class="html not-front not-logged-in one-sidebar sidebar-second page-frontpage">

            

Vendavais- É difícil viver em liberdade

A liberdade tem servido os principais interesses do homem ao longo de séculos, mas nem por isso ela serviu os interesses de todos. Na realidade, muitos acabaram com a possibilidade de ela existir e usaram a falta dela para esgrimir o seu poder absoluto como se fosse um dom divino. É verdade que muitos foram os que usaram a liberdade para mostrar o seu valor, mas do mesmo modo, salientaram que a sua falta não era condição necessária para sobreviver, como se isso fosse uma lei a que se tinha de obedecer, o que fazia do governante um homem sem escrúpulos e sem sentido. Ao desvalorizar a liberdade teria de dar valor ao seu contrário e isso nunca foi bem aceite por ninguém em nenhuma parte do globo. Hoje questionamo-nos frequentemente sobre a liberdade e até se conseguimos ser efetivamente livres. Será que somos livres? Como se consegue a liberdade? Onde começa e acaba a nossa liberdade? Sobre estas questões exibimos os clichés como a resposta mais sábia e certa, mas será que é assim tão certa? Cada um de nós deveria ter a noção exacta da sua responsabilidade e do significado que a liberdade lhe dá para seu governo e assim saber como agir perante a sociedade. Não basta dizer que a liberdade de cada um acaba onde começa a liberdade do outro. Qual outro? E onde começa a liberdade do outro? É com silogismos desta natureza que os mais inadaptados se desculpam para fugir às suas responsabilidades perante uma liberdade com que não sabem conviver. A verdade é que ao pôr um limite à liberdade de cada um tem perante o outro, está-se a impedir a própria liberdade, ou seja, ela não poderá ser utilizada na sua plenitude, deixando de haver liberdade a partir de um determinado momento. Então como vamos poder saber usar a liberdade? Não é fácil. Perante a pandemia que hoje nos assola, a liberdade é deveras questionada em vários vectores. De facto, as várias manifestações em prol da liberdade de circulação e de reunião e convívio, é disso prova evidente. Não temos liberdade para circular, para visitar a família, para ver os amigos, para nos reunirmos e para conviver. É verdade, mas se queremos fazer tudo isso amanhã, ou seja, se queremos ser livres, temos de nos sujeitar hoje a ficar sem essa liberdade. Parece lógico. Desta forma, a liberdade passa a ser uma peça de um tabuleiro de xadrez que se movimenta no sentido de atingir um objetivo: o xeque-mate. Ganhar o jogo. Mas afinal, somos livres ou não? Se proibimos uns de serem livres, estamos a ter a liberdade de cortarmos a liberdade dos outros. Será que podemos fazer isto? Será que temos a liberdade para o fazer? Concordamos todos certamente, que tudo isto não teria sentido se não fosse a sobreposição de um bem maior que a liberdade, a vida. Sem vida, a liberdade de nada serve. Perante a morte ou a sua proximidade, a liberdade toma um valor muito maior e tem um custo incomensurável só admissível porque se está vivo. Pois é esta realidade, o enfrentamento do Covid19 e a proximidade de com ele desfalecer, que nos faz dar tanto ênfase à liberdade, quer condenando, quer exaltando o seu usufruto. De um modo ou de outro, ela não poderá ser arremessada como uma arma ou um troféu que se ganha ou perde, numa qualquer batalha. Esta batalha pela vida que agora vivemos no país, parece estar no bom caminho, mas não descuremos a responsabilidade em prol de uma liberdade que ponha tudo a perder. É que os excessos são sempre condenáveis. Temos de condenar os que querem ter demasiada liberdade neste momento, impedindo os outros de usufruir a liberdade que lhes dá o direito de se manterem vivos e saudáveis. Esta semana que agora acaba de entrar, será uma prova real para medir tanto a responsabilidade como a liberdade de cada um e de todos nós. A Páscoa, festa de reunião familiar e convívio, não deverá ter o mesmo sentido e o mesmo peso de outros anos, mas se queremos ter o direito de no próximo ano podermos usufruir livremente desse direito, teremos de nos retrair este ano e penso que muitos o terão feito. Talvez por receio, talvez por responsabilidade ou até por liberdade de luta contra um vírus que nos quer roubar a nossa liberdade. A Páscoa passou e com ela os convívios possíveis, mas ficou o receio de ver o resultado que esses convívios deixaram. Esperemos que sejam bons e nos facilitem os dias que aí vêm, para os podermos viver em maior liberdade. Na verdade, não é nada fácil viver em liberdade!

Pascoelas

Flores humildes, desprovidas de fragrâncias capazes de inebriarem a lendária Coco Chanel, na sua singeleza alegravam as estradas e caminhos das redondezas de Bragança muitas vezes na companhia das trémulas violetas ao tempo responsáveis pelo derramamento de baldes de lágrimas escorridas dos rostos (primacialmente femininos) de quem viu o filme Violetas Imperiais, onde Sara Montiel e o tenor Luís Mariano arrebatavam as plateias. Vi a fita, muitos mais tarde em Salamanca, a cigana Violetera estava esplendorosa e não podemos, em plena época do esbatimento de diferenças de género, quão foi o seu impacto na sociedade espanhola franquista, reaccionária e, profundamente inquisitorial no tocante a costumes, noção de pecado numa época impregnada de machismo, a actriz italiana Lúcia Bosé casada com o célebre toureiro Dominguim é saliente exemplo do acima referido. Ao trazer à tona as florinhas pascais, procuro carrear lembranças de elementos cintilantes (alacridades na real/realidade longe do pobrete mas alegrete), sim de o Mundo não é exclusivo dos petulantes amores-perfeitos, a estimularem desejos nos canteiros do Jardim António José de Almeida e Avenida João da Cruz, levando os estudantes mais atrevidos a pisarem a relva e a cortarem os indicados pelas namoradas, estas ficavam vaidosas, se tivessem e estivessem à vontade, recebia na face casto e breve ósculo, deixando o apaixonado convicto que a partir daí iniciaria jornada até à concessão de beijos húmidos ao estilo dos galãs de capa e espada visionados no Cine-Teatro Camões. Os amores-perfeitos após secarem entravam espalmados nos livros de estudo, muito grafados com o nome do ofertante, a descambarem em perguntas inoportunas após um cabaz de anos, porque os livros foram mudados de lugar, de casa, de localidade. A rememoração podia continuar, no entanto, seria estultícia fazê-lo, saudades só para Dona Genciana, sulfurosa personagem criada pelo notável prosador José Rodrigues Miguéis, olvidado nos batocos do obscurantismo porque ler dá imenso trabalho, além de que nos telemóveis grudam maldades a leste dos estilos literários, desdentadas de subtileza e ironia. As flores faziam parte (fazem?) integrante da festa pascal, o folar recheado de interditos (mas saborosos) também, as figurações florais de plástico retiram verdade às representações, o folar longe do quilate dos elaborados com o beijinho da farinha demonstram a desqualificação de serem artesanais mecânicos, o progresso técnico, bem como as exigências da mobilidade, são a prova provada do mundo que nós perdemos, restando as pascoelas, as violetas, pouco mais. Nos meus escritos a propósito de tudo e de nada, a todo transe cito livros, não tenho ilusões: passo por pedante. Repito: ler dá imenso trabalho, por isso recomendo a leitura de Admirável Mundo Novo, de Aldous Huxley. Boa Pascoela.

Manifesto ecofágico

Boa tarde, meus caros. Espero que a anunciada Primavera vos traga saúde e esperança renovada. Hoje falo- -vos da natureza, de fauna e de flora, raposas, lobos, gamos, ginetos e javalis. Vai fazer um século que o manifesto antropofágico despoletou um movimento modernista brasileiro com o mesmo nome, inspirado no surrealismo francês de André Breton, para centrar a expressão artística na brasilidade, nas suas raízes indentitárias ameríndias, desprendendo-se das estrangeiras influências europeias e norte-americanas. Daí esse canibalismo, essa deglutição do Outro que o nome sugere. A antropofagia trasmontana de hoje não tem nada de surrealista, mas sim de ultra ou hiper-realista. Também não é bem antropofágica, porque não se trata de homens que comem outros à refeição, mas sim de naturofagia, biofagia ou ecofagia, ou seja, a natureza a dizer que o homem está ali um bocado a mais (ou a menos, na verdade). Às vezes costumo chamar à praça o académiquês no qual hoje em dia tudo consegue caber, mas, fora de brincadeiras, não sei qual a terminologia, mas estou certo de que haverá algum ramo da ciência que estude estas coisas. Temos por exemplo o caso de Chernobyl, conhecido por, depois da debandada das suas gentes, albergar agora uma vida natural única e vigorosa em termos de espécies vegetais e animais que vivem sem qualquer influência de actividade humana. O mesmo fenómeno se passa numa zona ainda mais difícil de aceder situada na divisão entre as Coreias, onde poucos ousam pôr o pé, mas onde muitos juram haver uma biodiversidade igualmente rara e especial. Uma faixa de terra desmilitarizada e sem presença humana desde a Guerra da Coreia, nos anos 50, com quatro quilómetros de largura e 250 de extensão onde a natureza se instalou com toda a naturalidade sem passar cartucho a humana e desavinda vizinhança. No caso do Nordeste Trasmontano as pessoas das aldeias relatam a cada vez maior propagação de animais selvagens pelos termos e pelos povoados, animais esses que muitas vezes se passeiam pelas aldeias natural e despudoradamente, alguns até já vão comer da gamela que lhes dão. Nos dias de batida ao javali os caçadores dizem avistar muitas dezenas, centenas destes animais. Nesta relação e interação entre gentes e fauna, quando deixa de haver pessoas, a fauna e a flora começam a deglutir e a envolver o meio involvente. Os animais selvagens proliferam e os humanos passam a ser para eles apenas quatro gatos pingados. Para todos os efeitos esse é um dos sinais mais realistas dos tempos que as aldeias do Nordeste vivem. Antes costumava ouvir-se muito a frase “antigamente estes caminhos andavam todos limpinhos, não havia uma brossa, umas silvas, isto até brilhava, cheios de gente pelos termos”. Depois os caminhos dos termos começaram a ficar abandonados, sem gente para os escanhoar, e agora estamos num outro inverso ponto em que são os animais que devem fazer semelhantes comentários: “Antigamente não se podia andar nestes caminhos de tanta gente. Agora, meu filho, se quiseres ir até à aldeia jantar a comida do gato à porta das pessoas, não tem nada que enganar, sempre a direito pelo carreiro. Não vale a pena andares aí a arranhar as patas no meio dos touções”. Raposas, cervos, javalis, gatos selvagens, etc., vivem tempos de liberdade. Tem a sua beleza, mas também tem os seus perigos e prejuízos. As aldeias do Nordeste Trasmontano fazem-se cada vez mais deles e cada vez menos de pessoas. Na perspectiva biológica e ecológica, e na perspectiva do PAN, é algo de enorme riqueza e singularidade. Na perspetiva demográfica e trasmontana, em termos de presença humana, é um bocado triste porque a natureza está literalmente a morfar ou a antropomorfar as pessoas e as suas pequenas comunidades. Pegando num termo muito ligado a Trás- -os-Montes, celebrizado pelo insigne poeta, estamos perante um telúrico-morfismo em que a terra enquanto elemento vivo, está a engolir os da terra enquanto elemento filosófico. Sendo que o elemento filosófico são as pessoas e sem elas há muitas coisas bonitas de serem apreciadas neste mundo, mas não filosofia nem outras formas que tais de ocupar o tempo. A natureza a ganhar espaço ao homem, um movimento cíclico, uma segunda parte de um jogo em que o marcador revira a favor da fauna e da flora. A terra a ir para as mãos de quem a trabalha. Há no Nordeste municípios de vastas centenas de metros quadrados com quatro, cinco mil pessoas. Na China isso pode perfeitamente ser a população de um prédio ou dois. Que o mundo é feito de desequilíbrios nao é novidade para ninguém. Que passados tantos anos não consigamos fazer grande coisa para inverter ou sequer impedir o acentuar desses desequilíbrios também não, mas é decepcionante. É urgente o amor e é urgente o equilíbrio, mas a questão que se coloca é sempre a mesma: como? Se o Polígrafo fosse investigar e analisar a veracidade da seguinte afirmação “O ser humano nas aldeias do Nordeste Trasmontano é um elemento em francas vias de extinção”, o veredito final seria: “Falso, mas...”. Um saudoso abraço a todos e muita saúde!

O poder da vida

Durante muito tempo mantive-me distante desta questão. E nunca fui capaz de responder, talvez um pouquinho, nem sei bem. Mas hoje, persigo, com esta questão da ressurreição, a minha pequena meditação pessoal sobre a possibilidade de acreditar. Tinha- -me parado em tempos sobre a noção do impossível, pensando ser possível pensar o impossível (perdão), e que esta via seria a saída escarpada para um senão e conseguir pelo menos antecipá-la. Mas chego ao ponto de me interrogar: seremos nós capazes de suportar o nosso pensamento? Não será isso mesmo o que chamámos fé? Esta tenacidade no combate de ter de pensar o impossível. Sei que a palavra combate em grego (mais exatamente, o lugar do combate) é agôn, “agonia” em português. A agonia do Cristo é, para mim, este lugar onde devo lutar para suportar o meu pensamento sobre o que é o amor, a morte e a esperança. Pode parecer abstrato mas penso que é o que vivi, como tantas outras pessoas confrontadas com a perda, com o desaparecimento. Havia estes sonhos, meus amigos, estes sonhos recorrentes durante meses, em que se vê a pessoa de quem gostamos e desaparecida toda na sua carne e luz terrestres, com detalhes duma precisão assassina, destes pequenos pormenores que teríamos imaginado indiscerníveis na noite absoluta. O sonho não ressuscita nada nem ninguém contudo, pela queimadura da falta, faz reaparecer o outro de forma exorbitante, impossível. Neste mesmo sonho, o outro perguntou-me o que fazia ali. Era o desaparecido para sempre que se preocupava pelo meu desertar, pela minha errância. Porquê que que não tinha ficado lá em baixo com os outros, com o resto da família e amigos? O que fazia ali, naquele não-lugar? Acordei alagado em suor quando a agonia, a luta, se tornava insuportável. Creio que pelo meu sonho pretendia encurralar a vida na prisão do meu pesar, encontrava-me eu mesmo prisioneiro aos olhos da pessoa que procurava em vão. Muitas vezes, transformamos a vida, mergulhados no nosso desespero, num pequeno prisioneiro. E fixava-me unicamente na ideia de que aquilo que tinha sido possível já não o era, ter- -se-ia tornado impossível. Mas a ressurreição, o seu trabalho em nós, se posso pronunciar- -me deste modo, começa quando cessam os sonhos e as aparições. Crer na ressurreição prende-se com esta reviravolta, aquela que vejo no torpor e deslumbramento das mulheres do Evangelho perante o túmulo vazio. Esta ekstasis (S. Marcos 16, 8) que em grego designava uma perturbação do espírito, um desregulamento e uma inspiração sagrada. Uma revolução do pensamento; já nada é impossível. O impossível já não nos prende. Percebo muito bem que prender-se ao impossível não passava da nossa imperfeição. Das nossas falhas, no sentido original da palavra “pecado” (falhar o alvo). Não nos era pedido acreditar no impossível, mas sim pensar que a vida era, perdurava inteiramente no possível do mundo. O que é radicalmente diferente da perversão do sonho que me fazia crer que o que era impossível se tornava possível. Oh, sei que é muito difícil de apreender, mas direi as coisas desta forma: na fé na ressurreição, não tenho que procurar salvar o ser, um ser amado que perdi. Além disso o sonho indicava-me que, acreditando nisso na minha pena, eu é que pedia desesperadamente para ser salvo pela pessoa que eu pretendia salvar da morte e do esquecimento. Acreditar na ressurreição liberta-me do impossível e entrega-me à vida, ao seu infinito possível. Para falar como S. Paulo na primeira epístola aos Coríntios, é uma questão de poder, que se revela na escuta do outro. Quando percebemos o que nos mostra a fé (na esperança) - são as palavras de Paulo. Como os dois amigos amedrontados após a morte de Cristo e que no caminho de Emaús vão ter a experiência de que Cristo está ainda bem presente possivelmente entre nós. Basta ler, orar, caminhar juntos, descansar juntos, amar- -se, e pôr-se ao serviço dos outros como Ele-mesmo se pôs definitivamente ao nosso serviço. E nada conservar do que foi vivido, mas acreditar no poder que nos faz avançar e viver. Sim, a fé na ressurreição destrói todos os nossos conservantismos. Os do medo, do ressentimento, da angústia e do luto. A ressurreição confia-nos aos possíveis do mundo. O que aconteceu está bem vivo. Não tenho nada a conservar, tudo está aí com a Vida. Oh, não tenho qualquer certeza de perceber muito. Contudo guardo agora esta compreensão da ressurreição: o túmulo está vazio, o que acontece está na vida que se vive. Eu é que tive que me erguer, que me levantar, no possível da vida. E manter assim qualquer coisa do objeto da minha esperança. É a condição necessária para estarmos libertos do impossível.

Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (IRS) Simulação: sim ou não?

O IRS é um quebr a- c a b e ç a s para muitas famílias. Por muita informação que exista, este é um processo de difícil compreensão. Desde o ano 2018 que as declarações anuais de rendimentos têm de ser  obrigatoriamente entregues online no Portal das Finanças. Para isso, é necessário ter uma senha pessoal de acesso. Caso não tenha senha ou não saiba o código de acesso, terá de a solicitar, alterar ou recuperar através do Portal. De 1 de abril a 30 de junho é o prazo a cumprir para entrega da declaração de IRS, independentemente da categoria de rendimentos. Isto para não desaproveitar deduções, pagar coimas ou juros de mora referentes aos rendimentos de 2020. São seis as categorias de IRS e que ditam o preenchimento do Modelo 3 e dos seus respetivos anexos. A cada uma delas corresponde uma letra: na categoria A inserem-se os rendimentos do trabalho dependente (ex: por conta de outrem); na B os rendimentos empresariais e profissionais (ex: recibos verdes); a E refere-se aos rendimentos de capitais (ex: os juros provenientes de contratos de mútuo a título oneroso); a F aos prediais (ex: rendas); a G aos incrementos de património (ex: mais-valias); e, por último, a H, na qual cabem todo o tipo de pensões. Caso seja casado ou viva em união de facto, deve fazer simulações para ver se vale a pena fazer o englobamento ou não, ou seja, promova uma declaração para cada um dos contribuintes e outra conjunta. A diferença de valores (das simulações efetuadas) irá demonstrar qual a melhor solução para o seu caso em concreto, por isso opte pelo cenário que lhe for mais favorável. Faça também simulações no caso de querer adicionar mais alguma despesa.   Caso esteja abrangido pelo IRS automático (medida implementada em 2017 no âmbito do programa Simplex), faça uma simulação manual, pois apesar de mais de 3 milhões de cidadãos se enquadrarem nesta modalidade, deve sempre confirmar que tudo está correto. Só assim conseguirá compreender qual o presumível reembolso. Verifique também todos os Anexos para garantir que estão corretamente preenchidos, simule e, por fim, submeta. Em 2020, 134 municípios concederam desconto no IRS. Verifique se o seu município atribui este benefício municipal. Para isso basta aceder ao Portal, consultar as taxas de Participação no IRS dos Municípios e escolher o ano 2020. Só beneficia se tiver entregado a sua declaração de IRS dentro do prazo (1 de abril a 30 de junho) e a sua morada fiscal estiver registada num dos municípios. O IRS faz parte da vida financeira e fiscal de todas as famílias ano após ano, por isso execute-o corretamente para obtenção de um maior reembolso. Em caso de dúvidas, pode sempre contactar o seu Solicitador, profissional habilitado na área do Direito Tributário e Fiscal, para o informar e orientar da melhor forma.

Judite Alves

Bragança : A Nação Judaica em Movimento- Um Inquisidor em Bragança a instruir processos

A partir de 1637, depois de 2 décadas de relativa acalmia, o Nordeste Trasmontano foi autenticamente varrido pelo vendaval da inquisição de Coimbra, que alvejava uma limpeza completa da heresia judaica, em verdadeiro religiocídio. A primeira grande operação foi lançada em Quintela de Lampaças, com êxito evidente. Dezenas de prisões e muitas mais fugas, com a gente da nação de Quintela a levar dinamismo empresarial e recursos financeiros para terras estrangeiras. Seguiu-se a limpeza de Sambade e consequente agonia do maior conglomerado têxtil de Trás-os-Montes. Sim, antes da moderna era industrial, esta terra constituía-se numa verdadeira encruzilhada dos caminhos trasmontanos da rota da lã, chegando a contar- -se nela mais de 250 artesãos cardadores e fabricantes de lã, com uma cascata de pisões implantados nas margens dos ribeiros que descem a serra de Bornes. No próprio tribunal de Coimbra se dava conta do êxito alcançado, com um promotor a solicitar dos inquisidores o lançamento de uma operação semelhante em Torre de Moncorvo, conforme se lê no processo de Francisca Vaz: - Lembro a Vossas Mercês que a Torre é terra nova em que importa ao serviço de Deus entrar a inquisição, que fez muito fruto entrando por testemunhas em Quintela e em Sambade. A Torre ficou mesmo limpa da gente da “infecta nação”, a partir dos anos de 1670. E ficou também limpa dos capitais e das empresas dos judeus, que se mudaram para outros sítios. A limpeza étnica prosseguiu por Chacim, Vila Flor, Miranda do Douro, Freixo de espada à Cinta, Carção Mogadouro… Sobre esta última localidade, escrevia outro promotor da inquisição de Coimbra, em 1653: - Mogadouro, que há muito tempo arde em judaísmo e aonde o santo ofício tem presas mais de 60 pessoas e tem fugidas outras tantas ou mais, para não serem presas. Bragança albergava uma das mais numerosas comunidades hebreias do país e, porventura, a mais rica e poderosa, mercê da sua florescente indústria das sedas, essencial para vestir a casa real, as gentes da nobreza, os bispos e os padres que nas igrejas glorificavam Cristo, cobrindo-se, eles e os altares, com luxuosas sedas fabricadas em dois ou três centos de oficinas familiares, em Bragança. Por isso mesmo, por se tratar de uma comunidade numerosa e rica, a “nação de Bragança” despertaria especial interesse e apetite da parte do santo ofício. Assim, ao findar da década de 1650, a avalanche de prisões, com várias pessoas “relaxadas à justiça secular”, fez com que muitos judaizantes brigantinos tomassem o caminho de Coimbra para se ir apresentar, antes que fossem prendê-los. Dir-se-ia então que os juízes daquele tribunal não tinham “mãos a medir”, tal o movimento de prisões e apresentações. Mais uma vez, tal como acontecera em finais da centúria de 500, os judeus brigantinos “entupiam” a inquisição de Coimbra. E então surgiu a ideia de fazerem uma petição, que enviaram àquele tribunal, manifestando o desejo de se apresentar a confessar suas culpas e pedindo para serem ouvidos em confissão por algum comissário ou inquisidor, na cidade de Bragança. A ideia ganhou concretização em 5 de janeiro de 1661, quando, cerca de meia centena de cristãos-novos assinou a citada petição. Por despacho do Conselho Geral, o santo ofício de Coimbra mandou para Bragança o novel inquisidor Manuel Pimentel de Sousa, que se fez acompanhar pelo escrivão do mesmo tribunal, Pedro Saraiva de Vasconcelos. Na capital trasmontana, durante 3 meses, entre Março e Maio daquele ano, eles assentaram morada e ouviram as confissões dos cerca de 50 judaizantes, ali se começando a organizar os respetivos processos. Antes de continuarmos, vamos fazer uma breve apresentação do inquisidor e do escrivão, ambos trasmontanos, aquele de Vimioso e este da Torre de Moncorvo e contando parentes comuns, vários deles servindo igualmente o santo ofício. Manuel Pimentel de Sousa, como se disse, era natural de Vimioso, filho e neto de gente daquela terra. Cursou a universidade de Coimbra, formando-se em Cânones. Ali se fez padre, com “habilitação de genere” tirada em 1646, e ascendeu a cónego da Sé da mesma cidade. Em 30.4.1654, foi nomeado deputado do tribunal da inquisição e, em 3.7.1660, tomou juramento de inquisidor. Mais tarde, ingressou nos quadros do conselho geral do santo ofício. D. Maria de Morais, irmã do inquisidor Pimentel de Sousa era casada com Pedro Gouveia de Vasconcelos, capitão-mor do concelho de Algoso e uma filha destes, chamada D. Mariana de Morais Pimentel, casou na Torre de Moncorvo, com Cristóvão Saraiva de Vasconcelos, irmão do comissário da inquisição, abade de Chacim, Dr. Manuel Gouveia de Vasconcelos. A esta família estava também ligado o escrivão Pedro Saraiva de Vasconcelos que, nascido embora em Freixo de Numão, por 1602, veio pequeno com sua mãe, D. Leonor Saraiva de Vasconcelos, para Moncorvo, acompanhando o seu irmão, padre António Saraiva de Vasconcelos, nomeado “escrivão da câmara eclesiástica, visitações e resíduos da comarca” e que mais tarde, seria também nomeado comissário da inquisição. Uma irmã destes, D. Brites Saraiva de Vasconcelos, casou em Torre de Moncorvo com Francisco Botelho de Morais, familiar da inquisição e “um dos homens ricos e principais da província”, conforme consta do processo de habilitação de seu filho, Paulo Botelho de Morais, que não conseguiu ser provido. Como se vê (e isto é apenas uma pequena amostra feita a partir de um ramo), tanto na família do inquisidor Pimentel de Sousa como na do escrivão Saraiva de Vasconcelos, como, aliás, na generalidade das famílias da nobreza cristã-velha, abundavam os funcionários e agentes da inquisição. Na inquisição, como em outras instituições e nas estruturas do poder político em geral, o compadrio reinava e as famílias constituíam-se em verdadeiras agências de emprego. Voltemos atrás, ao mês de Janeiro de 1661, “ao tempo em que principiavam a fazer muitas prisões na cidade de Bragança, que continuavam com um excesso tão grande, que quase despovoava a dita cidade. E de tal forma que os presos os mais dos moradores daquela cidade até viam seus filhos andar pelas ruas, despidos e descalços, padecendo a necessidade, sem ainda à noite terem onde se recolher. E vendo isso aqueles que não estavam presos, temendo que os carcerados, ou por vingança, ou por se verem soltos, jurariam contra eles, se resolveram a fugir pra Castela ou apresentarem-se voluntariamente, declarando o que não haviam cometido”- conforme testemunhou mais tarde, na inquisição de Coimbra uma das mulheres que assinaram a citada petição. Estamos agora no mês de Março de 1661, “na casa onde pousava o senhor inquisidor Manuel Pimentel de Sousa que, por ordem do conselho geral do santo ofício veio tomar as confissões das pessoas apresentadas”. Perante o senhor inquisidor, durante cerca de 3 meses, foram comparecendo os peticionários, cada um deles identificando-se e confessando depois as suas culpas de judaísmo, com Pedro Saraiva de Vasconcelos a organizar cada processo, e neles escrever as respetivas confissões. Autuadas as confissões e regressados a Coimbra o inquisidor e o escrivão, entraria aquele na análise de cada processo, certamente acrescentando confissões de outros presos e trocando informações de outros processos. E à medida que os processos iam ganhando corpo, cada um dos judaizantes de Bragança foi sendo chamado a Coimbra para ouvir a sentença ou para continuar o seu processo, até 1670. Vários acabaram presos e quase todos foram sentenciados, em penas mais ou menos leves. Na impossibilidade de estudarmos aquele cento de processos, escolhemos alguns deles e, nos próximos números deste jornal, seguiremos um pouco da história de 3 dos agrupamentos familiares envolvidos e seus descendentes.