class="html not-front not-logged-in one-sidebar sidebar-second page-frontpage">

            

Nós trasmontanos, sefarditas e marranos- Manuel Lopes, um judeu do tempo da inquisição - 6

Voltemos atrás, ao filho primogénito de Luís Lopes Penha, nascido em Mogadouro, cerca de 1629 e ali batizado com o nome de António Lopes Pereira. Sabemos que repartiu a mocidade negociando, entre Mogadouro e Castela. Em data que não conseguimos averiguar, foi casar em Torre de Moncorvo, com Maria Rodrigues, filha de João Rodrigues e Manuela Dias. O casal morou algum tempo em Moncorvo, mudando-se depois para o Mogadouro onde, por 1680, faleceu Maria Rodrigues, deixando 4 filhos: Luís Lopes Penha, de 10 anos, João Lopes Ventura, de 7, Salvador, de 4 Lopes e Manuel Lopes, o protagonista deste trabalho, recém-nascido. Aliás, presumimos que a mãe faleceu na sequência deste parto. Da vivência de António Lopes com seus filhos, temos o relato feito pelo filho mais velho, o Luís, na inquisição de Valhadolid em 10.2.1702: - Disse que, sendo de 10 anos e vivendo com seus pais António Lopes Pereira e Maria Rodrigues, já defuntos, no Mogadouro, e tendo morrido a dita sua mãe, havia coisa de um mês, disse a ele confitente seu pai e a seu irmão João Lopes Ventura, que no dito tempo seria de 7 anos, estando os três sozinhos, num aposento de sua casa aonde seu pai dormia, disse o dito seu pai, que havia ele confitente e seu irmão de sacar a alma de sua mãe das penas do purgatório e levá-la para o céu. E que a isto respondeu ele declarante e seu irmão que faziam o que pudessem, ainda que fosse necessário perder a vida. Ao que seu pai respondeu que para consegui-lo não necessitavam senão de estar sem comer nem beber pelo tempo de 24 horas, rezando algumas vezes padre-nosso, sem dizer ao fim Jesus. E convencendo- -os aos dois a fazê-lo, como seu pai dizia, naquele mesmo dia, seu pai e eles, do poente ao sol, comeram uma potage de garbanços e um pouco de peixe, dizendo seu pai que era para fazer a primeira ceia do jejum que haviam de fazer com ele pela alma de sua mãe e que até à noite seguinte, à mesma hora, não haviam de comer nem beber. E assim o fizeram ambos, rezando pela manhã e pela tarde um rosário de padre-nossos sem dizer Jesus ao final e sem estar presente seu pai. (1) Assim explicou Luís como foi introduzido por seu pai na prática da lei de Moisés, contando em seguida outras práticas e cerimónias judaicas e ditando várias orações que seu pai e sua avó materna lhe haviam ensinado. (2) Sim, para o Mogadouro se mudou também a sogra de António Lopes, chamada Manuela Dias, talvez depois da morte da filha, para cuidar dos netos. E à responsabilidade desta avó ficaram as 4 crianças, quando o pai morreu, por 1686. Por pouco tempo, já que a avó tratou logo de os encaminhar para junto de outros familiares que melhor pudessem educá- -los e introduzi-los na vida ativa. Assim: Luís Lopes Penha foi enviado para Benavente, Castela, para casa do tio paterno João Dias Pereira que, na região de Salamanca, trazia arrendada a venda do tabaco, com muitos familiares empregados em diversos estancos. Breve o Luís ficaria encarregado de um deles. (3) João Lopes Ventura foi enviado para Bragança, para casa da sua parente Inácia Maria Pereira, casada com Manuel Rodrigues, o Clérigo, de alcunha, onde aprendeu a arte de tecelão de sedas e de quem haveremos de falar mais adiante. Da infância de Salvador Lopes Penha, não temos qualquer informação. Sabemos tão só que, em 1702, quando contava uns 24 anos, se encontrava servindo o exército de Castela como soldado de cavalaria, conforme informação de sua “tia” Guiomar Lopes. Manuel Lopes, o mais novo, foi levado para Lebução, para casa de sua tia paterna Isabel Cardosa, como se verá. Porém, antes de prosseguirmos, acompanhando a infância de Manuel Lopes em Lebução, fiquemos em Torre de Moncorvo, procurando as suas raízes. E a primeira constatação é que na sua terra natal não conseguimos identificar qualquer parente seu. Tal como a sua avó materna, que era natural de Moncorvo e se passou para Mogadouro, deve dizer-se que todos os parentes que o Manuel encontrou ao longo da vida, originários de Torre de Moncorvo, andavam em outras terras portuguesas ou no estrangeiro. A Torre era uma terra completamente limpa da heresia judaica. É que, entre 1640 e 1670, a inquisição levara a efeito uma verdadeira operação de limpeza da etnia hebreia. Recuemos então àqueles anos de 1640, quando o promotor do tribunal do santo ofício de Coimbra solicitava as primeiras prisões, argumentando deste modo perante os inquisidores: - Ilustríssimos Senhores (…) A Torre é terra nova em que importa ao serviço de Deus entrar a Inquisição, que fez muito fruto entrando também por testemunhos de cerimónias em Quintela e Sambade. (4) Foi o início de uma alterosa vaga que, nos anos seguintes, arrastou para as celas da inquisição mais de 7 dezenas de cristãos-novos Moncorvenses, com todas as consequências, ao nível da economia, da sociedade e da cultura, ainda mais, tratando-se do sector mais dinâmico da sua população. E a operação de limpeza foi conduzida com tal eficiência que, uma dúzia de anos depois da primeira investida, em 1652, o comissário local da inquisição, que liderou o processo, Pedro Saraiva de Vasconcelos, (5) escrevia para os inquisidores de Coimbra: - Os cristãos-novos desta vila se fugiram todos para Castela e só ficaram três casas, que também farão o mesmo; porém, dizem que alguns estão escondidos em Vila Flor, que é a sua cidade de refúgio, com intenção de passarem a Castela. (6) Certamente que alguns ficariam em Vila Flor, o tempo suficiente para se desfazerem de alguns bens que não podiam levar e cobrar alguns dinheiros que tinham em mãos alheias. Mais ainda ficaram por Mogadouro, mas todos acabaram por se internar por Castela ou rumar ao Porto e Lisboa onde eram menos conhecidos e poderiam apanhar uma barco para uma terra onde pudessem livremente afirmar a sua religião. Facto é que, depois desta vaga não houve mais prisões em Torre de Moncorvo, nem manifestações públicas de judaísmo.

Sustentabilidade, moda consciente e eco friendly

A moda é uma expressão do estilo pessoal e a demonstração da individualidade, criatividade e do senso estético de um individuo. Ao usar uma marca, não se compra apenas a beleza da peça, está igualmente a concordar-se com todo o seu processo produtivo e a “incorporar” o valor moral da marca. Assim, em algumas situações, os consumidores têm o poder de apoiar ou punir marcas pelas suas atitudes sociais e ambientais, comprando ou não comprando em determinada loja. O número de consumidores “ecofriendly” tem aumentado nos últimos anos, associado á enorme preocupação global para a sustentabilidade do planeta. Muitos preveem que esta preocupação sobre sustentabilidade e moda consciente, intensificada com a actual pandemia do COVID19, que alertou a humanidade para valores mais humanos e amigos do ambiente, aumente significativamente a consciência dos consumidores, que irão exigir responsabilidades e atitudes sustentáveis ás empresas e marcas de moda, no sentido de investirem no paradigma do desenvolvimento sustentável. Uma marca de roupa pode, por exemplo, aumentar a vida útil de uma peça de roupa através do acabamento, pode usar tecidos que causem menor impacto ambiental, verificar a procedência das matérias-primas, assegurar condições dignas de trabalho, realizar o “upcycling”, etc. Diante destas preocupações, surgiram correntes adeptas do consumo consciente, como o movimento de “moda ética”, “slow fashion”, “eco moda”, “zero-waste fashion” e “eco chic”. Moda ética leva em consideração o impacto da dimensão sócio cultural e ambiental inserida na concepção de um produto. O movimento questiona a exploração de trabalho de funcionários de confecções, que muitas vezes são submetidos a condições análogas ao trabalho escravo : “ Quem fez as minhas roupas? Em que condições? A eco moda pretende que se reduza o consumo de recursos e o uso de tecidos de fibras orgânicas e métodos de produção que minimizem a contaminação de rios e mares, evitando ao máximo produtos químicos altamente poluentes. Algumas alternativas são o algodão orgânico, e fibras de ananás, de bambu, de cânhamo e outras. O eco produto é projectado de acordo com um balanço energético e material, quantifica as perdas e possíveis desperdícios, além de pensar em refrear a geração de resíduos sólidos. O conceito “slow fashion” contraria a produção de roupas massivas e de baixa qualidade, propondo um consumo mais lento e roupas com maior vida útil. O movimento questiona o conceito e a velocidade da moda, e visa um design intemporal com qualidade que proporcione uma durabilidade á peça. Resumidamente defende: - A qualidade das roupas em detrimento á quantidade de peças; - Mudança de consciência do consumidor para que se questione sobre a necessidade de consumir mais e mais, pensando no ciclo de vida de cada peça e na sua durabilidade; - A sustentabilidade em todas as etapas do processo de produção e uso consciente de recursos; - Remuneração justa e garantia de condições dignas e éticas de trabalho; - Incentivo a negócios locais Não podemos mais pensar isoladamente nas nossas roupas, sem tomarmos consciência de tudo o que está detrás da sua fabricação. É, pois, imprescindível que cada consumidor reconheça que faz parte dessa cadeia, em que as questões ambientais se cruzam com as questões sociais. É impossível ignorar nos dias de hoje que comprar uma roupa é também um “acto político”

Vendavais: Os vândalos racistas

Há alguns séculos atrás, mais concretamente no século V, a Norte da Europa foi invadida por vários povos bárbaros que destruíram o grandioso Império Romano do Ocidente. Várias investidas dos diferentes povos germânicos, acabaram com um domínio de muitos séculos, quer na Europa, quer mesmo no norte de África, circundando o Mediterrâneo, a que os romanos chamavam Mare Nostrum. Entre os vários povos bárbaros, vinham Vândalos, Suevos, Visigodos, Saxões, Francos e tantos outros que não vale a pena referir. Por cá se estabeleceram, criaram raízes e ficaram a governar criando reinos que se transformaram em países e em nações prósperas, mas diferenciadas, quer na civilização, quer na cultura intrínseca de cada um. Talvez por um acaso qualquer ou porque não conseguiram resistir ao avanço de quem vinha atrás ou determinação do destino, os Vândalos tiveram de atravessar o Mediterrâneo e refugiar-se no Norte de África, abandonando a Península onde pensavam permanecer. Nada mais havia a não ser o Atlântico desconhecido e o Mediterrâneo insondável. Por cá não ficaram. Mas deixaram um rasto de destruição tão grande que ainda hoje nos referimos a quem tem igual comportament, como autênticos Vândalos. No caminho da afirmação das nações, cada uma agiu a seu modo, teve os líderes que de alguma forma surgiram e se afirmaram, teve os governos que escolheu, ou não, mas mantiveram as suas identidades culturais, a sua força, o seu querer e idolatraram mesmo alguns dos seus heróis, eternizando-os em estátuas artísticas e significativas, que um qualquer artista sublimou. Nesse percurso, cada nação soube adaptar-se às vicissitudes que enfrentou, soube conviver com os seus vizinhos, a bem ou esgrimindo razões e direitos, tentou ser melhor, e conseguiram moldar a sua identidade e a própria mentalidade. No fundo, criaram as páginas da História Universal que nada nem ninguém conseguem apagar. Todos eram iguais? Não. Todos eram diferentes? Claro que sim. Raças, credos, mentalidades, civilizações, tudo era diferente e será sempre diferente. Ninguém pode alterar isso. E não é força de um determinismo etéreo. É a realidade. O modo como encarar as diferenças é que pode ser desigual e é. A História tem imensas páginas, mas a História é só uma. Ao longo dessas páginas estão pessoas boas e pessoas más, pessoas compreensivas e menos compreensivas, pessoas rudes e menos rudes, tiranos e ditadores, exterminadores, assassinos e alguns Nobel da paz. Lado a lado nas páginas da História, não se tocam, não se ofendem, não se destroem. Tiveram o seu tempo, ocuparam o seu espaço, com a anuência de uns e a oposição de outros, mas agiram de acordo com a consciência de quem tem de fazer algo para resolver situações que se lhes depararam. Uns receberam aplausos, outros apupos, outros fugiram para não serem punidos pelos raivosos. Hoje, em quase todos os locais, cidades e vilas, países deste planeta, existem monumentos, estátuas de pessoas relevantes que, de uma qualquer forma mereceram distinção, ainda que alguns vindouros, achem que houve desmerecimento. Estão no seu direito. A discordância é uma valência do discurso. Mas não confundamos discurso e discordância com destruição de ícones, ainda que relativizados. Como simples historiador e professor, não posso admitir que se destrua os representantes da História, como sei que não é possível destruir a História. Ela é indestrutível e os seus homens, bons ou maus, ícones ou simplesmente meros representantes de um ato isolado, igualmente são indestrutíveis e rasgados das páginas a que pertencem. Não sou racista, não sou xenófobo, não sou assassino e muito menos terrorista, mas sou contra os que são destruidores de um património histórico, usando os mesmos métodos que os Vândalos que destruíram tudo à sua passagem, na tentativa de dominar um território que não era deles. A destruição não apaga a memória nem a História. E não pode ser em nome de um epíteto racista, que se pode ter semelhante atitude. O Padre António Vieira usou a palavra para pregar, para convencer, para evangelizar e agora criticam a sua atitude apelidando-o de racista. Um ícone da língua portuguesa? Um nome alto e digno da Cultura nacional? Ele como tantos outros pelo mundo fora, viveram o seu tempo. Alguém apagou Estaline da História? Apagaram Hitler? Apagaram Lenine? Apagaram Nero? Não. Uns bem, outros muito mal, mas não será por isso que serão apagados da memória dos povos e das páginas da História Universal. Simplesmente porque existiram e agiram.

Máscaras, Mascarilhas e Mascarados

No tocante ao abrangente tema da Máscara guio-me pelo aprendido nas obras de Claude Lévi-Strauss, Mircea Eliade (que trabalhou na Avenida Marquês de Valbom em Lisboa), Marvin Harris e Roger Callois. Eu sei que existem centenas de outros especialistas e putativos especialistas, no entanto, prefiro confiar nos Mestres que sabem, a gastar os olhos nos do pouco pensado, reflectido e vivido em cavalgadas em vez do percorrido a pé, porque o caminho faz-se caminhando, assim o assinalou o poeta que morreu nos braços da burguesia após jornadas em caminhos que o seu opositor Camilo José Cela calcorreou de lés a lés de toda a Espanha franquista que nos legou Mazurca para dois mortos que vale por toneladas de títulos de antropologia. Esta obra do galego passa-se na Galiza e nela surgem como fantasmas risonhos, pícaros, obscenos, glutões e excessivos os nossos avós do Nordeste transmontano. No tocante a máscaras há quem a afivele todo o ano, excepto no Entrudo, há quem possua várias a fim de as usar conforme as circunstâncias por isso as mulheres astutas das nossas aldeias os crismaram de pantomineiros, há quem as coloque no intuito de mascararem as pulsões negativas – estupidez congénita, impostura, ingratidão, inveja, ódio – ao modo de figurantes repulsivos das grandes tragédias gregas – prometeu, antígona e as bacantes – só para citar as mais referenciadas, a não significar serem mais lidas e interpretadas. Já o escrevi, o Nuno, Nuno Álvaro Vaz, sócio da Livraria Cristal concedeu-me crédito, pagava os livros de acordo com as minhas possibilidades (que eram escassas, ele conhece as causas), uma das primeiras obras adquiridas foi o romance Os Três Mosqueteiros de Alexandre Dumas (a história regista ser o eclético autor dumas de outras). Os leitores leram a triste sorte do personagem O Homem da Máscara de Ferro, lembra que até do ferro se fazem máscaras, a significar ser possível a produção de máscaras conforme nos dá na real ou republicana gana. Neste tempo de virulenta pandemia as televisões exibem artefactos destinados a protegermos narizes mesmo os ranhosos e as bocas, até as impregnadas de aviltantes halitoses. As máscaras não são só signo/significante de luxúria, engodo, engano; aos as vislumbrarmos logo ficamos inteirados sobre o que uma mulher ou um homem estão ou deviam estar a praticar acções relativas aos seus conhecimentos e profissões, a torto e a direito verificamos incongruências tendo como elemento primacial a máscara, concedendo acuidade à sentença: bem prega frei Tomás, faz o que ele manda, não faças o que ele faz, este anexim já é conhecido antes do Professor Marcelo ser aguadeiro de António Costa, para lá das diferentes directrizes sobre o mesmo problema de Marta Temido e Graça Freitas. As duas senhoras ainda não convocaram uma conferência de imprensa a pedirem desculpa por que confundem máscara com mascarilha. Ao menos podiam ir à Interne ler as significações de máscara e mascarilha. Se as senhoras tivessem tido a sorte como eu tive de ver os filmes A mascarilha de Zorro o vingador, ou o Prisioneiro do Castelo de Zenda, verificavam as diferenças entre máscaras e mascarilhas. Bem sei, tais filmes não obedeciam ao cânone da actualidade – palavrões de fazerem corar a boca imunda de Aretino, em vez do sugestivo tapa-destapa dessa época de mulheres opulentas aparecem actrizes anorexias ambrientas e escanzeladas. Embora as comparações sejam odiosas, porém vejam as actrizes dos dois filmes nas versões de Zorro e do Prisioneiro, (a lindérrima Madeleine Carrol, espero mão me ter enganado no apelido) e depois vejam as diferenças. No que tange a mascarados volto, novamente, a Bragança não no sentido serôdio do fado coimbrão Coimbra dos meus amores, sim no referente à visão de futuro da cidade. Os leitores recordam-se de um candidato numas eleições autárquicas ter apostrofado Jorge Nunes e Hernâni Dias, o primeiro na justa e operativa medida de ter uma visão cultural da cidade apostando na criação de museus, o segundo continuou e continuará (assim espero) na mesma senda a demonstrar ao candidato a sandice do por ele pensado e proferido. O tempo dos pafós vale como recordação de um passado ancorado em tristeza, conformismo bafiento e estagnação pois no salazarismo tudo se concentrava na letra da canção é uma casa portuguesa (façam o favor de ouvir), no vinho carrascão e carapau do gato. O Museu da Máscara repleto de semióforos a perpetuarem vinculações é exemplo de antecipações do futuro escorado em sedimentações culturais capazes de contribuírem para o revigoramento da região. Os mascarados do presente são cínicos, plagiadores, logo miméticos. O Museu da Máscara ora trazido à colação pelas piores razões para lá de instrumental e separador do referido mimetismo oportunista e pescador em águas turvas a possibilitar a mantença de burocratas da cultura que não usam manguitos dado não estarem na moda, assume-se no quadro das estruturas e super-estruturas daquilo que é lícito esperar numa cidade cujo passado é (deve ser) âncora de fixação de massa crítica geradora de riqueza e emprego. A pandemia eivada de venenos civilizacionais teve o condão de motivar mobilidades que o pouco educado Secretário de Estado da dita cuja ou doença de S. Vito não conseguiu, ou por defeito de incompetência sem descurar a hipótese de raivosas ciumeiras de índole local serem a mãozinha fechada a movimentá-lo da mesma forma que xarabaneco das festas da cidade movimentava as marionetas. Lembram-se? Alguns do meu tempo sabiam fazê-lo destramente, assim soubesse o significado e substância de MORE. Hei-de saber!

E agora, António?

“ O povo português é absolutamente extraordinário nas crises e medíocre no regresso à normalidade.” – A frase não é minha mas sim de Costa Silva, o homem forte do momento, escolhido pelo primeiro-ministro para preparar o plano de recuperação pós-covid, Só a controvérsia gerada pela sua designação dava para escrever várias páginas, não por causa do perfil ou da competência, mas pelo que significa num país habituado a criticar por tudo e por nada. Interessa a frase, que subscrevo, e que se situa na linha de uma outra expressão, essa com mais anos, e da autoria de Jorge Dias: “O povo português passa facilmente da exaltação épica à lamentação ética”, ancorada, por sua vez, nas lamentações do grande poeta, Luís de Camões, que se queixa do desprezo a que foi votado e do estado da nação. No reinício da vida social, para além do que era previsível em termos pandémicos, somos confrontados com um mal maior que tem a ver com a ambiguidade do discurso das autoridades, associado a uma regulamentação que de tão contraditória que é, dá a impressão de se ter perdido por completo a noção da razoabilidade e da coerência na tomada de decisões. Pense-se, por exemplo, na reabertura dos jardins-de-infância e na ausência de regras para o funcionamento dos ATL’s que, por falta de legislação, continuam, até ao momento, encerrados. Mais grave ainda será a situação dos lares e das estruturas residenciais para idosos, com visitas proibidas desde o dia treze de março. Reiniciadas agora sob a batuta de um discurso sanitário preventivo, impõe restrições de tal ordem que se revelam contraproducentes, multiplicando relatos da recusa, por parte dos séniores, de aceitar visitas porque proíbe a socialização, os afetos e a proximidade. Ao esquecer outras dimensões da vida, tão ou mais importantes do que a saúde física, esquecem as autoridades que estão a segregar e a privar de um direito, aqueles que pelo simples facto de estar num espaço comunitário não lhes é permitido o regresso à nova normalidade e às rotinas que ainda lhe conferiam a singularidade de ser pessoa. Há nos lares, quem faça da ida ao café, ao cabeleireiro ou do simples passeio a âncora dos seus dias; no entanto, o estereótipo de que só vai para o lar quem já nada pode toldou a capacidade e o entendimento das autoridades obrigando esta população à continuação de um incompreensível confinamento que põe em causa liberdades e garantias. Sendo as falhas da supervisão sobejamente conhecidas, é legítimo questionar até que ponto pode o estado português garantir aos cidadãos, nomeadamente aos familiares dos utentes, que durante este período continuaram a receber o tratamento adequado, a atenção dos colaboradores e a assistência religiosa, caso a desejem. Há um longo caminho a percorrer na forma como se continua a olhar a geração dos maiores e, sobretudo, quando se conota o “idoso” com a pessoa vulnerável tão próximo do discurso idiota que os rotula de “meus bebés” ou “meus meninos” e no qual se tropeça a cada passo pelos corredores de tantas dessas estruturas. Em vez de achatar a curva da solidão, a pandemia serviu para a reforçar, em vez de se criarem programas de promoção de qualidade de vida, descurou-se o essencial. Algumas das figuras de proa e de decisores que diariamente têm aparecido nos ecrãs, estão a meia dúzia de anos, alguns menos, de entrar no grupo que agora mantêm entre quatro paredes. Passados noventa dias da declaração do estado de emergência e quando os apelos para o regresso à normalidade social se ouvem a cada instante, é lícito perguntar se, quando as autoridades de hoje, cidadãos comuns de amanhã, derem entrada num lar, também quererão estar confinadas? Hoje, tal como ontem, há apenas uma certeza: perante as leis da vida, somos todos iguais. Já não bastam os ensaios académicos, profundamente teóricos, que apontam para a necessidade de mudança no modo como se encara a velhice no século XXI. É que se aos jovens oferecemos uma escola do século dezanove, com professores do século vinte, para uma realidade do século vinte e um, aos maiores faz-se ainda pior, porque se antes eram encarados como fonte de sabedoria, hoje foram reduzidos a nada.

Entrega do prémio Pessoa a Tiago Rodrigues

Da história dos judeus em Torre de Moncorvo, que tenho estudado, o pormenor que mais me impressionou foi a utilização da palavra justo – referida a André Dias, líder da comunidade local em meados do século de 1500. Dezenas de anos depois de morto, ainda era recordado pelos seus concidadãos, com esta expressão – O Justo. Foi também esta a palavra que me pareceu mais apropriada para recordar o meu compatriota, jornalista Rogério Rodrigues, recentemente falecido. Talvez por isso mesmo, gostei muito de ouvir o Sr. Presidente da República repetir por 3 ou 4 vezes a palavra justo, referindo- -se a Tiago Rodrigues, filho do Rogério, dizendo-o: - Justo vencedor do prémio Pessoa; justo vencedor enquanto encenador; justo vencedor enquanto dramaturgo; justo vencedor enquanto autor e promotor teatral (…) e sobretudo, um justo vencedor enquanto ativíssimo agregador de talentos e vontades. Gostei também de ouvir a rápida conversa entre a locutora da SIC, Débora Henriques e Tiago Rodrigues, salientando este “o caráter coletivo e simbólico” do prémio, que distingue “a qualidade e diversidade do teatro português”. Vem tudo isto a propósito da cerimónia de entrega do Premio Pessoa 2019 a Tiago Rodrigues, ator, dramaturgo, encenador, produtor teatral e diretor artístico do Teatro Nacional D. Maria II, realizada no passado dia 9 de Junho, na Fortaleza de Cascais. Trata-se do maior galardão atribuído em Portugal a uma pessoa que anualmente se distingue na vida científica, artística e literária do país, instituído pelo jornal Expresso. É um prémio não estatal e, talvez por isso, Tiago disse acreditar que haja uma mudança “na forma como a sociedade civil, em Portugal, está atenta à cultura” e acrescentou com um recado ao poder político: - É urgente que a cultura seja um desígnio prioritário. Palavras simples, mas que devem ser bem pesadas, sobretudo nestes tempos de pandemia em que a o setor da cultura é mais atingido do que qualquer outro. O Presidente Marcelo Rebelo de Sousa lembrou que o premiado esteve quase para ser jornalista. Na verdade, foi como jornalista que eu o conheci, bem jovem ainda, em Torre de Moncorvo, escrevendo um texto sobre Jorge Luís Borges para o extinto jornal “Primeiro de Janeiro”. Mas foi em 2009, na Biblioteca Municipal de Torre de Moncorvo, que fui tocado pela magia poética e de ator, de Tiago Rodrigues, ao recitar a sua “Biografia”, inserta num pequeno/grande livro – “TORRE DE MONCORVO Março de 1974 a 2009” e que termina deste moto: E em último lugar Gostava de ser enterrado, sem missas nem cruzes No talhão dos bombeiros No cemitério dos prazeres E se os bombeiros não deixarem Ou já não houver espaço Então quero ser cremado sem missa à mesma E ser colocado dentro de um pote Aos pés da campa de Fernando Assis Pacheco Que também lá está nos prazeres E no pote uma inscrição: “está aqui porque os versos dele não chegavam aos calcanhares dos versos do Assis” em baixo um nome umas datas e obrigados. Tiago Rodrigues e Campos Monteiro são os dois nomes de “Filhos de Moncorvo” – perdoe-se-me a expressão – que ganharam nome a nível nacional, em termos de Teatro. Tiago é um jovem, Campos Monteiro faleceu há muito e celebrizou-se no primeiro quartel do século XX. Depois de morto, erigiram-lhe um busto em um Largo a que deram também o seu nome. Curiosamente, enquanto Portugal distinguia Tiago Rodrigues com o Prémio Pessoa, na Torre de Moncorvo retiraram do seu sítio aquele busto e o seu pedestal! Certamente o fizeram com a melhor das intenções (para escoar águas ou limpar as pedras de granito e o bronze! – ouvi dizer), mas com tremenda falta de respeito para com gerações de Moncorvenses. Bom: sejamos compreensivos. Errar é humano. Espero que rapidamente o pedestal e o busto regressem ao seu sítio, sob pena de encarar o ato como um atentado a História e à Cultura da Minha Terra. Ps. Utilizei a letra maiúscula para escrever Minha, não por vaidade nem por considerar mais minha do que dos outros, mas porque queria recordar o livro mais querido dos Moncorvenses – Ares da Minha Serra – escrito por Campos Monteiro.

António Júlio Andrade