ser prioridade socialista, as expectativas defraudadas e cada vez mais o espectro político e a identidade ideológica se vai esbatendo para mal dos cidadãos.

Os planos que nos preocupam são outros. Todos os anos, por esta altura, ouvimos falar do ordenamento do território como uma necessidade imperiosa para por cobro a tantos hectares queimados e a tantas vidas que já neste ano se perderam. Com tantos organismos envolvidos, e com a fé que nos carateriza, devemos acreditar que muitos planos já estão concebidos, bens e populações salvaguardados. Tudo estará elaborado, mas tudo está no segredo dos deuses porque esta é a matriz com que as instituições da nossa democracia estão habituadas a trabalhar. “— Quando ocorrer um fenómeno destes, todos os agentes sabem o que devem fazer. Está tudo coordenado e devidamente planificado” – com esta ou frases semelhantes afagam-nos o ânimo e os dias vão passando. Já assim não é quando, efetivamente, as coisas acontecem, as populações estão isoladas e sem planos de contingência ou de ordenamento capazes de lhe salvar as vidas porque não estão efetivamente elaborados, há um total desconhecimento dos mesmos e em momentos de catástrofe não há ninguém que seja capaz de, calmamente, se debruçar sobre os rabiscos e as linhas de evacuação ou tenha paciência para aguardar que o socorro chegue quando estradas estão cortadas e do céu não vem ajuda.

Não sendo saudosista, mas correndo o risco de ser apelidado de retrógrado, quer parecer-me que se a classe política conhecesse um pouco mais da história contemporânea, e os organismos responsáveis pela prevenção e combate a incêndios assumissem verdadeiramente a dimensão pública da sua missão, bastaria retomar aquilo que foram as campanhas de dinamização cultural e ação cívica dos anos setenta promover, com outras metodologias é certo, as necessárias ações de sensibilização e de promoção dos valores ecológicos e ambientais, neste caso, junto das populações que, resistindo ainda, ocupam os recônditos lugares deste Portugal profundo. Comparado com a eternidade, o tempo que medeia entre o momento em que os helicópteros paravam nos adros das igrejas e o agora é nada; evoluíram as técnicas de comunicação e de divulgação da informação, mas regrediram os agentes e os protagonistas no terreno. Antes, criava-se, decidia-se e executava-se; ia-se às aldeias, às vilas à rua e ao bairro e intervinha-se. Hoje, formula-se em Lisboa, aplica-se no gabinete e avalia-se entre quatro paredes. E a diferença fundamental é esta: já não se sabe vestir a camisola por causas públicas.

O manso e o guerreiro III – O dói-dói e a pomada

Mais uma vez, quando a tarde alaranjando se despede e desvanece, Júlio Manso e Tomé Guerreiro partilham um copo de tinto, um naco de queijo terrincho, uma lasca de presunto e um carolo de centeio ainda quente.

— As notícias são boas, ti Júlio?

— Podiam ser melhores. Veja só este título onde um deputado centrista reclama, como sendo grande desperdício, os beijinhos no dói-dói. 

— Desperdício? Só de uma enorme ignorância poderia sair tal dislate! Não terá, seguramente, propriedades terapêuticas cientificamente provadas e aprovadas, mas quando nada mais se pode fazer, não há nada como os beijinhos no dói-doi. A dor não é só física e a capacidade de a suportar aumenta na exata proporção do carinho com que os ósculos são depositados. 

— O meu amigo hoje está muito poético!

— Sabe o que realmente me dói? É a insensibilidade de alguns políticos a quem, de forma insistente e irresponsável, tudo lhes serve para arremessarem aos opositores!

— Ó ti’Tomé, vossemecê não poupa nas palavras.

— Não me resigno perante tanta demagogia. É claro, certo e sabido que os abraços e os afetos não vão resolver os gravíssimos problemas, nem apagam a tragédia que atingiram as gentes de Pedrógão e arredores. Contudo, para o que já não tem remédio e para o que, tendo, não tem solução imediata, mais nada há a fazer, de imediato, que mostrar e exercer a solidariedade que o Presidente da República veio trazer.

— Olhe que eu não diria melhor! E o que me diz desta notícia aqui logo a seguir sobre a candidatura portuguesa para sede da Agência Europeia do Medicamento? Então não é que, mais uma vez querem puxar mais esta para a capital? Mas os do Porto já vieram dizer que não pode ser assim!

— Pois vieram. Mas mais valia ficarem calados.

— Essa agora! Ainda há bem pouco se abespinhava todo com o centralismo lisboeta e agora acha bem que continuem com essa mania que é já um vício?

— Abespinhava e abespinho. Nada é mais necessário neste país, com o interior tão desertificado, do que a descentralização. 

— Pois, e então?

— Então, é que a altura não é esta. 

— Não? E porque não?

— Atente bem nisto. A vinda da agência para Portugal não é, nem de longe nem de perto, um dado adquirido. A probabilidade de sermos contemplados com tal infraestrutura é reduzida. Só por isso deveríamos juntar-nos todos à volta da melhor proposta que fosse possível apresentar. A divisão só nos vai prejudicar. Imagine agora que a gente do Porto leva a sua avante e que a candidatura portuguesa segue baseada numa localização da Invicta. A ida da agência para outro país será um trunfo enorme, que bem dispensávamos, para os defensores do centralismo. Poderão, a partir de agora, alegar, que a “cegueira” descentralizadora conduziu à derrota e, mesmo que o não possam provar, nada os impede de especular que uma proposta melhor teria outra chance de ter sido vitoriosa. Por outro lado vão martelar-nos, daqui em diante, que a insistência regionalista prejudica o país.

— Não deixa de ter alguma razão. Mas diga-me lá, já que parece estar tão bem informado. A proposta de Lisboa é melhor?

— Não tenha dúvida que é. E, ironicamente, por causa do centralismo governamental que tem instalado tudo quanto é sede de poder económico e técnico à beira do Tejo. É lá que está o Infarmed e as principais empresas farmacêuticas nacionais e as delegações internacionais. Também é ali que existe  um forte cluster científico e tecnológico público e privado. Para além de possuirem a necessária e exigível oferta de ensino internacional, a todos os níveis, para os milhares de funcionários que acompanharão a deslocalização da Agência.

– Estamos mais uma vez penalizados. E desta vez, duplamente. 

– Tem toda a razão. Mas olhe que a necessária regionalização é muito mais do que isto. Mudar o que quer que seja, de Lisboa para o Porto, não encaixa, propriamente, no conceito que tenho de descentralização!

Combate ao Insucesso Escolar e Estratégia Europa 2020

O combate ao insucesso escolar enquadra-se num dos objetivos temáticos do Acordo de Parceria do Portugal 2020 que prevê investimentos na educação, na formação, nomeadamente profissional, nas competências e na aprendizagem ao longo da vida, na prioridade de investimento “redução e prevenção do abandono escolar precoce e estabelecimento de condições de igualdade no acesso à educação infantil, primária e secundária, incluindo percursos de aprendizagem formais e informais, para reintegração no ensino e formação”.

Em Portugal, na última década, a taxa de abandono escolar precoce na faixa etária dos 18 aos 24 anos reduziu significativamente, para 14% em 2016, valor ainda muito acima da média dos países da OCDE, pretendendo-se reduzir para 10% até ao ano de 2020. Reconhece-se tratar-se de uma caminhada exigente que requere maior esforço, por incidir em grupos socioeconómicos mais frágeis, envolvendo abordagens mais integradas e inovadoras por parte da comunidade educativa.

A Estratégia Europa 2020 visa o crescimento da economia, a criação de emprego e o combate à pobreza, apoia-se numa orientação para o crescimento inteligente, com uma economia mais apoiada no conhecimento e na inovação, o crescimento sustentável, com uma economia mais eficiente em termos de utilização de recursos e mais alinhada com a temática das alterações climáticas e da energia, o crescimento inclusivo com uma economia com níveis mais elevados de emprego, que assegure coesão económica, social e territorial.

Para a sua concretização foram definidos cinco objetivos: o reforço da investigação e inovação, clima e energia, aumentar o emprego, combater a pobreza e as desigualdades sociais e o de garantir “mais e melhor educação”, tendo sido fixados indicadores e metas para cada um dos objetivos que obrigam o conjunto dos Estados da União. Os Planos Integrados e Inovadores de Combate ao Insucesso Escolar (PIICIE) envolvem iniciativas que contribuem para o objetivo “mais e melhor educação”, essencial para que a Região Norte venha a alterar a trajetória de crescimento e de convergência, no contexto europeu e nacional, por forma a assegurar mais coesão e competitividade regional e contribuir para que a Região deixe de ser a de mais baixo PIB per capita em termos nacionais, uma das mais pobres no conjunto das 274 regiões da União Europeia.

Os PIICIE, estão alinhados com o crescimento inclusivo, uma aposta da União Europeia, por razões associadas ao emprego, ao facto de a mão-de-obra europeia estar a diminuir devido à evolução demográfica, aos elevados níveis de desemprego particularmente nos jovens, por razões ligadas às competências do mercado laboral face a uma aposta crescente nas tecnologias que exigem postos de trabalho altamente qualificados, num mercado de trabalho global, mais complexo e inovador e em constante mudança, também por razões de luta contra a pobreza, visto um quinto da população europeia viver na pobreza ou em risco de pobreza e cerca de 10% da população ativa não ganhar o suficiente para sair do limiar de pobreza.

A elaboração dos Planos de Combate ao Insucesso Escolar foi antecedida de um processo de planeamento prévio, que iniciou com a elaboração à escala de NUT III de Estratégias Integradas de Desenvolvimento Territorial, mediante convite de 12 de novembro de 2014, dirigido às Comunidades Intermunicipais e Área Metropolitana, processo de colaboração entre instituições públicas e privadas e os cidadãos, visando o foco das políticas de desenvolvimento ao nível sub-regional, a identificação de recursos e resultados esperados. Aprovadas as Estratégias, seguiu-se o lançamento de convite a 17 de março de 2015, dirigido às mesmas entidades intermunicipais, para elaboração dos Pactos para o Desenvolvimento e Coesão Territorial, com enfase na racionalização e qualidade dos serviços públicos coletivos, nas áreas do empreendedorismo, da inclusão, da educação, da saúde e da formação. A dotação financeira para o conjunto dos 8 Planos de Ação dos Pactos foi de 545 milhões de euros, sendo a dotação do PDCT da CIM Terras de Trás-os-Montes de 58 milhões de euros, valor que tem contratualmente associado um conjunto de indicadores de realização e de resultados. 

Os oito Planos Integrados e Inovadores de Combate ao Insucesso Escolar previstos para a Região Norte estão incluídos nos Pactos. Após aprovação dos Pactos deu-se início à preparação dos avisos para a candidatura dos oito Planos, que por sua vez deram origem a cerca de centena e meia de projetos cuja concretização assegura a execução dos referidos Planos de Combate ao Insucesso Escolar. Foi um processo de muita articulação envolvendo as CIM e AM, as Autoridades de Gestão do Programa Regional e do Capital Humano, da Estrutura de Missão para a Promoção do Sucesso Educativo e da Direção Geral de Educação, visando especialmente as elegibilidades dos projetos e complementaridade com as políticas transversais do Ministério da Educação. 

A elaboração dos Planos à escala intermunicipal resultou de um trabalho alargado de participação política e técnica, processo exigente que envolveu as Comunidades Intermunicipais e Área Metropolitana, em articulação com os municípios, os Agrupamentos de Escolas e Escolas não Agrupadas, as associações de Pais, Instituições de Ensino Superior, Ensino Profissional, Instituições de Saúde, de Segurança, entidades da Economia Social, Associações Empresariais, iniciativa que contou com apoio de outras entidades públicas com responsabilidade de execução dos programas a nível regional e nacional.

A abordagem inovadora dos Planos obrigou a confrontar experiências, orientações e projetos, no sentido de afirmar a complementaridade com os projetos e políticas transversais e específicas, caso dos Planos Estratégicos e de Ação elaborados pelas escolas, no âmbito do Plano Nacional para a Promoção do Sucesso Educativo e os que decorrem da execução dos 49 Planos designados de Territórios Educativos de Intervenção Prioritária, também financiados pelo Programa Operacional Regional com 44 milhões de euros. Ou seja, evitar sobreposições, encontrar a complementaridade e articulação entre os projetos que decorrem na sala de aula e os que podem ocorrer no contexto exterior à sala de aula em estreita articulação no âmbito dos projetos educativos.

O insucesso escolar tem diferentes dimensões, é um fenómeno que tem que ser tratado na escola, no contexto socioeconómico e sócio institucional, tendo por base o compromisso local ao nível da comunidade educativa e o foco das atividades colocado no grupo alvo das crianças e jovens em risco de abandono e insucesso escolar. Em Portugal, ao longo do percurso de 12 anos de escolaridade obrigatória, a percentagem de alunos com pelo menos uma retenção é de 35%, um valor elevado no quadro comparativo dos países da OCDE. A qualificação dos recursos humanos é uma ambição central da estratégia de todos os territórios, no sentido de dispor de mão-de-obra mais qualificada e produtiva, visando o crescimento e a competitividade da economia, a criação de riqueza e uma melhor retribuição do trabalho. Na concretização das políticas de combate ao insucesso escolar, o PO Norte 2020 está a disponibilizar 104 milhões de euros de ajudas da Comissão Europeia.

A territorialização das políticas como abordagem específica dos problemas sub-regionais, envolvendo as especificidades socio económicas, culturais e identitárias, assenta no princípio da subsidiariedade, proporciona respostas específicas aos problemas locais identificados como mais relevantes, no caso concreto o desafio é o de assegurar que uma maior percentagem de jovens irá concluir o 12.º ano, que o farão com melhor preparação para integrar o mercado de trabalho, prosseguir a formação profissional ou prosseguir estudos, com a garantia de principio de que uma formação profissional, adequada à procura do mercado de trabalho, lhes proporcionará uma melhor remuneração e condições base para progredir na carreira profissional. Através de mais e melhor educação, a região reforçará a coesão, contribuirá para reduzir desigualdades sociais económicas e territoriais, sabendo que o sucesso e a equidade são estrada e destino do Sistema Educativo.

O Plano de Combate ao Insucesso Escolar da CIM Terras de Trás-os-Montes, prevê um custo total elegível de 6,4 milhões de euros foi dotado com 5,4 milhões de euros de ajudas comunitárias. Tem como beneficiários a própria CIM, os municípios e como parceiros não beneficiários os Agrupamentos de Escolas e Escolas não Agrupadas e um vasto conjunto de entidades públicas, associativas e privadas da Região. Sabendo que o insucesso e retenção escolar em Trás-os-Montes é duplamente penalizador, para os jovens porque sacrifica o seu futuro, para a região reduz a sua capacidade produtiva e de atração de investimento, essencial para criar emprego, fixar jovens e criar riqueza. A atração de novos investimentos exige que da oferta competitiva do território conste uma maior qualificação da força laboral. Trata-se de uma exigência de compromisso político e de estratégia que tem de envolver toda a comunidade educativa. A execução do Plano Integrado de Combate ao Insucesso Escolar, com os seus 24 projetos deve ser uma oportunidade para ajudar a construir um futuro de maior esperança para os jovens que devem acreditar e assegurar o futuro de Trás-os-Montes.

Foi em Pedrógão. Grande de morrer.

O  fogo é um fenómeno tão natural nos países mediterrâneos que algumas espécies, na sua evolução ao longo dos tempos, criaram mecanismos de defesa para fazer face a essa ocorrência cíclica. É o caso do sobreiro que apresenta uma casca com protecção térmica, a cortiça. E a maior mancha do mundo de sobreiro é em Portugal.

Portugal é, manifestamente, um país de incêndios. Temos de saber lidar com eles minimizando-lhes as consequências. Não podemos, de forma alguma, é deixar que um fenómeno natural passe a ter estatuto de catástrofe nacional. O que se passou em Pedrógão foi mau demais.

Muito se tem escrito sobre incêndios nestes últimos dias. Desde a forma de os evitar até à maneira de os não deixar propagar, passando pelas espécies florestais, pelo ordenamento, pelos aceiros, pelas cargas térmicas, pelos meios de combate, etc deixam o tema verdadeiramente escalpelizado. Mas, salvo algumas excepções, não me parecem artigos intelectualmente honestos. Quase todos fazem um tratamento do tema de forma interesseira, puxando a “brasa à sardinha”, egocentrista quando não corporativa. E a Floresta que se lixe.

Por exemplo: – os ecologistas e Sousa Tavares aproveitaram a oportunidade para diabolizar o eucalipto. Que tem uma elevada carga térmica, que seca os aquíferos subterrâneos, que as grandes manchas diminuem a biodiversidade são algumas das acusações. Como é que nunca se lembraram que as manchas de pinheiro eram desfavoráveis à biodiversidade é que não se entende, assim como não se entende o pouco incómodo que as cargas térmicas do pinheiro ou até dos matos autóctones lhes provocam. Quanto aos aquíferos gostava de saber se alguma vez foram monitorizados para conhecer o grau de quebra do aquífero por efeito do plantio de eucalipto. E há mais de 40 anos que falam disto!

Jerónimo de Sousa achou que a desmatação seria a panaceia para este mal e que além disso criava emprego. Fica-lhe bem esta tentativa de criação de postos de trabalho, mas as imagens “pedagógicas” que as televisões nos deram mostram que a desmatação não resolve nada em termos de controlo do incêndio. Vimos as línguas de fogo saltar de copa em copa fazendo ignições a dezenas de metros sem precisar da contribuição do mato rasteiro. Além disso a desmatação tornaria a mata um negócio ruinoso pois as receitas da mata não chegariam para pagar a desmatação.

Jaime Marta Soares, o eterno bombeiro, aponta como solução para o flagelo, o reforço de meios humanos e materiais, que é o mesmo que dizer reforço de verbas. Fica mal vindo de quem vem. Todos estamos fartos de ver incêndios em matas de países ricos onde os meios clássicos de combate (haverá outros?) não surtem qualquer efeito. Talvez que o exemplo mais emblemático disso sejam os incêndios em Beverly Hills, na Califórnia Americana, onde todos os anos as mansões multimilionárias ardem tão bem como os palheiros de Pedrógão perante a impotência dos diversos corpos de bombeiros. E não é por falta de meios sejam eles materiais ou humanos. O que se percebe é que o ataque não passa por aí.

Torres Pereira, homem ligado à autarquia de Sousel e à caça, aponta o acto venatório como um precioso ajudante no combate aos incêndios. Diz até:” por mais bombeiros que combatam esporadicamente os incêndios, eles nunca substituirão as pessoas que mantêm com a floresta e com a natureza uma relação próxima e permanente e, no caso das pessoas que caçam, baseada no respeito cúmplice e num legitimo interesse reciproco”.

Pois bem enganado andava eu. Ou não é verdade que os caçadores ao verem os seus congéneres das Associativas caçar dentro e fora das Associativas enquanto eles só podiam caçar fora delas, isso lhes causava tensões, crispações, invejas, cujo desabafo esteve muitas vezes numa caixa de fósforos? E quantas vezes, caçadores confrontados com um silvedo inexpugnável, onde o cão não entra e o coelho não sai, não fizeram da caixa de fósforos o furão da circunstância?

Outros que já não sei precisar entendem que sem o cadastro do território não é possível ter bons resultados no combate aos incêndios.

Outros ainda acusam a floresta de criar o seu próprio problema. Assim: a floresta cria a desertificação e esta por sua vez traz a falta de limpeza, de vigilância, de controlo. Parece-me que a desertificação não terá muito a ver com a floresta pois Bragança não precisou dela para se desertificar.

Passos Coelho, Marques Mendes e outros usam os incêndios como arma de arremesso político contra os seus adversários. Marques Mendes fez, até, um paradoxo irresistível. Diz não querer uma caça às bruxas mas não entende como não há demissões. (mais explicito não podia ser). Passos Coelho advertiu para não se usar a catástrofe de Pedrógão de forma “politiqueira” e de repente surge com uns suicídios na manga. Nunca se tinha visto e nem é bom lembrar. Estava na altura muito bem assessorado pela Dr.ª Teresa Morais fazendo lembrar a dupla Donald Trump e Kellyane Conway quando esta, apanhada em vergonhosa mentira, reagiu dizendo que não era mentira mas sim “factos alternativos”.

Os autarcas questionam agora a distribuição das verbas destinadas a ressarcir as vítimas do incêndio. E perante isto tudo pergunta-se: onde fica a mata? Por este andar Pedrógão é em qualquer sítio. E isso não pode voltar a acontecer.

A fileira florestal portuguesa oferece muito posto de trabalho e muitos milhares de milhões de euros. Talvez não seja a floresta ideal mas agora é imperioso defendê-la. (não me digam que a alternativa ao pinheiro e ao eucalipto é a carvalheira da Serra de Nogueira que há 60 anos só lhe vejo dar “bulharacos”).

Ora o fogo na mata com vento favorável é praticamente inatacável e arde enquanto ele quer. Por outro lado a limpeza da mata tem custos incomportáveis além de não garantir imunidade ao fogo. Assim, penso que uma forma de minimizar as consequências do incêndio será compartimentá-lo. Áreas de mata separadas umas das outras por aceiros de dimensão estudada, bordejadas por barreiras de árvores de folha caduca e estas num chão limpo de matos rasteiros. Assim se dificultaria a propagação quer pelas copas quer pelo chão. As árvores verdes não ardem bem e um chão limpo arde com pouca carga térmica. Criava-se assim uma faixa onde o fogo esmoreceria e se tornaria combatível. O que importa é conseguir estancá-lo dentro dos limites pré-estabelecidos. E na zona de mata, todas as estradas com alguma importância rodoviária teriam o tratamento de aceiros. Ladeadas por uma banda desmatada e as primeiras árvores a ver-se seriam obrigatoriamente de folha caduca de forma a nunca por em risco o trânsito e tornar quase impossível a passagem do fogo para o outro lado da estrada. (Hoje quaisquer dois garotos do DAESH com uma caixa de fósforos podem imobilizar o país por bloqueamento da A1). Apostar forte na detecção precoce do incêndio na perspectiva de o atacar em tempo útil. Depois é aplicar a técnica australiana. Deixá-lo arder.

Em relação aos perímetros urbanos fomos mais relapsos do que é admissível. Que é que aprendemos com o incêndio do Funchal? Nada. E parecia relativamente simples retirar a mata de dentro dos povoados, fazer a desmatação de todos os incultos dentro do perímetro urbano e se necessário colocar um sistema de rega periférico. Que não seja ainda tarde.

 

P.S. O incendio de Pedrógão teve dois epifenómenos que me deixaram perplexo.

O 1.º foi ver Judite de Sousa ao lado de um cadáver queimado como se de um troféu de caça se tratasse. E para ela foi. Custa a entender mas eu nego-me a perceber.

O 2.º foi ver o Chefe dos Bombeiros Marta Soares questionar a tese avançada pela Policia Judiciária de que o incêndio teria tido origem num raio. É evidente que a Judiciária avançou com essa explicação com o objetivo de aliviar a tensão, de esvaziar sentimentos de vingança, não porque acreditasse nela. Tanto morto junto cria um estado de crispação tal que uma palavra mal medida pode levar a um linchamento sumário. Foi isso que a Judiciária quis e conseguiu. Sem prejuízo da investigação. Marta Soares ao dizer que havia ali mão assassina, que pretendeu? Acirrar os ânimos?

Escrever para o boneco

Ter, 11/07/2017 - 10:45


A lendária história de António, o santo de Lisboa, a falar aos peixes, na sequência das orelhas moucas dos homens, já inspirou milhentas reflexões, mas continua a constituir um bom ponto de partida para falar da sina deste humilde editorialista.