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NÓS TRASMONTANOS, SEFARDITAS E MARRANOS - Vasco Fernandes, o Pataranha (n. Vila Flor, c. 1485)

Domingo de Páscoa de 1497 aconteceu em Portugal o mais terrível ato de religiocídio. Com efeito, por ordem do rei D. Manuel, as crianças judias foram tiradas aos pais e entregues a famílias cristãs que as levaram às igrejas a batizar e com elas ficaram para as educar. Não cabe aqui descrever as violências dos carrascos, os gritos dos inocentes e os clamores desesperados dos pais. Bispos como D. Fernando Coutinho ou D. Jerónimo Osório condenaram vivamente o ato e declaram-se pela nulidade do batismo forçado.
Vasco Fernandes foi uma das crianças assim batizadas em Vila Flor. Tinha 12 anos “quando tomaram os meninos” aos judeus e o levaram à igreja de S. Bartolomeu, como ele contaria mais tarde. E não foi o único dos irmãos a ser levado à pia batismal. A irmã Violante, 7 anos mais nova, dirá também que não sabia o seu nome de judia “porque era muito pequena quando a levaram de casa de uma ama a batizar”. (1) E certamente levaram os outros irmãos, como levariam todas as crianças judias.
Também não sabemos se o pai de Vasco e Violante era cristão ou judeu e se foi igualmente “obrigado” a receber o batismo e um nome cristão. Sabemos que se chamava Vasco Fernandes, como o filho, que era mercador e que veio a falecer na década de 1540. A mãe é que não foi batizada pois faleceu judia, no tempo em que ainda havia judeus em Portugal. E porque os nomes judeus também foram proibidos, ela ficaria anónima para sempre. Nem sequer podemos recordar o seu nome e resgatar a sua lembrança! 
Não fica muito claro qual seria a profissão de Vasco Fernandes. Ele apresentava-se como lavrador mas um seu denunciante afirmou que ele “ganhava a vida com uma besta”. Era natural e morador em Vila Flor, terra onde casou com Filipa Rodrigues. O casal teria pelo menos 3 filhos: António, Isabel e Inês, aquele ainda solteiro e estas casadas, quando o Pataranha foi preso, em Maio de 1558, contando para cima de 70 anos.
Apenas uma denúncia serviu de base à prisão de Vasco Fernandes. Foi feita por Álvaro Rodrigues, o Lamegão, dizendo que ele guardava os sábados como dias de descanso semanal e não os domingos, vestindo naqueles dias camisas lavadas.
Conduzido à inquisição de Lisboa foi metido em uma cela que estava por baixo da que era ocupada por um António de Gouveia, cristão-velho, clérigo de missa e curandeiro, natural dos Açores e que viajara por Espanha, Itália, Alemanha e Brasil e fora preso por superstição e feitiçaria. (2) Obviamente que se insinuava como “judeu” para conquistar a confiança dos companheiros “judeus”. E assim terá arrancado a Vasco Fernandes declarações muito comprometedoras que depois foi contar aos inquisidores. E estas foram culpas acrescentadas ao Pataranha. Vejamos o seu teor:
Que Jesus Cristo não era o Messias e que este ainda não tinha vindo, que viria entre 1560 e 1570. E antes, Roma seria destruída pela terceira vez. E que em Lisboa ouviram os de Vila Flor dizer que “vinham 100 mil judeus pelo mar, das 10 tribos que estavam escondidas, para destruir Portugal, porque andavam cá com esta inquisição”. (3)
Que ele acreditava nisso e “que tinha isso tão metido na cabeça que lho não tirariam com marras nem com picões” e que em Vila Flor havia 70 ou 80 casais que pensavam como ele e como ele esperavam a vinda do Messias.
Que louvava o inglês que, diante do rei, tirou a hóstia das mãos do padre que rezava a missa e a desfez em pedaços e atirou ao chão, acrescentando que “aquilo lhe parecia bom sinal que Deus dera uma bofetada a El-Rey”. (4)
Que ele, a mulher e os filhos guardavam o sábado como dia santo e que, em Vila Flor, ele ia a casa de João Rodrigues, que era casado com uma sobrinha sua, a ouvir ler a Bíblia, uma bíblia que trouxera de Salamanca.
Aliás, do processo (5) de Vasco Fernandes ressalta uma forte ligação entre estes dois homens. E tendo o João Rodrigues sido preso um ano antes, (6) é significativo que Vasco tenha mudado a residência para Castro Vicente, distante mais de 6 léguas de Vila Flor.
Significativo também Vasco Fernandes começou por se declarar inocente, suspeitando que fora preso por denúncias falsas, feitas por João Rodrigues, em ato de vingança. Explicou que devendo dinheiro a João, foi a sua casa para lhe pagar. E então o viu com um livro na mão, que era uma bíblia e que, lendo-lhe uma passagem, o quis doutrinar e convencer que o Messias ainda não tinha vindo e que devia guardar-se o sábado e não o domingo como dia de descanso semanal. E não aceitando ele tal doutrina, antes se afirmando cristão, o outro “o nomeou com injúrias chamando-lhe velho, ruim e velho falso (…) e o dito João Rodrigues pôs as mãos nas barbas ameaçando-o que lho havia de pagar”.
A explicação até poderia ter alguma lógica mas os inquisidores estavam já informados pelo malsim do António Gouveia que Vasco iria fazer uma confissão nesse sentido, acusando apenas o João Rodrigues.
Outras explicações buscaria, na tentativa inglória de convencer os inquisidores da sua inocência. Como a de um João Pires, de Roios, que lhe contara sobre uma grande seca que houvera anos atrás em Vila Flor. E fizeram os cristãos muitas rezas e procissões pelas igrejas e capelas da vila pedindo a Deus que mandasse a chuva, mas nada conseguiram. E então disseram aos judeus que rogassem por água ao seu Deus. E os judeus foram para os campos a pedir água e, à noite, quando regressaram à vila, choveu em abundância. E concluindo o outro a sua narrativa, Vasco Fernandes lhe dissera: - Boa lei é a nossa, João Pires!
Obviamente que desta ingénua confissão de judaísmo, pedia agora desculpa. Tal como pedia desculpa de ter proferido uma praga ofensiva de Deus quando lhe mataram um filho e ele desabafou: - Não haverá Deus nos céus que me vingue deste cabrão que me matou meu filho?!
Das acusações já atrás se disse e não foi muito difícil ao defensor contestar a denúncia do Lamegão, a única que precedeu a sua prisão. Quanto às denúncias do espia do padre Gouveia, o procurador argumentou que não mereciam qualquer crédito. E nisso teve alguma ajuda do alcaide dos cárceres, Brício de Camelo. Com efeito, o Gouveia disse que quando o Vasco Fernandes lhe falara todas as coisas atrás referidas, estava junto dele o alcaide. Este, chamado a depor, prestou o seguinte testemunho, algo comprometedor para o réu:
- Disse que haveria 25 dias, estando uma noite falando o dito António Gouveia com o referido Vasco Fernandes (…) que estava numa casa em baixo do corredor novo, e falavam um com o outro na vinda do Messias e que o réu Vasco Fernandes falou algumas palavras em que dava a entender que o Messias não era vindo e não lhe lembra a forma delas, somente falaram em que Roma se havia de perder e outras palavras que não está lembrado. E ele declarante disse a António Gouveia que perguntasse a Vasco Fernandes os fundamentos em que se baseava para dizer que o messias não era vindo e que lhe respondeu que o tinha tão metido na cabeça que não lhe tirariam a ideia nem com marras nem com picões e que se calasse e não falasse naquelas coisas.
Ao cabo de mais de um ano de prisão, o defensor pedia a absolvição do réu, dizendo “que a sua prisão, trabalho e velhice lhe devia bastar” para castigo das leves culpas que poderia ter. Foi o processo analisado em mesa e pareceu à maioria dos votos que o réu fosse levado a tormento. Na casa do tormento foi levantado duas vezes e ele repetindo apenas que nada tinha a confessar. Acabou condenado a cárcere e hábito a arbítrio. No texto da sentença diz-se que a condenação não é maior por se “haver respeito à qualidade e defeito da dita prova”. A sentença foi lida no auto da fé realizado na Ribeira de Lisboa em 24 de Setembro de 1559 onde abjurou “de vehementi”.

NOTAS e BIBLIOGRAFIA:
1-ANTT, inq. Évora, pº 9678, de Violante Fernandes, presa em Janeiro de 1546, viúva de Diogo Pires. Entre outras coisas, Violante foi acusada de comemorar a Páscoa cozinhando pão ázimo para comer com alfaces montesinhas e de rezar o Shemá Israel e a oração de Baruch.
2-ANTT, inq. Lisboa pº 5158, de António Gouveia.
3-MARCOCCI, Giuseppe; PAIVA, José Pedro – História da Inquisição Portuguesa, p. 63: - A partir do início da década de 60, a atenção do Tribunal dirigiu-se para o círculo de cristãos-novos que se reuniam em pequenos grupos, na Ribeira de Lisboa, para conversar do tempo do advento da “lei de Moisés” (…) Papel de relevo tinham os anciãos de origem castelhana, que transmitiam a memória da religião dos antepassados, sabiam falar e ler hebraico e possuíam profecias em antigos pergaminhos…
4-IDEM, pº 591, de Guilherme Cardinall. A cena teve lugar em 11.12.1552, na capela do Paço Real, estando presentes o rei D. João III e a rainha D. Catarina. Cardinall foi preso, acusado de luteranismo e queimado na fogueira.
5- IDEM, pº 7078, de Vasco Fernandes.
6-IDEM, pº 12463, de João Rodrigues.
 

Cronicando - CHEGOU A HORA

Que as artes e as letras florescem em tempos de paz, já há muito se diz. Como estas duas áreas se associam à educação, é óbvio que, por arrastamento, também esta se desenvolve quando estão reunidas as condições de estabilidade social e forças opostas se confrontam tão-somente no plano ideológico e através de meras palavras inerentes à construção e ao fortalecimento da própria democracia.

Num tempo de paz duradoura, esperar-se-ia assistir ao apogeu das manifestações artísticas e que a educação formal tivesse progredido para patamares que colocasse os portugueses ao nível dos melhores da Europa. Aqui, é a própria educação que parece o campo onde se faz a guerra. Se as lutas estudantis dos anos 60 foram determinantes na construção de um pensamento e na mobilização para o que iria acontecer em 74, na verdade, é que quem deteve o poder a seguir, não conseguindo distanciar-se desse pensamento, continuou a fazer da educação em sentido lato, a bandeira de uma luta legítima, porque necessária, para arejar ideias, alargar conhecimentos e iniciar uma senda de verdadeira liberdade intelectual.

O problema terá surgido uma década depois, quando questões anteriores continuaram mal resolvidas e se quis repensar a educação formal e a função da escola, num momento em que a democratização do ensino dava efetivamente os primeiros passos e a definição dos currículos era um campo onde se confrontavam ideologias e se pretendia marcar território. A sociologia da educação ensina que não há currículos neutros. No entanto, tal princípio jamais legitimará qualquer força partidária a agir neste domínio como têm atuado desde a revolução de abril. Ao estaticismo sucedeu a avalanche de reformas, esquecendo os decisores a lei fundamental do Estado Português que, nos seus artigos 43º, 74º e 77º, salvaguarda a neutralidade do currículo e o direito universal à educação, incidindo no direito que professores e alunos têm em participar na gestão democrática das escolas. A lei orgânica foi-se alterando até que culminou na restauração da figura do diretor com poderes reduzidos face à anterior. Recentemente, um cidadão que fez carreira no ensino, recordava que, incumbido de abrir uma escola, a ele era assacada a responsabilidade de cumprir e fazer cumprir as leis e as regras disciplinares. Quando algum aluno as infringia, era levado ao seu gabinete e a receita era chamar os pais e perguntar se preferiam uns dias de suspensão para o filho – que ficava em casa  - ou uns tabefes aplicados no momento. Segundo ele, todos optavam pela segunda hipótese. Não se falava em indisciplina, nem em bullying e a classe docente não era aquela que apresentava mais índices de depressão.

Hoje, apregoa-se o sucesso e todos são orientados para trabalhar em prol do mesmo sem sequer se definir o que é o sucesso escolar. Pior do que isso, é que não se permite, sequer, que cada unidade orgânica defina o seu padrão de sucesso, embora se lhe exijam políticas diferenciadas, quer na sala de aula, quer na organização. O culminar de tudo isto, é ainda a implementação de novos programas sem ter ainda havido tempo de avaliar os antigos, como é o panorama atual que irá colocar na mesma sala, lado a lado, alunos a realizar a mesma prova, salvo o erro a matemática (ensino secundário), tendo uns estudado pelo antigo e outros pelo novo. E como se resolve? -irão avaliar-se apenas os conteúdos comuns.

A suposta “revolução” ainda não acabou, o novo modelo da municipalização já mexe nas comunidades intermunicipais e lentamente vai fazendo caminho, pelo que em breve as escolas serão ainda mais coloridas na justa medida da paleta que governa o território. Lamenta-se que ainda não tenham percebido que a verdadeira mudança para o sucesso implica uma alteração na percepção do indivíduo no seu papel de aluno. Na verdade, a educação de hoje integra e desenvolve ou reproduz e silencia?    

DOS DRONES, DOS BASBAQUES E DO FUTURO

Um dia destes fui surpreendido com uma notícia em que o repórter, de queixo no ar e boca escancarada de espanto, deu a boa nova:
A Santa Casa da Misericórdia de já não sei onde, recorrendo às salvíficas novas tecnologias, mandou construir um drone para levar o almoço ao único morador que ainda habita uma dessas perdidas aldeias do Portugal profundo, evitando assim a grande maçada de enviar todos os dias alguém num jipe com a comidinha.
Não informou o dito repórter quanto custou a engenhosa caranguejola, mas a avaliar pelo preço que anda associado às novas tecnologias, a verba não teria sido de menosprezar. No entanto, o que mais me espantou, foi o aplauso acrítico, amorfo e provinciano, de gente que tem o dever de informar, olhando os factos de todos os ângulos possíveis, bem como a passividade de todos quantos escutaram tão grande maravilha. Ou será que já não há cidadãos em Portugal?
Tão triste e chocado me deixou a notícia que só agora consigo reagir e escrever estas linhas sem sentido.
Se é verdade que o homem é um animal social, e quando abandonado numa ilha, ou se torna um deus ou uma besta, no dizer do velho Aristóteles, não nos resta senão ver por antecipação o filme.
Os irmãos da Santa Casa de não sei onde, deram um duro golpe no solitário cidadão, retirando-lhe o único momento do dia em que podia ver e falar com gente. E com que ansiedade esperaria por esses breves momentos dos seus longos dias!
Consumada a obra, agora o que se segue? O caminho não poderá ser outro que o da bestialização, da morte de solidão e de tristeza, como os psicólogos já mostraram à saciedade.
    Vá irmãos da Santa Casa de não sei onde, não hesitem, levem até às últimas consequências a vossa inspirada congeminação: mandem instalar uma câmara no dito drone para registar passo a passo o fim a que condenaram o infeliz cidadão! E já agora, para rentabilizar o investimento, ponham à venda as imagens desse fascinante reality show que as televisões depressa vo-las comprarão.
Não sei o que será o futuro, mas se o futuro é como o desse infeliz, não o quero. E para poder escapar legalmente a uma morte como essa, vil e inumana, caríssimos parlamentares, por favor  apressem-se a legalizar em Portugal a eutanásia.
Sobre a inqualificável façanha Não vos consigo dizer mais nada. No entanto, deixem-me perguntar ainda a quem de direito, se com essas verbas não teria sido possível construir nessa aldeia uma instância de férias, uma  casa para famílias de refugiados, um hotel da juventude, uma empresa de apicultura, ou uma outra qualquer atividade económica que vá no sentido do repovoamento do Portugal rural que tão urgente se afigura ?

FALTA A OUTRA METADE

O Nordeste tem geografia, tem história, tem impante património imaterial e material, tem gastronomia, tem, tem tudo se me é permitido tentar fazer graça lembrando o comércio do Senhor «tem tudo», o qual acabou por nada ter. A velha urbe bragançana tem grandes activos dizem os entendidos, dizemos nós bragançanos aos vizinhos e aos forasteiros, no entanto, se meditarmos entre o Ser e o Ter, basta lermos os editoriais do director do Nordeste para percebemos que falta a outra metade.
Acerca do Ser e do Ter relativamente à real/realidade Nordestina não vou agrafar palavras melancólicas ou vibrantes, seria redundante, repetitivo, debotado. Nós somos, dizemos que temos (e temos), porém a violenta quebra demográfica produziu e produz enorme passivo político a suscitar o riso cínico dos contabilistas dos votos pois valemos três deputados. Valem três deputados! Só? Então valem muito pouco…
Os decisores políticos do centrão comentam entre eles os queixumes das gentes do Nordeste e interrogam: então porque se queixam desta maneira se só elegem três deputados? Elas têm a ciência da certeza de possuírem as resoluções eficazes para os problemas existentes?
E, no meu parecer chegamos ao âmago da questão. Nós temos princípios pessoais pelos quais afirmamos a identidade e o território, isto é, que o Nordeste tem de receber forte desenvolvimento atingindo o grau de fixação e atracção de mulheres e homens em idade de ambicionarem construir mundos no Mundo. Mas como?
Os estudos de prospectiva não devem servir apenas como ornamento recitativo nas comunicações, a sua utilidade está no fornecer elementos de análise das incertezas críticas relativamente ao futuro no pressuposto de os decisores dela saberem retirar proveitos intensivos e extensivos às populações.
Estamos em ano de eleições autárquicas, não quero comentar as torções à coerência na preparação das listas, prefiro convidar os leitores a pensarem qual vai ser o seu papel no próximo prélio eleitoral. Vai ser o de papel de embrulho? Vão deixar-se embrulhar nas serapilheiras? Vão servir de laçarote?
Esta crónica está recheada, repleta de interrogações. Não é preciso beber-se água cristalina para o leitor entender quanta perplexidade carrego no tocante ao plano de trabalhos a conceber de molde a conseguir-se conceber a tal metade em falta. O Gôngora poderia apreciar o invólucro, nos tempos de hoje só apreciamos fórmulas tempestivas de rápido entendimento e persuasivas de exequíveis sem demoras e custos fora da especulação.
As interrogações defendem os decisores e defendem-me, a errância também nelas se escora. Outros articulistas (cf. Jorge Nunes e Manuel Vaz Pires) cada qual à sua maneira têm gasto tempo a pensar a cauda das negatividades que nos afligem, os artigos publicados trazendo à correnteza dos dias gente talentosa obrigada a exilar-se dado defender e às escondidas praticar a religião mosaica, se não contém a essência do problema ajudam a intuir quão urgente é estabelecerem-se prioridades no aproveitarmos a onda de desconfiança caída sobre instituições e elites políticas e financeiras para soltarmos não o grito de Ipiranga, sim o da afirmação inteligente recorrendo a capitais próprios (inteligência e vontade) independentemente dos desejos partidários e/ou de ocasião.
O sagaz Gato das Botas quando dedica tempo a ler alguns escritos da minha autoria meneia a cabeça e vai miando a chamar-me lírico, acredito na possibilidade de vários leitores secundarem o sagaz felino, respeito o epíteto, isso não significa acordo, muito menos resignação. Não detenho virtudes declamatórias, muito menos no deserto, continuarei a de vez em quando clamar contra a nossa inércia no que tange a esmigalhar os pedregulhos impeditivos do progresso dos nossos terrunhos numa lógica de racionalidade vinculada à fruição de uma existência normal, isto é: harmónica, onde cada qual possa usufruir a felicidade por ele pensada e conseguida. Obviamente, dentro do normativo da sã convivência e respeito pelos outros.
Será assim tão difícil? Se quisermos não é. Será que queremos? E, as interrogações continuam. Outros me precederam no interrogar sobre a causa das coisas. Muitos pagaram duramente a irreverência. Vivemos noutra época (Vade retro…), as indagações que formulo só apaziguam o autor e estão longe de suscitar quebras de sono aos detentores do poder, para meu pesar. O tom sombrio desta crónica procura apaziguar os meus receios ante o rodar do tempo. O tempo, esse grande escultor, escreveu Yourcenar.

Corações ao Alto

Muito boas tardes, bons olhos vos vejam minha estimada gente. Ora deixem-me lá sentar um pouco aqui junto a vós neste banco de pedra. Deixem-se estar que cabemos todos. Ah, que bem que se está aqui. Março, marçagão, tardes soalheiras à espreita, já começam a saber bem as sombras. Pois é… E então como vai a vida? Já se vêem as andorinhas? Sim senhor… Por falar nisso diz que “quem em Março asserenou tarde acordou, mas quem asserenou bem se achou”. Asserenar, fazer serão, pois claro. As noites a ficar mais compridas e o chupão a pedir menos lenha. Não tarda vêm os Ramos e depois a Páscoa. A Quaresma, e pensar que houve um tempo em que durante estes dias não se comia carne à sexta-feira e que quem pagasse a bula ficava livre de tais comprometimentos. O padre a fazer de cobrador (de almas) e a igreja a cumprir o “venha a nós o vosso” (reino). O Ministério da fé e dos negócios (de Deus) não deixava contas por acertar, não havia mar que não se abrisse nem montanha que não se demovesse para quem tivesse o espírito recheado (de bondade). Expliquem estas e outras coisas aos miúdos de agora. Não era ser-se religioso, era ser-se resignado, submisso, submisso da falta de tudo, tudo o que permite aos homens terem o mínimo para poderem sequer conseguir pensar em reflectir sobre o que os rodeia. E quem tinha um olhito, facilmente coroado rei entre miseráveis. Corações ao alto que deixámos de ser assim – e o mais incrível no espaço de uma só geração - viver a religião, mas com um mínimo de discernimento, de consideração. Mudámos, entrámos na Europa, fizemo-nos país desenvolvido. Não tenham medo das palavras. Falarei disso numa próxima. Olhar para o mundo numa perspectiva global. País desenvolvido, do primeiríssimo mundo. Não o deixamos de ser por insistirem em nos colar o autocolante amarelo no vidro como se fossem agentes das empresas municipais de estacionamento: “Roda bloqueada e venha o reboque retirar este veículo da segunda fila da economia mundial: aqui está a factura, vai desejar com ou sem contribuinte?”. Não o deixamos de ser. Não é porque devêssemos ter mais centros de saúde abertos ou porque o médico não vem tanta vezes como gostaríamos, é porque temos liberdade e capacidade para o exigir e é sobretudo, porque há 50 anos nesses mesmos lugares crianças nasciam sem sequer saber o que eram cuidados de saúde e crianças morriam como não se morria em lugar nenhum do mundo. Caso de estudo a nossa redução da taxa de mortalidade infantil. Falem destes avanços aos jovens. Não é por termos escolas a fechar, onde para todos os efeitos há pouca gente, é por termos boa, diversificada e acessível educação. É por termos pessoas licenciadas a tratar dos nossos filhos nos jardins de infância. Trabalhei com público adulto e é surpreendente, chocante, bárbaro, a quantidade de gente neste país que deixou a escola por só dela receberem rispidez. Não era rispidez, era violência, porrada, da grossa nalguns casos. É atroz a imagem que tanta gente neste país guarda da escola. Aspereza em casa, toma crueldade na escola para aprenderes. Estamos a falar de crianças, crianças. E isto até há um par de décadas. Duas coisas: Primeiro, há que reconhecer o esforço e o mérito de uma geração que passou por tudo isto, que sofreu, que penou, que viu a sociedade mudar e mudou com ela, que começou lá muito em baixo e deu a volta por cima. Segundo, isto tem de ser partilhado com a juventude. É a nossa história, havia gente dentro disso, vidas, gerações de pessoas. Famílias, escolas, entidades: investiguem, partilhem, interajam, transmitam. É assim que se aprende a dar valor ao que se tem, sem darmos o que termos por garantido. É assim que se aprende a dar valor ao que os nossos pais nos conseguiram dar, sem descurar que o conseguiram à custa de muito suor e trabalho. É assim que se aprende de onde vimos e a defender o que somos, sem nunca esquecer que amanhã tudo pode mudar. É assim que se aprende a querer ir mais longe, para podermos estar mais preparados e dar o melhor de nós ao mundo onde vivemos. Pensem nisso. Bem, minha gente agora se me dão licença vou indo que “moinho parado não mói farinha”. Obrigado por este bocado. Boas tardes e até amanhã!

Vendavais - O diz que nunca disse

Somos o povo que somos e não é por ser assim que vamos mudar a nossa maneira de estar e de dizer as coisas que nos vêm à cabeça. De facto, é frequente dar o dito por não dito, embora isso não abone a credibilidade seja de quem for. Nós sabemos que somos assim, mas não mudamos. E não mudamos porquê? Porque simplesmente ninguém exige explicações sobre o que, no fundo, são puras mentiras ou falsas promessas.

Vem isto a propósito do que o governo disse e disso fez eco, sobre as reformas a levar a cabo na Educação a partir do próximo ano letivo. Todos ouvimos, lemos e comentámos a “decisão” do Ministério da Educação sobre grandes alterações em diferentes áreas disciplinares dando como exemplo as disciplinas de Português e Matemática que seriam objeto de redução de algumas horas para beneficiar disciplinas como História ou Geografia que necessitariam de uma nova redistribuição de horas. Durante dias e dias a fio o discurso manteve-se, embora não especificasse concretamente se seriam as disciplinas de Português e Matemática as que seriam sacrificadas e se a História e a Geografia as beneficiadas, deixando contudo, essa possibilidade em aberto já que se discutia a matriz e a operacionalização do perfil do aluno. Neste aspeto, teriam de se valorizar sempre as áreas curriculares e visto por essa óptica, faria todo o sentido essa distribuição de horas para novas disciplinas.

Pois passados alguns dias e durante o mês de Fevereiro, o Ministério da Educação veio dizer que nunca esteve equacionada qualquer redução da carga horária das disciplinas de Português e Matemática, reforçando que nunca o tinha afirmado. Sinceramente! Está tudo louco?

Como se isto não tivesse grande importância, mas querendo firmar os pés antes de poder cair, o Ministérios fez questão de voltar a afirmar que essas disciplinas não iriam sofrer qualquer redução horária. Deste modo passava uma esponja nas afirmações proferidas e alinhava em outra direção, deixando, mesmo assim, algumas dúvidas no ar especialmente no que se refere à disciplina ou tema, ou área da famosa Cidadania que não têm professores e que terão de se recrutar para o efeito. Caberá aqui os tais 25% da carga curricular que o Ministério adiantou e que as escolas poderiam gerir dentro da tal autonomia que nunca chegou?

Segundo parece, o Ministério tem vindo a contactar e a reunir com algumas escolas e associações de professores, diretores de escolas e outras identidades ligadas à educação, no sentido de aquilatar as melhores soluções a implementar, sem no entanto adiantar seja o que for que descubra o que agora está no segredo do governo. Afinal, parece que tinham começado pelo fim! As casas não se começam pelo telhado!

Resta agora perceber quando é que todo este processo estará resolvido e quando poderá ser implementado nas escolas e quais as escolas “cobaias” que o irão experimentar. Mas será que podemos contar com essa certeza? Sim, porque isso não foi desmentido pelo governo. É verdade que disse coisas que agora negou, mas também há coisas que nunca veio dizer que nunca disse e que nunca se iriam implementar. Já estamos fartos do diz que disse…, mas não disse.

Uma coisa é certa: antes de estar concluído todo o processo com as estratégias de implementação adequadas, ou não, nada vai ser divulgado e ainda bem, pois ninguém quer ser embalado em camas de sonho e acordar em esteias de arame. Haja responsabilidade no que se faz, mas também nos caberá a nós que somos os lesados ou beneficiados, uma quota de responsabilidade, pois teremos sempre de julgar os que nos impõem as suas decisões seja em que campo de análise for.

O que se pede é uma grande dose de responsabilidade por parte do governo e dos seus Ministérios e como não estamos em campanha, que parem de adiantar supostas decisões que afinal não o são, mas que dão falsas esperanças de resolver o que necessita de ser resolvido. Nem resolvem nem dão certezas de o fazer e no que se refere à Educação, é bom que se pare de experimentar reformas que também o não são e que só trazem confusão. São já anos e anos seguidos, governos e governos uns atrás dos outros a fazer experiências na Educação e o que temos visto não passa mesmo de experiências falhadas. E não venham dizer que já o tinham dito!

Atenção aos medicamentos para acidez do estômago

Chamam-se inibidores de bombas de protões (IBP) os medicamentos que reduzem a acidez produzida pelo estômago. Contém substâncias como omeprazol, lansoprazol, pantoprazol, rabeprazol, dezlansoprazol e esomeprazol.
Estes medicamentos podem ser usados em diversas situações clínicas, como por exemplo o tratamento de curto prazo dos sintomas de refluxo em adultos. O refluxo consiste na subida do ácido do estômago para a garganta, o que pode causar uma sensação de queimadura dolorosa no peito (azia) e um sabor amargo na boca (regurgitação ácida).