Henrique Pedro

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Que santo Alexandre nos valha!

Começo por esclarecer que, consciente da grande confusão que para aí vai, designadamente no discurso dos políticos mais categorizados, pessoalmente e sem obediência a nenhum credo partidário, mais uma vez me declaro contra o Regime político vigente, o que de forma alguma significa que seja contra o Sistema Político de Democracia Liberal e Representativa. Sistema político que, convém relembrar, assenta em três princípios fundamentais: cada cidadão seu voto, separação de poderes e eleição livre e justa dos competentes representantes para bem governar a Nação, podendo assumir várias formas constitucionais, ou regimes se se preferir. Ora, se tivermos em conta os princípios atrás citados havemos de concluir que o actual Regime português não é genuinamente democrático, nem como talse comporta, porquanto muitas dúvidas se levantam quanto à justeza dos actos eleitorais, como acaba de se constatar com os votos da emigração, para lá de que a separação de poderes e a representatividade estão amplamente viciados. Desde logo pela promiscuidade que se tem verificado entre a Presidência da República e o Governo e entre este e a Assembleia da Republica, a Justiça e a alta Finança, com a complacência da primeira instância. Depois porque também são por demais conhecidas deficiências graves da lei eleitoral e da lei autárquica, entre outras igualmente relevantes, que seria fastidioso aqui enumerar. Só assim se compreende que o Regime em apreço favoreça a corrupção generalizada, os altos índices de abstenção, o nepotismo e o compadrio, sem que os tribunais tenham mãos a medir para tantos crimes de natureza política. Sobretudo porque os políticos, genericamente falando, e os partidos, eles mesmos, vivem e medram nesse seu habitat privilegiado que defendem com unhas e dentes. Com graves prejuízos da dignidade do Estado, do erário público, da justiça social, do desenvolvimento sustentado do Pais e da coesão do território, como é por demais evidente. Não é por acaso que recorrentemente alguns políticos mais lúcidos trazem a público a emergência imperiosa da revisão da Constituição e da reforma do Estado, sem as quais a democracia continuará asfixiada e o país a definhar. É que raiz do mal está no Regime que é permissivo a todo o tipo de maldades e dos malfeitores que existem em toda a parte. Reformas que mais uma vez vão ficar congeladas com a maioria absoluta que o PS acaba de alcançar. Isto significa que o sistema de Justiça, o combate à corrupção, as leis eleitoral e autárquica vão continuar dependentes do livre arbítrio do Governo que no facciosismo, nas mordomias e sinecuras, na manipulação abusiva dos órgãos de comunicação mais influentes, tem as suas pedras de toque. Por outras palavras: a governança opaca, sectária e fantasiosa de António Costa vai adensar-se com a maioria absoluta. É o mais certo. Sem que, agora mais que nunca, nada nem ninguém lhe faça frente. Desde logo porque o actual Presidente da República já deu provas de que não tem vocação para tanto. O comentário político e as selfies emblemáticas vão continuar a ser, seguramente, o seu mais delicioso entretém. Depois porque o PSD vai continuar democraticamente inútil. Inutilidade agravada com a reconhecida falta de qualidade do seu novo grupo parlamentar. Depois porque a Justiça vai continuar enredada e subvertida apenas dignificada por meia dúzia de denodados magistrados. Depois porque a alta e a baixa Finança vão engalfinhar-se na disputa do bolo da CEE. Depois porque ao BE, destroçado e desacreditado, pouco mais resta que discutir o sexo dos anjos. Depois porque o PCP desgastado e alquebrado já tornou pública a intenção de se manifestar nas ruas, embora pouco mais consiga que sobressaltar os sem-abrigo. Algumas esperanças de dinamização e renovação democrática recaem, goste- -se ou não, nos vinte aguerridos deputados eleitos pelo Chega e pela Iniciativa Liberal que na Assembleia da Republica se farão ouvir, cada uma à sua maneira, protestando, denunciando e, sobretudo, ameaçando cativar o povo para futuros combates eleitorais, o que não deixará de muito preocupar o PS. Nunca se sabe, porém, se tudo não terminará em circo e folclore e se a montanha não irá parir um rato, até porque o mais certo será a oposição tradicional correr atrás de mitos e centrar os seus ataques no Chega e não no Governo, como seria democraticamente desejável. Eu diria, por tudo isto, que mais sólidas esperanças infunde o juiz Carlos Alexandre que aqui designo alegoricamente por santo Alexandre porque, como é por demais sabido, tem protagonizado prodigiosos milagres no combate à epidemia da corrupção. Alguns dos quais continuam a abalar o Regime, como é o caso que envolve o ex-primeiro ministro José Sócrates, figura maior do socialismo à portuguesa. Que santo Alexandre nos valha, portanto! O nosso, o de Mação, não o do Egipto! Vale de Salgueiro, 10 de Fevereiro de 2022.

A tentação totalitária socialista

Escrevo esta crónica no dia 27 quando ainda não são conhecidos os resultados eleitorais, como é óbvio, e as sondagens cada vez mais baralham os espíritos. Acresce que esta Crónica apenas será publicada depois de consumado o acto eleitoral. Não tenho, portanto, a mais pequena intenção de interferir na campanha eleitoral por mais influente que pudesse ser a minha humilde opinião. Acontece que não acredito no Regime vigente, muito embora continue a ter fé no Sistema de Democracia, liberal e representativa. Para mim, só mesmo esta democracia é revolucionária! Qual foice, qual martelo, qual punho fechado, qual sinistra globalização?! (https://henriquepedro.blogspot.com/2020/09/imperio- -mistico.html) Regime que persiste em promover a corrupção, a pobreza, as desigualdades sociais e a macrocefalia lisboeta, em prejuízo das demais regiões, em especial do meu querido Trás-os-Montes. ´ Regime que persiste em denegar o muito de bom e de bem que os portugueses fizeram por esse mundo de Cristo além. Não me cansarei de dizer, a este propósito, que militei, com muito orgulho e honra, no Exército mais humano da História que em simultâneo com a missão militar rasgou estradas, ergueu escolas e hospitais, tratou, curou, ensinou a ler e a escrever e matou a fome a milhares de infelizes. Que promoveu a paz e harmonia interétnicas e corrigiu os desmandos prevalecentes do colonialismo ancestral. Por tudo isso, não deixarei de pedir à Nossa Senhora de Fátima, se necessário for, que salve Portugal do pântano político e social em que cada vez mais se afunda. Donde se depreende que darei o meu apoio a todas as forças, sejam de esquerda, do centro ou de direita, que genuinamente se empenhem numa reforma positiva do Regime e do Estado. Mais uma vez constato, com tristeza que, apesar dos quase 50 anos que a democracia já leva, os políticos portugueses mais influentes ainda não alcançaram a necessária maturidade democrática já que se têm mostrado incapazes de bem governar o País, com maioria relativa ou absoluta. Por insuficiência de carácter ou de espirito democrático, o que os leva a discutir o cão e o gato e a pôr os interesses pessoais e partidários acima do interesse nacional. O espirito da democracia é servir o povo mas optam sistematicamente por servir o partido. É o caso de António Costa que no auge da campanha eleitoral não se coibiu de apelar ao eleitorado que premeie os seus fracassos governativos com maioria absoluta, apesar da Geringonça, da oposição de direita e do próprio Presidente da República lhe terem dado roda livre para governar como lhe apeteceu durante dois mandatos sucessivos. Controlou a comunicação social como bem entendeu, influenciou a Justiça sempre que lhe interessou, inundou o Estado dos correligionários incompetentes que entendeu. A aprovação dos Orçamentos de Estado pelo BE e o PC não foi mais do que um mero subterfúgio político circunstancial. Só quando se aperceberam que António Costa lhes comia as papas na cabeça e se arriscavam a pesadas perdas eleitorais é que decidiram por termo à governança socialista. Amónio Costa, porém, não desarmou. Incapaz de governar hegemonicamente com maioria relativa reclama agora uma maioria absoluta como a que partilhou no consulado de José Sócrates, de que foi elo fundamental. Maioria absoluta que redundou no desastre nacional que todos conhecemos comprovando que quem não é capaz de bem governar com maioria relativa pior o será com maioria absoluta. Havemos igualmente de concluir que o regime político vigente não está formatado para governos positivos de maioria absoluta ainda que também não facilite governos de maioria relativa. Apenas favorece governanças desenfreadas, ao deus dará, como se vem constatando, contrariamente a outras nações de igual natureza e dimensão. António Costa, porém, ciente do impacto negativo que a maioria absoluta de José Sócrates continua a causar na opinião pública, argumenta agora que o Presidente Marcelo de Sousa lhe não deixará pôr o pé em ramo verde. Só que Marcelo de Sousa se tem revelado o Presidente da República mais promiscuo e permissivo de sempre, como se constatou em diversos momentos críticos da governança de António Costa, como os trágicos incêndios florestais ou o assalto aos paióis de Tancos, em contraste com a vida negra que Mário Soares fez ao primeiro-ministro Cavaco Silva ou como Jorge Sampaio tratou Santana Lopes. Pedir maioria absoluta nas circunstâncias actuais é reflexo da atávica tentação totalitária socialista de António Costa, que mal disfarça com mudanças de discurso quando as sondagens lhe são desfavoráveis. Tentação totalitária essa que poderá levar António Costa a perder as eleições e a perder-se a si mesmo, à democracia e ao país, definitivamente, se as ganhar. A ver vamos.

Católicos, não crentes e sem fé

Magister Rui Rio dixit :“Sou católico mas não sou crente, não tenho fé”. “Tout court”. Esta declaração do líder do PSD no debate com a doutora Catarina Martins, a líder do BE, levantou a maior celeuma nas mais badaladas redes socias, o que não é de admirar. Porque se tratou de uma confissão insólita que já se tornou lendária. Tanto assim é que mereceu críticas exacerbadas, muitas delas desmioladas, dos mais diversificados analistas, opinantes e comentaristas. Uns tomaram-na como um mero deslize, outros como uma imbecilidade, a maior parte não compreendeu o seu propósito e oportunidade, muito menos se seria para rir, se para chorar. Houve mesmo quem opinasse que Rui Rio, embora não crente, sentiu necessidade de ali mesmo se confessar a Catarina Martins, como manda a boa educação cristã, porque esta, no dia anterior, se assumiu, no frente a frente que travou com André Ventura, do partido Chega, uma devota papisa, ou uma devotada papista, como também foi classificada, nas referidas redes sociais. Mas também houve quem opinasse que Rui Rio apenas pretendeu demarca- -se de André Ventura que é católico assumido e o seu mais incómodo adversário eleitoral. A generalidade das críticas, porém, manda a verdade que se diga, são injustas porque interpretam a polémica confissão de Rui Rio num contexto religioso, ou mesmo teológico. Se assim fosse, seria, sem dúvida, ilógica e contraditória. Mas não é! Porque o cenário é eminentemente político e é nesta perspectiva que a peregrina afirmação deverá ser analisada, o que nos levará a olhar benevolentemente Rui Rio como um português do povo e não como político de topo. Ele diz que é católico para dizer que é boa pessoa, homem sério, de confiança, como a generalidade dos portugueses a si mesmos, e a ele também, se consideram, mesmo quando não vão à missa ou se limitam a esperar as namoradas à porta da igreja ou no adro distribuem propaganda política, ou outra que seja. Depois, quando Rui Rio diz que não é crente poderá apenas querer dizer que não acredita no Regime político vigente que pretende mudar, ainda que muito ao de leve. Há que distinguir, contudo, Regime político de Sistema político o que Rui Rio parece não saber ou não lhe interessar separar. É que o Sistema de democracia liberal e representativa é, para muitos, o céu político enquanto o Regime politico português é o inferno que todos conhecemos, o mundo da corrupção institucionalizada, onde campeiam milhares de ladrões legais, demónios que infernizam a vida dos portugueses. Não é compreensível, portanto, que todo e qualquer verdadeiro democrata não se declare abertamente contra o Regime e a favor de reformas fundamentais. Por fim, Rui Rio diz não ter fé. Também aqui deve ser interpretado sob o ponto de vista político e, se assim for, surpreendentemente Rui Rio declara não ter fé que as coisas mudem, isto é, que o Regime, para o bem, se transfigure. Bem lá no fundo a generalidade dos portugueses pensa politicamente como Rui Rio, com excepção dos mais devotos que vão em peregrinação a Fátima ou a qualquer outro santuário invocar milagres, nomeadamente para salvação de Portugal. A afirmação em apreço é, última análise, uma legenda nacional porque a fórmula de Rui Rio também se aplica, com as devidas adaptações, aos demais machuchos seus colegas da política. Jerónimo de Sousa, por exemplo, muito embora não possa dizer como Rui Rio que é católico religiosamente falando, é abertamente um crente, adorador de santos como São Karl Marx ou São Estaline, para lá de que mantem acendrada fé no seu comunismo que acredita um dia governará toda a Humanidade. Já Catarina Martins demonstrou a sua piedosa religiosidade quando no debate com André Ventura se revelou a tal extremosa papisa atrás citada, mais papista que o próprio Papa. António Costa, por seu lado, sempre politicamente falando, aparenta ser um político pagão, um agnóstico que deu provas de nada entender do universo “gerigonceano”. Um governante sem doutrina, que não sabe minimamente o que anda a fazer, que governa o país ao deus-dará. Ou à deusa EU- -dará. Quanto a Marcelo de Sousa, bem, esse é o romeiro típico, o crente que não perde uma romaria para tocar a sanfona, bailar, lançar foguetes e apanhar as canas. André Ventura será o único que, na política como na religião, se declara abertamente católico, crente e ter fé de que tudo irá mudar com a sua empenhada devoção. Mas não será fé a mais?! Tudo isto seria divertido se não fosse dramático. Os portugueses são, em geral, católicos que é, com quem diz, boas pessoas, acreditam nos santos da sua estima, mas não fazem fé nos políticos. Muitos até já desabafam abertamente: mas será que não há um general, um sargento, um soldado que seja que ponha termo a tamanha javardice? Ai de nós se a crise económica, social e política se agravar, como muitos funestamente auguram!

Um vergonhoso jogo de batalha naval

A propósito da nomeação do novo chefe do Estado-Maior da Armada o senhor Marcelo de Sousa, enquanto presidente da república, o senhor António Costa enquanto primeiro-ministro em exercício, o senhor Rui Rio, enquanto putativo primeiro – ministro e o senhor Gouveia e Melo, enquanto marinheiro afamado, travaram publicamente, no mar da insídia política, uma batalha naval política, a todos os títulos lamentável. Batalha que poderá não ter ainda terminado embora haja quem diga que os senhores António Costa e Gouveia e Melo venceram o primeiro round. Batalha de que faz gáudio o jornal semanal “Tal e qual” sem que tenha sido, até ver, desmentido ou contestado pelos directamente visados. Titula, de facto, o referido jornal em toda a largura da primeira página do dia 29 de Dezembro de 2021: “ Gouveia e Melo esteve á beira de alinhar pelo PSD”. A que acrescenta o subtítulo “A manobra” do almirante” e, ainda na primeira página, explica: Rui Rio tinha o sonho de ver o “homem das vacinas” ao seu lado na próxima campanha eleitoral. E isso esteve por um fio. Mas António Costa trocou-lhe as voltas e ao mesmo tempo que “ destrunfou” o líder do PSD, fez a vontade a Gouveia e Melo, nomeando-chefe do Estado-Maior da Armada. Matéria que o jornal semanal “Tal e qual”, que cito com a devida vénia (agradecendo ao jornal Nordeste permitir- -me tão longa citação), desenvolve mais detalhadamente em páginas interiores. Trata-se de uma insidiosa batalha naval, portanto, entendida enquanto jogo político, que irá ficar inevitavelmente registada nos anais da Marinha e na história da triste democracia portuguesa. Não está em causa a categoria profissional e muito menos a eficiência com que a task force liderada pelo agora almirante executou o processo de vacinação na fase eventualmente mais crítica. Não se fique com a ideia, porém, que não há centenas de militares e civis, com competência bastante para desempenhar com igual ou superior brilhantismo a missão que muito justamente prestigiou Gouveia e Melo. Competências que, é por demais evidente, escasseiam, isso sim, na alargada manada de boys partidários que pululam na Administração Pública como se vem provando à saciedade. Por isso, o que verdadeiramente choca a qualquer democrata e português do povo é que, para começar, um emergente líder partidário com ambições de vir a ser primeiro-ministro se atreva, indecorosamente, a tentar arregimentar um almirante no activo para a sua causa pessoal e partidária. Depois, que um brioso militar tenha dado mostras de se predispor para despir a farda que garbosamente ostentou e alinhar em tal projecto. Ou será que se vestia de camuflado por congeminações estratégicas e não por louváveis razões tacticas? Depois, que tal almirante tenha imposto, ainda que sorrateiramente, ao primeiro-ministro em exercício a sua vontade e que este se tenha subordinado aos desígnios do tropa finório, tratando as Forças Armadas como uma coutada pessoal e partidária. Por fim, o que é mais grave ainda, que o mais alto magistrado da Nação e comandante supremo tenha sancionado e alinhado em tão indigna tramoia. A Corporação Militar foi, em última análise, mais uma vez usada, abusada desprestigiada e os seus mais dignos servidores tratados com mentecaptos, por personalidades que mostraram não ter o requerido perfil político e deontológico para da melhor forma governar Portugal. Personalidades que mais parecem apostadas em destruir o passado, o presente e o futuro do velhinho Portugal, sacrificando a Pátria, o Estado, a Nação e o Povo, a deuses que nem eles saberão quem são. Tudo só porque em causa estão as próximas eleições de 30 de Janeiro e o que verdadeiramente lhes interessa é o poleiro. Políticos que o próprio Regime gera para se auto desgovernar. É triste mas é verdade.

O sinistro aparelho político-partidário

Entre muitas outras coisas a palavra “aparelho” também se aplica, justamente, ao conjunto de artefactos com que se arreiam as cavalgaduras e que comporta, entre outras peças, a albarda, a rédea e a cilha. Objectos que já nada dizem às novas gerações porque os burros de quatro patas são uma espécie em vias de extinção. O que é pena porque se trata de animais dóceis que cumpriram um papel fundamental nos trabalhos rurais, até ao aparecimento máquinas agrícolas financiadas pela CEE, especificamente para esventrar e desassossegar os nossos campos paradisíacos. A cilha, para quem não sabe, é uma faixa larga que aperta a barriga da besta para que a albarda não caia. Da mesma forma que o cingidouro dos impostos cada vez mais arrocha a barriga dos contribuintes, sobretudo a dos mais magros e indefesos, que são a generalidade. Ocorreu-me esta imagem quando lia notícias relativas às recentes eleições internas do PSD que referiam que Rui Rio as ganhou contra o aparelho, precisamente. A vitória não terá sido assim tão folgada como muitos pretendem. Certo é que o jumento deu um pinote inesperado, ainda que tímido, e foi o que se viu e o que mais se verá. Falta saber se o dito jerico acabará por cair de cangalhas ou pura e simplesmente se acomodará, docilmente, sem espernear, por mais ornejos que já se ouçam, ao novo aparelho que ninguém garante será melhor que o anterior. Certo é que Rui Rio teve a coragem de montar o burro em pêlo, isto é, desaparelhado, o que lhe poderia ter sido particularmente doloroso. Acabou por provar, todavia, conhecer bem a arte de bem cavalgar toda a sela, contrariamente ao que vinha dando a entender. Não se fique a pensar, porém, que é só o PSD que tem um aparelho pomposo e sinistro com que arreia as próprias clientelas e albarda os portugueses, sempre que tem tal ensejo. O aparelho do PCP, por exemplo, embora pouco conhecido, tem-se revelado coeso e resiliente, o que não é de espantar porquanto foi talhado a foice e martelo. Já o aparelho do BE não passa disso mesmo. De uma tinta de água com que anda a dar uma primeira demão nas paredes da democracia mas que, será o mais certo, acabará por borrar a pintura se os portugueses o deixarem. Quanto ao aparelho socialista, que é volumoso e possui um acentuado toque familiar, está na espectativa de saber se o cavaleiro António Costa irá ou não aguentar os pinotes do jumento eleitoral depois que a mula Geringonça arreou das quatro patas. O que não é de espantar porque António Costa, que durante o seu longo consulado se mostrou incapaz de impor uma linha de rumo e de coordenar eficazmente os seus anafados governos, sobretudo nos momentos mais dramáticos e escandalosos, a que respondeu com burricadas atrás de burricadas. Ainda assim, o mais sinistro e arrochado aparelho é o Regime político vigente, paradoxalmente antidemocrático, comunizante e fascizante e que a tudo se presta, até para se fazer passar por um estado de direito, muito embora privilegie, descaradamente, os criminosos de alto gabarito. E é por uma questão de elementar justiça que aqui expresso uma vénia respeitosa à meia dúzia de magistrados, com Carlos Alexandre à cabeça, que tudo fazem para salvar a honra do convento. Certo é que este aparelho político-partidário regimental arreia e derreia os portugueses, principalmente com a albarda dos impostos, a rédea solta da corrupção e os estribos doirados da Justiça em que se estribam os criminosos mais notórios que, como se sabe, são hábeis cavaleiros do povo. Todos nós, portugueses, independentemente do credo, da raça ou da ideologia deveríamos sentir vergonha e, mais do que isso, indignação, pela democracia que somos e ser capazes de, democraticamente, dar uns tantos pinotes e atirar com a albarda ao ar. Sem ligar aos partidos que mais uma vez já afinam as suas aparelhagens sonoras para darem a música do costume aos eleitores nas eleições que se aproximam e posteriormente os poderem ajaezar a seu gosto. Música pimba. Claro é, partido a põe. PS.: Desejo um Santo e Feliz Natal a todos quantos o Jornal Nordeste passa pelas mãos e esta minha humilde crónica pelos olhos. Vale de Salgueiro, 16 de Dezembro de 2021 (Este texto não se conforma com o novo Acordo Ortográfico)

 

Forças Armadas: o espelho do Regime

Dizia-se, noutros tempos, que as Forças Armada eram o espelho da Nação. Havia muito de verdade nessa conhecida asserção porquanto todos os jovens com idade para tanto, independentemente da sua naturalidade ou condição social, eram ajuramentados para servir militarmente Portugal. Graciosamente, note-se. Eram o melhor que a Nação tinha, que a representava com fidelidade e por isso a Nação neles se revia e dessa forma muito os valorizava. Presentemente não é bem assim. As Forças Armadas são, bem pelo contrário, o espelho em que se reflectem as piores malformações do Regime, as decisões mais gravosas de governos sucessivos, com destaque para o chefiado pelo primeiro-ministro António Costa. Governo que foi malfadado pela Geringonça, como se sabe e que tem envolvido as Forças Armadas num chorrilho de escândalos tão desprestigiantes quanto injustos. Geringonça que faliu na forma, mas não no conteúdo, já que a sua ideologia, chamemos-lhe “gerigoncianismo”, uma caldeirada de comunismo, capitalismo e oportunismo, de que o próprio António Costa é ideólogo principal, continua a condicionar negativamente a vida política, económica e social. E militar, como é óbvio. Aos sucessivos escândalos que têm rebentado no seio das Forças Armadas na vigência formal da Geringonça, com destaque para o assalto aos paióis de Tancos, que continua por esclarecer, se é que algum dia o será, mesmo depois das habituais bocas do Comandante Supremo que as comanda por megafone a partir das varandas do palácio de Belém, acaba de se juntar um outro ainda de maior amplitude e gravidade já que não se confina ao mundo menor da NATO e tem forte repercussão internacional. Escândalo que, quer os senhores do “establishment” queiram quer não, afecta gravosamente não apenas as Forças Armadas mas o Estado no seu todo. Como era de esperar, agora no caso dos diamantes que municiam as armas dos combatentes da Operação Miríade, como no assalto aos paióis de Tancos, nenhum digníssimo governante assumiu a sua responsabilidade e se demitiu. Quando muito aceitaram, seraficamente, o digno papel de ignorantes, a começar pelo Presidente da República e pelo primeiro-ministro. Escovaram a água do capote como soe dizer-se. A verdade, porém, é que na Operação Miríade como no assalto de Tancos, a culpa é de todos. Desde alto a baixo e daqui para cima. É do soldado que comete o crime, do sargento que não controla o soldado, do comandante de pelotão que não conhece os homens que comanda, do coronel que não prepara e treina devidamente os militares que envia para o campo de batalha, do ministro que não acerta uma no cravo, do primeiro-ministro que mais uma vez dá provas de não ser capaz de coordenar eficazmente o governo e do próprio comandante supremo que o finge ser para português ver. Abre-se aqui, todavia, uma outra memória do antigamente quando se dizia que que “as Forças Armadas são um mal necessário”. Máxima atribuída ao ditador Salazar mas que julgo ter sido empregue noutros tempos e espaços e por muitas outras personalidades. Ideia que não deixa de ter sentido, dependendo, muito embora, do contexto e da intencionalidade com que é proferida. Males desnecessários, porém, não faltam no Regime e no Estado português. No espírito do“gerigoncianismo” as Forças Armados são, isso sim, um mal desnecessário. A abater, portanto. Poi isso o governo de António Costa as tem reduzido a uns tantos generais com os peitos enfeitados de condecorações para ornamentar tribunas cerimoniais e a grupos de mercenários, sem alma nem pátria, como agora se viu na República Centro Africana. E que o próprio Comandante Supremo confirma quando afirma publicamente que se trata de forças da ONU e não de Portugal. Mercenários, sem dúvida. Governo que só ainda não enxovalhou ainda mais as Forças Armadas porque sabe que há milhares de portugueses vivos que não se coíbem de manifestar os seu orgulho de terem militado no Exército mais humano da História que no extinto Ultramar rasgou estradas, ergueu escolas e hospitais, tratou, curou, ensinou a ler e a escrever e matou a fome a milhares de infelizes, em simultâneo com o cumprimento das missões de combate. Que promoveu a paz e harmonia interétnicas e corrigiu os desmandos prevalecentes do colonialismo ancestral. E que jamais deixarão de evocar e de honrar os muitos camaradas, brancos e negros, que tombaram no campo de batalha ou de lá saíram fisicamente diminuídos. Sem esquecer que face à miséria que grassa pelo Mundo, em África em particular e Angola em especial, a descolonização criminosa foi uma grande perda para a Humanidade. É por demais evidente que o “gerigoncianismo” de António Costa está apostado em converter o Estado-Nação num Estado Novo de Negação da História. Do passado e do futuro. Começando por destruir o que de mais essencial uma Nação possui-as suas Forças Armadas, enquanto alfobre de virtudes cívicas e de garante da integridade e independência nacionais. E da própria democracia. Quem semeia ventos colhe tempestades. 

Requiem pela Geringonça

Seis longos anos durou a Geringonça. Bastante mais do que se previa. Geringonça que, contrariamente ao que se pensa, não se limitou a fazer prova de vida sempre que foi chamada a aprovar sucessivos Orçamentos de Estado. Sub-repticiamente corrompeu ainda mais e aprofundou as contradições do Regime em consonância com os desígnios ideológicos dos seus constituintes da estrema esquerda. Tornou o futuro do país e da democracia ainda mais problemáticos, como agora diariamente se constata. Acabou por se desconjuntar ruidosamente. Ainda bem. O estrondo ainda se faz ouvir fragoroso e as peças ainda rolam incontroladas pela última ribanceira, o OE2022, que já não conseguiu vencer de tão gasta que andava, presa por arames e a bater válvulas. E agora? Apetece perguntar. Agora que já nenhum bate- -chapas lhe pode valer, resta à rapaziada socialista divertir-se e divertir os portugueses a buzinar o velho calhambeque, com António Costa ao volante, como diz a cantiga de Roberto Carlos, enquanto aguarda, ansiosa, o restauro do Cadillac da maioria absoluta. Rapaziada para quem nem seriam precisos mais orçamentos de Estado ou eleições e melhor seria deixar ficar tudo como está. Em família. Mais divertido ainda será, porém, se o calhambeque socialista for ultrapassado, nas curvas e contracurvas eleitorais, por um Ferrari de maior cilindrada, vindo da direita e em contra mão. Depois do que se viu em Lisboa com Medina e Moedas tudo é possível. Atenção que esta história não é para rir. É para reflectir e eventualmente para chorar. Todos os portugueses livres e de bons costumes, honi soit qui mal y pense, grupo no qual eu humildemente considero que me incluo, têm razões de sobra para se sentirem enojados e desfeiteados e se indignarem cívica e eticamente com o comportamento dos políticos em geral e de muitos governantes em particular. Nunca o Regime desceu tão baixo. Por obra e graça de uns tantos artistas, poucos que fossem seriam demais, incompetentes, cínicos e traidores que campeiam na política portuguesa. Que enfie o barrete quem lhe servir. Não é da democracia que se queixam os portugueses, porém. É da politicalha e dos politicalhos que habilmente se servem da democracia para se servirem a si próprios, devastando o Estado e a Nação. A bondade da Geringonça confinou-se a pontuais e irrelevantes benefícios sociais na esteira do abrandamento da austeridade imposta pela Troica, sem a qual não teria sido possível salvar Portugal dos dislates cometidos por sucessivos governos, com destaque para os socialistas de José Sócrates. Já as suas maldades, porém, vão muito para lá da desfiguração de Orçamentos de Estado, como melhor se verá a partir de agora, à medida que o Estado regurgitar as suas dramáticas incapacidades em todos os domínios, com relevância para a Saúde, a Educação, a Segurança Pública ou combate à corrupção. Particularmente significativo é o tratamento indigno que tem sido dado às Forças Armadas, a que não é alheia a ideologia mais íntima da Geringonça, que preconiza reduzi-las a uns tantos generais enfeitados de medalhas para ornamentar tribunas políticas e a grupos de mercenários sem alma nem pátria. Justa e honrosa é, por isso, a revolta dos paraquedistas que no dia do Exército foram impedidos de cantar o seu hino em louvor ao seu patriotismo. António Costa, o demiurgo da Geringonça, tem vindo a cometer erros capitais atrás de erros capitais. Com a Geringonça foi a sua estrelinha que se apagou. Levado pela sede de poder e instinto de sobrevivência política afrouxou a corda dos princípios ao limite e sobreavaliou a flexibilidade ideológica do PCP e do BE a quem, está visto, a democracia continua a pouco ou nada dizer. Deslumbrado com o sucesso original arredou, com sobranceria e insensatez, o PSD e o CDS do seu confinado diálogo político, como se de portugueses de outro credo ou raça se tratasse. Optou mergulhar de cabeça no pântano da Geringonça, como se viu, acabando por se afundar inexoravelmente. Já nem mesmo as artimanhas de Marcelo Maquiavel, em desespero de causa, foram capazes de lhe valer. Foi com a graça da Geringonça que ambos prestaram um péssimo serviço ao país, confundindo estabilidade política com promiscuidade institucional e convertendo a democracia num perigoso forrobodó. Esperemos que a eventual colação de Marcelo e Rangel a não transforme num permanente delírio. Tudo é de esperar do próximo acto eleitoral porque os portugueses, por natureza emotivos, reactivos e de memória curta, reagem em diferido, como sentem e nem sempre decidem racionalmente. Certo é que Portugal precisa, como de pão para a boca, de uma democracia reformada e renovada, com novos políticos capazes de imprimirem ao Regime a honestidade, a dignidade e a confiança que lhe falta. Democracia é sinónimo de dignidade e de serviço público. Não de aldrabice e corrupção. 

Pão, circo e socialismo (q.b.)

O Orçamento do Estado para 2022, que o Governo apresentou na Assembleia da República em 11 de Outubro, será votado, na generalidade, já no próximo dia 27, mas tem a votação final global agendada apenas para 25 Novembro. Tempo mais que suficiente, portanto, para o primeiro-ministro António Costa fazer valer as suas competências de domador de feras, dentro e fora do circo de São Bento. São Bento que é isso mesmo: uma tenda em que assentou arraiais a companhia circense Geringonça, que há seis anos dá pão, circo e socialismo (q.b.), ao povo português. Com muitos e variados números de ilusionismo, malabarismo e engolidores de sapos, agora abrilhantados com mágicos pozinhos de perlimpimpim polvilhados pela generosa bazuca bruxelense. Circo que muito tem divertido e distraído a maioria dos portugueses dos reais problemas do país, como convém aos talentosos artistas governamentais. Circo que nesta temporada pós Covid tem o seu número mais arrojado com o temerário primeiro-ministro a meter a cabeça nas mandíbulas escancaradas do feroz leão PCP e do sinistro leopardo BE, enquanto o dócil PAN exibe as habilidades dos seus cãezinhos amestrados. Tudo com o rufar de tambores anunciadores de uma eventual crise política que silenciam os ecos da sistémica crise económica e social que é bem mais grave e persistente. Quanto à bicharada de direita, que o afortunado domador António Costa remeteu para as galerias, tem-se limitado a piar baixinho, desafinada, à espera que a barraca abane. Não é de todo improvável que, quer o leão PCP, quer o leopardo BE, ou os dois em simultâneo, se vejam compelidos a fechar desastradamente as mandíbulas. Porém, se o fizerem, não será com o intuito de decepar o domador mas apenas para salvar as suas próprias cabeças. BE e PCP que, confrontados com a total e universal falência prática do marxismo puro e duro, procuram sobreviver com recurso à demagogia primária que não belisca o mais débil capitalismo, sequer, e nada de visível acrescenta à nação que trabalha. Ou será que já aprenderam que só mesmo a democracia é revolucionária?! Certo é que, se tal acontecer, apagar-se-ão definitivamente os holofotes da Geringonça, o que não significa, contudo, que o domador Costa não sobreviva. Bem pelo contrário! O mais provável até será o espetáculo de São Bento prosseguir sob a sua batuta, por algum tempo mais, embora com renovada companhia. Mais se evidenciará, contudo, outra competência deste prócere político também conhecido como mestre de sacudir a água do capote: o de saco de box, tanta a pancada que irá levar, de todos os lados. O mote até já foi dado por três conhecidas personalidades do mais alto gabarito, nada mais nada menos que Marcelo de Sousa, presidente da República em exercício, Cavaco Silva e Ramalho Eanes, dois ex-presidentes da mesma República, que recentemente vieram a público bater-lhe forte e feio. Não o fizeram por razões de cacaracá, o que só lhes ficaria mal, até porque sempre deram provas de se baterem por causas do mais alto interesse nacional, talvez com excepção de Marcelo de Sousa que, por tudo e por nada, opina sobre questões de lana caprina. As matérias tratadas por tão ilustres figuras são, de facto, altamente relevantes, porque estão intimamente ligadas à sobrevivência da Democracia e ao futuro da Nação. Foram pancadas certeiras e demolidoras que teriam provocado a imediata queda do primeiro-ministro, ou de alguém por ele, se houvesse vergonha e moralidade na política portuguesa. Tanto assim é que Marcelo de Sousa, a propósito da exoneração do Chefe de Estado-Maior da Armada, não se limitou aos palpites habituais. Puxou dos galões pela primeira vez e deu dois murros na mesa, o que fez com que António Costa de pronto metesse o rabo entre as pernas e arrepiasse caminho. Por sua vez, Ramalho Eanes, que em matérias do foro militar sabe bem do que fala e tem reconhecida autoridade, verberou, com o seu timbre peculiar, a mais que evidente tentativa de politização das Forças Armadas e mesmo a sua eventual partidarização o que, no seu avisado entendimento, poderia ser facilitada pela ambição e falta de carácter de alguns militares, como tão tristemente aconteceu no PREC, de mão memória. Já Cavaco Silva, por mais handicaps que lhe possam apontar, num extenso artigo publicado no Jornal Expresso limitou- -se a evidenciar preocupações partilhadas pelos economistas mais categorizados. Um discurso que ficaria melhor, é certo, na boca de Rui Rio, o principal líder da oposição que, lamentavelmente, continua a desaguar em mares que ainda nenhum navegador descobriu. Desgraçadamente, como bem se vê, a barca lusitana continua a navegar à vela e à vista do próximo naufrágio e os portugueses a sobreviver com o socialismo (q.b.), o circo e o pão recheado de impostos que o diabo do Regime amassou. Vale de Salgueiro, 21 de Outubro de 2021

Cinismo e Abstencionismo

É por demais sabido que o Sistema Democrático (liberal e representativo, em que o princípio um homem um voto, a separação de poderes e a representatividade das diferentes ideologias são práctica e são lei) não se esgota num único Regime político. E é por demais óbvio que os políticos do Regime vigente em Portugal, que favorece a adulteração sistemática do Sistema Democrático, nada têm feito para aumentar a participação dos portugueses nos sucessivos actos eleitorais e trazer a abstenção para valores minimamente aceitáveis. Para lá de discursos relapsos e de desenxabidas promessas de reforma. Sobretudo desde que senhor António Costa pôs em marcha o PRREPS (Processo Revolucionário de Redução do Estado ao Partido Socialista), com a conivência do BE e do PCP e a inação do PSD. A persistente taxa de abstenção eleitoral, vergonhosamente elevada, como mais uma vez se verificou nas últimas eleições autárquicas, é uma marca do Regime e um instrumento de que os manda-chuvas partidários, não só socialistas, se servem para sobreviver, adiando sistematicamente reformas fundamentais. Como é o caso da lei eleitoral e do recorrente processo de recenseamento de eleitores, precisamente. Tomemos o exemplo das eleições presidenciais de 24 de Janeiro de 2021, as mais recentes do género, em que a taxa de abstenção excedeu os 60%, com menos de ¼ dos eleitores legalmente habilitados a credenciar pelo voto o Presidente da República em exercício. Ora, é por demais evidente que nenhum Regime político, mesmo revestido de roupagens democráticas, se poderá assumir como genuinamente democrático quando mais de ¾ dos eleitores se alheia da eleição do mais alto magistrado da Nação. A verdade nua e crua é que mais de ¾ dos eleitores não abonaram expressamente tal eleição o que não preocupou nenhum político, mais interessados que estão com a sobrevivência, ainda que contra natura, do Regime corrupto. O abstencionismo, sistémico, e o cinismo político, atávico, coexistem na perfeição, como se vê. O problema fundamental, porém, não está na deficiente educação cívica dos portugueses como muitos pretendem. Bem pelo contrário, a abstenção tem razões diversas ainda que a maior parte delas não tenham o peso que muitos lhe querem dar. Desde logo a eventual doença, ausência ou simples comodismo dos abstencionistas cujos números não serão, quanto a mim, significativos para justificar a anormalidade da abstenção. Também há quem invoque a desatualização dos cadernos eleitorais que igualmente terá um peso marginal, para lá de que são por demais conhecidos episódios lamentáveis em que defuntos e ausentes milagrosamente também votam, por interpostas pessoas, claro está. A razão maior, isso sim, é que a grande maioria dos abstencionistas não se sente motivada a votar, indiferente e desgostosa que anda com o dito sistema, os ditos partidos, os ditos políticos, a dita corrupção e coisas que tais. Ou porque, pura e simplesmente, se não revê nas soluções e nas alternativas eleitorais que lhe são apresentadas. E também porque as forças políticas que têm poder para tanto, promovem a viciação das sondagens eleitorais com o propósito de desmotivar aqueles que, à partida, reconhecem como adversos. Já no que aos votantes diz respeito muitos são, por certo, os que louvavelmente votam só porque entendem que devem assumir o direito e dever de votar sem outros interesses associados. Honra lhes seja prestada. A maioria, porém, fá-lo porque obviamente serve, se serve ou espera vir a servir ou a servir- -se do sistema. Claro que os partidos que granjearam clientelas e militantes seguros não estão interessados em que haja votantes que não sejam seus simpatizantes. O seu único interesse é ganhar eleições, com maioria absoluta se possível, nem que seja um só cidadão a votar. Daí que não lhes interesse promover a ida às urnas dos abstencionistas porque sabem, de antemão, que isso os prejudicaria. Assim se compreende que os políticos mais influentes do presente regime menosprezem o voto obrigatório mesmo se configurado de forma justa, adequada e democraticamente persuasora. Não o fazem por opção ideológica, seguramente, (qual marxismo, qual liberalismo, qual esquerda, qual direita!), mas por meras razões corporativas. E porque sabem que só a democracia livre e representativa é verdadeiramente revolucionária, desde que genuína e plenamente assumida. A verdade é que quem não cumpre o dever de votar também não pode reclamar direitos correlativos, porque o voto é simultaneamente um direito político e um dever cívico. Havemos de concluir que cinismo atávico e abstencionismo sistémico são a alma do regime. Servem o sistema prevalecente mas corrompem a democracia.

Negacionismo a Ferro e fogo

A definição mais justa de negacionismo encontrei- -a no Diccionario de la Lengua Española, da Real Academia Española, que reza assim: Actitud que consiste en la negación de determinadas realidades y hechos históricos o naturales relevantes, especialmente el Holocausto. Especialmente o Holocausto, vejam só! Não sei, nem me importa saber, como é ou deixa de ser o cidadão Eduardo Ferro Rodrigues na sua vida particular e muito menos privada. Enquanto figura pública e principalmente Presidente da Assembleia, a segunda figura do Estado logo a seguir ao Presidente da mesmíssima República, note-se bem, é comumente tido como arrogante, faccioso e mal-educado. Um manancial de animosidade, portanto, que em nada prestigia o cargo que exerce. A verdade é que foi eleito por um número suficiente de portugueses. Ou malteses, sabe-se lá, integrando uma emblemática lista do género “todos à molhada e fé no partido”, tão característica da democracia lusitana. A sua nomeação como presidente de tão douta assembleia política foi posteriormente acordada interpares. Ferro Rodrigues é uma figura de proa partidária, um machucho do emergente totalitarismo socialista que paulatinamente tem vindo a abocanhar a democracia portuguesa, sobretudo desde que António Costa, com a bênção de Marcelo de Sousa, seu amigo de circunstância, ousou controlar avassaladoramente a comunicação social mais determinante, instalar agentes na administração pública e política mais relevante, tutelar a denegação da justiça nos processos políticos mais escandalosos, explorar a confrangedora acefalia da oposição de direita e manipular a esquerda a seu bel-prazer. Não quero com isto dizer que Ferro Rodrigues, enquanto Presidente da Assembleia da República, não deva ser democraticamente respeitado, mesmo quando o próprio, no exercício do cargo, se não dá ao respeito. Bem pelo contrário! Entendo até que as ameaças e os insultos de que foi alvo quando almoçava tranquilamente, acompanhado pela esposa, num restaurante próximo do Palácio de São Bento, devem ser drasticamente verberados, publicamente e nos tribunais. Ofensas que os principais órgãos de comunicação social atribuíram a negacionistas, “tout court”, sem considerações relevantes sobre esta importante temática, o que evidencia algum tipo de engajamento. Importa esclarecer, por isso, que negacionismos e negacionistas há muitos e para todos os gostos. Desde logo há os que negam a existência de Deus, que a Terra seja redonda, a evolução darwiniana, o aquecimento global ou o próprio Holocausto, o que é, quanto a mim, o espanto maior. Não seria de admirar, portanto, se alguém viesse agora argumentar que o “homo politicus” Ferro Rodrigues não existe, de tão surpreendente que é. Só mesmo o seu correligionário Eduardo Cabrita, ministro da Administração Interna, se lhe compara mas também ninguém apareceu, até hoje, a duvidar da sua existência. No caso que envolveu Ferro Rodrigues não restam dúvidas, porém, de que se está apenas e tão-somente, perante negacionistas da COVID-19 e da justeza da vacinação contra este flagelo que irreflectidamente associam ao desastrado Presidente da Assembleia da República, como se tivesse sido ele, mais os seus acólitos, a inventá-la, embora não necessariamente a produzi-la na chafarica de São Bento. É que, se assim fosse, tal não passaria de um “remake” da teoria da conspiração de que que os chinocas se conseguiram safar, até melhor ver. É claro que os negacionistas lusitanos da Covida-19 estão no exercício pleno de um consagrado direito democrático. Devem é apresentar argumentos relevantes, cientificamente validados para as suas reivindicações e fazê-lo de forma pacífica e dentro da Lei. O que não foi o caso. É o que acontece, por regra, com os diferentes tipos de negacionismo que irrompem nas democracias liberais, que poderão nada ter de espontâneo e antes serem provocados, promovidos e financiados por forças escondidas. Com realce para as que preconizam a tão badalada Nova Ordem Mundial que é, na verdade, uma hidra de sete cabeças, expressão moderna, em última análise, da velha tentação totalitária, não sendo necessária grande imaginação para encontrar tentáculos americanos, chineses ou mesmo islamitas, entre outros, a esbracejar subrepticiamente. Preocupante é, contudo, concluir que todos eles contemplam a extinção de grande parte da Humanidade por diversas vias, mesmo quando declaram o contrário, no quadro de uma governação mundial optimizada em função dos seus próprios desígnios totalitários. São forças que, sob capas progressistas, esquerdistas e revolucionárias, mesmo quando marcadamente de direita, privilegiam a mobilização de ingénuos e papalvos, porque assim se torna mais fácil e eficaz a desmoralização e destabilização de sociedades e da própria Humanidade.